Produção de sorgo no Brasil sobe mais de 36% em apenas uma safra

Assunto foi debatido por especialistas das áreas de mercado e de pesquisa durante o XXXIII Congresso Nacional de Milho e Sorgo

19.09.2022 | 14:56 (UTC -3)
Embrapa

A forte expansão do sorgo no Brasil, tanto em área quanto em produção nas últimas quatro décadas, e os cenários favoráveis para um (ainda) maior desenvolvimento da cultura nos próximos anos foram aspectos debatidos por especialistas das áreas de mercado e de pesquisa durante o XXXIII Congresso Nacional de Milho e Sorgo. “Temos um horizonte promissor para o sorgo. Com a expectativa de acréscimo das exportações de milho do Brasil para a China, os preços devem continuar valorizados e o sorgo deve ser mais procurado pelas agroindústrias”, prevê Felipe Fabbri, coordenador da divisão de mercado de proteínas alternativas e de custo de produção da Scot Consultoria.

“Ano a ano temos visto incrementos na área e na produção, índices que vêm sendo puxados por agroindústrias de produção animal, que querem reduzir os custos na produção de rações, e por quebras na produção de milho em função do clima”, descreve. O Brasil, segundo o último levantamento de safras da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) divulgado no dia 8 de setembro, produziu 2,85 milhões de toneladas de sorgo na última safra (36,9% a mais que no período anterior), em uma área plantada de 1,03 milhão de hectares (incremento de 19,4%). A produtividade, segundo a instituição, está em 2.763 quilos por hectare, com variação positiva de 14,6% em relação à safra 2020/2021.

“O cenário para 2022/2023 é de forte evolução, com mais investimento em tecnologia. Devemos ter mais um ano sob a influência do La Niña e os produtores podem optar mais pelo sorgo, caso a janela se encurtar no plantio da safra de verão”, avalia Fabbri. O cereal é praticamente semeado em sua totalidade no período de segunda safra, pois apresenta maior resistência à escassez de chuva e tolera temperaturas mais altas. Essa vantagem competitiva do sorgo vem acompanhada de um menor custo de produção – se comparado ao milho entre 20% e 30% a menos – e um cenário de alta liquidez vivenciada pelos produtores nos últimos anos.

Segundo o coordenador da equipe de inteligência de mercado da Scot há, por parte da indústria, alta procura pelos grãos no período da colheita. “É uma opção de fácil acesso com menor custo”, resume. Totalmente voltado ao consumo doméstico, a cadeia produtiva do sorgo tem se profissionalizado com medidas adotadas pelas agroindústrias no processo de comercialização. “A partir de 2019 estabelecemos regras claras para o produtor de sorgo, garantindo no mínimo 85% da cotação da saca de milho, podendo, inclusive, constar em contrato, se o agricultor desejar”, reafirma o gerente-executivo de Operações e Logística da BRF, Dércio Luís Oppelt.

Segundo ele, a empresa ainda trabalha com outras formas de comercialização, como compras futuras com preços fixados em reais e também atrelados às bolsas brasileira e de Chicago, além de compras em depósito com a estipulação da data de venda podendo ser definida pelo próprio produtor ou pela cooperativa. “O agricultor pode entregar a produção e não vender, aguardando o melhor momento. Adequamos a forma de comercialização do sorgo à mesma forma de comercialização do milho”, explica Oppelt. “O estabelecimento dessa clareza no processo de venda é fundamental para o mercado e para o produtor”, completa.

De acordo com Dércio, um dos desafios para uma maior expansão da cultura no País é a logística de transporte, com os altos preços do frete, com o aumento do óleo diesel, já que a região Centro-Sul concentra a produção – Goiás produz quase 41% do sorgo brasileiro. Outro fator apontado pelo gerente são as perdas no processo de transporte. “Os caminhões devem ter a carroceria bem fechada. Os grãos de sorgo, sendo bem menores que os do milho, são mais suscetíveis a perdas na logística”, aponta. Dércio Oppelt ainda reforça a necessidade de mais investimento em pesquisa e a necessidade de registro de herbicidas e inseticidas para a cultura, além de investimentos nas fábricas para o uso do sorgo na formulação de rações.

Sorghum Belt do Brasil

Goiás, Minas e São Paulo lideram a produção de sorgo no País. Mas o eixo de produção está mudando, segundo dados apresentados por Urubatan Klink, gerente comercial da América do Sul da Innovative Seed Solutions. “Matopiba e Sealba, além dos estados de Mato Grosso e Rondônia, são movimentações importantes em termos de territórios de produção, o que nos traz uma série de esforços pensando em cada uma dessas regiões”, avalia. Segundo ele, as regiões de Sorriso e Primavera do Leste, em Mato Grosso, têm ainda oportunidades de expansão na carona do crescimento da produção de etanol.

Abaixo, veja um diagnóstico das principais áreas produtivas brasileiras e tendências futuras, na visão de Klink.

Região Central: Minas Gerais, Goiás e Norte de São Paulo

Tendência de crescimento da área plantada de 13,6% em cinco anos, passando dos atuais 1,2 milhão de hectares para quase 2 milhões de hectares em 2027. “É uma área mais tecnificada, mas devemos estar atentos a cultivares tolerantes ao pulgão, que provocou sérios problemas em lavouras nos Estados Unidos”, alerta. Segundo Urubatan Klink, há a necessidade de desenvolvimento de novas moléculas químicas (herbicidas, inseticidas e fungicidas), novos híbridos de alto potencial produtivo e geração de grãos de alta qualidade para a indústria de carne.

Região Norte: Mato Grosso, Rondônia e Pará

Incremento de 32,3% na área plantada nos próximos cinco anos, atingindo 603 mil hectares em 2027. Desenvolvimento de híbridos eficientes de alta estabilidade e tolerantes a nematoides, principalmente para regiões de solos arenosos. Geração de híbridos de alta qualidade para a indústria da carne e para as usinas de etanol, além de desenvolvimento da produção local de sementes.

Região Nordeste: Matopiba e Sealba

Crescimento de 35,1% da área plantada até 2027, chegando a 935 mil hectares. Desenvolvimento de híbridos de alto potencial produtivo para áreas irrigadas e de alta estabilidade para regiões de sequeiro, tolerantes ao pulgão e a nematoides. Novas moléculas químicas. Híbridos de alta qualidade para a indústria da carne e para etanol (principalmente na região de Luís Eduardo Magalhães, na Bahia, onde já foi iniciado um polo de produção de álcool), além do desenvolvimento da produção local de sementes.

Região Subtropical: sul de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul

De 245 mil hectares em 2022 para 499 mil hectares em 2027. “Talvez seja uma das poucas regiões do País em que está havendo uma substituição da cultura do milho pelo sorgo em decorrência da cigarrinha-do-milho”, interpreta. Desenvolvimento de híbridos eficientes de alta estabilidade e tolerantes ao ergot, principalmente em plantios mais tardios, e ao pulgão. Geração de grãos de alta qualidade para a indústria da carne e para a alimentação bovina.

Região Sul: Rio Grande do Sul e Santa Catarina

Crescimento de 78,7% na área plantada até 2027, chegando a 124 mil hectares em 2027. Desenvolvimento de híbridos para essa região, eficientes e de alta estabilidade para plantio de verão, adaptados para áreas encharcadas (rotação com a cultura do arroz, promovendo a redução da planta daninha conhecida como arroz vermelho). Geração de grãos de alta qualidade para a indústria da carne e para a alimentação bovina.

Particularidades da cultura

“Nos últimos 10 anos, houve uma evolução muito grande do potencial produtivo dos híbridos, saindo de um potencial de 80 para 150 sacas, além do aperfeiçoamento de atributos importantes, como tolerância à seca, qualidade nutricional e redutores de nematoides. É importante continuar a evolução desses híbridos para que possam garantir o incremento das áreas plantadas nas regiões de expansão, além de oferecer ao mercado cultivares tolerantes ao pulgão”, comenta o gerente comercial da América do Sul da Innovative Seed Solutions. Entre os híbridos citados, de alto potencial produtivo, está o BRS 373, desenvolvido pela Embrapa.

Etanol e alimentação humana

Atualmente, cerca de 12% da safra de sorgo dos Estados Unidos, principal país produtor da cultura, é usada para a produção de biocombustíveis. “Além disso, a cultura é adequada para diferentes tipos de produção de etanol, sendo que o grão de sorgo produz a mesma quantidade de etanol por tonelada que o milho, mas usa um terço a menos de água em sua produção”, expõe.

Em relação ao potencial de uso do sorgo na alimentação humana, Klink é enfático. “Temos usado muito pouco esse grão de sorgo. Sabemos que outros países têm usado muito mais e explorado esse potencial, como Japão, Estados Unidos e União Europeia. Traz essa tremenda vantagem da intolerância ao glúten”, reforça.

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