Pintou o preto

A pinta preta ocorre em praticamente todas as regiões onde o tomateiro e a batateira são cultivados.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O tomateiro (

Mill.) e a batateira (

L.) são as duas olerícolas cultivadas de maior importância no Brasil, tanto em termos de área plantada como de produção. As duas espécies têm origem nos países andinos. O tomateiro é, provavelmente, originário de uma faixa estreita, compreendendo áreas de baixas altitudes, que vai do norte do Chile ao Equador (Giordano e Ribeiro, 2000; Jones et al., 1991). A batateira tem origem numa área mais ampla, concentrando o maior número de espécies entre o Peru e Bolívia, localizadas preferencialmente em regiões de altas altitudes (próximas ou acima de 2000m) (Brown, 1993). Além da origem, as duas espécies pertencem à mesma família botânica e compartilham outras características comuns. Nestas culturas, os custos de produção são elevados em razão de demandarem grande quantidade de insumos durante todo o ciclo de cultivo e ambas são, em geral, suscetíveis a muitas doenças, sendo algumas comuns às duas culturas.

Várias doenças incidem nas culturas do tomateiro e da batateira, comprometendo a produção, acarretando em aumento dos custos e dos riscos associados ao uso intenso de fungicidas. Dentre as doenças, destaca-se a pinta-preta, causada pelo fungo

Sorauer. A pinta-preta causa perdas na produção pela destruição de área foliar, resultando em queima dos frutos de tomate pelos raios solares, redução em número e tamanho de frutos de tomate e tubérculos de batata, além de causar apodrecimento desses órgãos.

A pinta-preta ocorre em praticamente todas as regiões onde tomateiro e batateira são cultivados. É uma doença muito importante, principalmente em condições de temperatura e umidade elevadas, quando sua intensidade é maior. Se medidas de controle não forem adotadas corretamente, constata-se grande redução na produção tanto de tomate quanto de batata.

Sintomas da pinta-preta

Toda parte aérea pode ser afetada, em qualquer estádio de desenvolvimento da planta. As infecções iniciam-se geralmente pelas folhas mais velhas, aquelas localizadas no terço inferior das plantas. Nas folhas, ocorrem lesões de coloração pardo-escuras, geralmente circundadas por uma faixa estreita (cerca de 3mm) de cor amarela. O halo clorótico e anéis concêntricos são formados com o aumento das manchas. Quando o ataque é muito severo, ocorre seca da folhagem, devido ao alto número de lesões e à coalescência das mesmas. No caule, as lesões são alongadas e circulares com anéis concêntricos evidentes.

Em frutos de tomate, são observadas lesões deprimidas e escuras, geralmente de aspecto aveludado. Normalmente, os frutos atacados caem ao solo. Sintomas em tubérculos são raramente observados no Brasil. Quando ocorrem, estes caracterizam-se por lesões escuras, deprimidas, circulares a irregulares, rodeadas por bordas elevadas de coloração purpúra à bronzeada. Na Embrapa Hortaliças, tubérculos com sintomas semelhantes a estes têm sido analisados mas, nos isolamentos, o principal organismo associado tem sido outra espécie,

.

Quando o inóculo já está presente na semente / batata-semente ou no solo, pode ocorrer podridão de colo de plântulas e/ou de mudas de tomate, podendo matá-las e, caso a planta sobreviva, há uma redução de seu crescimento e produção. Esta fase da doença pode fornecer inóculo para ciclos secundários na parte aérea da cultura.

Epidemiologia da doença

As condições favoráveis ao desenvolvimento da doença são alta umidade e temperatura entre 25 e 30oC. Geralmente, essas condições são verificadas durante o período de verão na maioria das regiões produtoras. Isto não impede que, em invernos brandos, principalmente nas regiões menos frias, a doença possa ocorrer e até causar problemas. Certas características do organismo fazem com que as epidemias sejam severas e o controle dificultado. Os esporos do fungo são facilmente dispersos pelo vento, pelas sementes e pelos respingos de chuva e de água de irrigação. Essas estruturas podem permanecer viáveis por longo período de tempo. O fungo sobrevive em restos de culturas, no solo, em sementes botânicas, em tubérculos-sementes, e também em outras plantas hospedeiras. Além do tomateiro e batateira,

afeta outras plantas da família Solanaceae como pimentão, berinjela e o jiló. Também há relatos na literatura de infecção de A. solani em algumas espécies de Brassica. Estas outras hospedeiras podem fornecer inóculo para culturas de tomate e batata, sendo importantes como fonte de inóculo inicial.

Em geral, a pinta-preta é menos severa nos estádios iniciais de desenvolvimento das plantas.

Controle da doença

O controle da pinta-preta em batateira e tomateiro tem sido baseado na aplicação de fungicidas. Vários deles estão registrados no Brasil para controle da doença (Tabela 1 -

). Estes fungicidas devem ser utilizados nas dosagens recomendadas pelo fabricante e respeitando-se os intervalos de carência e outras recomendações constantes na bula do produto. Além disso, o uso de controle químico deve ser feito de maneira racional, caso contrário poderá trazer problemas de cunho econômico, ecológico e social.

Medidas de controle cultural como tratamento de sementes, rotação de culturas, manejo adequado de irrigação, espaçamento adequado e/ou sistema de condução da cultura, adubação e a eliminação de lavouras antigas e dos restos culturais podem ser utilizadas com o objetivo de controlar a pinta-preta, mas estas práticas são difíceis de serem adotadas em cultivos intensivos e, por si só, não são muito eficientes. A manutenção do bom estado nutricional das plantas colabora para uma maior resistência à infecção. No caso de cultivos de tomate em estufa, algumas medidas de controle por métodos físicos são eficientes em reduzir a intensidade da pinta-preta. O uso de filmes plásticos, capazes de absorverem determinados comprimentos de ondas, essenciais à esporulação de

, pode reduzir a severidade da doença.

Resistência recomendada

O controle da doença por meio da resistência é a medida mais recomendável e com maiores possibilidades de reduzir o uso de fungicidas nas duas culturas. A integração de variedades resistentes e controle químico é viável e já foi demonstrada ser capaz de reduzir o número de aplicações de fungicidas, principalmente na cultura da batata.

Na espécie

, fontes de resistência à doença são muito raras, mas há possibilidade de encontrá-las entre as espécies selvagens. Entretanto, a resistência encontrada é do tipo quantitativa (horizontal) e a mesma está associada a características de maturidade tardia (ciclo longo). A Embrapa Hortaliças vem pesquisando clones de batata quanto à resistência à doença. Estes clones foram obtidos a partir de cruzamentos realizados no Centro Internacional da Batata (CIP) e na Embrapa Hortaliças. Até o presente, foram selecionados mais de 100 clones com resistência de campo ao fungo. Estes clones estão sendo testados para resistência a vírus e outros patógenos e para ciclo vegetativo curto e qualidade comercial dos tubérculos.

Entre as cultivares de batata comercialmente conhecidas, as mais resistentes são: Aracy, Catucha e Eliza. As cultivares Asterix e Baraka são moderadamente resistentes; enquanto as variedades Achat, Bintje e Monalisa são muito suscetíveis.

Entre as cultivares comerciais de tomate, observa-se certa diferença na resistência a campo, mas nenhuma apresenta altos níveis. Existem várias fontes de resistência dentre as espécies do gênero Lycopersicon, porém muitas não possuem características agronômicas desejáveis e/ou os caracteres são de difícil transferência para materiais de interesse. Recentemente, alguns genótipos foram testados quanto à resistência a A. solani, e dentre estes destacaram-se os genótipos CNPH423, CNPH650, e CNPH956. Porém, esses genótipos precisam ser avaliados em condições de alta pressão de inóculo, em campo. Em outro trabalho, realizado na Embrapa Hortaliças, foram identificadas boas fontes de resistência à doença como os acessos CNPH-081, CNPH-423, CNPH-650 e CNPH-956, entretanto, a resistência é do tipo quantitativa (horizontal), sendo difícil de ser transferida para cultivares comerciais.

A resistência do tomateiro e da batateira a A. solani está associada às características de maturidade, frutificação e tuberização. Em geral, genótipos resistentes são de maturação tardia e maior intensidade da doença é observada a partir da frutificação do tomateiro e formação de tubérculos na batata. O controle genético da resistência ainda necessita ser melhor elucidado.

Eduardo S. G. Mizubuti,

Universidade Federal de Viçosa

Ailton Reis

e

Sieglinde Brune,

Embrapa / CNPH, Brasília

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