Sintomas de podridão e quebramento de hastes em soja se expandem na safra 2024

Emergência de Diaporthe ueckeri e Diaporthe longicolla em plantas de soja, na região Sul do Brasil; diagnóstico correto é essencial para manejo adequado

20.02.2025 | 14:58 (UTC -3)

Plantas de soja com sintomas de podridão e quebramento de hastes foram observadas no estado do Mato Grosso, e recentemente esse problema vem se expandindo para outros estados do Brasil. Pesquisas recentes observaram que o fungo Diaporthe (sin. Phomopsis) é o principal patógeno recuperado de plantas sintomáticas. Em áreas com alta incidência, as estruturas reprodutivas do fungo podem ser visualizadas nos tecidos externos das hastes (Figura 1A, 1B e 1C). Dependendo da suscetibilidade dos cultivares de soja e das condições climáticas favoráveis para o desenvolvimento do patógeno, em casos mais severos, o sintoma característico é o quebramento das hastes, que ocorre cerca de 5 cm a 10 cm acima do solo (Figura 1D e 1E).

Trabalhos publicados em outros países produtores de soja reportaram, por exemplo, a ocorrência de diversas espécies de Diaporthe isoladas de sintomas de podridão em vagens e grãos. O crescimento micelial dessas espécies é morfologicamente muito semelhante entre elas e impossibilita a correta identificação das espécies. Contudo, destaca-se a importância de se realizar a correta identificação das espécies de Diaporthe que podem estar ocasionando o sintoma de podridão e quebramento de hastes na soja.

O objetivo desta pesquisa foi identificar, através do uso de ferramentas de biologia molecular, como o sequenciamento de DNA, as espécies de Diaporthe spp. predominantes em plantas de soja que apresentam os sintomas de podridão e quebramento de hastes.

<b>Figura 1 - </b>plantas de soja utilizadas nesta pesquisa que apresentavam sintomas de quebramento de haste. A) e B) A planta foi amostrada na cidade de Ubiratã (PR), em novembro de 2023. C) Hastes de soja com estruturas fúngicas de picnídios que foram identificadas como D. longicolla, em amostra coletada na cidade de Vargeão (SC), no mês de janeiro de 2024. D) e E) Hastes de plantas de soja sintomáticas coletadas nas cidades de Passo Fundo e Erebango, respectivamente, no Rio Grande do Sul; ambas as amostras foram coletadas no mês de janeiro de 2024
Figura 1 - plantas de soja utilizadas nesta pesquisa que apresentavam sintomas de quebramento de haste. A) e B) A planta foi amostrada na cidade de Ubiratã (PR), em novembro de 2023. C) Hastes de soja com estruturas fúngicas de picnídios que foram identificadas como D. longicolla, em amostra coletada na cidade de Vargeão (SC), no mês de janeiro de 2024. D) e E) Hastes de plantas de soja sintomáticas coletadas nas cidades de Passo Fundo e Erebango, respectivamente, no Rio Grande do Sul; ambas as amostras foram coletadas no mês de janeiro de 2024

Metodologia utilizada

As plantas sintomáticas foram coletadas nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, durante a safra de 2024. Mais de 50 amostras de plantas de soja foram coletadas em áreas comerciais e analisadas em laboratório. Dessas amostras, foram recuperados 90 isolados de Diaporthe spp.

O isolamento do fungo ocorreu de forma direta, por meio da identificação das estruturas presentes nas suas hastes. Essas estruturas foram transferidas para o meio de cultura BDA (batata-dextrose-ágar) e mantidas em temperatura de 24°C±2°C, em 12 horas de fotoperíodo.

Após o isolamento e a purificação dos isolados, o crescimento micelial de cada isolado foi transferido individualmente para um microtubo, para extração de DNA e análises da sequência do DNA e identificação das espécies, usando algumas regiões do genoma (ITS, TUB2 e EF1-α).

Os eletroferogramas (exemplo na Figura 2) foram analisados e as sequências consensus foram geradas e usadas nas análises de similaridade com sequências de espécies conhecidas e disponíveis publicamente.

<b>Figura 2 - </b>eletroferograma da sequência parcial do gene do fator de elongação (EF1-α), usado na análise de identificação das espécies de Diaporthe. Na imagem, estão alinhadas as sequências de uma amostra de D. ueckeri e outra de D. longicolla. Nucleotídeos diferentes entre as duas espécies estão destacados nos retângulos e indicados pelas setas. A sequência referência usada para o alinhamento é de D. ueckeri
Figura 2 - eletroferograma da sequência parcial do gene do fator de elongação (EF1-α), usado na análise de identificação das espécies de Diaporthe. Na imagem, estão alinhadas as sequências de uma amostra de D. ueckeri e outra de D. longicolla. Nucleotídeos diferentes entre as duas espécies estão destacados nos retângulos e indicados pelas setas. A sequência referência usada para o alinhamento é de D. ueckeri

Resultados obtidos

As espécies D. ueckeri e D. longicolla são as duas que estão associadas aos sintomas de quebramento de hastes em plantas sintomáticas de soja. Dos 90 isolados analisados e oriundos dos três estados, 38 (42,2%) foram identificados como D. ueckeri e 52 (57,8%) como D. longicolla, mostrando uma predominância dessa espécie na região Sul.

Comparativamente, em outro estudo com amostras coletadas no Cerrado, mais especificamente no Mato Grosso, de 68 isolados recuperados, 50 foram identificados como D. ueckeri, mostrando, assim, uma predominância dessa espécie no Cerrado. As diferenças nas sequências do DNA de duas amostras, uma de D. ueckeri e outra de D. longicolla, estão destacadas na Figura 2.

Ambas as espécies recuperadas apresentam distribuição ampla em todos os estados amostrados, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Figura 3). Contudo, dos 30 isolados analisados provenientes de amostras do Rio Grande do Sul, 27 foram identificados como D. longicolla.

Dos 90 isolados analisados, nenhum deles foi identificado como sendo D. caulivora ou D. aspalathi, o que mostra que os cultivares plantados, atualmente, ainda apresentam resistência a essas duas espécies, principalmente a D. aspalathi.

<b>Figura 3 -</b> distribuição geográfica e localização dos 90 isolados de D. ueckeri e D. longicolla recuperados de plantas de soja que apresentavam sintomas de quebramento de haste. Dos 90 isolados, 54 são do estado do Paraná, seis de Santa Catarina e 30 do Rio Grande do Sul. As cores no mapa representam os isolados identificados molecularmente como sendo D. ueckeri (azul) e D. longicolla (verde)&nbsp;
Figura 3 - distribuição geográfica e localização dos 90 isolados de D. ueckeri e D. longicolla recuperados de plantas de soja que apresentavam sintomas de quebramento de haste. Dos 90 isolados, 54 são do estado do Paraná, seis de Santa Catarina e 30 do Rio Grande do Sul. As cores no mapa representam os isolados identificados molecularmente como sendo D. ueckeri (azul) e D. longicolla (verde) 

Diagnóstico correto

A correta identificação dos patógenos associados aos sintomas de podridão e quebramento de hastes tornou-se um novo desafio, desde as safras 2019/2020 no Brasil. O diagnóstico correto, através da combinação de análises morfológicas das estruturas do patógeno e do uso de ferramentas de biologia molecular, é essencial para auxiliar no manejo adequado dos patógenos e mitigar os danos que vêm sendo observados nas últimas safras. Principalmente, porque, neste momento, não se conhece detalhadamente o comportamento genético dos cultivares comerciais quanto à resistência a D. ueckeri e D. longicolla.

Até a identificação de fontes de genes de resistência e o desenvolvimento de cultivares com determinado nível de resistência, outras ferramentas de manejo, como a rotação de culturas não hospedeiras e a aplicação de fungicidas, são fundamentais para mitigar danos futuros.

Considerações finais

Nesta pesquisa, observamos que, durante a safra de 2024, as espécies D. ueckeri e D. longicolla foram predominantes nas áreas amostradas na região Sul. Com esse resultado, juntamente com os obtidos em estudos anteriores que observaram as duas espécies no Cerrado, observa-se que elas estão distribuídas em todas as regiões produtoras de soja do Brasil. Além disso, nas regiões amostradas não foram recuperados isolados de D. aspalathi e D. caulivora de plantas sintomáticas, mostrando a emergência de D. ueckeri e D. longicolla em vagens e hastes de soja.

Flávia Elis de Mello,
Sandra Marisa Mathioni,
Stephane Pereira de Jesus,
Eric Hirata,
Douglas Braga Marques,
Syngenta Proteção de Cultivos Ltda

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