O aproveitamento de dejetos animais como fertilizantes nas áreas de produção agropecuária é uma alternativa de adubação capaz de reduzir os custos da implantação de lavouras e pastagens e também repor os nutrientes exportados pela colheita ou pastejo.
O rebanho brasileiro é composto por aproximadamente 186 milhões de cabeças de bovinos, 750 milhões de aves, 32 milhões de suínos, 14,2 milhões de cabeças de ovinos, 8,1 milhões de caprinos e 1,6 milhões de cabeças de bubalinos, segundo senso realizado em 2002 (IBGE, 2004).
Utilizando estes dados é possível estimar a quantidade produzida de esterco animal no Brasil. Porém a quantidade que apresenta potencial de uso na produção de forragens e de grãos depende da concentração destes dejetos em locais de armazenamento (esterqueiras, por exemplo). A quantidade estimada de produção de esterco de aves e suínos, que em geral são criados em regime de confinamento, é de 93 milhões m3 (produção de 0,1 kg dia por cabeça) e 175 milhões m3 (utilizando média de produção de 15 litros dia por cabeça), respectivamente, por ano. Estes dados poderiam ser acrescidos da produção de pelo menos 180 milhões m3 de esterco líquido por ano do rebanho bovino, especialmente do leiteiro, que tem em torno de 20 milhões de cabeças ordenhadas (um animal que produz 6 mil litros de leite por ano gera aproximadamente 50 litros de esterco líquido dia) e apresenta parte de sua produção em regime de confinamento.
Se fossem aplicados 10 m3 de esterco de aves e 60 m3 de esterco de suínos ou de bovinos por ha por ano, seria possível aplicar estes produtos como fertilizantes em aproximadamente 15 milhões de hectares em um ano. Estes dados impressionam, mas considerando que ocorre perda de grande parte do dejeto produzido (rachaduras em esterqueiras, transporte, esterqueiras sem revestimento, entre outras), este potencial deixa de ser utilizado.
Para a realização de adubação orgânica, é necessário avaliar a composição do material disponível, através de análise química. Os teores médios de nutrientes contidos em alguns materiais orgânicos (Tabela 1 -
) devem ser utilizados como referência caso não seja possível a realização da análise. Porém, estes dados podem ser bem diferentes para cada região, propriedade ou lote de animais, dependendo do tipo de alimentação, manejo do rebanho, da idade do animal, manejo do esterco, estocagem dos dejetos, tipo de cama utilizada, entre outros. Quanto menos água no esterco, maior é a distância viável entre o local de armazenamento e de aplicação. Portanto, é importante a adoção de medidas que evitem a entrada desnecessária de água nas esterqueiras, como a água das chuvas ou de escorrimento superficial.
Diferente da maioria dos adubos minerais sintetizados, os adubos orgânicos podem conter alta quantidade de micronutrientes, sendo que com a aplicação de esterco praticamente é eliminada a necessidade de complementação com fontes minerais.
Aplicação de estercos
Aumentos nos teores dos macronutrientes Ca, Mg, P, K e N e nos teores de micronutrientes no solo, principalmente Cu e Zn, têm sido observados em áreas que receberam doses elevadas ou uso prolongado de esterco de origem animal.
A freqüência da aplicação do esterco depende do tamanho dos tanques de armazenamento, da colheita ou pastejo e do teor de nutrientes no solo.
Para calcular a quantidade de esterco a aplicar, podem ser adotadas como estratégias principais: a) o nutriente presente em maior quantidade no esterco, com complementação para os demais através de adubação mineral; b) o nutriente presente em menor nível no solo, para aumentar a disponibilidade deste para as plantas; c) a quantidade de nutrientes exportada pela colheita ou pastejo para que não ocorra a diminuição dos níveis do solo para valores deficientes ou então o acúmulo para níveis que podem ser prejudiciais às culturas ou significar riscos ao ambiente e; d) a resposta da cultura às doses de nutrientes, sendo esta estratégia aplicada basicamente ao N.
No caso de pastejo para a produção de carne ou leite, a exportação de nutrientes é muito menor que na colheita da parte aérea para silagem ou na colheita de grãos. Enquanto o milho, por exemplo, exporta em média 25, 4,3 e 18,2 kg por tonelada de grãos com a colheita de toda a parte aérea para silagem e 15,8, 3,8, 4,8 kg por tonelada de grãos de N, P e K, respectivamente, com a colheita de grãos (Pauletti, 2004), bovinos entre 60 a 300 kg de peso vivo exportam entre 15,72 a 16,85 g de Ca; 8,51 a 8,56 g de P; 0,27 a 0,34 g de Mg; 0,89 a 1,24 g de Na; e 1,87 a 2,08 g de K, para o ganho de um kg de peso vivo vazio (Araujo et al, 1998). Para N, estima-se que menos de 25% é retido pelo animal e o restante excretado principalmente junto à urina. Observa-se, portanto, que a maior parte dos nutrientes ingeridos da pastagem pelos animais retorna ao solo através das fezes ou da urina.
Para estimar a quantidade de nutrientes do esterco que estará disponível para as culturas, são utilizados índices de liberação. Sherer (2002) considera para esterco sólido valores de 50%, 60% e 100% para N, P e K, respectivamente, para o primeiro cultivo, ou seja, nos primeiros meses após a aplicação, e acrescenta os valores de 80%, 80% e 100%, para N, P e K, respectivamente, para estercos líquidos.
Utilizando como exemplo (Tabela 2) uma aplicação de 4 m3 ha de esterco de frango de corte, a quantidade de nutrientes liberada para a cultura é de aproximadamente 10,2; 8,9 e 10,0 kg/ha de N, P2O5 e K2O, respectivamente. Se utilizada a estratégia de reposição de nutrientes exportados pela produção de carne, considerando o período de inverno e produção de 400 kg/ha de carne de bovino de corte, haveria ainda um saldo positivo de 1,1 e 9,0 kg/ha de P2O5 e K2O, respectivamente.
Se no mesmo exemplo a estratégia de alimentação dos animais fosse através da colheita de silagem de azevém e fornecimento no cocho (gado confinado), os saldos seriam negativos, com destaque maior para o K (Tabela 2).
No caso do N, em que a necessidade da cultura é muito mais em função das curvas de resposta que propriamente da exportação, o saldo é negativo. Portanto, haveria necessidade de complementação através de fertilizantes minerais.
Cuidados ambientais
O N e o P são apontados como os principais responsáveis pela eutrofização de reservatórios d’água e rios em regiões de alta concentração de produção animal. O N na forma de nitrato pode lixiviar e atingir o lençol freático ou escorrer superficialmente e atingir os corpos d’água. O P pode atingir os corpos d’água principalmente através do escorrimento superficial.
Para diminuir os riscos de contaminação, é importante o balanço correto entre entrada e saída de nutrientes das áreas cultivadas, manter criteriosamente as áreas de preservação permanente, evitar aplicação com solo saturado que dificulte a infiltração do esterco aplicado e adoção de práticas que evitem ou minimizem a erosão do solo como o terraceamento, plantio em nível e plantio sem preparo do solo (plantio direto). Outra estratégia é a rotação entre pastoreio direto e o corte para a retirada para silagem ou feno, aumentando a exportação de nutrientes e evitando o enriquecimento do solo ao longo dos anos.
Volnei Pauletti
Fundação ABC
Antonio Carlos Vargas Motta
Universidade Federal do Paraná
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