Técnicos iniciam pesquisa para levantamento da safra de grãos em Goiás
Em função da pandemia de COVID-19, o trabalho será feito por meio de monitoramento remoto de imagens de satélite
A podridão floral dos citros (PFC), popularmente conhecida por estrelinha, é uma doença cuja relevância vem aumentando nas últimas décadas nos pomares brasileiros. A PFC é causada por duas espécies de fungo, Colletotrichum acutatum (C. abscissum) e C. gloeosporioides, sendo a primeira a mais encontrada nos pomares de São Paulo, principal região produtora de citros no Brasil.
A ocorrência de chuvas frequentes e prolongadas e temperaturas com variações entre 20ºC e 30ºC durante o florescimento das plantas são condições muito favoráveis à doença. Sob estas condições climáticas, aliadas ao histórico da doença no local, epidemias de PFC costumam apresentar caráter explosivo, ou seja, a incidência da doença aumenta rapidamente nos pomares. Os esporos do fungo, estruturas microscópicas que germinam e infectam as flores, estão presentes em grande quantidade tanto nas flores doentes quanto nas folhas (estruturas de sobrevivência). Em epidemias de PFC ocorridas no Brasil e em outros países das Américas, observou-se redução de 80% na produção das plantas.
Plantas de “Natal” e de outras laranjas doces que apresentam vários surtos de florescimento, como é o caso da “Pera”, são as variedades que sofrem as maiores perdas causadas pela doença. As plantas de lima ácida “Tahiti” também são bastante afetadas. A PFC pode ser potencializada por floradas fora de época, que muitas vezes são causadas por outras doenças presentes no pomar, tais como o Greening (Huanglongbing ou HLB), a gomose de Phytophthora e o declínio, bem como por estresses abióticos.
Os sintomas iniciais da doença são caracterizados por lesões alaranjadas nas pétalas (Figura 1) e escuras no estigma e estilete das flores de citros. Nas flores infectadas há alterações hormonais que tornam os frutos cloróticos e os derrubam precocemente, deixando seus cálices retidos (“estrelinha”) aos ramos das árvores por até 18 meses. É comum que as estrelinhas apareçam agrupadas em um mesmo ramo ou em um setor da planta, uma vez que os esporos do fungo são disseminados por respingos de água na copa das plantas. Os sintomas podem ser vistos nos botões brancos ainda fechados, embora a maioria das lesões seja observada nas flores abertas. As fases de botão expandido (“cotonete”) e de flor aberta são consideradas as mais críticas para a infeção pelo fungo. Portanto, a atenção do citricultor deve ser redobrada quando os pomares apresentarem floradas nessas fases de desenvolvimento.
O manejo da PFC pode ser realizado adotando-se algumas estratégias antes do florescimento. A eliminação de plantas, sob estresse ou muito afetadas por outras doenças que resultem em múltiplas floradas, ajuda a reduzir a multiplicação do fungo no pomar. A manutenção de práticas que resultem em boas condições nutricionais também reduz os danos causados pela doença. Entretanto, durante a florada, o controle da doença é realizado, principalmente, pela aplicação de fungicidas registrados para a cultura dos citros. De maneira geral, o controle químico deve ser feito quando há condições climáticas favoráveis à doença, desde a fase de botões ainda fechados até a queda do estigma/estilete (“fase de chumbinho”).
No Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) são registradas formulações que têm como ingredientes ativos os fungicidas carbendazim (benzimidazol), fluxapiroxade (carboxamida) + piraclostrobina (estrobilurina), azoxistrobina (estrobilurina) + tebuconazol (triazol), tebuconazol (triazol) + trifloxistrobina (estrobilurina) e ciprodinil (anilinopirimidina) + fludioxonil (fenilpirrol). Entretanto, nem todos esses fungicidas são permitidos em pomares que produzem frutas destinadas à industrialização e exportação de suco. Os fungicidas permitidos estão incluídos na Lista ProteCitrus, disponível no site do Fundecitrus (www.fundecitrus.com.br).
O controle químico da PFC é adotado pelos produtores em praticamente todas as safras, principalmente por aqueles que sofreram perdas de produção ocasionadas pela doença no passado. Contudo, epidemias de PFC que causam reduções significativas na produção ocorrem esporadicamente, em sincronia com períodos chuvosos prolongados durante o florescimento das plantas. Essa íntima relação da PFC com o clima levou pesquisadores da Esalq/USP, do Fundecitrus e da Universidade da Flórida a elaborarem um modelo matemático (equação) que estimasse a intensidade da PFC no pomar em função das condições climáticas, sendo possível, desta maneira, alertar o citricultor sobre o momento mais adequado de proteger as flores.
Assim, uma primeira pesquisa avaliou a germinação de esporos do fungo em laboratório sob diferentes combinações de temperatura e período de molhamento (água disponível para o patógeno). Posteriormente, essa relação entre o fungo e o clima foi comparada com a expressão dos sintomas nas flores de plantas mantidas sob condições controladas de temperatura e molhamento. Com os dados destes experimentos, os pesquisadores geraram uma equação que descrevia a relação da germinação dos esporos do fungo com a temperatura e a duração do molhamento. Por fim, foram testados diferentes valores de germinação dos esporos que, ao serem atingidos, o controle químico da PFC seria adotado. Esses limites foram comparados com a aplicação de fungicidas comumente adotada por citricultores e baseada em calendário. Os valores de germinação de esporos que apresentaram melhores relações custo-benefício no controle da doença foram utilizados para estimar os riscos de ocorrência da PFC em um novo sistema de previsão lançado em 2016, que pode ser acessado pelo link.
O sistema de previsão da PFC vem sendo avaliado no campo desde a sua elaboração e tem contribuído para reduzir em até 75% o número de aplicações de fungicida para o controle da PFC quando comparado ao sistema tradicional de calendário de pulverizações. Esta queda no número de pulverizações ocorreu sem que houvesse redução na eficiência de controle da doença. Esse sistema também foi avaliado por duas safras em pomares paulistas de diferentes variedades de laranja doce (Baianinha, Pera e Natal) e a economia com as aplicações variou de 25% a 75%. No momento, esse sistema de previsão está sendo testado com algumas modificações também em pomares da Flórida, nos Estados Unidos.
Atualmente, o sistema de previsão conta com mais de 50 estações meteorológicas instaladas em fazendas de citros no estado de São Paulo e Triângulo Mineiro. Essas estações registram dados de diferentes variáveis climáticas e enviam para o sistema, que estima os riscos diários de ocorrência da PFC especificamente nestes locais monitorados. O sistema é gratuito e possui uma plataforma de fácil uso (Figura 2), uma vez que estima os riscos sem a necessidade do usuário inserir informações adicionais. Alertas de risco de PFC são enviados automaticamente, por e-mail e mensagens de celular, quando as condições climáticas que implicam necessidade de controle da doença são atingidas.
A utilização do sistema pelos citricultores vem crescendo, uma vez que os alertas têm ajudado a reduzir os custos de controle e os impactos ambientais, principalmente em safras em que não são verificadas condições favoráveis ao desenvolvimento da PFC e, assim, as aplicações são dispensáveis. Durante os testes do sistema entre 2015 e 2018, uma pulverização foi estimada em aproximadamente R$ 80,00/ha. Com a redução, em média, de quatro para apenas uma aplicação por safra, a economia gerada pela adoção do sistema de previsão da PFC poderia ser de, aproximadamente, R$ 240,00 por hectare. Além da economia financeira, a adoção de medidas de manejo restritas aos períodos críticos da doença também contribui para reduzir os riscos de seleção de fungo resistente aos fungicidas comumente utilizados nos pomares, aumentando a vida útil desses produtos.
A resistência do fungo aos principais fungicidas utilizados em citros no Brasil (difenoconazol, tebuconazol, trifloxistrobina e carbendazim) tem sido monitorada. Amostras do fungo que causa a PFC coletadas nos últimos 20 anos em diversos municípios afetados pela doença no estado de São Paulo foram utilizadas para avaliação da resistência. Os testes foram realizados em laboratório com uma coleção de mais de 400 amostras do fungo. Os testes compararam a dose necessária para controlar o crescimento do fungo que já havia sido exposto aos fungicidas com a dose necessária para controle do fungo nunca exposto. Estes experimentos em laboratório tinham como objetivo verificar se houve ou não mudança na sensibilidade daquela amostra de fungo, o que poderia servir como indício do que estava ocorrendo na população do fungo nos pomares de citros paulistas. Alterações genéticas relacionadas com a resistência do fungo a esses fungicidas também foram verificadas.
Os resultados indicaram que ainda não há isolados de C. acutatum (C. abscissum) resistentes a esses quatro fungicidas nos pomares paulistas. Apesar desta ser uma ótima notícia para os citricultores do estado de São Paulo, é importante lembrar que práticas que evitem a seleção de fungos resistentes devem ser mantidas. É recomendado evitar a aplicação de produtos do mesmo grupo químico mais de duas vezes por safra, alternar fungicidas com modos de ação distintos, bem como fazer aplicações somente quando as condições forem favoráveis para a PFC (usar como base os alertas do sistema de previsão). Portanto, as aplicações devem ser realizadas somente quando o sistema de previsão emitir um alerta de risco alto, que na maioria dos municípios paulistas está associado com a ocorrência de chuvas. Adicionalmente, o sistema pode emitir alerta de risco extremo, sugerindo que os pomares estão com floradas nas fases de botões expandidos e flores abertas. Sendo assim, mesmo que essas plantas tenham sido pulverizadas há alguns dias, devem ser novamente protegidas, uma vez que as chuvas intensas (> 20mm) podem remover os produtos das flores e também favorecer a multiplicação do fungo. Portanto, as boas práticas de manejo da PFC garantem que os fungicidas permaneçam efetivos por mais tempo, que os gastos com operações agrícolas sejam reduzidos e que o impacto ambiental seja menor.
André Bueno Gama, University of Florida Geraldo José da Silva Júnior, Fundecitrus Maria Cândida de Godoy Gasparoto, Unesp - Campus Registro
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