Como manejar corretamente daninhas em maracujá
Manejo equilibrado é uma necessidade tanto para prevenir competição por recursos como água e nutrientes, como para evitar agravamento de outros problemas
O tomateiro (Solanum lycopersicum) é uma das culturas olerícolas comerciais de maior importância, com destaque dentre as solanáceas cultivadas. Entretanto, muitos problemas fitossanitários incidem na cultura, causando perdas consideráveis. Uma das principais doenças do tomateiro é a mancha bacteriana, que afeta todos os órgãos da parte aérea da planta e, quando em alta severidade, compromete a área fotossintética, além de ocasionar redução da quantidade e qualidade dos frutos. Até o início deste século, a doença era atribuída a dois agentes causais: Xanthomonas vesicatoria e X. axonopodis pv. vesicatoria. Posteriormente, no ano de 2004, por meio de estudos envolvendo ferramentas de biologia molecular se constatou que quatro espécies causavam esta doença, com diferenças epidemiológicas e sintomatológicas sutis entre elas. Embora todas ocorram em tomateiro no Brasil, a espécie X. perforans é considerada prevalente nas principais áreas de produção.
Apesar de existirem diferentes raças de X. perforans, o que aumenta as chances de sucesso no controle da doença por meio de resistência genética em plantas de tomateiro, outras alternativas associadas ao manejo da doença são importantes para auxiliar que os genótipos melhorados apresentem uma resistência durável, além de atender demais cultivares que não sejam resistentes à mancha bacteriana. Ainda que alguns defensivos sejam registrados para o seu controle, com ênfase nos cúpricos, dados demonstram que o seu uso frequente leva à seleção de estirpes resistentes do patógeno, fazendo com que percam sua eficácia. Neste contexto, a oferta de outras opções é importante para compor um rol de alternativas para integrarem a estratégia de controle da mancha bacteriana.
O uso de ativos biológicos é uma opção interessante como componente do manejo integrado de doenças. Sua demanda é crescente e atende a diversos modelos produtivos, abrangendo desde pequenas e médias propriedades, com adoção gradativa pelas de grande porte. Também agrega como vantagens a redução do impacto ambiental e social das atividades agrícolas, um aspecto cada vez mais demandado pela sociedade. Esses fatores fazem com que o mercado de defensivos naturais cresça mais a cada ano.
Entretanto, o controle biológico de bacterioses de plantas é um desafio, principalmente devido à grande versatilidade dos patógenos bacterianos. Dentre as estratégias de controle de bacterioses por meio de ativos microbianos, algumas são mais estudadas, como o uso da indução de resistência mediada por rizobactérias. Porém, estes agentes podem atuar também de outras formas, permitindo-se explorar aspectos referentes às suas características ecológicas importantes de estabelecimento e sobrevivência. É possível destacar, por exemplo, a disputa por nichos, que envolve não somente a competição por recursos fundamentais para o seu estabelecimento, mas também pela produção de compostos inibitórios capazes de auxiliar na sua ocupação.
Em princípio, um agente de controle biológico que exerça esta disputa com o agente causal de uma doença é promissor. Imagine-se uma semente recém-semeada. Ao germinar, tanto o sistema radicular como a parte aérea em processo de emergência entram em contato com micro-organismos do solo. Destes, os capazes de utilizar e se beneficiar dos exsudatos radiculares irão competir pela ocupação da área ao redor das raízes (rizosfera), uma vez que neste local a planta irá lhes prover, convenientemente, fonte de nutrientes. O mesmo ocorre na ocupação da superfície das folhas (filoplano). À medida que a planta se desenvolve, essas populações de micro-organismos se estabelecem. Portanto, aqueles que forem mais aptos a competir pelos exsudatos terão mais chances de prevalecer, em detrimento dos demais. Neste processo, a produção de compostos inibitórios a outros organismos é outra habilidade que lhes traz vantagens. Este mesmo princípio pode ser aplicado aos agentes de controle biológico, uma vez que utilizar os modos de ação envolvidos na disputa entre um organismo benéfico e um patógeno é um fundamento inerente ao controle biológico.
Adicionalmente, um agente de biocontrole que tenha características que lhe permitam resistir a fatores adversos do ambiente também constitui uma vantagem. Estes aspectos fazem com que bactérias do gênero Bacillus e gêneros correlatos ganhem um olhar especial, tanto pela sua versatilidade quanto pela sua capacidade de produzir esporos de resistência, que lhes conferem capacidade de sobrevivência diante de fatores adversos.
Diante destes fundamentos, uma pesquisa colaborativa recente entre Embrapa, IF Goiano e o Laboratório Farroupilha, envolvendo essas bactérias, postulou que quanto mais mecanismos este agente de controle exerça, maiores são suas chances de atingir um bom resultado na redução da intensidade da mancha bacteriana do tomateiro. Além disso, procurou responder à pergunta: Quais modos de ação o micro-organismo tem que utilizar para exercer o controle desta doença?
Neste estudo, um isolado de Bacillus forneceu estas respostas. Após sobressair entre outras bactérias pré-selecionadas, uma estirpe de Bacillus velezensis demonstrou que algumas características são de fato importantes para que um ativo microbiano consiga controlar a mancha bacteriana. A primeira delas foi a capacidade de competir por recursos com o patógeno. Foi observado que tanto o B. velezensis quanto a X. perforans são capazes de metabolizar, em grande parte, as mesmas fontes de açúcares e compostos nitrogenados. Isso indica que, quando as duas bactérias estão disputando o mesmo espaço, irão competir pelos mesmos recursos para se estabelecer. Em tese, quem conseguir se estabelecer primeiro, será capaz de ocupar determinado nicho, desfavorecendo aquele que chegar depois. Um segundo aspecto observado foi que B. velezensis produz compostos inibitórios a X. perforans. Quando cultivados juntos, B. velezensis mostrou capacidade de inativar as células de X. perforans cinco horas após o momento em que foi adicionado o mesmo substrato. Após esse período juntos, as células de X. perforans colocadas para crescer não conseguiram gerar colônias. Isso indica que o agente de controle biológico produz uma substância capaz de matar células do patógeno rapidamente. Sendo assim, onde o agente de controle biológico se estabelece o nicho se torna bastante desfavorável a X. perforans. Essas duas propriedades explicam como B. velezensis atua no controle da doença, diretamente na parte aérea da planta. Ou seja, naqueles locais onde B. velezensis se estabelece, X. perforans tem dificuldade de sobreviver na superfície da planta antes de causar infecção, resultando em menores danos à planta. Mesmo que X. perforans consiga causar infecção em alguns locais, a presença do antagonista poderá interferir na viabilidade da fonte de inóculo que seria dispersa para iniciar novos ciclos da doença, reduzindo os danos.
Outra forma de atuação constatada foi a capacidade em induzir resistência. Quando presente nas raízes das plantas de tomateiro, a doença demorou mais tempo para ser observada nas folhas e os danos foram menores enquanto o seu efeito permaneceu ativo. Ensaios com enzimas relacionadas à resposta de indução de resistência mostraram que pelo menos duas delas, peroxidase e polifenoloxidase, tiveram relação com a capacidade de controle da doença. Este modo de controle traz como vantagem a capacidade do bioagente desencadear uma resposta sistêmica de defesa na planta. Isso faz com que contribua no controle da doença em diversos locais da planta, mesmo sem a sua presença nos sítios de infecção.
Portanto, pode-se considerar que esta estirpe de B. velezensis pode atuar tanto direta quanto indiretamente no controle da mancha bacteriana. Quando em folhas, competindo e inibindo o estabelecimento da X. perforans. Quando nas raízes, ativando resposta de resistência da própria planta. Esta versatilidade de modos de ação com que este agente de controle atua faz com que seja um interessante ativo biológico no controle da bacteriose. Soma-se também a sua característica em produzir esporos de resistência, que permite que este micro-organismo possa se estabelecer com maior facilidade no tomateiro, além de aumentar a sua viabilidade e o tempo de prateleira como um produto formulado.
Os modos de ação empregados por B. velezensis no controle da mancha bacteriana lançam uma luz nos atributos que são importantes para que um micro-organismo interfira em um patógeno bacteriano de parte aérea, resultando em redução de danos às plantas. A compreensão de como atuam é fundamental, tanto para definir a melhor maneira de usá-los como para prospectar novos bioativos. Explorar os aspectos inerentes tanto ao agente de biocontrole quanto ao patógeno é fator-chave quando se buscam ativos biológicos. A condução de alguns estudos em campo envolvendo, por exemplo, a frequência de aplicação e a concentração de células viáveis a serem utilizadas em formulação ainda é passo a ser trilhado para oferecer esta tecnologia para uso, de fato, pelo agricultor. Entretanto, os resultados encontrados até o momento permitem mostrar como é relevante a compreensão do modo como age um organismo benéfico em detrimento de outro nocivo e que um maior número de mecanismos de ação envolvidos pode resultar em maior efetividade do agente de controle.
Bernardo de Almeida Halfeld-Vieira, Embrapa Meio Ambiente
A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade.
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