IAC sedia debate sobre uso agrícola do lodo de esgoto

14.05.2009 | 20:59 (UTC -3)

O Workshop Uso agrícola de lodo de esgoto: avaliação após a Resolução nº 375 do CONAMA, será realizado no Instituto Agronômico (IAC), em Campinas, nos dias 19 e 20 de maio.

Quer algo mais comum no cotidiano que o esgoto? E como quase tudo que é comum, acaba passando despercebido. O tratamento do esgoto pode parecer, a um primeiro olhar, a solução definitiva. Porém, dele resulta o lodo, que sacrifica aterros sanitários e mananciais. O custo é elevado. E quem paga é a população. O débito é de caráter ambiental e financeiro. E lembre-se: custeado pelo contribuinte. Isso porque a disposição de lodo de esgoto em aterro custa em torno de 50% do custo total de uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE).

Porém, o uso agrícola do lodo beneficia a sociedade de forma geral, poupando o ambiente, reduzindo custo de produção na agricultura e aumentando a produtividade das lavouras, dizem os especialistas. A abrangência e relevância do assunto o tornam de interesse nacional. E este será o tema de Workshop: Uso agrícola de lodo de esgoto: avaliação após a Resolução nº 375 do CONAMA, a ser realizado no Instituto Agronômico (IAC), em Campinas, nos dias 19 e 20 de maio de 2009. “O principal benefício para o ambiente está na reciclagem da matéria orgânica e dos nutrientes presentes nos resíduos, dando uma nova chance para produção de alimentos. Com isso, economizam-se aterros sanitários, aumentando a vida útil desses espaços e reduzindo os gastos com adubos químicos”, resume Ronaldo Berton, pesquisador do IAC, instituto da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento.

Durante o evento, os especialistas da área vão levantar como está a aplicação do lodo após a norma de 2006 que regulamenta o procedimento. A Resolução nº 375 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) estabelece critérios e procedimentos para uso agrícola do lodo de esgoto gerado em estação de tratamento. De acordo com a norma, que aborda todas as permissões e restrições para o uso agrícola do lodo, é proibida a aplicação em pastagens e olerícolas, raízes e tubérculos, culturas inundadas, como o arroz, e outras plantas cuja parte comestível fique em contato com o solo. “O workshop vai discutir o que já foi feito e o que precisa ser realizado para melhorar a norma”, afirma o pesquisador do IAC e um dos organizadores do evento. Este será o primeiro encontro desde a criação da norma, há quase três anos.

Esse encontro vai trazer a primeira avaliação do cenário do uso agrícola do lodo no Brasil — a legislação está sendo seguida? Os resultados são adequados? As quantidades prescritas estão corretas ou devem ser ajustadas? Todas as necessidades de acertos serão expostas no workshop, que reunirá especialistas e pesquisadores do Brasil, da Austrália e dos Estados Unidos, onde o uso agrícola do lodo é feito há cerca de seis décadas, com média de 65% do lodo destinado à agricultura.

A troca de experiência com outros países é importante para contribuir para o avanço do sistema no Brasil, onde o tratamento de esgoto teve início há quase 40 anos, com tecnologias importadas. Já a destinação agrícola do resíduo do tratamento tem cerca de uma década apenas. São necessários muitos estudos no sentido de adequar a prática e garantir a segurança ambiental.

Os especialistas entendem que, por ser uma atividade nova no País, o uso agrícola do lodo de esgoto deve estar acompanhado da constante revisão de normas reguladoras e de estudos científicos que viabilizem a prática de forma sustentável para o ambiente e viável para as cadeias produtivas e os consumidores.

A disponibilidade desse resíduo depende da quantidade tratada de esgoto. De uma maneira bem simples, cada habitante gera cerca de 0,15 litros de lodo centrifugado, com 20% de sólidos por dia. Uma cidade com cerca de um milhão de habitantes, como Campinas, deverá gerar em torno de 150 toneladas/dia de lodo, quando estiver com 100% de seu esgoto sendo tratado.

Lodo de esgoto – um adubo super-nitrogenado e mais completo que o comercial

De acordo com o pesquisador Ronaldo Berton, o uso do lodo de esgoto requer análise periódica do solo, já que a composição desse resíduo é desbalanceada e pode refletir no solo. “O lodo tem muito nitrogênio e não tem quase nada de potássio e magnésio, por exemplo, e isso pode causar desequilíbrio no solo, por isso a necessidade do monitoramento”, explica o pesquisador do IAC.

A bananeira ilustra bem a necessidade da tecnologia adequada de aplicação e, consequentemente, a importância das instituições de pesquisa. Essa cultura é altamente exigente em potássio e a falta deste elemento prejudica a qualidade e a quantidade de frutos produzidos. “Deve-se tomar muito cuidado em fornecer o potássio necessário para a cultura. A relação entre esses elementos é crítica para a bananeira, pois dela dependem a resistência a certas doenças e a condições de estresse”, alerta o pesquisador do IAC que faz parte da equipe de pesquisa com lodo, Luiz Antonio Junqueira Teixeira.

Em geral, um terço do nitrogênio presente no lodo é disponível para a planta. Porém, Teixeira ressalta que a dose de lodo deve ser calculada com base na necessidade de nitrogênio da cultura, que varia em função da variedade plantada, da condição de cultivo, da produtividade esperada e da disponibilidade de nitrogênio do lodo. Ele lembra que esse índice pode variar conforme o tipo de lodo e outros fatores, como o teor de água no material. Vale ressaltar que, conforme a resolução CONAMA, a qualidade do lodo é de responsabilidade da Estação de Tratamento de Esgoto geradora. Cada ETE deve controlar também o destino do lodo disponibilizado, isto é, qual propriedade agrícola recebe determinado lote do resíduo. Essa rastreabilidade é importante para a checagem de um eventual problema.

Segundo Teixeira, a aplicação deve ser feita no sulco de plantio, tomando o cuidado de evitar o contato direto da muda com o lodo. Além de ser mais barato que o adubo comercial, o lodo contribui para reduzir a mão-de-obra na fase de adubação e os custos relacionados — economia que envolve hora de trabalho de homem e de máquina, além de combustível. Isso porque a dosagem de lodo pode ser aplicada por completo no momento do plantio, enquanto o adubo mineral é colocado no plantio e em outras duas ou três vezes depois, em cobertura.

Segundo Berton, esse ganho se dá porque o lodo libera nitrogênio para a planta mais lentamente e, por ser orgânico, o elemento não é lavado pela chuva, permanecendo em contato com a planta. “O nitrogênio orgânico do lodo precisa se decompor no solo para ser liberado para a planta. Já o nitrogênio mineral se dissolve em nitrato e amônia e se perde com a chuva”, explica Berton. Por essa característica, o lodo pode ser aplicado em uma única vez e ainda diminui os riscos de contaminação das águas subterrâneas, principalmente com o nitrato.

Pesquisa IAC confirma benefícios da tecnologia sustentável

O Instituto Agronômico pesquisa, desde 2000, os efeitos da aplicação do lodo no cultivo de pupunha, café e banana. Já na década de 80, o Instituto analisava o resíduo como fonte de nutrientes e, portanto, melhorador do solo. O resíduo serve como fonte de nitrogênio e, como mostram os estudos, sem diminuir a qualidade do fruto e sem prejuízo ambiental para o solo e as águas subterrâneas. “Quando aplicado na dose adequada, o lodo aumenta o sistema radicular e a produção da pupunheira, que fornece o palmito pupunha para salada, dispensa a adubação nitrogenada na implantação da cultura do café e aumenta a produção e diminui o ciclo vegetativo da cultura da banana”, afirma o pesquisador.

De acordo com o pesquisador Luiz Teixeira, os ganhos para a bananeira podem ser atestados com certeza e os resultados decorrem de muito trabalho de pesquisa de campo. Ele afirma que toda a necessidade de nitrogênio e fósforo da cultura pode ser perfeitamente atendida. “É possível deixar de aplicar as versões comerciais e usar o lodo”, afirma. Os resíduos orgânicos, como o lodo de esgoto, em geral melhoram as propriedades físicas do solo, como a porosidade e a capacidade de retenção de água. A matéria orgânica ainda é uma fonte de energia que estimula o desenvolvimento da microbiota do solo.

O aspecto negativo que ronda a tecnologia é a possibilidade — em caso de mal uso do resíduo — de contaminação do solo e dos mananciais com patógenos, metais pesados e compostos orgânicos persistentes (estes resultantes do cloro presente águas sanitárias, por exemplo, com potencial cancerígeno). “A presença de patógenos constitui um gargalo no uso do lodo. A resolução estabelece um baixo índice para a presença de helmintos e a higienização do lodo tem alto custo para as estações”, explica Ronaldo Berton, pesquisador do IAC. Esses limites, baseados em legislação americana, também serão debatidos no workshop.

Uma solução que vem sendo adotada nesse caso é a compostagem formada pelo lodo somado com serragem, que é fonte de carbono. Esse procedimento reduz sensivelmente a quantidade de patógenos presentes no solo, segundo Berton.

Uso agrícola do lodo: Prática de conservação e recuperação dos solos, ganhos econômicos e ambientais

Segundo o pesquisador do IAC Ronaldo Berton, há duas posturas possíveis no caso do uso agrícola do lodo de esgoto: a primeira, trata do risco zero, ou seja, decidem-se por não usar o lodo e dar a ele outro destino, em geral os aterros sanitários. A segunda postura envolve a adoção da avaliação de risco. Isto é, adota-se a utilização do lodo na agricultura com o controle de riscos.

Ao elaborar, em 2006, a normatização do uso agrícola do lodo, o Brasil optou pela avaliação de risco. A Resolução do CONAMA minimiza o risco aos menores índices ao controlar a aplicação do lodo com restrição de culturas receptoras e de quantidades a serem aplicadas. “A decisão pelo risco controlado se deve ao fato de o uso agrícola trazer mais benefícios ambientais e sociais que desvantagens, desde que feito de forma adequada”, diz Berton, um dos palestrantes do workshop.

SERVIÇO

Workshop: Uso agrícola de lodo de esgoto: avaliação após a Resolução nº 375 do CONAMA

Data: 19 e 20 de maio de 2009.

Local: IAC, avenida Barão de Itapura, 1481, Guanabara, Campinas, SP.

Programação completa no

Carla Gomes

IAC

19 3231-5422, r. 124 /

Compartilhar

Newsletter Cultivar

Receba por e-mail as últimas notícias sobre agricultura

LS Tractor Fevereiro