Manejo do mofo branco em feijão
Diversas estratégias de controle devem ser adotadas, pois, uma vez instalada, a erradicação do patógeno é quase impossível
Com o advento da colheita mecanizada da cana-de-açúcar e a consequente supressão da queima na pré-colheita, o destino e a correta utilização da biomassa foliar dos canaviais transformaram-se em desafio adicional, repleto de potencialidades. Sustentar a produtividade das áreas e auxiliar na armazenagem de matéria orgânica no solo são algumas das possibilidades quando se efetua o adequado manejo desses resíduos.
Estudos em diversas regiões brasileiras vêm sendo conduzidos com o objetivo de desenvolver estratégias para utilização sustentável dos solos, com a finalidade de reduzir o impacto das atividades agrícolas sobre o ambiente. Há quase um século as pesquisas na cultura da cana-de-açúcar são baseadas em áreas sob queima da biomassa foliar (palhada) na pré-colheita. Porém, a supressão da queima na pré-colheita vem sendo adotada com efetividade nos últimos anos. Mudanças no manejo de resíduos de colheita são importantes, pois ajudam a sustentar a produtividade das áreas e auxiliam na armazenagem de matéria orgânica no solo, principalmente quando grandes áreas fazem parte do sistema de produção.
Os aspectos ambientais e sociais do uso negativo da queima na pré-colheita são: poluição do ar e aumento de fuligem ao redor de centros urbanos; maior consumo de água para limpeza da cana colhida em seu processamento na indústria, além da limpeza de sujeira nas cidades próximas; elevação no número de acidentes em rodovias devido à fumaça proveniente da queima; aumento de problemas respiratórios; supressão da fauna e flora silvestre no canavial e áreas vizinhas, assim como ambiente de trabalho adverso para o cortador de cana.
Nos últimos anos, a proibição da queima para eliminar as palhas na pré-colheita tem representado um dilema socioambiental. De um lado, a eliminação da etapa de queima pode contribuir para melhoria da qualidade do ar e redução de problemas respiratórios, além de favorecer a sustentabilidade ambiental, mas, por outro, pode suprimir milhares de empregos, sendo necessário direcionar a mão de obra para outros postos de trabalhos, como operar máquinas agrícolas e atuar nas suas revisões e manutenções.
Ao colher a cana crua através da utilização de máquinas, as folhas secas e verdes dos colmos, além dos ponteiros, formam camada de palha na superfície do solo, o que contribui para: (I) redução da compactação superficial e melhorias dos atributos físicos do solo, (II) redução do escorrimento superficial do solo, água e nutrientes, impedindo a erosão, (III) aumento no teor de matéria orgânica, (IV) elevação da capacidade de troca catiônica (CTC), (V) favorecimento do microclima próximo ao solo, que auxilia a manutenção da umidade por período maior, evitando mudanças bruscas na temperatura e influência positiva na dinâmica do carbono no solo, armazenando-o por maior período.
Além da substituição da queima da palhada da cana-de-açúcar durante a pré-colheita, tem-se também incremento à utilização dos resíduos da própria indústria, minimizado impactos ambientais, além de reduzir o uso de fertilizantes minerais. Destacam-se, entre os resíduos gerados, a água de lavagem da cana, o bagaço, a torta de filtro e a vinhaça (Figura 1). A aplicação destes resíduos em solo cultivado é uma das formas de repor os nutrientes extraídos pela cultura, complementando ou substituindo total ou parcialmente a quantidade de fertilizantes minerais recomendados nos programas de adubação, além de reduzir a contaminação ambiental no descarte destes resíduos.
O aproveitamento da vinhaça gerada durante a produção do etanol (álcool)/açúcar como fertilizante agrícola pode ser realizado mediante fertirrigação. Esse resíduo tem alto valor como fertilizante por possuir elevado teor de potássio e matéria orgânica. A fertirrigação com vinhaça é bastante difundida nas regiões canavieiras, com resultados satisfatórios em relação às alterações químicas no solo, proporcionando aumento de matéria orgânica, pH, cálcio, magnésio e potássio. Porém, cuidados devem ser tomados no momento de sua recomendação, para evitar aplicação em excesso com consequente contaminaçãodo solo e lençol freático.
Outro resíduo muito aproveitado pelas usinas é a torta de filtro, composta por resíduos solúveis e insolúveis, que equivalem ao precipitado (lodo) formado na etapa de clarificação do caldo de cana. O lodo formado é um composto orgânico e inorgânico insolubilizado, que passa por processo de filtração a vácuo, recebendo, então, a denominação de torta de filtro. Este resíduo tem composição química variável e apresenta altos teores de matéria orgânica, fósforo, nitrogênio, cálcio e possui, ainda, teores consideráveis de potássio e magnésio. Características deste resíduo como ausência de alumínio, teores consideráveis de potássio e acidez fraca permitem que a torta de filtro seja usada para práticas de correção do solo.
No Quadro 1 são apresentadas as características e os usos dos mais diversos tipos de resíduos da indústria sucroalcooleira.
A manutenção dos nutrientes decorrentes da adição da vinhaça e torta de filtro entre outros resíduos aplicados ao solo, associada à eliminação da queima da cana por ocasião da colheita mecanizada, promove maior acúmulo de restos culturais e consequentemente incremento da matéria orgânica no solo, contribuindo para manutenção e elevação da qualidade do solo, que repercute em melhor desenvolvimento da cultura.
Em trabalho realizado no estado de Mato Grosso do Sul, Rosset e colaboradores avaliaram diferentes sistemas de manejo de cana-de-açúcar com ou sem queima na pré-colheita na presença e ausência de vinhaça (Tabela 1).
Com intuito de identificar os possíveis benefícios de cada sistema de manejo foram avaliados indicativos de qualidade do solo, como a quantidade de carbono estocado em profundidade, além de parâmetros estruturais do solo.
Os menores estoques de carbono orgânico total (COT) foram observados na área de cana-de-açúcar com queima antes da colheita sem aplicação de resíduos (QSR), variando de 11,04mg/ha e 22,96mg/ha(toneladas por hectare) (Gráfico 1). Ao longo dos anos, a queima do canavial, aliada à não aplicação de resíduos como a torta de filtro e vinhaça, influenciou negativamente os estoques de COT, sendo prejudicial à qualidade do solo. Em áreas manejadas com cana-de-açúcar, a mobilização do solo com grade aradora (reforma do canavial), associada à queima antes da colheita, contribui para perda de COT.
Ao observar áreas com aplicação de vinhaça, a área com queima (QCV) apresentou os maiores estoques de COT. Tal fato se deve ao maior tempo de aplicação de vinhaça nesta área (16 anos), diferente da área de colheita com cana crua, que passou a receber vinhaça somente após a conversão do sistema de colheita (três anos).
Com o passar dos anos de cultivo recebendo resíduos existe tendência de que a área de colheita da cana crua em comparação à queima aumente consideravelmente seus estoques de carbono, uma vez que o carbono que seria emitido para a atmosfera na forma de dióxido de carbono (CO2), no momento da queima, retorna ao sistema solo. Trabalhos na literatura indicam que após vários anos com colheita sem a prática da queima, associada à aplicação de resíduos como a vinhaça, promove aumento do conteúdo de carbono no solo, consequentemente com benefícios às propriedades químicas, físicas e biológicas das áreas cultivadas. Canellas et al (2003) verificaram que a contribuição da palhada possibilitou prolongar de quatro para oito anos o cultivo sem renovação do canavial.
Em áreas que receberam somente aplicação de vinhaça como resíduo (CCVe QCV), foi possível observar que a área de cana crua apresentou maiores valores de diâmetro médio ponderado (DMP) e diâmetro médio geométrico (DMG), 4,76mm e 4,32mm, enquanto na área de cana queimada, estes valores foram de 4,68mm e 4,22mm, respectivamente (Gráfico 2), evidenciando que a supressão da queima associada à aplicação de vinhaça por três anos fornece melhoria aos atributos físicos do solo. Passarin et al (2007) encontraram para a camada de 0-0,1m valores de DMP variando de 2,73mm a 3,30mm e DMG de 1,01mm a 2,02mm nos tratamentos com aplicação de vinhaça. Também evidenciaram que a vinhaça, quando aplicada ao solo provoca, aumento da atividade microbiana, em consequência da presença de matéria orgânica. Essa atividade é acompanhada pelo aumento na produção de mucilagem, que pode favorecer a agregação e promover aumento na estabilidade estrutural do solo.
A área com queima na pré-colheita sem aplicação de resíduos apresentou os menores índices de agregação, tanto DMP quanto DMG. Ceddia et al (1999) explicam que menores valores de DMP em áreas de cana queimada estão relacionados à destruição dos agregados do solo com o passar do tempo, pois a diminuição no conteúdo de matéria orgânica (considerada agente de “cimentação” entre as partículas minerais do solo), interfere negativamente, proporcionando menores valores para os índices de agregação DMP e DMG. Souza et al (2004) verificaram que o uso intensivo de áreas de Latossolos em São Paulo, com preparo excessivo do solo e queima dos resíduos, modifica significativamente as propriedades físicas do solo, principalmente afetando a estabilidade de agregados.
No Gráfico 2 é observado que mesmo na área CCV com aplicação de vinhaça e colheita sem queima há apenas três anos ocorreu maior porcentagem de agregados maiores que 2mm, chegando a 94,4%. Isso indica que a prática da supressão da queima na pré-colheita, associada à aplicação de vinhaça, auxilia os processos de agregação do solo, aumentando o tamanho dos agregados. A maior porcentagem de agregados maiores que 2mm indica que o solo está melhor estruturado, com presença de agregados mais estáveis, ou seja, maior resistência à ruptura por forças externas, como ação da chuva. Comparando diferentes formas de colheita e manutenção dos resíduos sobre o solo, Graham et al (2002) observaram maiores porcentagens de agregados maiores que 2mm em área de cana crua (78%) e posteriormente na área que passou pelo processo de queima na pré-colheita (70%). Esse padrão demonstra a importância da manutenção da palhada e consequente aumento nos teores de COT do solo no processo de estabilização dosagregados. Padrão totalmente inverso à área de QSR, como observado no Gráfico 2, com menor porcentagem de agregados maiores que 2mm.
Observa-se a importância da aplicação dos resíduos para manutenção e aumento nos estoques de carbono e melhorias na agregação do solo. Essa prática se torna duplamente viável, pois além de diminuir os problemas com impactos ambientais do descarte de resíduos em rios como a vinhaça, traz melhorias para os atributos químicos e físicos do solo e, consequentemente afeta positivamente os atributos biológicos com o passar dos anos de cultivo.
Ao longo dos anos, a manutenção da palhada no momento da colheita, associada à aplicação de resíduos como a vinhaça e torta de filtro, pode auxiliar no aumento dos teores e estoques de carbono orgânico total e melhoria dos atributos físicos do solo, especialmente obtendo maior tamanho e estabilidade dos agregados.
Segundo dados da União das Indústrias de Cana-de-açúcar (Unica), na safra 2013/2014 a região Centro-Sul brasileira é responsável pela maior produção em área e moagem de cana-de-açúcar, com destaque para os cinco maiores estados produtores: São Paulo, Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul, que, juntos, somam aproximadamente 574,09 mil toneladas moídas (87% da produção nacional).
Jean Sérgio Rosset, Instituto Federal do Paraná. Áreas de atuação: Manejo do solo/Fertilidade do solo; Leandro Rampim, Universidade Estadual do Oeste do Paraná; Jolimar Antonio Schiavo, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
Artigo publicado na edição 190 da Cultivar Grandes Culturas.
Receba por e-mail as últimas notícias sobre agricultura
Receba por e-mail as últimas notícias sobre agricultura