Aeração de grãos armazenados consiste basicamente em promover a passagem de baixa vazão de ar natural ou resfriado por meio de ventiladores através da massa granular com o objetivo de baixar e uniformizar a temperatura dos grãos armazenados, prevenir a migração de umidade e, dependendo das condições climáticas e da vazão de ar, promover a secagem ou reumedecimento dos grãos.
Nos Estados Unidos, tem-se fato de pesquisas com aeração desde 1930 realizados por F.C. Fenton e C.O. Swanson na Universidade Estadual de Kansas. Após 1949, George H. Foster desenvolveu relevantes trabalhos sobre aeração e foi idealizador da seca-aeração.
No Brasil, os primeiros trabalhos relatados sobre aeração de feijão feitos por P.M.Del Giúdice e T.Hara na Universidade Federal de Viçosa no final da década de 1960, sob orientação de George H.Foster, Bruce McKenzie, John R.Foley e Gerald W. Isaacs, da Purdue University.
Em 1974, no I Seminário Nacional de Armazenagem, realizado em Porto Alegre, RS, o prof. Tetuo Hara da Universidade Federal de Viçosa proferiu uma palestra sobre o potencial uso da Aeração de Grãos no Brasil.
Assim posto, pode-se afirmar que o conhecimento e a prática da aeração no Brasil é relativamente recente. Hoje, é considera-se praticamente indispensável na boa conservação de grãos armazenados, porém há necessidade de se tomar alguns cuidados para evitar a deterioração de grãos armazenados e o desperdício de energia elétrica.
Navarro & Noyes (2001) diziam que grãos armazenados fazem parte de um ecossistema com elementos bióticos (insetos, fungos, fermentação, etc.) e abióticos (temperatura, umidade, pressão etc.) que interagem com os grãos armazenados, representou-o por meio de um diagrama (Fig.1 -
).
Temperatura e umidade dos grãos são elementos que podemos controlar e que, por sua vez, promovem o favorecimento ou não da ação dos elementos bióticos.
Um dos mais importantes fatores a ser considerado na aeração é o fenômeno chamado “Equilíbrio higroscópico”, que é a relação termodinâmica específica para cada grão existente entre a pressão d’água contida no grão e a pressão do vapor d’água do ar em contato com o mesmo. Em outras palavras, a umidade de cada grão está em equilíbrio para cada condição de ar que o envolve para uma determinada temperatura e Umidade Relativa.
Digamos que um determinado grão com 13% de umidade está em equilíbrio com o ar com Umidade Relativa de 65% a 25°C. Se colocarmos este grão num ambiente ou em contato com ar com 40% de Umidade Relativa a 25°C, existe um desequilíbrio e haverá a passagem da água do grão para o ar (secagem). No caso inverso, se o ar estiver com 90% de Umidade Relativa a 25°C, a água do ar, em forma de vapor, tenderá a transferir-se para o grão (Umedecimento).
Hoje existem diversas equações que expressam o Equilíbrio Higroscópico para diversos grãos e que fazem parte dos programas computacionais, tanto de secagem como de Aeração.
Qual o objetivo da armazenagem? Preservar a qualidade dos grãos e sementes após a colheita, os quais serão colocados no ecossistema em questão e sujeitos aos agentes bióticos e abióticos.
A maioria dos agentes bióticos tem suas condições de fatores abióticos, principalmente de temperatura e de umidade, em que são mais ou menos favoráveis para sua sobrevivência, assim como as condições ótimas de desenvolvimento.
Para que não se perca a qualidade do produto armazenado, como encontrar a condição adequada e econômica? Burrrel & Burrell, 1964, citado por Christensen (1974), idealizaram o “Diagrama de Boa Conservação” (Fig. 2) que até hoje tem sua validade prática na indicação da umidade segura do grão ou semente para sua armazenagem em função da temperatura dos mesmos (não é a temperatura do ar ambiente).
No eixo da ordenada estão representadas as temperaturas do grão ou semente em °C; na abscissa, o Teor de umidade expresso em % (base úmida, bu), que representa o percentual de água existente no grão ou da semente em relação ao seu Peso total (água + matéria seca), é o percentual de umidade comumente utilizada na comercialização, na secagem, na armazenagem e nos medidores de umidade comerciais.
Assim, no Diagrama de Conservação de Cereais a linha A, maior parte horizontal, na linha dos 18°C, indica que a condição de temperatura do grão ou semente, abaixo desta linha, representa que a maioria dos insetos tem o desenvolvimento reduzido, sendo mais reduzido quanto mais baixa for a temperatura. Do mesmo, quanto mais alta for a temperatura acima da linha A, maior será o seu desenvolvimento até a temperatura limite específica de cada inseto.
A linha B é o referencial para as sementes. As condições à esquerda da linha representam as condições favoráveis de umidade e temperatura dos cereais de armazenagem.
A linha C é o referencial para os grãos destinados à indústria. Analogamente ao item anterior, as condições à esquerda da linha representam as condições favoráveis de umidade e de temperatura dos cereais de armazenagem. Atualmente, há uma forte tendência para se adotar a linha B mesmo para os grãos destinados às indústrias.
Assim, através do Diagrama de Conservação de Cereais podemos ter os indicativos da umidade e da temperatura favoráveis para a armazenagem segura que irá depender ainda do local e da região, do tipo de estrutura de armazenagem e do manejo da aeração.
Originalmente, para evitar que os grãos se aquecessem, revolviam-se os grãos passando-os através do ar, no caso de armazenagem comercial, corresponderia à operação de transilagem. A aeração, em contrapartida, é uma operação que consiste em passar o ar através da massa de grãos armazenados.
Em 1972, Calderon citado por Navarro & Noyes, 2002, define a Aeração como a movimentação forçada de ar com qualidade adequada ou com ar adequadamente condicionado através da massa de grãos para melhorar a capacidade de armazená-los. É também chamada de ventilação ativa, mecânica, baixo volume ou forçada, desde que um ventilador seja utilizado para movimentar o ar ambiente.
Os autores também chamam a atenção para não confundir a aeração com a ventilação natural ou corrente de ar convectivo ou também com aeração passiva que ocorre em tradicionais paióis de milho em espiga.
As vazões de ar utilizadas na aeração são relativamente baixas. Só para se ter uma idéia, veja o Quadro 1.
No caso, são exemplos para mostrar que as vazões de ar são bem baixas comparadas às de secagem que, de modo geral, são superiores a 2m3 min /ton.
Nota-se que o tempo de Aeração é inversamente proporcional à Vazão de ar. Repetindo, a medida que se aumenta a vazão, aumenta-se o consumo de energia com conseqüente aumento de custo da operação.
É lógico que, quanto maior a vazão, mais rápido completa-se a aeração e conseqüentemente maior será o consumo de energia.
O quadro 2 mostra um exemplo da relação entre a vazão de ar e o tempo de aeração em um determinado silo.
Assim, deve-se compatibilizar, de acordo com as condições de sanidade, da temperatura e umidade dos grãos armazenados, das condições climáticas locais, tempo máximo que os grãos podem permanecer nas condições originais sem que se inicie o processo de deterioração, as características dos equipamentos instalados para se fazer a escolha da vazão mínima ou estimar o tempo que será necessário para completar a aeração.
Outro fator importante a ser considerado é a resistência que os grãos, isto é, a massa granular, oferece à passagem de ar de aeração. Cada tipo de grão, de acordo com a espessura ou altura da camada granular, com a compactação, com a umidade e com o teor de impurezas, oferece uma resistência específica à passagem do ar que é expressa em Pressão Estática. Estes dados são obtidos não só no clássico trabalho de Holman, 1960, por meio do gráfico de Shedd (1953) constante no Manual da ASAE, 2002 como em diversos trabalhos publicados não só no exterior como também no Brasil.
A quantidade, disposição, principalmente das impurezas finas, afeta de modo significativo a resistência à passagem do ar através da massa granular. Deste modo, é de suma importância reduzir o máximo possível o teor de impurezas, principalmente as finas e tomar as devidas precauções no carregamento dos silos, preferencialmente com um bom espalhador.
Em situações de um verão muito quente ou em regiões quentes está cada vez mais comum a aeração com ar resfriado. Alguns anos atrás só existiam um tipo de equipamento de resfriamento de ar para aeração, mas o consumo excessivo de energia tornava-se inviável.
Hoje já existem vários tipos e modelos, na maioria programáveis e de consumo energético viável e muito útil ou mesmo necessários em situações específicas mencionadas.
Um sistema de aeração é composto basicamente pelo ventilador, pelo duto de suprimento de ar, dutos de aeração e sistema de controle.
A seguir serão apresentados os principais elementos que compõem o sistema de aeração.
O ventilador é sem dúvida um elemento muito importante do sistema de aeração. Sua identificação e o conhecimento de suas características permitirão o melhor manejo.
Cada ventilador tem sua Curva Característica que correlaciona a vazão de ar, potência requerida, a pressão estática e a rotação do eixo do ventilador, que pode ser obtida do fabricante. A curva característica permite ao usuário verificar se um determinado ventilador atende o fluxo de ar necessário e compatível com o sistema de aeração projetado.
Não é incomum a existência de ventiladores sub-dimensionados que não conseguem vencer a pressão estática e, mesmo estando o ventilador ligado, não está movimentando o ar através da massa granular.
Como na maioria dos casos, o ventilador insufla o ar no silo, diferente daqueles em que promove a sucção, o atrito das pás dos ventiladores e em alguns casos complementado pela geração de calor dos motores, o ar de aeração insuflado é ligeiramente aquecido em torno de 6°C, ou mais, acima da temperatura ambiente. Para tanto, deve-se proceder a correção das condições psicrométricas do ar nos cálculos da aeração.
Na escolha do ventilador para a aeração, além do aspecto de engenharia, hoje, é de suma importância fazer a seleção sob o aspecto de meio ambiental principalmente relativo ao nível de ruído.
Os principais tipos de ventiladores (Fig. 3) utilizados na aeração podem ser agrupados conforme mostrado no Quadro 3.
O duto de suprimento de ar do sistema interliga o ventilador dos dutos de aeração. Ele é dimensionado de tal forma que haja a menor perda de carga possível e é onde se toma a pressão estática geralmente por meio de manômetro em “U” ou sensores de pressão conectados a uma leitora ou sistema computadorizado remoto.
Os dutos de aeração mais eficientes são os de fundo falso, em que toda a superfície do fundo é constituída de chapa perfurada, cuja perfuração é de tamanho tal que não permita a passagem dos grãos e a área perfurada é superior a 10% do total.
Os dutos ou calhas de aeração são mais comuns em unidades armazenadoras maiores e de dimensionamento com base a partir do trabalho clássico de Holman, 1960. É importante ressaltar que no seu dimensionamento são considerados o tipo de unidade armazenadora, a vazão do ar, tipo e umidade do produto, a velocidade do ar, o diâmetro do duto, o comprimento do duto, a disposição dos dutos, a velocidade de saída do ar do duto para a massa granular, a temperatura e umidade relativa do ar, dentre outros fatores.
Neste capítulo, como foi mencionado, não será possível entrar em detalhes de dimensionamento e o objetivo é conhecer os fatores envolvidos, verificar os pontos básicos e operar o sistema um pouco mais conscientemente.
O sistema de controle da aeração consiste não só na operação de ligar e desligar o ventilador como também em um sistema automatizado que analisa o tipo de grãos com suas condições de umidade, temperatura, nível de impureza e sanidade; condições climáticas atuais e históricas; objetivos da aeração; tempo de aeração; consumo de energia etc.
Estes sistemas automatizados já estão disponíveis no mercado brasileiro.
Um sistema automatizado não significa a solução final para a operação de aeração. Ele é uma ferramenta bastante útil que facilita sobremaneira o trabalho do operador. Seria o mesmo que entregar um carro com transmissão automática a um inabilitado e ele sair dirigindo sem problema pela estrada afora.
• A experiência do operador pode ajudar em operar a Aeração, no entanto, o conhecimento de sua tecnologia otimizará a operação tanto no aspecto qualitativo, quanto na economia do sistema. Programa de capacitação e de atualização é essencial;
• Manutenção preventiva do sistema de aeração é imprescindível para que ele funcione a contento. Assim, é necessário que se proceda, antes de se carregar o silo, uma limpeza rigorosa não só nas paredes e no piso da unidade armazenadora, mas principalmente nos ventiladores, aerodutos e os furos das chapas perfuradas. Verificar se nos furos das chapas não estão obstruídos.
Verificação de todo sistema elétrico (fiação, conectores, fusíveis ou sistema de proteção), ligação dos pólos correta (certeza do sentido da rotação dos ventiladores), estado dos rolamentos, tensão das correias, fixação dos ventiladores, vedação adequada dos aerodutos, limpeza em torno das entradas de ar dos ventiladores etc;
• Origem e histórico dos grãos a serem aerados (nível de umidade e de impurezas, principalmente de finos). Modo de carregamento dos silos (com ou sem espalhadores);
• Obtenção de dados climatológicos locais por meio de Estações Meteorológicas oficiais como a do Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, de alguma instituição estatal ou privada que registre estes dados.
Na impossibilidade de se obter estes dados, pode-se montar uma pequena estação meteorológica própria ou, no mínimo, ter um psicrômetro (que consiste em dois termômetros em que em um dos bulbos está envolvido com uma gaze molhada com água destilada) com um Gráfico Psicrométrico (constante em qualquer livro de Termodinâmica ou obtido através do CENTREINAR) para permitir conhecer as características do ar utilizado na aeração;
• Ao ligar o sistema de aeração, manual ou automático, verifique se o ar está fluindo uniformemente em toda a superfície da massa granular. Se não possuir anemômetros bastante sensíveis, é possível construir um aparato muito simples conforme a Figura 8. Este aparato consiste em um tubo de vidro, com bolha de detergente na parte interna. Este tubo é conectado a uma curva por meio de tubos de borracha e na outra extremidade da curva, com uma estaca rígida de 800 mm presa por meio de braçadeiras, deve ser introduzida 100 mm perpendicularmente em relação à superfície da massa granular. O ar que sai da massa granular faz movimentar a bolha de detergente. Com um cronômetro, determine o tempo para a bolha se deslocar 500 mm no tubo transparente.
Se desejar determinar a velocidade do ar, poderá utilizar a Curva de Calibração;
• Após o início da operação a movimentação da Frente de Resfriamento da aeração (Fig. 7) deve ser monitorada por meio da termometria e não desligar o sistema até que a frente tenha atravessado toda a massa de grãos;
• Preferencialmente desligar o sistema no início da manhã para aproveitar ao máximo as temperaturas mais baixas da noite e, conseqüentemente, evitar o desligamento da aeração no final do dia;
• Não se precipitar em desligar a aeração quando a Umidade Relativa do Ar estiver acima do Equilíbrio Higroscópico, desde que a temperatura do ar externo esteja abaixo da temperatura média dos grãos armazenados, pois o processo de umedecimento é 4 a 6 vezes mais lento que o de secagem. É preferível aproveitar para baixar a temperatura dos grãos com leve umedecimento do que a elevação de temperatura e, na maioria dos casos, não é interessante que ocorra a secagem;
• Um operador de unidade armazenadora com experiência, somente sentindo o cheiro do ar que sai da aeração, pode detectar o desempenho da aeração, bolsões de aquecimento devido a princípio de deterioração ou infestação de insetos antes da termometria.
Concluindo, podemos afirmar que a Aeração é um instrumento muito útil, se não indispensável em muitos casos, na conservação de grãos armazenados quando bem operada. Por outro lado, quando operada inadequadamente, sem o devido conhecimento tecnológico, será uma fonte de perda quanti-qualitativa de grãos armazenados como também será uma fonte de despesas intoleráveis para a unidade armazenadora.
CENTREINAR - UFV
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