Combinação ideal de enxerto/porta-enxerto na cultura do pêssego

Ao produzir frutas de caroço, como pessegueiro, é importante estar atento a aspectos como a melhor combinação enxerto/porta-enxerto e aos efeitos de solo e clima presentes em cada região de cultivo

03.11.2017 | 21:59 (UTC -3)

A produção brasileira de frutas de caroço apresenta diferentes características de acordo com a região. No Rio Grande do Sul predomina o cultivo de fru­tas para indústria e dupla finalidade, e nas demais regiões, tem destaque o plantio de pêssegos, ameixas e nectarinas para mesa. As principais ações de pesquisa com frutas de caroço envolvem criação e adaptação de cultivares que sejam resistentes a doenças e produzam frutas de qualidade ao gosto do consumidor.

Os porta-enxertos influenciam o grau de sensibilidade ao ambiente, ou seja, grau de adaptação climática da cultivar copa, assim como as diferentes respostas fisiológicas frente a condições adversas como elevadas temperaturas durante a floração, déficit hídrico, irregularidade nas temperaturas hibernais, afetando desse modo a formação dos gametas sexuais, variando o padrão produtivo das cultivares nos anos de cultivo.

Desta forma é importante que os produtores adquiram informações sobre os atributos e as limitações de porta-enxertos específicos e os efeitos de solo e clima de cada região. Para isso são necessários estudos do desempenho dos porta-enxertos para cada região edafoclimática determinada, pois com estas avaliações é possível identificar a melhor combinação enxerto/porta-enxerto ideal para obter frutas de qualidade. Visto que o porta-enxerto pode influenciar no tamanho e na produção das plantas enxertadas, assim como na qualidade.  

O presente trabalho foi realizado para avaliar os componentes do rendimento e qualidade dos pessegueiros Chimarrita e Maciel sobre diferentes porta-enxertos em três locais de cultivo e identificar a dissimilaridade entre estes porta-enxertos para os componentes da qualidade apontando as variáveis com maior importância relativa.

O experimento foi conduzido em três campos experimentais: Embrapa Uva e Vinho, localizada no município de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul (local 1); Estação Experimental Agronômica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, EEA/UFRGS (local 2), em Eldorado do Sul (RS); e Centro Agropecuário da Palma, CAP/UFPel (local 3), pertencente à Universidade Federal de Pelotas, no município de Capão do Leão (RS).

As cultivares copa utilizadas foram: Chimarrita (polpa branca, consumo in natura) e Maciel (polpa amarela, duplo propósito) sobre os porta-enxertos: 'Aldrighi' (Prunus persica Batsch L.), 'Capdeboscq' (Prunus persica Batsch L.), ‘Flordaguard’ [Prunus persica L. Batsch X Prunus davidiana (Carr.)], ‘Nemaguard’ [Prunus persica L. Batsch X Prunus davidiana (Carr.)], ‘Okinawa’ (Prunus persica Batsch L.) e Umezeiro (Prunus mume Sieb & Zucc), formando combinações enxerto/porta-enxerto.

O sistema de condução foi em “V” e o espaçamento entre linhas de 5m e entre plantas 1,5m.

A produção de pêssegos não foi influenciada pelo porta-enxerto no local 1. No local 2 (EEA UFRGS), para os componentes do rendimento a análise de variância não foi significativa em relação aos pessegueiros Chimarrita e Maciel. Na combinação Chimarrita sobre Umezeiro os componentes do rendimento somente foram avaliados em 2011. Nos anos anteriores não foi possível obter frutas para avaliação. Pode-se inferir que este porta-enxerto no local 2 (EEA/UFRGS) não seja aconselhável devido à instabilidade de produção.

Isso possivelmente está associado a dois fatores somados: a sensibilidade do Umezeiro a áreas de replantio aliada ao baixo vigor da cultivar Chimarrita, visto que o porta-enxerto Umezeiro já imprime baixo vigor, seja pelo fato de ser ananizante ou por proporcionar no ponto de enxertia intumescimento que gera um certo grau de incompatibilidade.

No local 3 (CAP/UFPel), a análise de variância foi significativa somente para número de frutas por plantas para a cultivar de pessegueiro Chimarrita e eficiência produtiva baseada em  quilo de frutas por m3 de copa para cultivar de pessegueiro Maciel. O número de frutas não diferiu significativamente entre os porta-enxertos. O porta-enxerto Umezeiro induziu maior eficiência produtiva (quilo de frutas por m3 de copa) ao pessegueiro Maciel, se comparada aos demais. ‘Capdeboscq’ e ‘Okinawa’ estavam em um grupo intermediário e ‘Adrighi’, ‘Flordaguard’ e ‘Nemaguard’ proporcionaram menor eficiência produtiva baseada em volume de copa.

Este fato deve ter ocorrido possivelmente porque apesar do porta-enxerto Umezeiro induzir menor vigor, pelo fato de ser ananizante ou por ter certo grau de incompatibilidade (devido à formação de intumescimento no ponto de enxertia), tem um melhor aproveitamento da copa que proporciona à cultivar Maciel. Pois mesmo sendo menor produz mais frutas por m3. Obviamente a própria cultivar Maciel também contribui para tal fato, por ser mais vigorosa que Chimarrita.

A alta eficiência produtiva e o baixo vigor são vantagens importantes para sistema de produção em alta densidade. Este fato chama a atenção para a cultivar de pessegueiro Maciel enxertada sobre Umezeiro no local 3, porém ainda existe o fato da incompatibilidade a um certo grau constatada pela observação visual do intumescimento do ponto de enxertia.

Acredita-se que estas divergências tenham ocorrido em vista de que no presente experimento foram utilizadas as médias de três anos, diminuindo um pouco a influência do ambiente de cada ano, além do fato de cada unidade experimental que compõe as repetições causar grande variação neste aspecto pelas diferenças nos rendimentos, tornando o coeficiente de variação elevado. Os referidos autores citados trabalharam com os dados de cada ano individualmente estando mais suscetível a variações ambientais que propriamente dos porta-enxertos.

As variáveis de componentes da qualidade das frutas são provenientes da média dos três anos de avaliação (2009, 2010 e 2011), com exceção do porta-enxerto Umezeiro no local 2 (EEA/UFRGS) para a cultivar Chimarrita, que são apenas de 2011, pelo fato de em 2009 e 2010 não se ter conseguido frutas para as avaliações.

Para o local 1 (Embrapa Uva e Vinho), a análise de variância não foi significativa para a coloração, somente para acidez titulável das frutas dos pessegueiros Chimarrita e Maciel. Para as frutas do pessegueiro Chimarrita não houve diferença estatística significativa entre os porta-enxertos para a acidez titulável. Os porta-enxertos ‘Flordaguard’, ‘Nemaguard’ e ‘Okinawa’ induziram maior acidez titulável para os pêssegos da cultivar Maciel se comparados aos demais porta-enxertos.

Para os locais 2 (EEA/UFRGS) e 3 (CAP/UFPel), a análise de variância foi significativa para mais de uma variável componente da qualidade das frutas, por este motivo foi possível realizar análise multivariada e observar a dissimilaridade entre os porta-enxertos.

O fato do porta-enxerto Umezeiro ter proporcionado características diferentes dos demais à cultivar Chimarrita pode ser explicado pela sua característica de vigor reduzido, por ser ananizante ou apresentar certo grau de incompatibilidade. Com o menor crescimento vegetativo as frutas ficam mais expostas à luz, sendo que para sua proteção desenvolvem a coloração vermelha com maior intensidade. O processo de amadurecimento também acelera.

No local 3 (CAP/UFPel) também foi possível observar a formação de três grupos de porta-enxertos: grupo I (‘Capdeboscq’, ‘Flordaguard’, ‘Nemaguard’ e ‘Okinawa’), grupo II (‘Aldrigui’) e grupo III (Umezeiro). As variáveis utilizadas para a referida análise foram acidez titulável, Ratio SS/AT e firmeza de polpa (N). As duas variáveis canônicas expressaram 95,84% da variabilidade dos dados. Observou-se maior importância relativa das variáveis Ratio SS/AT e firmeza de polpa (N), totalizando 72,20% da responsabilidade pela divergência entre os porta-enxertos.

No local 3 (CAP/UFPel), o porta-enxerto Umezeiro induziu maior Ratio SS/AT e juntamente com os porta-enxertos ‘Capdeboscq’, ‘Flordaguard’, ‘Nemaguard’ e ‘Okinawa’ menor firmeza de polpa (N) à cultivar Maciel. Neste sentido, o porta-enxerto Umezeiro proporcionou uma característica interessante à cultivar de pessegueiro Maciel para o local 3 (CAP/UFPel). Isso pode ser explicado por dois fatores: o porta-enxerto Umezeiro imprime menor vigor, proporcionado maior exposição das frutas à luz, adiantando o processo de maturação ou, ainda, pelo fato dos dados serem provenientes de três anos de cultivo, sendo que em 2010 e 2011, no período de maturação, observou-se pouca precipitação pluviométrica concentrando mais os sólidos solúveis e aumentando o Ratio SS/AT, visto que são diretamente proporcionais.

Conclusões

Os componentes do rendimento foram pouco influenciados pelos porta-enxertos depois de três anos de cultivo, existindo apenas variações de acordo com a região de cultivo avaliada;

Os componentes da qualidade foram mais afetados pelos porta-enxertos nas regiões de EEA/UFRGS (local 2) e CAP/UFPel (local 3);

O porta-enxerto Umezeiro não é recomendado para o local 2 (EEA/UFRGS), combinado com pessegueiro Chimarrita, devido à falta de produção em 2009 e 2010, porém, é recomendado para o local 3 (CAP/UFPel) combinado com o pessegueiro Maciel devido à eficiência produtiva e ao Ratio SS/AT maior;

Os porta-enxertos ‘Aldrighi’, ‘Capdeboscq’, ‘Flordaguard’, ‘Nemaguard’ e ‘Okinawa’ podem ser recomendados para os pessegueiros Chimarrita e Maciel nos três locais de cultivo (Embrapa Uva e Vinho, E.E.A UFRGS e CAP UFPel).

 



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