Bebida constituída de frutos de açaí e café: Uma alternativa viável

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O açaí constitui-se a base da alimentação cotidiana de diversas famílias da região Norte do Brasil e oferece grande disponibilidade de resíduos.

Segundo o IBGE 2010, o Brasil produziu em 2009, aproximadamente, 119.000 toneladas de frutos de açaí, sendo que cerca de 90 % deste volume corresponde aos resíduos gerados após o processamento agroindustrial do fruto.

0s resíduos do fruto são constituídos basicamente de semente e de fibras. Apesar de ser uma fonte de material lignocelulósico renovável, este resíduo representa atualmente um grave problema ambiental. Denomina-se semente de açaí, o fruto despolpado que representa 83 % do fruto sendo obtido no ato da extração da polpa para preparação do suco de açaí. O poder calorífico da semente, obtido em laboratório, é, em média de 4.505 kcal/kg e o potencial energético em torno de 40.800 MWh/mês. No entanto, não existem referências sobre o aproveitamento dessas sementes para fins alimentícios.

Atualmente, o café tem grande importância na economia mundial. Seu mercado internacional movimenta anualmente recursos na ordem de 15 bilhões de dólares. O café é a bebida mais consumida no mundo e o segundo maior mercado depois do petróleo. Pelo fato deste alto consumo mundial, a partir de anos mais recentes, as pesquisas relacionadas às atividades biológicas do café torrado foram intensamente estimuladas (ABIC, 2010).

Logo, a utilização da semente do açaí como ingrediente da bebida de café propõe interessante alternativa, uma vez que agrega valor ao resíduo, reduz os custos necessários para tratamento e destino destes resíduos e contribui para redução do impacto ambiental dentro de um sistema de desenvolvimento sustentável.

Sendo assim, objetivou-se com o presente trabalho avaliar o aproveitamento sustentável da semente de açaí, subproduto do beneficiamento dos frutos para produção de uma bebida à base de café e açaí.

Neste trabalho, foram utilizados café torrado adquirido no comércio local e frutos de açaí (Euterpe oleracea Mart.) provenientes do estado do Pará.

Os frutos de açaí foram torradas e moídas no Laboratório do Centro Nacional de Treinamento em Armazenagem - CENTREINAR

Foram torradas 3,6 kg de frutos previamente limpos, no torrador (Rod Bel S.A) a 120 ºC por trinta minutos. Os grãos torrados de café e de açaí foram moídos no equipamento de moagem MAHLKONIG na granulometria 2.

Utilizou-se açaí (SA) e café (GC) em 5 diferentes formulações de acordo com as seguintes proporções: 0 % SA e 100 % GC, 25 % SA e 75 % GC, 50 % SA e 50 % GC, 75 % SA e 25 % GC e 100 % SA e 0 % GC.

As amostras de café com açaí torrada e moída foram preparadas de modo a se obter uma infusão concentrada, utilizando cerca de 40 g de pó (café com semente de açaí) e 250 mL de água fervente, à temperatura de 95 ºC, utilizando-se suporte de filtro plástico sobre recipiente coletor e papel de filtro comum para filtragem.

A análise sensorial foi realizada, utilizando-se cinco amostras de bebida de café e açaí em diferentes concentrações.

A avaliação foi feita, utilizando-se 30 mL de cada amostra da bebida servida em copos descartáveis previamente codificados com número de três dígitos. As amostras foram avaliadas à temperatura média de 60 oC por 50 julgadores não treinados, sendo 28 homens (56 %) e 22 mulheres (44 %).

O conteúdo fenólico total foi determinado em triplicata pelo ensaio com o reagente Foling-Denis, segundo metodologia citada por Shahidi & Naczk (1995), com algumas modificações. A análise foi realizada na amostra de maior aceitabilidade sensorial (25 % de açaí) e nas amostras de 0 e 100 % de semente, utilizadas como controle.

As leituras espectrofotométricas da amostra e do branco foram realizadas a 750 nm em espectrofotômetro UV-1601 PC Shimadzu, em cubetas de quartzo. A quantificação de polifenóis totais foi feita com base na curva-padrão de ácido gálico P. A., preparada com soluções do padrão, variando entre 25 e 150 mg/L. O conteúdo fenólico total foi expresso em “ácido gálico equivalente” (g de ácido gálico equivalente/ 100 mL da bebida).

A análise de minerais foi realizada no Laboratório de Mineralogia do Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa. A amostra de maior aceitação sensorial foi utilizada para análise de minerais (25 % de açaí).

As amostras de bebida de 0, 25 e 100% de açaí torradas e moídas tiveram os teores de minerais quantificados através do método de espectrofotometria de absorção atômica, já que a amostra de 25% de açaí foi a mais aceita na análise sensorial. Por esta metodologia foi possível determinar os teores de K, Ca, Mg, Fe e P.

A leitura dos minerais foi feita no aparelho de absorção atômica modelo Spectra 220SS marca Varian, com gás acetileno, nos comprimentos de onda: 422,7; 285,2; 248,3 e 725 nm.

Para análise dos resultados obtidos, realizou-se regressão linear das médias dos escores obtidos no teste de aceitação com a porcentagem de açaí na bebida (Figura 1).

Observou-se efeito negativo da porcentagem de semente de açaí presente na bebida em relação às médias dos escores obtidos no teste de aceitação. De acordo com esta análise observa-se que a partir do escore seis cujo termo hedônico refere-se a “Gostei ligeiramente”, a amostra da bebida é considerada aceitável. Os resultados mostraram que é possível uma composição de até 22% de açaí na bebida (Figura 1).

A partir do resultado do teste de aceitação, a bebida com 25 % de açaí e as bebidas com 0 e 100 % de açaí (controle) foram caracterizadas através das análises de polifenóis totais e minerais (K, Ca, Mg, Fe, P), sendo que as amostras de 50 e 75 % não apresentaram boa aceitabilidade pelos julgadores e portanto não foram caracterizadas ( polifenóis e minerais).

A curva padrão seguiu o comportamento indicado pela Figura 2:

Em seguida, as leituras espectofotométricas para as bebidas contendo 0, 25 e 100% de açaí foram obtidas. Os resultados são apresentados na Tabela 2:

A partir desses resultados, pode-se observar que a amostra com 25 % de açaí e 75 % de café contém aproximadamente 86 mg/L de polifenóis expressos em ácido gálico, o que é aceitável, já que em comparação com a bebida de 0 % de açaí (bebida de café) apresentou apenas uma redução de 15,7 % em polifenóis totais.

Por outro lado, a bebida com 100 % de açaí apresentou quantidade insignificante de polifenóis totais presentes comparados à quantidade presente na bebida com 0 % de açaí.

Os resultados obtidos na análise de minerais pelo método de espectrofotometria de absorção atômica das amostras de 0, 25 e 100 % de açaí se encontram na Tabela 2.

Pelos resultados é possível observar menor teor de minerais presentes na bebida contendo 100 % de açaí em relação à bebida de café (tabela 2). Já a mistura contendo 25 % de açaí apresentou valores próximos ao da bebida de café (0 % de semente de açaí).

A fim de verificar se os valores médios do teor de minerais destas duas bebidas diferem entre si ao nível de 1 % de probabilidade, realizou-se uma análise estatística utilizando o teste t de Student ( tabela 3).

Conforme observado, os minerais K e Fe apresentaram diferença significativa do café para a mistura de 25 % de açaí e 75 % de grãos de café. Já os minerais Ca, P e Mg não diferiram estatisticamente ao nível de 1 % de probabilidade.

Apesar de a semente apresentar um aroma similiar ao de café, sua aceitação sensorial ficou limitada a utilização de no máximo 22 % na bebida à base de café. A amostra contendo 25 % de açaí e 75 % de café foi a de maior aceitação pelos julgadores.

Os resultados de polifenóis totais e minerais na caracterização da bebida contendo 25 % de açaí mostraram que esta apresenta baixos valores de polifenóis totais e de minerais.

O aproveitamento do fruto de açaí em bebida à base de café se propõe como uma alternativa para redução de custos necessários para disposição e tratamento desses resíduos, redução do impacto ambiental causado pelo elevado volume de resíduo gerado e para agregação de valor ao resíduo da agroindústria de açaí.

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