Evento em Goiás debate o papel do Estado na autossuficiência do trigo nacional

Expansão da cultura no Centro-Oeste é estratégica ao cumprimento da agenda exigida de produção de 20 milhões de toneladas/ano até 2030

15.12.2023 | 13:53 (UTC -3)
Joseani M. Antunes
Foto: Alex Malheiros
Foto: Alex Malheiros

Discutir o potencial de Goiás para tornar o Brasil não apenas autossuficiente na produção de trigo, mas também inverter a balança comercial, transformando o país em grande exportador do grão. Foi com esse desafio que o Conselho Temático da Agroindústria (CTA) da Fieg, o Sindicato dos Moinhos de Trigo da Região Centro-Oeste (Sindtrigo) e a Embrapa Trigo, promoveram nesta semana o Fórum do Trigo Tropical de Goiás .

O evento reuniu, na Casa da Indústria, em Goiânia (GO), representantes da indústria, produtores rurais e demais atores da cadeia tritícola. O fórum contou com painéis e palestras, que abordaram detalhes sobre o potencial do Estado para o planejamento do grão.

"Precisamos diversificar nossas culturas em Goiás. E o CTA-Fieg está aqui para incentivos esse movimento e fomentar o desenvolvimento em nosso Estado”, afirmou Marduk Duarte, presidente do conselho, ao falar sobre o potencial do trigo em Goiás, destacando que “a meta é plantar trigo em Goiás, industrializar os grãos em Goiás e garantir o abastecimento do consumo goiano, além de gerar renda exportando o excedente”, complementou.

Dados da Embrapa mostram que a área propícia ao cultivo do trigo tropical no Brasil é estimada em 4 milhões de hectares, sendo 1,5 milhão disponíveis ao cultivo irrigado e 2,5 milhões ao cultivo sequeiro. Considerando a área potencial de produção de trigo tropical, apenas 12,5% são cultivados com o cereal. Os cultivos abrangem além dos estados da região Centro-Oeste (GO, MT, MS e DF), Minas Gerais, São Paulo e Bahia.

"Temos muito espaço para aumentar a cultura do trigo em Goiás. Além de área para cultivo, nossas indústrias já possuem capacidade instalada para processar 700 mil toneladas/ano do grão. Entretanto, nossa produção está na casa de 300 mil toneladas/ano”, argumentou Sérgio Scodro, presidente do Sindtrigo. Ele explicou que a qualidade do trigo plantado em Goiás é elaborada aos melhores trigos do mundo e que é preciso superar alguns desafios para o avanço da cultura no Estado, como aumentar o diálogo com os produtores de soja e equacionar a questão da armazenagem. "Estamos confiantes nesse avanço e empenhados nessa parceria técnica com a Embrapa para promover a cultura do trigo na região", disse.

O diretor de administração e finanças do Sebrae/GO, João Carlos Gouveia, apresentou algumas ações da instituição voltadas ao suporte no caminho ao crescimento da triticultura na região: “Estamos investindo em programas voltados à capacitação de recursos humanos e ao fomento do trigo em Goiás , como redução de perdas, boas práticas de produção e selo de qualidade dos grãos e subprodutos”.

Potencial do Centro-Oeste

No Cerrado brasileiro, a produção de trigo em Goiás vem crescendo nos últimos anos, e atingiu cerca de 300 mil toneladas na safra de 2023. Isso representa um crescimento de 4,8 vezes no período de sete anos e é a maior produção da série histórica da cultura, desde 1982. Na comparação com a safra de 2022, o volume estimado para a produção goiana de trigo no ciclo atual representa um crescimento de 36,2%. O recorde é puxado principalmente pelo aumento da área plantada de trigo em Goiás, com uma expansão projetada de 33,3%. Os 100 mil hectares destinados à cultura na safra de 2023 também representam a maior área do cereal já registrada no estado, de acordo com os agentes da cadeia produtiva goiana. 

Apesar do Brasil não figurar entre os principais players na produção de trigo e de o cultivo do grão em território nacional estar concentrado no Sul do País (92%), vem de solo goiano o resultado de máxima eficiência na produção de trigo. Em 2021, no município de Cristalina, o Brasil atingiu o recorde mundial de produtividade/dia de trigo (80,9 kg/ha/dia), chegando a 9.630 kg/ha, em trabalho comercial em sistema irrigado. “O trigo veio para contribuir com os associados da Coopa-DF que tinham equipamentos de soja e de milho. Uma terceira renda trazida pelo trigo garante segurança ao produtor nesta 'indústria a céu aberto' que é a agricultura”, avalia o produtor Paulo Bonato, detentor do recorde mundial de produtividade em 2021. “O trigo é o futuro para o nosso Estado”, conclui o produtor.

Opinião semelhante foi compartilhada pelo Chefe Geral da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski. Ele destacou o crescimento do trigo tropical no Brasil, que chegou a 1,3 milhão de toneladas em 2023, crescendo a área de cultivo em sete estados da federação. Segundo ele, o planejamento do complexo agroindustrial do trigo goiano para o próximo ano prevê diversas ações de transferência de tecnologia na região, como capacitação da assistência técnica para qualificar ainda mais a atuação no trigo tropical, através da parceria com a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), a instalação de novas Unidades de Referência Tecnológica em trabalhos, palestras e dias de campo. “Vamos avançar ainda mais na agenda do trigo em Goiás, como parte da agenda 20-30, isto é, chegar a 20 milhões de toneladas de trigo/ano no Brasil até o ano de 2030”, afirma.

Desafios e oportunidades

No âmbito das oportunidades, o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Ailton Vilela, ressaltou que o Sul do Brasil se aproxima do teto produtivo da cultura, com pouca margem para crescimento, por isso a importância dessa expansão para outras regiões: “A autossuficiência brasileira de trigo passa obrigatoriamente pelo Cerrado”.

Nesse sentido, o produtor Cláudio Malinski, que também é responsável técnico da Coopa-DF, defende que Goiás tem potencial para se tornar protagonista nessa produção. "O trigo é uma cultura que permite ganhar dinheiro, com manejo que traz excelentes resultados ao sistema de produção, como controle de nematóides, oferta de raízes que melhoram o solo e quebra no ciclo de doenças com rotação na soja, no feijão e no milho. O estado de Goiás tem potencial para se tornar o Brasil grande exportador de trigo, assim como o Sul, revertendo o cenário atual de importação de cereais", disse.

Durante o Fórum, foram apresentados os resultados agronômicos do projeto Transferência de Tecnologia ao Cultivo de Trigo em Goiás. O trabalho, conduzido pelo engenheiro agrônomo Rodrigo Zuccolin, do Moinho Vitória, fez avaliações de solo em cinco propriedades rurais em diferentes locais do Estado, para verificar limitações físicas e/ou químicas para maximizar a produção de trigo nas atividades. “Constatamos resultados excelentes e outros a melhorar. Vemos produtores plantar na época certa, utilizar a melhor cultivar, o pacote fitossanitário mais eficiente, mas se o solo não estiver equilibrado, o resultado não é esmagador. Com o solo pobre, sem correção das especificações físicas e químicas, o trigo não consegue expressar o potencial da cultura na região”, explica Rodrigo.

Os principais obtentores de genética de trigo tropical estiveram presentes no Fórum, apresentando cultivares e direcionamentos das linhas de melhoramento genético ocorrendo no Brasil. Desafios como brusone (principal doença da cultura em ambiente tropical), déficit hídrico e calor são alvo de todas as empresas, com resultados que evoluíram gradativamente ao longo dos anos, permitindo ao trigo avanço no ambiente tropical. “A safra deste ano surpreendeu positivamente a todos nós, que estamos há décadas na triticultura. Conseguimos qualidade e produtividade, o que indica o cenário de crescimento contínuo para o cultivo da cultura na região”, declarou o presidente da Associação dos Triticultores de Minas Gerais (Atrie-MG), Eduardo Abrahim. Atualmente, o ambiente tropical conta com 14 cultivares indicadas para a região, em sistemas irrigados e de sequeiro.

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