Milho transgênico em favor do desenvolvimento

A grande questão é como conseguir esse aumento na produção do grão. E só há dois caminhos: aumentar a área ou aumentar a produtividade, aplicando mais tecnologia à agricultura.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

Nos últimos 50 anos, a população brasileira triplicou e migrou para as cidades. O país era tipicamente rural e apenas 20% das pessoas viviam em zonas urbanas. Hoje, essa relação é praticamente inversa, com poucas pessoas trabalhando no campo.

Como explicar, então, que o custo da cesta básica tenha caído pela metade nesse período, ao invés de subir? A resposta está na tecnologia e na produção em escala aplicadas na agropecuária, que permitiram que mais alimentos fossem produzidos em menos espaço. Não é por acaso que o frango de granja custa R$3,50 o quilo, enquanto seu similar caipira sai por R$9,00 o quilo.

Nesse processo de modernização, o milho tem um destaque especial porque representa cerca de 40% de toda a safra brasileira de grãos e porque é a principal fonte de alimento energético para a produção de proteínas animais, como ovos, leite e carnes suína e de aves. Portanto, qualquer variação no preço do milho afeta diretamente o preço final desses alimentos. Da mesma forma, o aumento da produção de proteínas animais pressupõe um aumento na produção de milho. Ou seja: se o brasileiro quer e pode ter mais frango em sua mesa, por exemplo, mais milho precisa ser colhido.

A grande questão é como conseguir esse aumento na produção do grão. E só há dois caminhos: aumentar a área ou aumentar a produtividade, aplicando mais tecnologia à agricultura. Considerando esta segunda via, uma das fórmulas mais eficientes é diminuir as perdas causadas por pragas. Na cultura do milho, a lagarta-do-cartucho exige três aplicações de agrodefensivos por safra para ser controlada. Há outras pragas para as quais nem há controle químico, como a lagarta-da-espiga e a broca-do-colmo.

Por isso, foi muito bem recebida no Brasil a tecnologia do milho Bt, uma variedade geneticamente modificada (transgênica) resistente a insetos. Neste primeiro ano de uso no país, essa variedade mostrou um aumento de 15% a 20% na produtividade. E, além da redução das perdas diretas causadas pelas lagartas, diversos estudos comprovaram que há uma redução dos danos indiretos desses insetos. O que ocorre é que as aberturas geradas pelas lagartas na espiga tornam-se pontos de entrada para microrganismos que produzem micotoxinas, substâncias tóxicas para homens e animais. E há ainda os ganhos decorrentes da redução da aplicação de agrodefensivos e da menor contaminação do meio ambiente.

Mas uma preocupação muito razoável que pode surgir com a adoção do milho Bt é a possibilidade de que ele se misture a lavouras de milho não-transgênico. De fato, o fluxo gênico no milho é possível e exige estratégias específicas para permitir a coexistência segura entre duas variedades que se deseja manter puras. Um exemplo de lavoura comercial de milho mantida com isolamento é a de milhos especiais, como milho doce, milho pipoca e milho branco. Essas estratégias de coexistência vêm sendo utilizadas pelos melhoristas de milho desde 1920, quando se iniciou o uso do milho híbrido.

A coexistência do milho transgênico com o não-transgênico, portanto, não traz novidade para a ciência ou para a cadeia produtiva do milho. Trata-se de um conjunto de práticas agrícolas que permite aos agricultores a produção de grãos convencionais, transgênicos, orgânicos ou outros, de acordo com os padrões de pureza exigidos pela lei. No Brasil, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) determinou regras para garantir a coexistência entre cultivos transgênicos e não-transgênicos. A adoção dessas regras é fundamental para preservar a liberdade de escolha dos produtores, tanto pelo milho convencional quanto pelo milho transgênico.

Estudos revelaram que, em distâncias maiores que 50 metros, a taxa de cruzamento varia de 0,51% a 0,02%. Portanto, muito abaixo da taxa limite exigida pela lei brasileira, que é de 1%, uma vez que a presença de transgênicos acima desse percentual obriga o produto a ser rotulado como transgênico. Ainda assim, a CTNBio definiu normas de coexistência mais rigorosas, que exigem isolamento de 100 metros, ou 20 metros contendo 10 fileiras de milho não-transgênico, que impedem a dispersão do pólen do milho geneticamente modificado. Aliás, os 20 metros podem ser aproveitados inteiramente para plantio de milho convencional e, assim, servir como refúgio – desde que correspondam a 10% da área total de milho transgênico plantado.

As evidências científicas apontam para a eficiência dessas medidas e o cumprimento das normas da CTNBio será cada vez mais relevante para o crescimento da agricultura brasileira. Afinal, o milho Bt chega para revolucionar o controle de lagartas e, portanto, tende a ser rapidamente adotado em larga escala pelos agricultores do país.

Antônio Álvaro Corsetti Purcino

e

José Magid Waquil

Pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo

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