Solo: um sistema vivo e complexo
Por Guilherme Bavia, engenheiro agrônomo e gerente técnico da Alltech Crop Science
O cultivo de soja com taxa variável de fertilizantes na linha de semeadura reduz a quantidade necessária de aplicação desses insumos e aumenta a lucratividade do agricultor.
A constante busca pelo aumento da produtividade e lucratividade das lavouras brasileiras tem feito com que os agricultores busquem, cada vez mais, formas de aperfeiçoar a utilização dos recursos, potencializando seus benefícios, tornando-se, desta forma, mais competitivos diante das variações econômicas.
Uma das alternativas encontradas por muitos agricultores, com o intuito de aumentar a lucratividade, foi aumentar as áreas de produção. Porém, desde o final da década de 90, o Brasil vivenciou a introdução da Agricultura de Precisão (AP), que tem como principal objetivo otimizar recursos e reduzir os custos de produção.
A AP baseia-se na aplicação de um conjunto de técnicas que visa identificar a variabilidade existente na lavoura, tanto do solo quanto das culturas, permitindo a intervenção de forma localizada e diferenciada dentro da área. Neste sentido, potencializam-se os resultados de produtividade, além da redução dos custos através da otimização dos recursos dentro do processo produtivo.
O desenvolvimento de sensores e a utilização do GPS (Sistema de Posicionamento Global) para auxiliar as operações agrícolas fizeram com que um novo setor dentro das empresas fabricantes de máquinas agrícolas fosse criado, sendo que, atualmente, grande parte delas já adota essa tecnologia em suas máquinas, permitindo, desta forma, realizar diversas operações com um mesmo conjunto mecanizado, além de monitorar e registrar constantemente toda a operação.
Geralmente, inicia-sea AP por meio do histórico de mapas de colheita, porém, muitos agricultores não dispõem desses mapas, mas isso não impede que a técnica seja aplicada. Alguns atributos de solo apresentam importante correlação com a produtividade, sendo que o mapeamento desses pode ser realizado por meio da divisão espacial da área analisada, o que gera uma malha de amostragem (Grid), para obter pontos amostrais e, consequentemente, análises de solo equidistantes.
Inúmeros são os fatores que levam à heterogeneidade do solo, que vão desde o processo de formação deste, a influência do relevo, bem como as intervenções realizadas pela prática da agricultura. A utilização de fertilizantes químicos revolucionou a agricultura, promovendo um aumento na produtividade das lavouras, mas a recomendação de adubação realizada pela média, amplamente difundida, também promoveu o aumento da heterogeneidade do solo no que se refere aos teores dos principais nutrientes. Neste sentido, tem se buscado novas alternativas de manejo que possam minimizar o efeito da variabilidade existente no solo no que se refere ao uso da fertilização química.
A aplicação de insumos, mais precisamente de fertilizantes, durante o manejo dos solos pode ser feita por meio dataxa variável, sempre que esta prática for economicamente viável. Para isso, o mapeamento das propriedades químicas do solo e a identificação da variabilidade espacial de seus atributos são essenciais para a realização deste tipo de aplicação.
Atualmente, no mercado brasileiro, são disponibilizados pelos fabricantes de máquinas agrícolas diversos equipamentos destinados à AP. Para a distribuição de fertilizantes a Taxa Variável (TV) utilizam-se distribuidores centrífugos e por gravidade, que aplicam os insumos em superfície, que também podem ser utilizados na aplicação a Taxa Fixa (TF). Normalmente os fertilizantes mais utilizados na aplicação a lanço são o nitrogênio, o fósforo e o potássio (NPK). Dentro desse mesmo contexto, estão sendo desenvolvidas e aprimoradas semeadoras-adubadoras capazes de distribuir fertilizantes formulados ou de forma individualizada diretamente na linha de semeadura (sulco) a TV.
Segundo a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda, 2014), 45% de todo o fertilizante utilizado nas lavouras brasileiras é comercializado em fórmulas NPK, no entanto, a decisão de realizar a aplicação destes insumos a taxas variáveis está fundamentalmente baseada na viabilidade econômica, para que a aquisição de novos equipamentos com tecnologia de aplicação a taxas variáveis se justifique.
Essa mudança no sistema produtivo promove uma alteração nos custos de produção que devem ser criteriosamente analisados, para que a tomada de decisão não seja baseada somente em critérios técnicos, mas também em critérios econômicos, justificando a aquisição da nova tecnologia, com o objetivo de incrementar a produção e/ou reduzir os custos.
Com o objetivo de verificar a viabilidade econômica da semeadura de soja com aplicação a TV de fertilizante na linha de semeadura, uma equipe de pesquisa realizou um experimento de campo em uma área de cultivo comercial, no município de Nova Mutum, no estado do Mato Grosso (MT). Neste experimento foi utilizada uma semeadora-adubadora de 15 linhas de semeadura com espaçamento de 0,5 metro, equipada com um kit (experimental) capaz de realizar a dosagem de fertilizantes de acordo com mapas de prescrição, previamente elaborados, com base no mapeamento da fertilidade do solo.
A semeadura da cultura da soja, variedade Monsoy M9144RR, foi feita a Taxa Fixa, para uma população final de 270 mil plantas/ha. Já a aplicação do fertilizante foi realizada a Taxa Fixa (TF) e a Taxa Variável (TV), de forma alternada, em cinco faixas de semeadura (repetições) para cada tratamento avaliado (TF e TV).
Para cada parcela foi estabelecida uma largura de 15m e 700m de comprimento. Essa largura foi definida para permitir o deslocamento de ida e de volta do conjunto trator/semeadora. Nas parcelas onde o fertilizante foi aplicado a TF, foi utilizada uma dose de 150kg/ha, baseada na exigência média da área. Já parcelas onde o fertilizante foi aplicado a TV, foram aplicadas taxas de 100kg/h a 215kg/ha, conforme interpretação do laudo da análise de solo. Na área experimental para delimitar as parcelas, durante a operação de colheita, faixas não colhidas foram feitas para separar as parcelas dos dois tratamentos avaliados.
Para a realização da análise econômica foi necessário determinar os custos fixos (depreciação, custo de remuneração e seguro do capital imobilizado), custo de oportunidade da terra e demais custos inerentes à produção. Já os custos variáveis levam em consideração: gastos com combustível, mão de obra, manutenção, insumos, entre outros. Estes foram computados, com o objetivo de determinar o custo horário do conjunto mecanizado. Neste experimento, o custo do kit para a aplicação do fertilizante a TV foi considerado apenas para o referido tratamento.
A análise da viabilidade econômica, conhecida como payback, foi realizada comparando-se o lucro do tratamento 1, a TV de fertilizante, em relação ao lucro do tratamento 2, a TF. Também foi determinado o tempo de retorno financeiro do investimento do kit utilizado no sistema de aplicação de fertilizante a TV.
O peso seco dos grãos de soja colhidos na área do experimento para o tratamento a TF de fertilizante foi de 13.933kg, representando uma produtividade média de 3.240kg/ha (54 sacas/ha). No tratamento a TV de fertilizante (área com as mesmas dimensões da anterior) foram colhidos 14.390kg de soja, sendo que a produtividade média foi de 3.347kg/ha (55,8 sacas/ha), ou seja, uma produtividade 3,3% superior em relação ao primeiro tratamento.
Com base no somatório dos custos envolvidos na semeadura da soja (fixos e variáveis), em cada um dos tratamentos avaliados, e da receita obtida com a comercialização do produto colhido, foi possível obter o lucro para cada tratamento.
Na Figura 3 é apresentado o custo fixo total, o custo variável total e o lucro por hectare de soja, para os dois tratamentos, bem como a diferença de lucratividade obtida com a aplicação a TV e a TF de fertilizante.
Ao observar os resultados da Figura 3, percebe-se que o custo fixo total do tratamento a TV de fertilizante foi 0,8% (R$ 3,31) superior ao do tratamento a TF, enquanto que o custo variável total do primeiro tratamento foi 0,8% inferior (R$ 9,60) em relação ao segundo, fazendo com que o custo total ficasse em R$ 6,29 por hectare, 0,4% menor para o tratamento a TV.
A análise dos dados demonstra que a receita obtida com o tratamento a TF de fertilizante foi de R$ 2.883,60 por hectare, enquanto que para o tratamento a TV foi de R$ 2.978,83 por hectare, ou seja, 3,3% superior em relação à TF. Deduzindo-se o custo total das receitas, se obtém um lucro de R$ 1.404,78 por hectare para o tratamento a TF, e de R$ 1.506,30 para o tratamento a TV. A diferença entre eles foi de R$ 101,52 por hectare, sendo que o tratamento a TV teve 7,2% a mais de lucro em relação ao tratamento a TF.
Os resultados obtidos no experimento vão ao encontro aos encontrados por Amado (2006), durante trabalhos realizados no Projeto Aquarius, onde por meio da redução da utilização de fertilizantes, a propriedade analisada teve uma redução significativa nos custos de produção. Fiorin et al (2011) obtiveram resultados superiores de produtividade em áreas manejadas com o sistema de Agricultura de Precisão, onde participaram produtores de Cooperativas Agrícolas do estado do Rio Grande do Sul. Além do aumento de produtividade das áreas, também foram obtidas reduções na quantidade de fertilizante aplicado nas lavouras, maximizando ainda mais os lucros dos agricultores.
A utilização de novas ferramentas aliada às técnicas de Agricultura de Precisão propicia aos agricultores uma administração mais eficiente da variabilidade existente em suas lavouras, bem como realizar intervenções de forma mais precisa.
Deve-se ter em mente que, muitas vezes, não ocorre um incremento imediato na produtividade, mas em contrapartida ocorre uma otimização e racionalização dos recursos utilizados, o que reduz consideravelmente os custos de produção, garantindo dessa forma a sustentabilidade econômica e, principalmente, a sustentabilidade ambiental do sistema produtivo.
Analisando-se a diferença de lucratividade por hectare do tratamento a TV de fertilizante em relação ao tratamento a TF, que foi de R$ 101,52, bem como de posse do valor de aquisição do kit para aplicação de fertilizante a taxa variável, foi possível calcular o tempo necessário de retorno econômico do capital investido, que foi de R$ 12.300,00.
Dividindo-se o valor de aquisição do kit pela diferença de lucratividade entre os tratamentos (R$ 101,52), verifica-se que são necessários aproximadamente 122 hectares, com condições similares ao da área experimental, para que o dinheiro investido seja retornado para o agricultor.
Considerando-se que uma semeadora-adubadora, como a que foi utilizada no experimento, trabalha em média 300 horas/ano ou, aproximadamente, 900 hectares por safra agrícola, o retorno financeiro do investimento do kit de aplicação de fertilizante a Taxa Variável ocorre em menos de um ano de uso.
GuilhermeJostBeras, John Deere; Alexandre Russini, Ulisses Giacomini Frantz, Unipampa; José Fernando Schlosser, Marcelo Silveira de Farias, Nema –UFSM
Artigo publicado na edição 152 da Cultivar Máquinas.
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