Acilalaninas

29.06.2025 | 14:00 (UTC -3)

As acilalaninas constituem um grupo químico de fungicidas sistêmicos altamente específicos para o controle de oomicetos, incluindo espécies dos gêneros Phytophthora, Peronospora, Plasmopara, Bremia e Albugo.

Esses compostos apresentam excelente atividade curativa e protetiva, sendo amplamente utilizados no controle de míldios, requeimas e ferrugens brancas em culturas como batata, tomate, videira, hortaliças folhosas, soja e culturas ornamentais.

A importância estratégica deste grupo químico no cenário agrícola mundial justifica-se pela sua eficácia excepcional contra patógenos que historicamente causavam perdas significativas na produção agrícola, especialmente em condições de alta umidade e temperatura moderada.

Desenvolvimento das acilalaninas

O desenvolvimento das acilalaninas representa um marco significativo na fitopatologia moderna. Este grupo químico teve origem nos laboratórios de pesquisa da Ciba-Geigy, durante a década de 1970, período marcado pela busca intensiva por compostos com atividade sistêmica e maior especificidade biológica.

A primeira síntese do metalaxil foi divulgada em patentes depositadas pela empresa suíça, utilizando uma rota sintética inovadora que envolvia a alquilação da 2,6-xilidina com 2-bromopropionato de metila para formar um derivado de alanina, posteriormente reagido com cloreto de ácido metoxiacético para produzir o metalaxil racêmico.

O processo de desenvolvimento seguiu uma trajetória sistemática que se estendeu por quase uma década antes da comercialização efetiva. Entre 1970 e 1975, os pesquisadores da Ciba-Geigy concentraram esforços na fase de descoberta e síntese inicial, período durante o qual foi identificada a atividade antifúngica específica contra oomicetos, um grupo de patógenos que até então apresentava opções limitadas de controle químico eficaz.

O período subsequente, compreendido entre 1976 e 1978, foi dedicado ao desenvolvimento de processos de síntese em escala industrial e à realização de estudos aprofundados de eficácia biológica, investigações que revelaram o mecanismo de ação único baseado na inibição seletiva da RNA polimerase I em células de oomicetos.

O ano de 1979 marcou um divisor de águas na proteção de cultivos com a introdução comercial do metalaxil, quando a Ciba-Geigy obteve o primeiro registro nos Estados Unidos, dando início oficialmente à era comercial das acilalaninas (há quem fale que a primeira ocorrência foi no ano de 1977). Este marco foi seguido pela aprovação da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura em 1982, evento que expandiu significativamente o uso global destes fungicidas e consolidou sua aceitação pela comunidade científica internacional.

A década de 1980 foi caracterizada pelo desenvolvimento contínuo de novas moléculas dentro do grupo, culminando com o lançamento do benalaxil entre 1985 e 1990, representando uma segunda geração de acilalaninas que oferecia espectro de controle similar ao metalaxil, porém com perfil toxicológico diferenciado e melhor adequação a determinadas culturas.

A evolução tecnológica do grupo atingiu novo patamar durante a década de 1990, período em que os avanços na química de síntese assimétrica possibilitaram o desenvolvimento da versão quiral homogênea do metalaxil, conhecida comercialmente como metalaxil-M ou mefenoxam.

Essa inovação representou um refinamento significativo da tecnologia original, uma vez que a nova molécula retinha toda a atividade fungicida presente na mistura racêmica original, mas com eficácia superior por unidade de massa aplicada, resultando em redução das doses necessárias e consequente diminuição do impacto ambiental.

Modo de ação

O mecanismo de ação das acilalaninas fundamenta-se na inibição seletiva da síntese de RNA em células de oomicetos, processo que ocorre através da interferência específica com a RNA polimerase I.

Esse mecanismo envolve a ligação do fungicida à enzima RNA polimerase, bloqueando efetivamente a transcrição de genes essenciais para o crescimento e desenvolvimento do patógeno. O alvo bioquímico primário constitui-se na RNA polimerase I, enzima responsável pela síntese de RNA ribossomal em oomicetos, que apresenta características estruturais específicas que diferem significativamente daquelas encontradas em fungos verdadeiros, plantas superiores e animais, conferindo alta seletividade ao grupo químico.

Segundo a classificação do Fungicide Resistance Action Committee, as acilalaninas pertencem ao Grupo FRAC 4, com código de resistência PA (Phenylamides), sendo categorizadas como inibidores da síntese de ácidos nucleicos, especificamente do subgrupo RNA polimerase I.

A inibição desta enzima resulta em severa redução na síntese de ribossomos, comprometendo drasticamente a síntese proteica celular e consequentemente provocando paralização do crescimento micelial, inibição da esporulação, bloqueio da germinação de esporos e supressão da formação de estruturas reprodutivas. Em concentrações eficazes, o patógeno perde completamente sua capacidade infectiva e reprodutiva, caracterizando a ação fungicida do grupo.

Espectro de controle

O espectro de controle das acilalaninas abrange diversas culturas de importância econômica, com destaque para o controle da requeima causada por Phytophthora infestans em batata e tomate, onde são aplicadas doses entre 0,5-2,0 L/ha e 0,5-1,5 L/ha, respectivamente.

Na viticultura, demonstram excelente eficácia contra o míldio da videira (Plasmopara viticola) em doses de 0,3-0,8 L/ha, enquanto em hortaliças folhosas como alface controlam eficientemente o míldio causado por Bremia lactucae com doses de 0,5-1,0 L/ha.

Em culturas extensivas, o controle de Peronospora manshurica em soja e de Plasmopara halstedii em girassol requer doses de 0,5-1,0 L/ha e 0,8-1,5 L/ha, respectivamente.

Os intervalos de segurança variam significativamente conforme a cultura e formulação utilizada, com Período de Carência situando-se entre 3 a 21 dias, enquanto o Intervalo de Reentrada é tipicamente de 24 horas para aplicações em campo aberto e 48 horas para cultivos protegidos, podendo variar conforme legislação local e condições específicas de aplicação.

Manejo de resistência

O gerenciamento da resistência às acilalaninas constitui aspecto crítico para a sustentabilidade do grupo químico, uma vez que a resistência foi documentada pela primeira vez na década de 1980, apenas poucos anos após a introdução comercial do metalaxil.

No Brasil, a resistência de Phytophthora infestans em batata foi reportada em regiões produtoras do Sul e Sudeste a partir dos anos 1990, enquanto populações de Plasmopara viticola resistentes foram identificadas em vinhedos da Serra Gaúcha e Vale do São Francisco.

Mundialmente, a resistência generalizada foi documentada em diversos países, incluindo Estados Unidos, Canadá, países europeus e Austrália, tornando-se um dos principais fatores limitantes para o uso continuado destes fungicidas.

Para retardar o desenvolvimento de resistência, recomenda-se rotação obrigatória com fungicidas de diferentes grupos FRAC, preferencialmente grupos 11, 21, 22, 27, 28 e 40, limitando o uso de acilalaninas a no máximo 30% das aplicações totais por ciclo. A implementação de misturas pré-formuladas com fungicidas multissítio como cobre, mancozeb e clorotalonil, bem como a alternância entre diferentes ingredientes ativos dentro do próprio grupo das acilalaninas, constituem estratégias fundamentais de manejo.

A estratégia de taxa alta é recomendada para situações de alta pressão de doença e quando há suspeita de populações com sensibilidade reduzida, enquanto taxa reduzida pode ser utilizada preventivamente em condições de baixa pressão, sempre em combinação com fungicidas de modo de ação diferente.

Quanto aos aspectos de segurança e impacto ambiental, a maioria dos produtos à base de acilalaninas apresenta classificação toxicológica III (medianamente tóxico) ou IV (pouco tóxico), variando conforme a formulação e concentração do ingrediente ativo. A classificação ambiental situa-se entre II (muito perigoso) e III (perigoso ao meio ambiente). A persistência no solo varia entre 15-70 dias de meia-vida, dependendo das condições edafoclimáticas, sendo que solos com pH neutro a alcalino apresentam degradação mais rápida, temperaturas elevadas aceleram a degradação e umidade adequada favorece a biodegradação.

O coeficiente de adsorção situa-se entre 50-162 mL/g, indicando mobilidade moderada a alta no solo, o que confere às acilalaninas potencial moderado a alto de lixiviação devido à sua alta solubilidade em água e baixo coeficiente de adsorção. Cuidados especiais devem ser tomados em solos arenosos com baixo teor de matéria orgânica, áreas próximas a corpos d'água, regiões com alta precipitação pluviométrica e aplicações em períodos chuvosos.

Interações e compatibilidades

As interações e compatibilidades das acilalaninas mostram-se favoráveis com fungicidas cúpricos, ditiocarbamatos, clorotalonil, fungicidas sistêmicos de outros grupos FRAC e fertilizantes foliares com pH neutro.

Entretanto, apresentam incompatibilidade com produtos altamente alcalinos, óleos minerais e adjuvantes oleosos em altas concentrações, alguns inseticidas organofosforados e fertilizantes com alto teor de cálcio.

A fitotoxicidade pode manifestar-se em aplicações sob condições de estresse hídrico severo, overdose ou aplicações repetidas em curtos intervalos, culturas jovens ou em estádios sensíveis, combinação com adjuvantes incompatíveis e condições de alta temperatura com umidade relativa baixa.

Eficácia agronômica

A eficácia agronômica das acilalaninas é influenciada por diversos fatores ambientais e de aplicação. Temperaturas entre 15-25°C, umidade relativa entre 60-90%, aplicação preventiva ou no início dos sintomas e pH da calda entre 6,0-7,0 constituem condições favoráveis à eficácia.

Por outro lado, chuvas intensas nas primeiras 2-4 horas após aplicação, temperaturas extremas, estresse hídrico severo nas plantas e aplicação em estádios avançados da doença representam fatores limitantes da eficácia.

As principais vantagens das acilalaninas incluem excelente atividade sistêmica com translocação acropetal, alta especificidade para oomicetos, ação curativa e erradicante, longo período residual e eficácia em baixas doses de aplicação. Entre as limitações destacam-se o espectro restrito apenas a oomicetos, alto risco de desenvolvimento de resistência, custo elevado comparado a fungicidas multissítio, potencial de contaminação ambiental e dependência de condições climáticas específicas.

Posicionamento estratégico

O posicionamento estratégico das acilalaninas em sistemas agrícolas varia conforme a cultura e condições regionais.

Na soja, o uso preventivo no estádio V4-V6 é recomendado para controle de míldio, especialmente em regiões com histórico da doença e condições climáticas favoráveis.

No milho, a aplicação preventiva em híbridos suscetíveis ao míldio é prioritária em regiões de cultivo contínuo e clima úmido.

Para o algodão, o controle de míldio em mudas e plantas jovens requer ênfase em aplicações preventivas durante os primeiros 60 dias de cultivo.

Em cana-de-açúcar, o uso limita-se ao controle de míldio em viveiros e mudas, focando na proteção de material propagativo.

Na cafeicultura, a aplicação preventiva para controle de míldio é especialmente importante em regiões montanhosas com alta umidade e nebulosidade frequente.

No trigo, o controle preventivo de míldio é essencial em regiões de cultivo irrigado e condições de alta umidade relativa.

Para hortaliças, o uso intensivo em cultivos protegidos e campo aberto requer ênfase em programas preventivos e rotativos para evitar resistência.

Na fruticultura, a aplicação estratégica em videiras, citros e frutas de clima temperado deve focar na proteção durante períodos críticos de desenvolvimento.

O posicionamento estratégico das acilalaninas deve sempre considerar o manejo integrado de doenças, incluindo resistência genética, práticas culturais, monitoramento climático e rotação criteriosa com fungicidas de diferentes modos de ação, visando sustentabilidade e eficácia a longo prazo no controle de oomicetos.

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