O frio e a baixa umidade têm favorecido a sanidade das lavouras de trigo no Rio Grande do Sul. A cultura deverá contar com chuvas irregulares durante toda a primavera. O frio intenso, principalmente no final do mês de julho, com temperaturas negativas e abaixo da média histórica em grande parte do Rio Grande do Sul, retardou o desenvolvimento das plantas, evitando maiores danos por geadas na cultura do trigo, que ainda estava na fase de desenvolvimento vegetativo em 90% das lavouras gaúchas. “O risco maior é a incidência de geadas no florescimento e espigamento, quando afeta o potencial produtivo da cultura”, explica o analista de meteorologia da Embrapa Trigo, Aldemir Pasinato.
Outro motivo de queixa do produtor – a falta de chuva nos meses de inverno – também foi amenizado com as precipitações no final do mês de agosto, com médias superando os 50 mm nas principais regiões tritícolas do Estado. “As chuvas recentes permitiram realizar as operações de adubação em cobertura nas lavouras e o resultado é visível no campo, com plantas mais fortes que já estão apresentando uma cor verde intensa nas folhas, bom perfilhamento e alto potencial produtivo”, conta Adriano Boeira, da equipe de sementes da Embrapa Trigo.
Ele destaca que, apesar da estiagem que afetou o trigo na safra passada, a qualidade das sementes não ficou comprometida: “Os lotes de sementes, com boa capacidade de germinação e excelente sanidade, garantiram a uniformidade das lavouras implantadas neste ano”. Mesmo com PMS (Peso de Mil Sementes) menor, a qualidade das sementes permitiu fazer economia, ajustando a densidade da lavoura em plantas por metro linear ao invés de quilos por hectare.
“Quem seguiu as recomendações da pesquisa, adquirindo sementes de qualidade e fazendo o tratamento dos lotes, associado ao manejo rentável com menor volume de sementes e uso racional de defensivos, certamente terá mais um ano de lucro com o trigo. Agora é torcer pelo clima favorável”, conclui Boeira. A avaliação positiva na produção de sementes considerou as áreas de multiplicação de sementes da Embrapa Trigo, no norte do RS, em Passo Fundo, Coxilha, Pejuçara, Panambi, Cruz Alta, Carazinho e Almirante Tamandaré do Sul, com visitas na primeira quinzena de agosto.
Os impactos da falta de chuva em trigo na região noroeste do RS são maiores. A equipe de transferência de tecnologia da Embrapa Trigo visitou produtores e experimentos de trigo de 23 a 27 de agosto, nos municípios de Santo Ângelo, Giruá, São Luiz Gonzaga, São Miguel das Missões, Rolador e Roque Gonzales. Segundo o engenheiro agrônomo Marcelo Klein, o longo período sem chuvas na região impossibilitou a adubação de cobertura ou prejudicou a absorção dos fertilizantes.
“Vimos espigas já formadas, com 4 a 5 espiguetas, quando o normal seriam 9 a 10. Um dano que dificilmente poderá ser revertido daqui pra frente, mesmo com a volta das chuvas”, informa Klein, mas faz uma ressalva: “O que pode acontecer é a planta compensar o menor número de grãos com um maior enchimento dos grãos ou mesmo resultando num trigo de melhor qualidade”, avalia Klein, reforçando que, apesar das perdas pontuais, está se desenhando uma excelente safra de trigo no RS. “Nós nunca chegamos à fase reprodutiva do trigo com uma condição de sanidade tão boa na lavoura”, conclui.
Pragas e Doenças
O tempo seco e o frio ajudaram na sanidade das lavouras, com a ausência de pragas e doenças no trigo. Muitas lavouras seguem sem nenhuma aplicação de fungicida ou inseticida, apenas com os defensivos utilizados no tratamento de sementes. Contudo, nos últimos dias, a Embrapa Trigo tem recebido registros de folhas com sintomas de ferrugem linear do trigo em lavouras do PR, SC e RS. Apesar de, até hoje, não ter sido registrada nenhuma epidemia da doença no Brasil, a pesquisa já tinha alertado para o aumento da ocorrência da ferrugem linear do trigo em 2020 (veja nota técnica).
Para Cheila Sbalcheiro, fitopatologista da Embrapa Trigo, neste ano a doença pode ter sido favorecida pelas baixas temperaturas e o orvalho que se formou durante a noite e persistiu por várias horas do dia. O vento ajudou a disseminar os esporos do fungo com longo alcance, chegando a novas lavouras. “O momento é de atenção no acompanhamento da lavoura, observando os primeiros sinais de doenças fúngicas”, orienta Cheila, lembrando que a assistência técnica está preparada para fazer o diagnóstico e indicar o melhor controle.
Clima favorável
Mais uma vez o tempo seco fez parte do inverno gaúcho. Na estação meteorológica de Passo Fundo a média histórica de precipitações para o mês de agosto é de 187 mm, mas até 23/08 choveu apenas 30 mm.
“Esta redução no volume de chuvas se repetiu na maioria do Estado. A irregularidade na quantidade e na distribuição das chuvas deverá continuar durante a primavera, quando as previsões indicam regime de chuvas dentro da normal ou pouco abaixo da média histórica”, explica o analista Aldemir Pasinato. Após a chuva no final de agosto, com precipitações entre 50 e 60 mm no norte e noroeste do RS, a volta da chuva está prevista para meados de setembro: “Se o volume não for em excesso, essa distribuição vai favorecer o enchimento de grãos”, avalia Pasinato lembrando que o risco maior é justamente chuva no espigamento do trigo, que aumenta os riscos com giberela, e na pré-colheita, quando a chuva pode levar à germinação na espiga. “Até o momento, a tendência é de redução gradativa no volume de chuvas, com primavera mais seca, o que ajuda os cultivos de inverno mas pode afetar as lavouras de verão”, conclui ele.
Preços em elevação
O anúncio do Conselho Internacional de Grãos sobre a menor oferta de trigo no mercado colocou os preços do cereal em elevação novamente. Apesar de um recorde mundial em volume, frustrações climáticas afetaram grandes países produtores, como Rússia, Estados Unidos e Canadá. Além do aumento no consumo humano de trigo, também aumentou o consumo de carnes, que focam no trigo para compor a formulação de rações. As cotações do trigo no mercado internacional tiveram elevação de 10,8% entre julho e agosto de 2021.
No Brasil, as geadas que afetaram o milho em muitas regiões acabaram valorizando ainda mais o trigo e outros cereais de inverno para abastecer a indústria de proteína animal. A saca de 60 kg que estava cotada a, aproximadamente, R$ 50,00 em julho de 2020, chegou a R$ 80,00 em julho de 2021, e muitas cooperativas já fecharam contratos a R$ 85,00/sc.
De acordo com o engenheiro agrônomo Marcelo Klein, a relação de troca na lavoura está mais favorável neste ano: “Segundo análises da Coopatrigo, no ano passado o produtor precisava colher 47 sacas de trigo para pagar os custos da lavoura. Hoje, com os preços atuais, precisa colher 32 sacas. Sem dúvida uma perspectiva de margem de lucro maior”.
A Conab estima que o rendimento das lavouras de trigo no Brasil deverá ser 19,7% superior nesta safra, com produtividade média próxima a 53 sacas por hectare.