Cientistas sugerem melhor método para criar trigo mais produtivo

Estudo indica que selecionar plantas em condições ideais permite maior rendimento mesmo sob estresse hídrico e climático

09.10.2025 | 08:05 (UTC -3)
Revista Cultivar, a partir de informações da Universidade de Barcelona

A estratégia mais eficiente e econômica para o melhoramento genético do trigo deve começar pela escolha de variedades com alto potencial de rendimento em ambientes agronomicamente favoráveis. Apenas nas fases finais do processo, as linhagens devem ser testadas nas regiões de destino, onde o clima e o solo são mais desafiadores.

Essas são algumas das conclusões de revisão científica conduzida por pesquisadores da Universidade de Barcelona, da Universidade de Talca (Chile) e da Universidade de Adelaide (Austrália).

O grupo analisou dados agronômicos, fisiológicos e genéticos de diversas variedades de trigo em diferentes ambientes, buscando responder uma questão recorrente entre melhoristas: é mais eficaz selecionar variedades pelo potencial de rendimento ou pela adaptação ao estresse?

Estratégia em duas etapas

A proposta envolve duas fases. A primeira concentra-se nas seis ou sete primeiras gerações da seleção. Nessas etapas, os cruzamentos ocorrem sob condições ideais de cultivo, com disponibilidade plena de água, nutrientes e temperatura estável. O objetivo é identificar plantas com maior produtividade bruta.

Na segunda etapa, as linhagens mais promissoras seguem para testes finais nas regiões onde serão cultivadas comercialmente. Com isso, os pesquisadores buscam identificar quais genótipos expressam melhor seu potencial nos ambientes reais, sem depender exclusivamente de adaptações a condições extremas.

Os três tipos usuais de relações genótipo × ambiente (G×E) para rendimento de grãos de trigo em diferentes ambientes - doi.org/10.1016/j.tplants.2025.07.012
Os três tipos usuais de relações genótipo × ambiente (G×E) para rendimento de grãos de trigo em diferentes ambientes - doi.org/10.1016/j.tplants.2025.07.012

José Luis Araus, professor da Universidade de Barcelona, afirma que “o que é bom em condições ideais também tende a ser bom sob estresse moderado”. Segundo ele, variedades desenvolvidas diretamente em condições severas, como seca extrema, costumam ter desempenho limitado em termos de produtividade, o que reduz sua viabilidade comercial, especialmente na Europa.

Menos custos, mais precisão

Reduzir o número de locais de teste inicial pode diminuir o custo global do melhoramento genético de variedades. Além disso, a seleção em ambientes controlados aumenta a eficiência do processo, pois permite uma melhor expressão do potencial genético das plantas.

Em condições adversas, fatores como falta de água, solos pobres ou temperaturas instáveis dificultam a distinção entre características genéticas e ruído ambiental.

Araus explica que “em ambientes ideais, o potencial genético se manifesta com mais clareza”, facilitando a escolha das plantas mais promissoras. Depois, essas variedades seguem para ambientes-alvo, onde passam por ajustes finais de seleção.

Características que aumentam a produtividade

O estudo também identificou características fisiológicas e agronômicas ligadas ao aumento do rendimento, com ênfase no uso eficiente da luz solar e na captação de água.

Plantas com folhas superiores mais verticais, por exemplo, distribuem melhor a radiação ao longo do dossel, permitindo que folhas inferiores também realizem fotossíntese de forma eficaz.

Características relacionadas à atividade fotossintética, estado hídrico e carboidratos solúveis em água associadas a genótipos que não apresentam efeito de cruzamento entre diferentes ambientes - doi.org/10.1016/j.tplants.2025.07.012
Características relacionadas à atividade fotossintética, estado hídrico e carboidratos solúveis em água associadas a genótipos que não apresentam efeito de cruzamento entre diferentes ambientes - doi.org/10.1016/j.tplants.2025.07.012

A capacidade de absorver mais água também aparece como vantagem. Para isso, variedades com raízes profundas ou adaptadas para captar água da superfície, em caso de chuvas ou irrigação, apresentam desempenho superior.

Outros fatores relevantes incluem a produção de mais espigas por metro quadrado, maior número de grãos por espiga e maior taxa de fotossíntese por unidade de radiação solar absorvida. Esses elementos dependem da arquitetura da planta e da capacidade de manter os estômatos abertos sob boas condições de hidratação.

Potencial de adaptação

O estudo desmonta a ideia de que há um “conflito inevitável” entre potencial produtivo e tolerância ao estresse. Os dados indicam que é possível encontrar genótipos com alto rendimento tanto em ambientes favoráveis quanto sob seca ou calor moderado.

Essa ausência de efeito “crossover” (quando uma variedade produtiva em um ambiente tem desempenho ruim em outro) abre caminho para melhoristas priorizarem o potencial genético sem comprometer a adaptação.

Em regiões com clima mediterrâneo, como o Chile, genótipos com maior produtividade em condições irrigadas também apresentaram bom desempenho sob seca. Características como alta condutância estomática, baixa temperatura do dossel e maior discriminação isotópica de carbono foram associadas a rendimentos elevados.

A busca por eficiência fotossintética

A pesquisa também destaca o papel da arquitetura da planta na eficiência do uso da radiação solar, conhecida como RUE (sigla em inglês para radiation use efficiency). Plantas com folhas mais eretas e verdes, aliadas a maior concentração de açúcares solúveis e bom índice de colheita (HI), tendem a converter melhor a energia solar em biomassa.

A fotossíntese realizada pelas espigas, especialmente durante o enchimento de grãos, também contribui significativamente para o rendimento. Esse mecanismo pode representar de 10% a 80% dos assimilados do grão, dependendo do genótipo e do ambiente.

Outras informações em doi.org/10.1016/j.tplants.2025.07.012

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