Podridão de Diplodia: o perigo invisível

Por Joana Souza Fernandes e Renato Mendes Guimarães, DAG/UFLA

15.04.2023 | 13:22 (UTC -3)
Sementes infectadas - teste de germinação (esq.) e de danidade (dir.) - Foto: Joana Souza Fernandes
Sementes infectadas - teste de germinação (esq.) e de danidade (dir.) - Foto: Joana Souza Fernandes

Os fungos são organismos que se reproduzem na forma de esporos. Podem ser classificados quanto à forma de nutrição em biotróficos e necrotróficos. As espécies necrotróficas são parasitas facultativos, nutrem-se de células danificadas ou mortas, causando danos irreversíveis. Esse grupo engloba a maioria das espécies fúngicas associadas às sementes.

A espécie Stenocarpella maydis, necrotrófica, causadora da podridão branca da espiga, popularmente chamada de podridão de diplodia afeta diretamente a qualidade de sementes de milho. A presença do fungo nas sementes tem importância especial não apenas devido aos danos econômicos que acarreta, mas também pelo perigo do consumo das sementes infectadas e seus derivados.

Os fungos que geralmente colonizam sementes são divididos em fungos de campo e de armazenamento. Os fungos de campo necessitam de uma alta umidade relativa para crescerem, a exemplo do complexo Diplodia, e restos culturais são ideais para a sobrevivência do inóculo até a colonização da planta. Duas espécies de Stenocarpella (nome científico do complexo diplodia), podem causar podridões, sendo a espécie Stenocarpella maydis, causadora da podridão branca da espiga, e Stenocarpella macrospora, causadora da podridão do colmo e de manchas foliares.

Nos últimos anos podemos observar o aumento de lavouras implantadas sob o sistema de plantio direto, que reduz as operações de preparo de solo aumentando e mantendo a umidade. Além de vantagens com relação a manutenção física do solo, o aumento da umidade pré-dispõe as plantas de milho ao ataque de microrganismos, criando um ambiente ideal para o desenvolvimento de fungos de campo, sendo a infestação um dos fatores que afetam diretamente na qualidade fisiológica e sanitária na produção de sementes.

Stenocarpella maydis

Normalmente, a doença causada por S. maydis é mais severa e afeta com maior frequência as espigas de milho, consequentemente as sementes (Figura 1A). Essa espécie ocorre em regiões com altitudes acima de 700 m, temperaturas moderadas e, sobretudo, altas umidades relativas.

O fungo Stenocarpella maydis apresenta estruturas reprodutivas microscópicas até 2 vezes menores em comparação com a espécie S. macrospora, sendo esse fato uma forma de diferenciação entre as espécies, além dos sinais e sintomas apresentados após o período de infecção (Figura 1B). O micélio fúngico possuí desenvolvimento rápido em meio de cultura, é de aparência cotonosa, e de cor esbranquiçada no início de seu desenvolvimento. Após 15 dias de crescimento, colônias de S. maydis adquirem cor esbranquiçada com fundo escurecido.

Qualidade fisiológica e sanitária de sementes

O termo qualidade de sementes é definido pelo somatório dos atributos físicos (que diz respeito à pureza física do lote de sementes); genéticos (o que compreende à pureza genética), fisiológicos e sanitários.

A qualidade sanitária de sementes é um dos principais atributos que condicionam o desempenho no campo, o estabelecimento de bons estandes e consequentemente, boa produtividade. Dentre os agentes patogênicos que podem associar-se às sementes, comprometendo sua qualidade sanitária, os fungos formam o maior grupo, seguido das bactérias e, em menor proporção, dos vírus e dos nematóides.

A qualidade fisiológica das sementes é influenciada por vários fatores a partir da fertilização do óvulo, até o momento da semeadura, desde a posição da semente no fruto, época e técnicas de colheita, genótipo, condições ambientais durante o desenvolvimento das sementes, condições de armazenamento e tratamentos pré-semeadura.

O desenvolvimento da semente é um evento que ocorre de forma sincronizada na planta. O acompanhamento do desenvolvimento das sementes é feito com base em fatores físicos e fisiológicos, assim, quando ocorre o ataque de fungos fitopatogênicos na planta, consequentemente ocorre o comprometimento na formação, no desenvolvimento e na qualidade final das sementes. Esse fato, pode ainda ser mais prejudicial, quando o patógeno em questão pode ser transmitido via sementes, o que leva a própria semente a ser fonte direta de contaminação para a nova área de plantio.

Assegurar que as sementes possuam alta qualidade é fator primordial na comercialização e requer grande comprometimento dos produtores de sementes, para que o produto seja comercializado dentro das normas e padrões estabelecidos pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).

Podridão de Diplodia

A ocorrência das doenças causadas pelo gênero Stenocarpella sp. é variada e depende das precipitações pluviais e da temperatura, ocorrendo em todas as regiões de cultivo, devido à eficiente transmissão desses patógenos pelas sementes.

Amplamente distribuída em todos os locais onde o milho é cultivado no Brasil, a ocorrência do fungo Stenocarpella sp. é mais frequente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, com intensidade e severidade variadas entre as regiões, afetando diretamente as maiores regiões produtoras de sementes de milho.

Pesquisas recentes realizadas no Laboratório de Análise de Sementes da Universidade Federal de Lavras, com o objetivo de estudar a qualidade fisiológica de sementes de milho inoculadas com S. maydis em diferentes períodos de inoculação (0, 24, 48, e 72 horas de contato entre o fungo e a semente) com um híbrido tolerante e outro suscetível ao fungo, mostraram resultados interessantes.

Para o híbrido tolerante não houve diferença significativa na qualidade fisiológica avaliada pelos testes de germinação, primeira contagem de germinação, teste frio sem solo e emergência de plântulas. Porém, o índice de velocidade de emergência foi afetado, mostrando que para os maiores potenciais de inoculo (48 e 72 horas), maior foi o índice de velocidade de emergência, ou seja, para sementes tidas como tolerantes, o fungo não afetou a qualidade fisiológica, com os tempos de inoculação testados e a emergência foi acelerada. Esse resultado pode ser explicado pelo fato das sementes terem sido expostas por um período maior de horas ao micélio fúngico muito úmido, levando-as a absorverem água, e assim, acelerarem o processo de embebição que é o inicio do processo germinativo.

Já para sementes suscetíveis ao fungo, houve efeito significativo na primeira contagem de germinação que avalia o vigor das sementes, e no teste de germinação propriamente dito. A medida que o tempo de exposição ao fungo aumenta, os danos no vigor e na germinação das sementes também aumentaram, o que mostra que a espécie S. maydis é prejudicial nos estádios iniciais de desenvolvimento da plântula de milho.

Em outra pesquisa, sobre o comportamento de híbridos de milho inoculados com fungos causadores do complexo grãos ardidos foi relatado que nos tratamentos inoculados com S. maydis não houve diferenças significativas entre os híbridos tolerantes inoculados.

O nível de tolerância dos híbridos comerciais atualmente é um fator que deve ser levado em consideração na aquisição de sementes de milho principalmente em áreas com histórico de ocorrência do fungo, e em áreas onde haverá a implantação sob sistema de plantio direto. Assim, deve-se preconizar o uso de materiais tolerantes para garantir a produtividade e evitar danos causados por S. maydis.

Métodos de controle

Tem sido demonstrada a importância da semente na continuidade do ciclo biológico dos fungos parasitas necrotróficos, isto é, a sua transmissão ou passagem das sementes aos órgãos aéreos e/ou radiculares dos hospedeiros. Esse fato gerou a necessidade de controlar tais fungos sob um novo enfoque: erradicar os patógenos presentes nas sementes, a fim de evitar a introdução do inóculo na lavoura.

No plantio, o controle da podridão do colmo e da espiga deve ser feito pelo uso de semente sadia e/ou pelo tratamento de semente com fungicida que leve a erradicação do fungo. O tratamento de sementes de milho com fungicidas têm como objetivo controlar fungos associados à semente e protegê-las contra aqueles do solo, prevenindo a deterioração da semente e evitando a transmissão do patógeno para as plântulas, reduzindo assim, a intensidade de podridões.

A utilização de híbridos tolerantes é uma alternativa de controle, uma vez que pesquisas comprovam a tolerância mesmo quando moderada, ao ataque de S. maydis não comprometendo a qualidade fisiológica das sementes de milho.

Por Joana Souza Fernandes e Renato Mendes Guimarães, DAG/UFLA 

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