Pesquisa propõe controle regional do inseto-vetor para melhorar combate ao HLB dos citros

O psilídeo precisa ser controlado para combater o HLB

28.09.2018 | 20:59 (UTC -3)
Alessandra Vale

Estudo da Embrapa e parceiros internacionais deve subsidiar alteração em regulamentação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para melhorar o controle no País do Huanglongbing (HLB), ou Greening, atualmente a mais severa doença dos citros identificada no Brasil, nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná. Nesse trabalho de pesquisa, os cientistas recomendam a adoção de medidas de controle do inseto-vetor, o psilídeo-asiático-dos-citros (Diaphorina citri).

A Instrução Normativa Mapa nº 53, de 16 de outubro de 2008, versa sobre as medidas de contenção da doença, mas não trata, por exemplo, do controle do inseto-vetor, essencial para que não haja disseminação do HLB em escala regional.

“A pesquisa é fundamental na geração do conhecimento técnico para a tomada de decisão do Mapa. Estamos totalmente de acordo com esse estudo. O controle do vetor do HLB é imprescindível para conter a doença. Temos de encontrar uma forma legal de incluirmos essa ação durante a revisão da IN 53/2008”, afirma o coordenador-geral de Proteção de Plantas do Departamento de Sanidade Vegetal, vinculado à Secretaria de Defesa Agropecuária do Mapa, Paulo Parizzi.

Ele acrescenta que a revisão da IN 53/2008 é prioridade da Coordenação-Geral de Proteção de Plantas. “Esperamos que ainda este ano um grupo de trabalho formado por instituições envolvidas na pesquisa e controle do HLB, tais como o Mapa, Embrapa, Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus) e órgãos de defesa agropecuária dos estados, possam dar início aos trabalhos de revisão da norma, e com certeza os resultados dessa pesquisa serão discutidos”, afirma o coordenador do ministério.

A pesquisa é tema de artigo escolhido recentemente como destaque (Editor’s Choice) pelo Journal of Applied Ecology, periódico inglês focado na divulgação de resultados de pesquisa aplicados em ações de intervenção relacionados a aspectos ecológicos.

“[Esse estudo] é um ótimo exemplo de trabalho ecológico aplicado que se relaciona diretamente com uma regulamentação específica”, afirma o editor sênior do periódico Phil Stephens, em sua análise do artigo “Grower and regulator conflict in management of the citrus disease Huanglongbing in Brazil: A modelling study” (Conflito entre produtores e reguladores no manejo da doença cítrica Huanglongbing no Brasil: um estudo de modelagem).

Após fazer um panorama dos impactos da doença em diversos países, Stephens relata que, em 2008, o governo brasileiro emitiu uma instrução normativa que determina a remoção das árvores sintomáticas em intervalos trimestrais e que qualquer unidade de produção com pelo menos 28% de árvores com sintomas deve ser removida completamente. Destaca ainda que a norma causou conflito com os produtores, porque mesmo as árvores sintomáticas podem produzir e, portanto, muitos produtores prefeririam não as remover.

Com base em ferramentas biomatemáticas, os autores do artigo, entre eles o pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA) Francisco Laranjeira, coordenador do portfólio de Sanidade Vegetal, demonstram que os aspectos da instrução normativa, direcionados a pomares individuais, não iriam funcionar em escala regional. Eles propõem formas melhores de manejo para reduzir as infecções das plantas e evitar, assim, perdas de rendimento para o produtor.

Não basta retirar a planta doente
“Com esse trabalho, conseguimos mostrar que existe um conflito na determinação de remover, de tempos em tempos, todas as plantas dos pomares com mais de 28% de plantas sintomáticas, como estabelece a instrução normativa. Isso porque se você remove uma planta sintomática que ainda está produzindo, pode não ser bom para o agricultor, mas, ao deixá-la no campo, ela vai servir de fonte para a propagação do HLB na região. Ou seja, não é bom para o controle da doença. Apesar disso, para plantas mais novas, vale a pena remover. Em uma escala regional, demonstramos que isso não é suficiente [para controlar a doença]. É preciso reduzir a população do inseto-vetor. A instrução normativa só atua em relação à planta e é omissa quanto ao vetor”, explica Laranjeira.

No artigo, os autores fazem uma série de considerações no intuito de aprimorar a instrução normativa como, por exemplo, o incentivo à implementação de áreas regionais de manejo. Os cientistas são contrários ao limite para remover toda uma unidade de produção. Em vez disso, defendem uma combinação entre a pulverização em toda a área (para reduzir substancialmente a população do vetor) e a remoção de árvores sintomáticas. Se a pulverização resultar em reduções esperadas na infecção, menos árvores terão de ser removidas, uma situação mais aceitável para os produtores.

“Vamos dizer que a doença chegue ao estado de Sergipe. Pela instrução normativa, a agência estadual de defesa vegetal vai orientar os produtores a remover as plantas. Rapidamente, eles vão removê-las e vão perder tudo, se não tiver essa redução da população do inseto-vetor na área”, explica Laranjeira.

De acordo com ele, o estudo demonstrou que não adianta o produtor fazer isso em sua área, se os demais na região não o fizerem. “Por isso, é preciso que haja um grupo de citricultores muito bem organizado ou uma estrutura regional em que haja um grande produtor que auxilie os pequenos a fazer o controle ou alguma ação pública de organização”, detalha o pesquisador.

Laranjeira explica que a pesquisa também mostrou a necessidade de o poder público implantar ações de controle nessas áreas de manejo. “Isoladamente os citricultores não vão conseguir controlar a doença”, destaca Laranjeira.

Histórico do HLB BioMath
O embrião dessa pesquisa foi o trabalho de pós-doutoramento de Laranjeira na Universidade de Cambridge, na Inglaterra, com o mesmo grupo de pesquisadores que assinam o artigo. A partir daí, surgiu o projeto HLB BioMath, que integra o portfólio de Sanidade Vegetal da Embrapa e já teve duas fases. Foram desenvolvidos vários modelos que vêm sendo aplicados para análise de critérios legislativos de amostragem e controle e análise de cenários de disseminação em nível regional, entre outras ações.

De acordo com Laranjeira, o trabalho tema desse artigo vai embasar a proposta da terceira fase do HLB BioMath. “Uma das ideias é justamente o delineamento das áreas regionais de manejo. Eu brinco dizendo que vamos desenvolver ‘armas’ contra o HLB. ‘Armas’ são as iniciais de ‘áreas regionais de manejo’ para combater a doença. Espero que esse seja um bom processo agrícola a ser aplicado pelos citricultores, servindo também de apoio a políticas públicas, e que as agências de defesa de sanidade vegetal possam elaborar melhores planos de contingência”, diz.

Além de Laranjeira, participaram da pesquisa os cientistas Andrew Craig, Nik Cunniffe e Christopher Gilligan, da Universidade de Cambridge (Inglaterra), e Matthew Parry, da Universidade de Otago (Nova Zelândia).


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