No Brasil, o cultivo do meloeiro (
L.) teve início na década de 60 no Estado de São Paulo. Nos anos 70, houve um considerável incremento na produção do melão nacional, quando passou a ser cultivado também em Pernambuco e na Bahia. Na década de 90, o melão se estabeleceu como cultura importante para o semi-árido nordestino. Hoje, a região Nordeste detém 94% da produção nacional, com destaque para o Rio Grande do Norte (Vale do Açu/Mossoró) e Ceará (Aracati/Chapada do Apodi) responsáveis por 95% da produção da região.
Nos últimos anos, a tecnificação da lavoura e o cultivo de híbridos mais produtivos e de melhor aceitação no mercado conduziram a uma expansão expressiva tanto na área plantada quanto na produtividade do melão nacional. Embora o Brasil seja apenas o 17o produtor mundial, a qualidade dos frutos produzidos na Região Nordeste garantiu um incremento nas exportações do melão, tornando o Brasil o segundo maior fornecedor de melões para os países europeus. Contudo, nas principais áreas produtoras do Nordeste, uma nova doença (amarelão do meloeiro) vem causando significativos prejuízos à cultura do melão.
Anteriormente, pensou-se que se tratava de um distúrbio fisiológico associado à deficiência de molibdênio, um importante micronutriente. Porém, hoje é quase certo que se trata de uma doença causada por um vírus, embora ainda não exista a completa elucidação do patógeno (agente etiológico) envolvido.
O amarelão do meloeiro foi inicialmente observado em plantios comerciais de Baraúna-RN, em 1997. A doença tem uma distribuição geográfica restrita à Região Nordeste, estando dispersa em suas principais áreas produtoras, principalmente no Ceará e Rio Grande do Norte. Segundo alguns produtores potiguares, o comprometimento da produção já teria chegado a 40% nas áreas de produção afetadas.
Esta doença deprecia significativamente a qualidade dos frutos de melão, com acentuada redução do teor de sólidos solúveis, que é a característica mais importante do fruto de melão para o mercado. Esta característica é medida por meio de refratômetros sendo expressa em grau brix (oB), o principal indicador da quantidade de açúcar na polpa do fruto. No exterior, sobretudo, o alto valor do oB é o principal diferencial a favor do melão produzido no nordeste brasileiro.
Em geral, os sintomas da doença no meloeiro se iniciam seis semanas após o plantio. Primeiramente, é observado um clareamento entre as nervuras foliares, o qual se expande para um amarelo intenso por toda superfície foliar. Estes sintomas surgem nas folhas mais velhas da parte inferior da planta e se desenvolvem até atingirem as folhas da parte mediana do meloeiro. Três semanas após o início dos sintomas, um aspecto de mosaico verde-amarelo pode ser observado no meloeiro. As folhas com sintomas severos (amareladas) se tornam coriáceas e quebradiças. Os frutos de melão não apresentam sintomas desta doença.
Embora o agente etiológico do amarelão do meloeiro ainda não esteja completamente elucidado, estudos de microscopia eletrônica conduzidos pela Universidade Federal do Ceará (UFC) indicaram que se trata de um vírus pertencente ao gênero Crinivírus da família Closteroviridae. Além dessas evidências, a sintomatologia, o padrão de disseminação em campo e a transmissão por mosca-branca são fatores que corroboram essa hipótese taxonômica, embora a mesma ainda necessite de comprovação científica.
Já foram relatadas oito espécies de crinivírus transmitidas por mosca-branca no mundo, todas transmitidas por pelo menos umas das seguintes espécies de moscas-brancas:
e
Destas espécies de crinivírus, LIYV (Lettuce infectious yellow virus), CYSDV (Cucurbit yellow stunting disorder virus) e BPYV (Beet pseudo-yellows virus) já foram relatadas como patógenos de curcubitáceas em outros países. A forma de transmissão é semi-persistente, pois após adquirir o vírus estas moscas-brancas serão virulífiras (capazes de transmitir o vírus) somente por um período de 1 a 9 dias.
Análises no genoma viral, realizadas no laboratório de Virologia da UFC, indicaram que o amarelão do meloeiro pode ser causado por uma nova estirpe de LIYV e CYSDV. Entretanto, estudos moleculares adicionais serão necessários para a correta identificação e classificação taxonômica deste patógeno, não estando descartada a possibilidade de mais de um vírus (complexo viral) estarem associados ao desenvolvimento da doença. Os laboratórios de Virologia da UFC, EMBRAPA (Agroindústria Tropical e Hortaliças, Universidade Católica de Brasília (UCB), Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Escola Superior de Mossoró (ESAM) estão realizando estudos visando o completo esclarecimentos dessas questões.
As maiores incidências do amarelão do meloeiro coincidem com a ocorrência de altas populações de mosca-branca em áreas de produção. A mosca-branca é um inseto-praga de corpo amarelo-pálido e asas membranosas cobertas por uma substância branca, tem aparelho bucal sugador e pertence à família Aleyrodidae da ordem Homoptera, com destaque para os gêneros Bemisia, Aleurothrixus, Dialeurodes, Trialeuroides e Aleurodicus. Seu ciclo de vida dura em média 21 dias, sob uma temperatura de 25oC. Trata-se de um inseto-vetor polífago com um ciclo de mais 300 hospedeiros e apresenta alta resistência aos inseticidas.
O surto epidêmico do amarelão do meloeiro está sendo associado à introdução da B. tabaci biotipo B (também denominada como
) nos campos de produção. Diante desta observação, pesquisadores da Embrapa Agroindústria Tropical conduziram um ensaio preliminar, sob condições de casa de vegetação, no qual demonstraram que a mosca-branca é o vetor responsável pela transmissão da doença. Em outro ensaio, estes pesquisadores inocularam o amarelão do meloeiro em algumas curcubitáceas nativas e cultivadas, também por meio de mosca-branca. Os resultados mostraram que a melancia (
), o melão pepino (
sp.) e a bucha (
) apresentaram apenas sintomas leves de amarelecimento, enquanto que, abóbora (
), maxixe (
) e melão caipira (
sp.) foram mais suscetíveis, exibindo os sintomas severos de amarelão do meloeiro, na maioria das folhas.
Pesquisas conduzidas na UFC e na Embrapa Hortaliças também mostraram a transmissão do amarelão do meloeiro pela mosca-branca. Todavia, tanto esses autores quanto pesquisadores de diversas instituições ressaltam a necessidade da realização de pesquisas adicionais que permitam conclusões acerca do inseto vetor do vírus responsável pelo amarelão do meloeiro.
O histórico dessa mosca-branca no Brasil, sua alta capacidade de dispersão e seu alto potencial biótico devem ser considerados, de maneira relevante, pelos produtores de melão. Este vetor causou sérios prejuízos à cultura do tomate no Vale do São Francisco, ao transmitir o geminivírus do tomateiro. Inclusive, ocasionou o fechamento de indústrias de beneficiamento de tomate da região. Atualmente, os produtores do Triângulo Mineiro, Goiás e São Paulo estão enfrentando uma verdadeira batalha no combate à mosca-branca e ao geminivírus do tomateiro.
Ações preventivas devem ser adotadas para o manejo da doença nas áreas de produção de melão. Dependendo do nível populacional atingido pela mosca-branca, qualquer medida de controle, mesmo o químico, poderá ser ineficiente. Embora o agente causal ainda não tenha sido elucidados a contento, são recomendadas algumas medidas que visam reduzir da incidência do amarelão do meloeiro:
• adubar adequadamente o solo evitando pesadas adubações nitrogenadas;
• controle químico da mosca-branca;
• eliminar as ervas daninhas (hospedeiros alternativos) da área de plantio;
• eliminar restos culturais imediatamente após a colheita;
• monitorar a incidência da doença nas regiões produtoras;
• monitorar entrada da mosca-branca nas áreas de cultivo;
• não fazer plantios novos próximos a culturas em estádios avançados;
• realizar rotação com culturas não hospedeiras de mosca-branca (ex: milho e sorgo);
• se possível, cultivar o meloeiro em ambiente protegido;
• utilizar cultivares mais tolerantes à doença;
• utilizar mudas sadias produzidas em ambientes protegidos;
O controle químico da mosca-branca é a estratégia de controle mais empregada, embora muitas vezes da forma errada. Em geral, os produtores utilizam determinado defensivo agrícola, aumentando sua dose e freqüência, até que a praga adquira resistência. Para evitar esse problema, o produto químico deve ser trocado a cada 3 semanas. Os óleos minerais e vegetais e os detergentes neutros podem ser utilizados para melhorar o controle químico da mosca-branca, ambos na concentração de 1%. Devem ser aplicados os produtos registrados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e as pulverizações deverão estar sob a orientação de um agrônomo. A eficiência do controle químico será melhorada pela realização das outras ações do manejo. A Secretaria de Agricultura Irrigada do Ceará (SEAGRI), em convênio com o CNPq, publicou um boletim técnico sobre o manejo integrado da mosca-branca na cultura do melão.
O cultivo de genótipos resistentes (cultivares de polinização aberta e/ou híbridos) será uma medida bastante eficiente contra o amarelão do meloeiro. Contudo, somente após a completa elucidação do agente causal da doença, do seu vetor e dos parâmetros de transmissão, será possível estabelecer uma busca por fontes de resistência e, posteriormente, um programa de melhoramento genético visando a introgressão da resistência do meloeiro ao amarelão.
Portanto, somente a ação integrada de técnicos e produtores de melão visando o manejo da praga e da doença e abrangendo todas as áreas produtoras, poderá surtir efeitos positivos no controle da disseminação do amarelão do meloeiro.
e
Embrapa Hortaliças
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