Artigo: Indução de resistência como ferramenta para manejo da mancha bacteriana do tomateiro

30.09.2011 | 20:59 (UTC -3)

A mancha bacteriana é uma das doenças mais destrutivas para a cultura do tomate, pois provoca perdas severas tanto no segmento de tomate para consumo in natura como no de processamento industrial. Isto se deve ao fato de a doença atacar todos os órgãos da parte aérea da planta. O primeiro relato da doença no Brasil data da década de 50, no estado de São Paulo. Hoje ela já se encontra disseminada em todas as regiões produtoras do país.

Nas folhas, os primeiros sintomas são observados quando da formação de pequenos pontos encharcados, devido ao congestionamento de água nos tecidos. Estes sintomas evoluem para manchas de cor marrom, que podem ter tons mais claros ou mais escuros. Neste ponto, os sintomas são facilmente confundidos com os causados por outras doenças, como as fúngicas pinta preta (Alternaria spp.), septoriose (Septoria lyvopersici) e mancha de estenfílio (Stemphyllium sp.).

As manchas também podem aparecer no pecíolo, no caule e nas partes florais, provocando queda de flores e frutos em formação. Nos frutos, as lesões se iniciam como pequenos pontos esbranquiçados, que se confundem com os do cancro-bacteriano (Clavibacter michiganensis subsp. michiganensis), evoluindo para lesões de cor marrom, deprimidas e de textura áspera.

Anteriormente, acreditava-se que a doença era causada por apenas uma espécie bacteriana, denominada Xanthomonas campestris pv. vesicatoria. Estudos recentes comprovam que a mancha bacteriana do tomateiro pode ser causada por quatro diferentes espécies do patógeno (X. euvesicatoria, X. gardneri, X. perforans e X. vesicatoria), cada uma com diferentes especificidades, tanto no que diz respeito ao ambiente, como em relação à gama de hospedeiros.

A mancha bacteriana acarreta grandes perdas à cultura do tomate em razão da diminuição da superfície foliar fotossintetizante, que leva à redução de frutos, escaldadura pela exposição ao sol, depreciação da qualidade de frutos com manchas, somado aos gastos com agroquímicos para o controle da doença e outras medidas de manejo.

Atualmente, não se dispõe de variedades comerciais com bons níveis de resistência à doença, o que pode ser resultado da variabilidade do patógeno, só agora em fase de estudo. Desta forma, o manejo da doença tem sido baseado na pulverização de defensivos de forma preventiva, principalmente com a utilização de fungicidas cúpricos e antibióticos agrícolas. Tais produtos apresentam diversas desvantagens, o que tem levado ao estudo de novas moléculas que possam elevar a eficiência do controle químico da mancha bacteriana.

Desde o início do século XIX, sabe-se que plantas podem responder ao ataque de patógenos por meio da ativação de mecanismos de defesa. Estes mecanismos são ativados a partir de sinais percebidos no ponto de infecção e transmitidos de forma sistêmica para outras partes da planta. Este fenômeno é denominado resistência sistêmica adquirida (SAR).

Após a descoberta de SAR, estudos sobre as respostas de defesa das plantas ganham cada vez mais atenção, tendo em vista o potencial prático de aplicação destes conhecimentos no controle de doenças nas culturas. Tais estudos levaram à descoberta de que determinados produtos químicos também podem induzir respostas de defesa nas plantas.

Plantas expostas a tais substâncias podem ser elevadas a um estado denominado de indução, onde seus tecidos reagem mais rapidamente e com maior eficiência às tentativas de infecção do patógeno. Além da sistemicidade, este tipo de resistência tem como vantagens o fato de ser duradoura e de amplo espectro.

A partir da década de 80, tiveram início programas de triagem de moléculas, com o objetivo de encontrar substâncias capazes de ativar SAR em culturas de importância econômica. Uma das alternativas seria a utilização do ácido salicílico, composto produzido pelas plantas, envolvido na sinalização de SAR. Entretanto, quando aplicado externamente, o ácido salicílico demonstrou ser extremamente fitotóxico.

No início da década seguinte foi descoberto o acibenzolar-S-metil (ASM), um análogo do ácido salicílico, com potencial de induzir SAR em plantas sem, no entanto, acarretar em fitotoxidez. Os primeiros trabalhos foram realizados com trigo, sendo rapidamente avaliado o seu emprego em outras culturas contra os mais variados agentes patogênicos. Em 2001, Louws e colaboradores realizaram o primeiro trabalho com o objetivo de avaliar o efeito do ASM no controle da mancha bacteriana em lavouras de tomate no nordeste dos Estados Unidos.

Foi observada redução da severidade da doença com a aplicação do ASM tanto em relação à testemunha não tratada, como aos tratamentos convencionais utilizados pelos produtores. A partir daí, diversos trabalhos foram feitos com o ASM para o controle da mancha bacteriana do tomateiro.Entretanto, não são raros os relatos em que a aplicação deste indutor não se traduz em bom nível de controle da mancha bacteriana, tanto em trabalhos de pesquisa, como em cultivos comerciais.

Com o objetivo de identificar possíveis fatores que venham a interferir no funcionamento acibenzolar-S-metil, um estudo vem sendo conduzido em conjunto entre a Embrapa Hortaliças e a Universidade Federal de Viçosa (UFV). Tal trabalho busca potencializar o uso do ASM no controle da mancha bacteriana no tomate para processamento industrial, doença considerada pelos técnicos envolvidos neste segmento como um dos principais problemas fitossanitários.A primeira etapa do trabalho teve como objetivo avaliar em condições controladas o efeito residual do ASM na indução de resistência do tomate à mancha bacteriana, tendo em vista que esta informação é fundamental para determinar o momento em que se deve reaplicar o produto(intervalo de aplicação). Plantas da variedade suscetível Yuba foram tratadas com ASM em intervalos variando entre 14 e zero dias antes da exposição das plantas ao patógeno (X. perforans). Ao se avaliar o percentual da área foliar lesionada, observou-se que a ação do produto na proteção das plantas só era percebida até o quinto dia após a aplicação do ASM (Figura 1). Este resultado demonstra a necessidade de se utilizar intervalos de aplicação não muito superiores a cinco dias.

Nos Estados Unidos existem relatos de recomendações de intervalos de aplicação de até 14 dias, o que também tem sido adotado por alguns produtores no Brasil. Entretanto, de acordo com os resultados obtidos, a adoção de tal intervalo pode deixar a planta desprotegida por um período consideravelmente longo. Sabendo-se que grande parte dos produtores realiza a aplicação de agroquímicos semanalmente, um intervalo de aplicação de sete dias poderia ser avaliado para a aplicação do ASM em campo.

Assim, em um segundo momento, avaliou-se a aplicação do ASM para o controle da doença na cultivar Heinz 9992 em campo experimental, em comparação com outros produtos tradicionalmente utilizados para o controle da doença, bem como com uma testemunha não tratada. Em todos os tratamentos, adotouse o intervalo de aplicação de sete dias, com volume de calda de 500L/ha e concentração da calda conforme recomendada na bula dos respectivos produtos. Após a sexta aplicação, 49 dias depois da inoculação, avaliouse a severidade da doença. Foi possível observar maior eficiência no controle da doença quando da utilização do ASM, em relação aos demais tratamentos nas condições utilizadas (Figura 2). Entretanto, em continuidade à pesquisa, procurar-se-á identificar fatores que possam interferir nesta eficiência. Além disso, são necessários mais estudos para determinar o gasto energético que a indução de resistência impõe à planta. Quezado-Duval e colaboradores (2005) observaram que a utilização do produto em número superior a dez aplicações pode interferir negativamente na produtividade.

Outros produtos têm sido avaliados como indutores de resistência em tomate, para o controle da mancha bacteriana. Nos Estados Unidos está sendo avaliada a aplicação da harpina, proteína extraída de uma bactéria, como indutora de resistência em tomate contra a mancha bacteriana. Apesar de alguns trabalhos terem demonstrado a diminuição da severidade da doença, os resultados a campo ainda são variáveis. No Brasil, outros produtos tidos como indutores de resistência também têm sido constantemente avaliados para o controle da mancha bacteriana, como alguns fosfitos e silicatos. Entretanto, não se tem observado resultados consistentes.

O uso de indutores de resistência apresenta-se como interessante ferramenta de controle da mancha bacteriana na cultura do tomate, tendo em vista o seu efeito sistêmico, a compatibilidade com outros produtos e o amplo espectro de ação, o que acaba auxiliando no controle de outras doenças. Entretanto, novos estudos, principalmente em campo, devem ser realizados a fim de se potencializar os efeitos dos produtos já utilizados, encontrar novas opções de indutores de resistência, bem como avaliar o efeito na produtividade final da cultura do tomate.

UFV

Embrapa Hortaliças

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