Estudo aponta que plantio mais rápido de soja não compromete qualidade e pode aumentar produtividade
Por Vinicius Cunha, coordenador Farm Solutions da AGCO América do Sul
A aplicação em conjunto do herbicida lactofen e de cinetina pode resultar em efeito sinérgico na produtividade da soja. Entretanto seu uso precisa ser criterioso e o potencial de resposta depende da variedade utilizada. É necessário, ainda, que o ambiente de cultivo seja capaz de possibilitar a recuperação das plantas e permitir que respondam à sinalização proporcionada pelo hormônio.
A produtividade média de soja no Brasil não ultrapassa 50 sacas por hectare. No entanto, algumas pesquisas mostram que a produtividade potencial da cultura supera as 330 sacas por hectares. Prova disso, recentemente no estado da Geórgia, nos EUA, o produtor Randy Dowdy bateu o recorde mundial de produtividade da oleaginosa, colhendo 192,23 sacas de 60 quilos por hectare. Tais resultados mostram que ainda há muito para explorar do potencial produtivo desta cultura.
Atualmente, a exploração do potencial produtivo tem sido baseada em estratégias de manejo que buscam alterar os componentes de produção da cultura, pois regulam diretamente a produtividade (Figura 1). A densidade de plantas é um fator importante para o crescimento e a produtividade de soja, embora a densidade não seja diretamente proporcional à produção de matéria seca e de sementes. Quando a densidade de plantas é elevada, a formação de ramos laterais diminui e dessa forma o número de nós decresce. No entanto, quando a população de plantas é reduzida, as plantas tendem a incrementar a formação de ramos laterais, aumentando o número de nós produtivos, o que significa que plantas de soja apresentam potencial para terem seu crescimento modulado em função do ambiente ou manejo adotado.
As informações contidas na figura 1 realçam a hipótese de que plantas de soja apresentam alto potencial para terem seu crescimento modulado em função do ambiente ou manejo adotado, aproveitando a plasticidade das plantas. Como exemplo, variações na produtividade de soja frequentemente estão associadas com alterações no número de vagens e sementes por unidade de área. Consequentemente, práticas de manejo que alteram o número de ramificações e nós produtivos podem potencializar a produtividade da cultura por proporcionar a maior formação de pontos de formação de órgãos reprodutivos.
Com este objetivo, tem crescido nas últimas safras a utilização do hormônio citocinina e do herbicida lactofen para atender tal objetivo. Já é bastante conhecido que a auxina, juntamente com a citocinina, regula a brotação das gemas laterais. Em situações em que há a decapitação do caule (quebra da dominância apical), ocorre o brotamento das gemas laterais, favorecido pela menor produção de auxina no ápice e melhor redistribuição da citocinina nas gemas laterais.
Como no campo é difícil causar a quebra da dominância apical mecanicamente. O lactofen tem sido utilizado com este propósito. Este herbicida, quando aplicado ocasiona acúmulo de protoporfirina-IX como resultado da translocação do substrato da Protox para o citoplasma, seguido pela oxidação não enzimática ou por oxidases insensíveis ao herbicida. Na presença de luz, a protoporfirina-IX acumulada, agora compartimentalizada, está incapaz de ser utilizada e reage com o O2, formando oxigênio singleto (1O2). O 1O2 formado causa a peroxidação dos lipídios e, eventualmente, mata as células (Figura 2a).
O estresse oxidativo causado pelo herbicida com posterior morte das células causa danos no ápice das plantas. Devido aos danos causados, ocorre a quebra da dominância apical, que repercute na formação de ramos laterais e redução do crescimento das plantas (Figura 2b e 3). As ramificações laterais são um dos componentes que regulam a produtividade de soja, pois influi na quantidade de nós reprodutivos formados e, consequentemente de vagens potenciais.
Com base nos efeitos proporcionados pela aplicação pela citocinina e pelo lactofen, a utilização em conjunto poderia ocasionar efeitos sinérgicos nas plantas. A quebra da dominância apical proporcionado pelo lactofen associada à aplicação de citocinina poderia potencializar a brotação das gemas laterais (Figura 4). Além disso, algumas pesquisas têm mostrado que as citocininas aumentam a tolerância das plantas a estresses por interagir com as vias do ácido salicílico e abscísico, hormônios conhecidos como reguladores de estresses em plantas.
Trabalhos realizados pelos autores em Patos de Minas, Minas Gerais, buscaram entender o efeito da aplicação de citocinina e lactofen em duas cultivares de soja. Foram utilizadas as variedades cultivadas de soja NA-5909-RG (grupo de maturação 6.7) e NS-7114-RR (grupo de maturação 7.1) submetidas à aplicação no estádio V4 de cinetina (CK) (50 mg/ ha), lactofen (LC) (60 g [i.a.] ha) e cinetina + lactofen, comparadas às plantas sem aplicação (Controle).
Os resultados apresentados na Figura 6 mostram que aplicação de lactofen proporcionou incremento no dano foliar nas duas variedades cultivadas, sendo o maior efeito na NS-7114-RR, enquanto que a cinetina reduziu o dano na NA-5909-RG e incrementou na NS-7114-RR. A associação de lactofen com cinetina reduziu o dano foliar nas duas variedades comparado a aplicação isolada de lactofen, o que reforça o potencial da citocinina em reduzir o nível de estresse celular devido à ativação do metabolismo antiestresse.
O dano celular, além de comprometer a produção de energia pelas plantas, repercute em gasto energético para reparação das estruturas degradadas. Portanto, a aplicação de produtos como o lactofen deve ser bem planejada, pois o alto nível de estresse gerado pode reduzir a produtividade, caso estas plantas não tenham condições ambientais suficientes para garantir a saída do estresse. Exemplo disso, em outros ensaios desenvolvidos pela equipe do Núcleo de Pesquisa em Fisiologia e Estresse de Plantas (NUFEP) em Patos de Minas-MG, quando a aplicação de lactofen antecedeu longos períodos de estiagem houve redução na produtividade de soja.
Nos resultados apresentados na Tabela 1, embora a aplicação de lactofen tenha incrementado o número de nós e de vagens por planta na variedade cultivada NA-5909-RG, não foi observado aumento na produtividade. Esta variedade cultivada, por ser de grupo de maturação menor comparado à NS-7114-RR foi mais precoce, com menor duração da fase reprodutiva, o que limitou a recuperação do estresse causado pelo lactofen. Na variedade cultivada NS-7114-RR, mesmo com o estresse causado pela aplicação de lactofen, houve incremento de 5,4% no número de vagens e 9,1 sacas/ha. Estes resultados realçam a ideia de que o posicionamento deve ser planejado, pois depende também da variedade cultivada. Embora não existam informações científicas concretas sobre tal fato, acredita-se que variedades de ciclo precoce são mais sensíveis a estresses e, consequentemente, menos responsivas a estas práticas de manejo.
A aplicação de citocinina isolada proporcionou aumento no número de vagens nas duas variedades cultivadas, o que causou incremento de 4,7 sacas na variedade cultivada NA-5909-RG e 11,9 sacas na NS-7114-RR, em relação ao Controle (Tabela 1). Novamente, a variedade com maior grupo de maturação foi mais responsiva. Estes resultados estão ligados ao fato de que os hormônios desempenham funções de sinalização nas plantas. Para que as plantas respondam à sinalização proporcionada pelo hormônio é necessário que as condições de cultivo proporcionem esta resposta. Cultivares de ciclo curto, como o caso da NA-5909-RG, apresentam menor duração da fase reprodutiva e são mais sensíveis às condições ambientais, o que reduz o potencial de resposta. Estas informações significam que para que haja elevada resposta da aplicação de hormônios em plantas é necessário que antes da aplicação, outros aspectos como adaptação da variedade ao ambiente de cultivo, correção de solo, nutrição de plantas, irrigação, sanidade de folhas seja muito bem trabalhados.
A associação entre lactofen e cinetina não alterou o número de nós e vagens na NA-5909-RG, embora tenha incrementado 8,8 sacas/ha na produtividade em relação ao Controle. Na NS-7114-RR, o aumento no número de nós e vagens proporcionou aumento de 14,7 sacas/ha em relação ao Controle (Tabela 1). Estes resultados mostram que o lactofen e a cinetina proporcionaram efeito sinérgico na produtividade da cultura, no entanto, o potencial de resposta é modulado pela variedade cultivada utilizada. Portanto, estes sistemas de manejo podem contribuir para a potencialização da produtividade de soja. No entanto é necessário que o ambiente de cultivo seja capaz de possibilitar a recuperação das plantas e permitir que estas respondam a sinalização proporcionada pelo hormônio. Além disso, ainda é necessário entender mais sobre como as diversas variedades cultivadas de soja disponíveis no mercado respondem a este tipo de manejo.
Luís Henrique Soares, Evandro Binotto Fagan, Marina Rodrigues dos Reis, Isabella Sabrina Pereira, Unipam
Artigo publicado na edição 211 da Cultivar Grandes Culturas.
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