Uso de nitrogênio em milho

Importância de estabelecer estratégias que aumentem a eficiência agronômica do uso do nitrogênio e minimizem perdas

30.01.2023 | 15:37 (UTC -3)

Essencial para a produtividade o Nitrogênio é também o nutriente mais complexo para manejo e recomendação na cultura do milho. Sua oferta está relacionada a diversos processos, que incluem mineralização/imobilização, volatilização, desnitrificação e lixiviação. Por isso a importância de estabelecer estratégias que aumentem a eficiência agronômica do seu uso e minimizem perdas.

O milho é uma das culturas mais exigentes em fertilizantes, especialmente os nitrogenados. O suprimento inadequado desse nutriente é um dos principais fatores limitantes ao seu potencial produtivo, principalmente no estádio reprodutivo (Kappes et al., 2009). Diferentemente do que se observa com outros nutrientes, como o fósforo e o potássio, a quantidade de nitrogênio (N) disponível no sistema solo-planta pode sofrer variações significativas em função de alterações na adição e na perda do nutriente no solo. Assim, a oferta de N está relacionada a diversos processos, tais como mineralização/imobilização, volatilização, desnitrificação e lixiviação. Esses processos afetam a eficiência de uso do N que, normalmente, não ultrapassa 50 % do que é aplicado no solo, quando a fonte utilizada é a ureia (Saiz-Fernandez et al., 2015).

Entre os principais mecanismos de perdas de N, destacam-se a lixiviação e a volatilização. A lixiviação consiste na movimentação do N mineral (nitrato e amônio) disponível no solo para camadas mais profundas, por ação da água que infiltra (Peng et al., 2015). Desta forma, o nutriente não é absorvido pelas raízes das plantas, além de ser uma fonte de contaminação de águas superficiais e subterrâneas (Cerri et al., 2009). Por sua vez, a volatilização envolve a perda de nitrogênio na forma gasosa (amônia - NH3). A volatilização de NH3 é a principal reação que diminui a eficiência de utilização pelas plantas do N proveniente da ureia, quando aplicada sobre a superfície do solo (Tasca et al., 2011). A quantidade de N volatilizada após a aplicação superficial de ureia ao solo é muito variável e depende de inúmeros fatores, incluindo condições ambientais e atributos relacionados ao solo. Esse fenômeno pode ser pouco relevante, totalizando de 1%  a 15 %, ou atingir valores expressivos, maiores que 50 % do N aplicado (Sangoi et al., 2016).

Nesse sentido, estratégias de manejo que minimizem perdas e otimizem o uso de N, devem ser consideradas. Dessa forma, com objetivo de diminuir essas perdas, tem sido estudada a eficiência do uso de fertilizantes estabilizados com compostos que reduzem as reações de perdas de N no solo. O correto manejo da adubação nitrogenada deve suprir a demanda das plantas nos períodos críticos, maximizar a eficiência agronômica do N e minimizar o impacto ambiental, pela redução de perdas.

Fontes estabilizadas de N em milho

As fontes estabilizadas de N utilizam inibidores da atividade de enzimas, como da urease e/ou da nitrificação do amônio, junto ao grânulo. Possuem menores taxas de liberação do nutriente em relação aos fertilizantes convencionais. O uso de fontes estabilizadas pode aumentar a eficiência da adubação nitrogenada, com obtenção de maiores produtividades de grãos de milho.

Inibidores da urease

Atualmente, o uso de inibidores da enzima urease é o mais difundido. A adição desses compostos à ureia comum tem a finalidade de diminuir a atividade da enzima urease e, em consequência, a hidrólise da ureia. Quando se utiliza a ureia comum, o pico de perdas de amônia por volatilização ocorre 48 horas após sua aplicação em solo seco (Viero et al., 2012; Menezes, 2015), conforme pode-se observar na Figura 1.

Figura 1.	Percentagem de perda do N aplicado na forma de ureia comum (U) e ureia com inibidor de urease (UI), nas doses de 100 e 200 kg ha-1 de N, em três manejos da irrigação em milho, na época de semeadura antecipada (agosto/setembro), em dois anos agrícolas. Eldorado do Sul-RS. Após a adubação (a e d); antes da adubação (b e e) e somente aos sete dias após adubação (c e f). Fonte: Menezes (2015).
Figura 1. Percentagem de perda do N aplicado na forma de ureia comum (U) e ureia com inibidor de urease (UI), nas doses de 100 e 200 kg ha-1 de N, em três manejos da irrigação em milho, na época de semeadura antecipada (agosto/setembro), em dois anos agrícolas. Eldorado do Sul-RS. Após a adubação (a e d); antes da adubação (b e e) e somente aos sete dias após adubação (c e f). Fonte: Menezes (2015).

A utilização da ureia com inibidor da urease retarda os picos de volatilização de amônia em relação à ureia comum (Menezes, 2015), diminuindo as perdas por volatilização de amônia e aumentando o aproveitamento de N pelas plantas. Os compostos que apresentam estrutura análoga à da ureia, como o NBPT ((N-(n-butil) tiofosfórico triamida), possuem boa eficiência, por apresentarem características de solubilidade e difusividade similares às da ureia. O NBPT precisa ser convertido ao seu análogo de oxigênio NBPTO (fosfato de N-n-butiltriamida), que ocupa o mesmo sítio de ligação, inativando a enzima urease. A velocidade de conversão de NBPT em NBPTO depende da oferta de O2 e pode levar apenas minutos ou horas em solos bem arejados.

Os inibidores de urease inibem a ação da enzima por um período em que ocorrem as maiores perdas, principalmente nos primeiros 15 dias, ocorrendo o pico de perdas aos dois dias após a sua aplicação. O intervalo da efetiva inibição depende, principalmente, da temperatura e da umidade do solo, pois o NBPT é degradado por microrganismos.

Em solos de textura mais arenosa, como os Argissolos, há maior resposta à aplicação de ureia com inibidor da urease e, consequentemente, maior eficiência de uso do N (Tabela 1). Nesse solo, a aplicação de 120 kg /ha de N na forma de ureia com inibidor da urease aumentou 20 % a produtividade de grãos do milho, em relação ao uso da ureia comum (Tabela 4). Já em outro estudo, realizado em solo com característica textural mais argilosa, como o Nitossolo, não houve resposta à aplicação da ureia com inibidor da urease e ao uso de outras fontes de N no estado de Santa Catarina em relação à ureia comum, com quatro doses de N (Figura 2) (Mota et al., 2015).

Figura 2. 	Produtividade de grãos de milho em função da aplicação de doses de nitrogênio em cobertura, na média de quatro fontes de N, em dois anos agrícolas. Lages-SC. Fonte: Mota et al. (2015).
Figura 2. Produtividade de grãos de milho em função da aplicação de doses de nitrogênio em cobertura, na média de quatro fontes de N, em dois anos agrícolas. Lages-SC. Fonte: Mota et al. (2015).
Tabela 1
Tabela 1

Em 15 experimentos conduzidos nos solos de textura média a argilosa no estado do Paraná, a utilização da ureia com inibidor da urease não resultou em maior produtividade de grãos de milho em relação à ureia comum (Fontoura et al., 2015). No entanto, nesses estudos a volatilização de N reduziu de 20 %, com o uso da ureia comum, para menos de 5 % com a aplicação da ureia com inibidor da urease. A redução de 15 % nas perdas de N por volatilização é similar à diferença de custo entre a ureia comum e a ureia com inibidor da urease.          

A magnitude de perdas de N por volatilização de amônia também depende das condições de precipitação pluvial que ocorrem imediatamente antes ou depois da aplicação da ureia. A incorporação do adubo nitrogenado, logo após sua aplicação, via irrigação e/ou precipitação pluvial (20 ou mais mm) por meios mecanizados, é uma alternativa eficiente para reduzir perdas de N (Menezes, 2015). Por outro lado, as perdas aumentam quando se aplica ureia comum em solo úmido (Tabela 2).

Tabela 2
Tabela 2

As perdas de N da ureia comum por volatilização de amônia reduzem a disponibilidade de N para a planta, resultando em maior senescência foliar em relação ao uso da ureia com inibidor da urease (Figura 3). Em consequência dessa menor oferta de N, há redução da produtividade de grãos e da eficiência agronômica de uso do N (Tabela 3), resultando em prejuízos ao produtor e ao ambiente.

Figura 3.	A utilização da ureia com inibidor da urease (IU+IN) reduz as perdas de N por volatilização de amônia e, em consequência, a senescência foliar em relação à ureia comum (UC). Fonte: Caio Borges, 2015.
Figura 3. A utilização da ureia com inibidor da urease (IU+IN) reduz as perdas de N por volatilização de amônia e, em consequência, a senescência foliar em relação à ureia comum (UC). Fonte: Caio Borges, 2015.
Tabela 3
Tabela 3

Para se analisar as vantagens econômicas do uso da ureia com inibidor da urease deve-se considerar que seu custo é de 10% a 15 % superior ao da ureia comum.

Inibidores da nitrificação

Outra fonte estabilizada de N é a ureia com os inibidores da nitrificação. Esses inibidores atuam desacelerando o processo de transformação de amônio (NH3) em nitrato. Com isso, o N permanece na forma amoniacal, que é menos suscetível à lixiviação, ficando preservado no solo por mais tempo (Trenkel, 2010). Atuam na primeira fase da nitrificação, diminuindo a atividade das bactérias do gênero Nitrosomonas. Com isto, retardam a oxidação do amônio a nitrito por algum tempo. Assim, a segunda fase da nitrificação não ocorre, pois falta nitrito para ser oxidado a nitrato.

Desde os anos de 1970 tem-se dado ênfase à utilização de inibidores sintéticos da nitrificação. Dentre os disponíveis no mercado, destacam-se a nitrapirina. Na década de 1990, surgiu o dicianodiamida (DCD). Posteriormente, no início do presente século, foi desenvolvido o 3,4 dimetilpirazolfosfato (DMPP). Em trabalho desenvolvido pela UFRGS nos anos agrícolas 2015/16 e 2016/17 (Tabela 4) foi testado um produto lançado recentemente, que possui os dois inibidores juntos, o da urease e o da nitrificação, denominado de Neon, da empresa americana Eco Agro.

Tabela 4
Tabela 4

A nitrapirina pertence ao grupo dos organoclorados (2-cloro-6-triclorometil-piridina). Quando aplicada em condição de temperaturas elevadas no solo, pode ser ativa por um período de seis a oito semanas. Entretanto, sua atividade de inibição é potencializada em solos com temperaturas baixas, podendo inibir o processo da nitrificação por até 30 semanas (Trenkel, 2010).

Já o DCD é originado a partir de cianamida de cálcio. Apresenta alta solubilidade em água e rápida mineralização, quando comparado a outros inibidores, como a nitrapirina. Com isso, sua capacidade de inibição fica restrita a um período de quatro a 10 semanas, dependendo das condições de temperatura e de atividade microbiana do solo (Trenkel, 2010).

A partir dos anos 2000 foi desenvolvido o 3,4 dimetilpirazolfosfato (DMPP), originado do grupo dos pirazóis, que ocorre frequentemente na natureza. Apresenta liberação lenta e gradativa do N, conforme temperatura e oferta hídrica no solo, podendo inibir o processo de nitrificação durante um período de seis a oito semanas. Além disso, o DMPP tem baixa solubilidade em água e não é fitotóxico às plantas (Trenkel, 2010).

No entanto, a eficiência de uso dos inibidores da nitrificação está muito associada às condições edafoclimáticas. No Brasil, há poucos trabalhos sobre o comportamento dos diferentes compostos inibidores da nitrificação. Assim, não se sabe se têm o mesmo efeito nas condições climáticas e nos solos do Brasil comparado às condições de clima temperado, onde foram muito estudados.

Diversos fatores de solo, como teor de matéria orgânica, textura, temperatura, pH e umidade, influenciam diretamente a eficiência dos inibidores da nitrificação, devido ao fato destes fatores estarem diretamente relacionados ao processo de nitrificação do solo. Maiores perdas de N por lixiviação ocorrem em solos arenosos, devido à maior infiltração de água no perfil. O uso de inibidores da nitrificação pode ser mais eficiente nessas condições. Em um solo arenoso, observou-se aumento da produtividade de grãos de milho à aplicação da ureia com inibidor da nitrificação somente quando associado ao uso do inibidor da urease e na dose mais alta de N aplicada (270 kg/ ha) (Tabela 4). A associação dos dois inibidores resultou em menor taxa de volatilização diária de amônia e, consequentemente menores perdas de N para a atmosfera (Figura 4).

Figura 4.	Taxa de volatilização diária e percentagem de perda do N aplicado na forma de ureia comum, ureia com inibidor de urease (UI), ureia com inibidor da nitrificação (IN) e inibidores associados (IU+IN) em milho, em três doses de N aplicado em cobertura. Eldorado do Sul-RS, 2016/17. Fonte: Silva et al., 2017.
Figura 4. Taxa de volatilização diária e percentagem de perda do N aplicado na forma de ureia comum, ureia com inibidor de urease (UI), ureia com inibidor da nitrificação (IN) e inibidores associados (IU+IN) em milho, em três doses de N aplicado em cobertura. Eldorado do Sul-RS, 2016/17. Fonte: Silva et al., 2017.

Já em solos com característica textural mais argilosa, como os Nitossolos, a aplicação de inibidores da nitrificação não resultou em aumento da produtividade de grãos (Figura 2) e da eficiência agronômica de uso do N no milho (Tabela 5) (Mota et al, 2015). Quanto maior o teor de argila, maior é a agregação do solo. Isto reduz a infiltração de água no perfil e a movimentação do N em profundidade. Assim, o N permanece no solo por mais tempo, minimizando o efeito do inibidor da nitrificação. Além disso, a maior atividade microbiana encontrada em solos argilosos também pode reduzir o efeito do inibidor da nitrificação, devido à maior degradação do composto no solo pelos microrganismos.

Tabela 5
Tabela 5

Considerações finais

Dentre as várias fontes nitrogenadas utilizadas na agricultura, a ureia comum é a mais difundida, devido à sua alta concentração de N (~45 %) e ao seu menor custo. Entretanto, a sua eficiência de uso é baixa, em virtude das inúmeras transformações a que o N está sujeito. Apenas parte do N aplicado é absorvida pelas plantas, o que pode provocar assincronia entre a oferta do nutriente no solo e a demanda da planta.

Neste contexto, estratégias de manejo que otimizem o uso e minimizem as perdas de N devem ser enfatizadas. Dentre as alternativas que podem ser usadas para aumentar a eficiência de uso do N destacam-se: o desenvolvimento de plantas mais eficientes na absorção e uso desse nutriente, a utilização de práticas de manejo que possibilitem a obtenção de maior sincronia entre a época de aplicação de N e os estádios de maior demanda da planta e a aplicação de N sob condições ambientais que minimizem perdas e maximizem sua absorção.

São fatores importantes para aumentar a eficiência de uso do N na cultura do milho: aplicar a maior parte do N entre os estádios V4 e V10, nos quais a planta está com o seu sistema radicular mais desenvolvido e a demanda pelo nutriente é maior; parcelar a dose, principalmente em solos arenosos, com baixo teor de matéria orgânica, e/ou em situações com elevadas precipitações pluviais ou sob irrigação complementar durante a estação de crescimento do milho; aplicar o adubo nitrogenado antes de uma precipitação e/ou irrigação; utilizar fontes estabilizadas com inibidores da urease quando as condições ambientais são favoráveis a perdas por volatilização de amônia; utilizar fontes estabilizadas com inibidores da nitrificação quando as condições edafo-climáticas são favoráveis a perdas por lixiviação de nitrato. Nestas duas últimas situações, embora com custo um pouco mais alto em relação ao da ureia comum, há retorno econômico com a aplicação de fertilizantes nitrogenados estabilizados.

O N é o nutriente mais complexo para manejo e recomendação na cultura do milho. Por isso, estratégias que aumentem a eficiência agronômica do seu uso e mitiguem perdas desse nutriente devem ser analisadas.

Natan Henrique Ferrari Pagliarini, Monsanto do Brasil; Paulo Regis Ferreira da Silva, UFRGS; Luis Sangoi, UDESC; Fernando Viero, Instituto Federal de Farroupilha; Cimélio Bayer, Bruno Tadashi Chiba da Silva, UFRGS 

Artigo publicado na edição 232 da Cultivar Grandes Culturas, mês setembro, ano 2018.

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