Quinze anos de greening no Brasil

Como a citricultura de SP e MG tem conseguido controlar a doença e se manter como principal produtora de suco de laranja do mundo

22.02.2019 | 20:59 (UTC -3)
Beatriz Flório

Em março de 2004, o greening foi identificado no Brasil, na região de Araraquara, centro do estado de São Paulo. A pior doença da citricultura mundial desafiou pesquisadores e citricultores brasileiros, mas hoje, após 15 anos, o modelo de inteligência e o conjunto de medidas fitossanitárias adotados garantem ao país posição de destaque no cenário internacional: o Brasil é responsável por 34% da laranja e 56% do suco produzido no mundo e tem 76% de participação no comércio mundial de suco de laranja, sendo o maior exportador da bebida no planeta. O parque citrícola de São Paulo e Triângulo/Sudoeste Mineiro é a principal região produtora. A citricultura está presente em 350 municípios, gerando 200 mil empregos diretos e indiretos e movimentando US$ 14 bilhões por ano.

O greening em potencial para devastar pomares inteiros. A doença causa queda precoce dos frutos, que não se desenvolvem normalmente e ficam com sabor mais ácido, dentre outros sintomas, comprometendo e reduzindo a produção. Como não tem cura, é necessário erradicar as árvores sintomáticas. Em 2018, a incidência da doença atingiu 18,15% do cinturão citrícola, seu maior índice, o que corresponde a 35,3 milhões de árvores doentes. Apesar do número recorde, São Paulo e Minas Gerais produziram 398 milhões de caixas de laranja, número 25% maior que a média das safras dos últimos dez anos.

Na Flórida (EUA), citricultura que foi referência no mundo na década de 1990 em relação a planejamento dos pomares, adensamento, nutrição, irrigação e produtividade, o greening foi identificado um ano depois, em 2005, e hoje afeta cerca de 90% das plantas, sendo o principal responsável pela queda de produção, que já chega a 70% do que era produzido há 14 anos.

Manejo eficiente e sustentável

Enquanto o Brasil adotou a eliminação de plantas com greening como ponto fundamental para o controle da doença, uma vez que árvores infectadas servem de fonte de contaminação do inseto transmissor, o psilídeo, a erradicação não foi bem aceita nos EUA, e as pesquisas para a cura das plantas não tiveram os resultados esperados. “Eles investiram em nutrição, termoterapia e antibióticos, que não impediram o avanço do greening nos pomares nem o aumento da severidade dos sintomas nas árvores doentes”, analisa o pesquisador do Fundo de Defesa da Citricultura – Fundecitrus, Renato Bassanezi.
No Brasil, o manejo do greening baseia-se ainda na aquisição de mudas sadias vindas de viveiros certificados e no monitoramento do psilídeo, que ajuda a direcionar as pulverizações para os momentos e locais críticos.

O grande desafio em relação ao greening consiste em obter e aplicar medidas ao mesmo tempo eficientes e sustentáveis, com custos praticáveis. Nesse sentido, a redução do volume de calda – com até 50% menos água e ingrediente ativo –, o manejo regional – que consiste no controle químico conjunto de produtores de uma mesma região, “encurralando” o inseto transmissor – e as ações de controle externas – feitas ao redor das propriedades comerciais – revolucionaram o controle.

Os estudos sobre o psilídeo mostraram que a migração para pomares comerciais ocorre de pomares vizinhos abandonados ou não tratados adequadamente, de chácaras, ranchos e quintais que mantêm pés de laranja, tangerina ou limão sem o cuidado recomendado ou de residências e mesmo espaços públicos, como escolas, praças e cemitérios, que cultivam a murta (dama da noite) como ornamentação e até cerca-viva. Nas ações externas contra o greening, agrônomos e técnicos do Fundecitrus conscientizam a população sobre o que é a doença e a importância econômica e social da citricultura e propõe-se a substituição gratuita por outras espécies frutíferas e ornamentais. Com essas ações externas, o Fundecitrus já efetuou a substituição de quase 180 mil plantas de setembro de 2017 a novembro de 2018. Nesse período, foram erradicadas ainda quase 270 mil plantas em pomares abandonados.

É no contexto das ações externas que está a liberação de Tamarixia radiata, pequena vespa inimigo natural do psilídeo, que é solta nas proximidades dos pomares comerciais, principalmente nos distritos, baixando a população do inseto.

O primeiro bioinseticida para o controle de psilídeo, produzido pela Koppert, em parceria com Fundecitrus e Esalq/USP, é uma ferramenta a mais para os citricultores, ampliando o leque do manejo integrado de pragas. O produto não deixa resíduos e preserva inimigos naturais e agentes polinizadores.

Futuro ainda mais sustentável

A biotecnologia é uma área estratégica para sofisticar o manejo do greening: o melhoramento das plantas vislumbra a diminuição do uso de inseticidas, menor exposição dos profissionais do campo aos defensivos agrícolas, aumento da produtividade e qualidade da fruta. O Fundecitrus trabalha com mais de uma linha, dentre elas a planta repelente e a borda letal ao psilídeo, que podem ser integradas.

Já o feromônio do psilídeo é realidade. Anunciada em dezembro de 2017, a descoberta da molécula atrativa ao inseto pela equipe do Fundecitrus juntamente com o cientista Walter Leal, professor titular da Universidade da Califórnia (UCDavis), abre novas possibilidades para o monitoramento do inseto transmissor. Neste momento, a formulação do produto que será aplicado à armadilha está em desenvolvimento, passando por testes sucessivos.

Para o gerente-geral do Fundecitrus, São Paulo tem excelentes condições para se manter como referência mundial em produtividade e sustentabilidade. “O clima e o solo são favoráveis, a infraestrutura é equiparável à dos principais centros mundiais. O setor tem duas instituições de relevância global, o Fundecitrus e a CitrusBR. E a experiência dos citricultores e da indústria de suco de laranja fazem a diferença em relação à capacidade e à qualidade dos produtos do parque citrícola”, elenca.

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