O desafio que se apresenta para a agricultura brasileira neste novo milênio é suprir a crescente demanda nacional e mundial por alimentos. No ano 2005 a população mundial será de 6,3 bilhões de pessoas e o consumo previsto pode chegar a 740 milhões de toneladas de trigo, por exemplo. Estimativas mostram que haverá uma deficiência de oferta superior a 100 milhões de toneladas.
Repetir que trigo não é uma cultura nova no Brasil, que temos tecnologia para produzir, que importar o cereal nos custa mais de US$ 1,1 bilhão por ano, que pode converter um emprego direto e dois indiretos para cada 17 hectares incorporados ao sistema produtivo, que é a única opção econômica para o inverno na região sul do Brasil, que nosso problema é o custo Brasil, que os subsídios e o “dumping” praticado pelos países exportadores é cruel, entre outras verdades conhecidas e incessantemente repetidas, não é mais producente e parece não estar ajudando a triticultura nacional, pelo menos nunca foi.
Buscar no governo um culpado para os problemas da triticultura nacional é uma prática conveniente, mas não mais convincente, até porque não é somente culpa do governo o fato de termos uma dependência tão grande do trigo importado, ou que o trigo nacional não tenha a credibilidade que o conhecimento disponível nos levaria a acreditar que devesse ter.
Mas um questionamento é importante: o que a próxima safra, que se inicia já no final de fevereiro nas regiões produtoras do Brasil Central e se estenderá até meados do mês de julho no Noroeste do Rio Grande do Sul, pode prometer? Bem, é o terceiro ano consecutivo que o governo promete, com medidas positivas à triticultura - como preço mínimo remunerador, disponibilidade de crédito para plantio - promessa de comercialização financiada e até, suportada por medidas de competitividade como é o caso do EGF para indústria de semente e de moagem, contratos de opção - CPR’s e o PEP para a movimentação da safra.
Também, temos uma realidade mercadológica que não era consistente até há pouco tempo atrás, quando os preços de mercado eram definidos pelos estoques internacionais, pela demanda de alguns países tradicionais importadores - como é o caso de China e Rússia - ou quando a demanda é maior que a oferta. Na verdade, novamente esses fatores passaram a influenciar de forma previsível e a exportação dos excedentes argentinos para o Oriente Médio causaram um aumento de pelo menos 30% no preço do trigo daquele país. O trigo gaúcho, por exemplo, passou, apesar da difamação qualitativa, a ser procurado com ofertas significativamente remuneradoras.
Na safra de 2000, quando tivemos dois problemas sérios - uma geada no norte do Paraná, que destruiu um milhão de toneladas, e chuvas intensas no período de colheita do trigo do Rio Grande do Sul - no entanto, lavouras com tecnologia adequada conseguiram produzir mais de quatro toneladas por hectare, chegando, em alguns casos, como no Noroeste Gaúcho, a produzir 6,2 toneladas por hectare.
Outro ponto importante que nos faz prever condições vantajosas para a triticultura Brasileira é o retorno da possibilidade, com demanda bem caracterizada, de reintroduzir o trigo nas regiões menos tradicionais do Brasil Central, como é o caso do Sul de Minas Gerais, Triângulo Mineiro, Sudoeste de Goiás, Distrito Federal e Mato Grosso do Sul, tanto em condições de sequeiro, acima de 600 metros, como em condições de irrigação. A capacidade industrial daquela região é de aproximadamente 1,2 milhão de toneladas e demanda próxima a esse número. Existe a capacidade inquestionável de absorver até 500 mil toneladas de trigo produzido na região com marcante competitividade em relação ao trigo importado do exterior ou mesmo de outras regiões produtoras do país.
É marcante, também, a transformação do mercado com relação a características qualitativas. Práticas de segregação de produto por qualidades caracterizadas permitem bonificações significativas, até para trigos que antes eram considerados “comuns”, e hoje são considerados “superiores” para a produção de biscoitos e bolos caseiros. A segregação da colheita e do armazenamento passa a ser um processo agregador de valor ao produto beneficiando a cadeia produtiva como um todo.
O Brasil terá que importar cerca de 8 milhões de toneladas de trigo neste ano de 2001. Quanto teremos que importar no próximo ano? Óbvio que isto depende de quanto produziremos. O Rio Grande do Sul e Santa Catarina podem incrementar, pelo menos em 20%, a área plantada nesta próxima safra, passando dos 530 mil hectares colhidos no ano passado para pelo menos 600 mil hectares. O Paraná, apesar do susto, pode aumentar para até 900 mil hectares, pois o grande competidor do trigo é o milho safrinha, que também foi prejudicado pela geada e não tem preço competitivo. Temos condições de retornar no Mato Grosso do Sul, em São Paulo e nos estados do Brasil Central em lavouras de cerrado, principalmente irrigadas. Isso permite antever um potencial para 150 mil hectares em sequeiro e 30 mil hectares sob pivot central de irrigação, que hoje estão ociosos. Podemos prever um incremento lento, mas consistente. Se quisermos, podemos colher, já na próxima safra 3,6 milhões de toneladas, muito menos do que necessitamos, mas qua
se o dobro do que colhemos na última safra e um passo decisivo para a menor dependência.
Se for esta a política, e os indicadores dizem que é, podemos continuar este incremento de produção até atingirmos, no ano de 2003, cinco milhões de toneladas, o que seria uma posição significativa para a consolidação da triticultura nacional, consistente com a capacidade real do produtor brasileiro, com a habilidade competitiva de nosso agronegócio e como um indicador claro de que podemos, se quisermos, até exportar trigo no futuro.
Embrapa Trigo
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