Como barrar avanço do vetor do greening nos pomares do Sul do Brasil
Para evitar que inseto e doença se disseminem nos demais estados do Sul, como SC, é preciso redobrar atenção às medidas de monitoramento
27.05.2020 | 20:59 (UTC -3)
Cultivar Hortaliças e Frutas
O Huanglongbing dos citros (HLB), também conhecido como Greening, é a doença mais importante dessa frutífera atualmente. A doença é causada pela bactéria habitante de floema Candidatus Liberibacter asiaticus e é transmitida pelo psilídeo-asiático-dos-citros, Diaphorina citri Kuwayama (Hemiptera: Liviidae). Os principais sintomas da doença são mosqueado nas folhas, nervuras amarelas e salientes, frutos pequenos, deformados e assimétricos com sementes abortadas, queda de folhas e de frutos. O mosqueado é o principal sintoma resultante da infecção pela liberibacter, e se caracteriza pela coloração verde clara e escura sem delimitação evidente nas folhas. As alterações provocadas pelo HLB nas plantas provocam grandes perdas de produtividade e podem levar a planta à morte dentro de poucos anos.
O HLB foi detectado no Brasil em 2004, em Araraquara, no estado de São Paulo, e encontra-se disseminado de forma severa em São Paulo e em vários municípios de Minas Gerais e Paraná. No entanto, a doença é considerada uma praga quarentenária A2 no Brasil, ou seja, não está distribuída em todo o território nacional. Não existem variedades comerciais resistentes ou tolerantes ao HLB nem medidas curativas para a doença. Portanto, a única maneira de manejo desta doença se baseia na prevenção da infecção da árvore cítrica. Nos locais onde a doença é endêmica no Brasil, o manejo da doença no campo vem sendo conseguido com certo sucesso ao serem utilizadas estratégias que envolvem plantio de mudas sadias, eliminação de plantas doentes e controle de D. citri, especialmente se essas medidas forem aplicadas regionalmente pelos citricultores. Em locais onde o HLB não está presente, o citricultor deve adquirir mudas produzidas em viveiros idôneos e evitar o transporte de mudas de outros estados, especialmente se a origem desse material não é conhecida.
Há o risco de introdução do HLB nos estados do Sul do Brasil, onde a doença ainda não está presente ou ao menos não foi relatada. A doença vem sendo disseminada pelo Noroeste do Paraná. Possivelmente, as condições climáticas que ocorrem entre o Noroeste do Paraná e Oeste e extremo Oeste de Santa Catarina são propícias ao psilídeo, o que aumenta o risco de introdução do patógeno do HLB através da dispersão do inseto vetor. De fato, o psilídeo vetor foi registrado no estado em 2004, no município de Chapecó (Chiaradia et al, 2006). Caso a tendência da dispersão continue, é provável que o HLB chegue ao extremo Oeste catarinense. A disseminação da doença pelo estado traria grande impacto aos pequenos produtores de citros, que são maioria absoluta no estado e que seriam obrigados a erradicar plantas e possivelmente pomares inteiros, levando ao abandono da cultura. O estado do Rio Grande do Sul tem população de psilídeo, mas não há registro da doença. Manuela Sulzbach e colaboradores, em artigo publicado na revista Tropical Plant Pathology em 2018, estimam que o risco de introdução e disseminação do HLB no estado do Rio Grande do Sul pode ser classificado como médio ou alto e consideram que a presença da doença em países vizinhos e o transporte de frutas de outras regiões são os fatores que mais colaboram para o risco.
A Instrução Normativa n° 53, de 16 de outubro de 2008, rege que, em Unidades Federativas sem a ocorrência da praga, o Órgão Estadual de Defesa Sanitária Vegetal realize levantamentos semestrais da doença. As condições encontradas devem ser informadas regularmente ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc), juntamente com a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), tem monitorado a ocorrência do HLB no estado. O monitoramento da doença é feito através de levantamentos do psilídeo vetor do HLB no estado, bem como vistoriando os pomares na busca de plantas com sintomas típicos do HLB, como o mosqueado. Diferentes métodos de amostragem são utilizados para monitorar populações de D. citri em campo. Um método comumente utilizado é a avaliação da população de psilídeos através de observação visual das plantas em busca de ovos, ninfas e adultos do psilídeo. Outro método largamente utilizado é a captura de adultos em armadilhas adesivas amarelas, disponíveis comercialmente. Em diversos lugares no mundo onde a doença foi primeiramente identificada, a detecção se deu através de inspeções baseadas no psilídeo vetor, devido à facilidade de instalação de armadilhas para a captura desses insetos e à dificuldade de reconhecer os sintomas na planta, que muito se parecem com deficiência nutricional.
O monitoramento sistemático no estado de Santa Catarina foi iniciado em 2016. Atualmente, são vistoriados pomares comerciais nos municípios de Chapecó, Itajaí, Mafra, Celso Ramos, Araranguá, Balneário Rincão, Pouso Redondo, São Lourenço do Oeste e Apiúna. Armadilhas adesivas amarelas são instaladas no terço superior das plantas cítricas, nas bordas e no interior dos pomares. Após recolhidas, as armadilhas são enviadas para o Laboratório de Fitossanidade do Centro de Pesquisa para Agricultura Familiar (Cepaf/Epagri), onde são examinadas buscando-se a presença do psilídeo com a ajuda de um estereomicroscópio. D. citri é um inseto pequeno, que mede 2,7mm a 3,3mm de comprimento quando adultos, com manchas marrons características nas asas. Aproximadamente 2.500 armadilhas já foram analisadas e um psilídeo D. citri foi encontrado em apenas uma. Em teste molecular para a detecção de liberibacter, verificou-se que o inseto não estava infectado com a bactéria. Árvores com sintomas também não foram encontradas durante as vistorias desses pomares. Até o presente momento, o HLB não foi detectado em Santa Catarina, estado que se apresenta com a condição de “livre de ocorrência da praga” perante o Mapa.
Medidas como essa que a Cidasc e a Epagri realizam são também desempenhadas em outros locais com o intuito de prevenir a invasão do HLB e o consequente impacto sobre a citricultura local. A Argentina tem um programa de monitoramento e erradicação do HLB e dispõe de um canal aberto de comunicação com a instituição responsável funcionando continuamente. Viveiros clandestinos são destruídos quando encontrados. A doença já foi relatada por lá, assim como na Colômbia e no Paraguai. No Peru, onde a doença ainda é ausente, medidas de prevenção foram implementadas, nas quais apreende-se material sem certificação em circulação. Nos Estados Unidos, uma medida de quarentena foi anunciada a partir da detecção de uma única árvore doente no condado de San Bernardino, na Califórnia. A medida proíbe o movimento de todos os materiais ou partes de citros a partir daquela área. No Brasil, a Instrução Normativa n° 53 rege não apenas o monitoramento da doença em áreas onde está presente e ausente, mas também medidas para prevenir a sua disseminação, como a produção de mudas e material de propagação em ambiente protegido, cuja construção esteja de acordo com exigências e trânsito de material com certificação fitossanitária de origem e permissão. Todo material em que se constata a infecção pelo HLB é eliminado.
A produção brasileira de laranja é a maior do mundo e responde por mais de 60% do total de suco produzido e 80% do mercado internacional. A produção de laranja em Santa Catarina gera rendimento bruto de aproximadamente R$ 11 milhões, dos quais se beneficiam 1.371 produtores (dados de Goulart Junior et al, Relatório de projeto: Fruticultura Catarinense - Valor da produção comercial na safra 2014/15), na sua maioria agricultores familiares, o que evidencia a importância social da citricultura para os produtores catarinenses. Mais de 80% da produção se concentra nas regiões Oeste e Alto Vale do Itajaí, com predominância de laranjas e tangerinas voltadas para a indústria de sucos e consumo in natura. Como não há oferta de cultivares resistentes ao HLB nem medidas curativas à doença, medidas preventivas para impedir sua introdução em Santa Catarina e em outros estados onde a doença não está presente se fazem necessárias. Os produtores catarinenses de citros devem entrar em contato com a Cidasc caso identifiquem suspeita do HLB em sua propriedade.
Maria Cristina Canale, Rodolfo Vargas Castilhos, Luana Aparecida Castilho Maro e Eduardo Cesar Brugnara, Epagri
Cultivar Hortaliças e Frutas abril/Maio 2020
A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade. Na edição de abril/maio você confere também:
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