Manejo integrado contra doenças da parte aérea do algodoeiro
Principais doenças da parte aérea do algodoeiro, a mancha-de-ramulária e a mancha-alvo norteiam a tomada de decisão de parte importante do manejo das lavouras
A disseminação de vírus de plantas na natureza pode ocorrer de diferentes formas. O próprio homem se constitui no maior “vetor” destes patógenos pela facilidade de levá-los a grandes distâncias, seja para diferentes países ou continentes. Porém, na natureza, estes micro-organismos são transmitidos principalmente por outros organismos vetores, que podem ser: fungos (por exemplo Polymyxia graminis), nematoides (Xiphinema spp.) e artrópodos (Brevipalpus phoenicis). Dentro desta última classe destacam-se os insetos sugadores - afídeos, tripes, cigarrinhas e moscas-brancas - e os mastigadores, com ênfase para os coleópteros.
Os insetos atravessaram um longo período de evolução e adaptação frente às suas plantas hospedeiras. Sendo assim, não é surpreendente que alguns grupos tenham desenvolvido diferentes modelos de associação com suas correspondentes hospedeiras, utilizando estratégias distintas, sejam essas na sua biologia ou na sua alimentação. Um exemplo básico são os afídeos e as cigarrinhas que pertencem à mesma família, mas possuem alvos diferentes para obter alimento. Enquanto os pulgões priorizam os tecidos floemáticos, as cigarrinhas preferem se alimentar no xilema, ou seja, possuem métodos de exploração diferentes, assim como uma nutrição diversa, locais de alimentação etc. Por outro lado, é preciso lembrar alguns princípios que envolvem as doenças de etiologia viral. O primeiro é que o vírus ou as partículas de vírus são parasitas intracelulares obrigatórios, então, necessitam de uma célula viva para poder realizar sua replicação utilizando a “maquinaria celular” da planta e desta maneira dar início à infecção. Talvez este fato explique o porquê de a grande maioria dos insetos vetores pertencer ao grupo dos sugadores (Hemiptera: Homoptera), pois o mais importante aspecto é que neste processo a célula vegetal envolvida não é danificada (a introdução do estilete é intercelular), diferente de como ocorre com os vírus transmitidos por besouros, já que este grupo é mastigador, e destrói o tecido foliar. Dentro da ordem Homoptera, o modo de penetração do estilete pode ser dividido em dilacerador (cigarrinhas) e portadores de bainha estiletar (afídeos, moscas-branca), representando cerca de 60% do total de vírus transmitidos por insetos (Figura 1).
Outro princípio é que não existem tratamentos curativos para os fitovírus. Sendo assim, os métodos de controle utilizados somente podem ser preventivos. Portanto, o conhecimento de biologia, comportamento, taxonomia e outras informações relacionadas ao vetor são de suma importância, pois auxiliam diretamente no combate às doenças causadas por vírus, visto que a principal metodologia utilizada atualmente consiste no controle dos insetos vetores e, desta forma, permite minimizar o risco de infecções e redução das perdas nas diferentes culturas atacadas.
Os fitovírus transmitidos por coleópteros possuem algumas características particulares: são constituídos de RNA de fita simples, possuem partículas isométricas que variam de 25nm a 30nm de diâmetro, se transmitem facilmente por inoculação mecânica (ou mecanicamente), são bastante estáveis e atingem elevadas concentrações nos tecidos infectados; além disto, este grupo de vírus têm um círculo de plantas hospedeiras relativamente restrito – se limitam a algumas famílias botânicas - e possuem um número limitado de espécies de coleópteros vetores. Quanto à transmissão, pode-se dizer que, na grande maioria dos casos, é do tipo semipersistente, pois o vírus pode ser transmitido (PAI) por até alguns dias após a aquisição (PAA), depende do tempo de alimentação, sendo diretamente proporcional ao tempo em alimentação. O vírus pode ser transmitido após a primeira mordida em uma planta infectada. Apesar de parecer um processo estritamente mecânico e simples, se trata de um dos mais complexos, que vem sendo desvendado a anos. Trata-se de uma relação distinta e altamente específica que envolve a interação entre vírus e besouros vetores, a estabilidade dos nucleocapsídeos virais e a translocação na planta hospedeira. Há uma diferença entre os sugadores e os besouros. Os últimos não possuem glândulas salivares e no processo de alimentação regurgitam o tecido mastigado associado a uma enzima (ribonuclease - RNAse) que possui um caráter seletivo e auxilia na transmissão dos vírus, inclusive nas células.
As partículas virais são facilmente detectadas nas fezes, hemolinfa (Figura 2) e no regurgitado dos insetos, comprovando que estes fluidos têm papel importante na transmissão destes vírus e conseguem se deslocar pelo aparelho digestivo e algumas vezes alcançar a hemolinfa.
Até o momento foram descritas 61 espécies de besouros transmitindo 42 espécies de vírus e que se classificam em seis gêneros: Bromovirus, Carmovirus, Comovirus, Machlomovirus, Sobemovirus e Tymovirus.
O primeiro relato que descreveu um fitovírus sendo transmitido por um besouro ocorreu em 1924 e envolvia a espécie Epilachna varivestis ou “besouro mexicano do feijão”, um coccinelídeo (joaninha) transmitindo um vírus da família Comoviridae, o Cowpea mosaic virus - CpMV (vírus do mosaico do caupi), ambos presentes no Brasil. No Brasil já foram descritas aproximadamente 200 famílias da ordem Coleoptera, onde existe um grande número de insetos fitófagos e que são considerados pragas agrícolas. Porém, apenas quatro famílias têm representantes que transmitem vírus de plantas: Chrysomelidae, Coccinelidae, Curculionidae e Meloidae.
O maior número de espécies entre as quatro famílias se encontra nos crisomelídeos, que se dividem em duas subfamílias: Galerucinae (vaquinhas) e Halticinae (pulgas), onde se destacam os gêneros: Acalyma, Colaspis, Ootheca, Phaedon, Cerotoma, Diabrotica e Epitrix, sendo estes três últimos os mais comuns no Brasil. No Brasil, a principal espécie envolvida na transmissão de diversos vírus é Diabrotica speciosa (patriota, brasileirinho ou larva-alfinete quando na sua fase larval) associados à transmissão de vírus em culturas como tomate, batata, soja, feijão, caupi, milho etc. Outra espécie importante neste grupo é Cerotoma arcuata (“vaquinha-preta-e-amarela-da-soja”) e merece destaque como vetora dos vírus transmitidos por coleópteros, pois adultos desta espécie estão associados à disseminação da maioria dos fitovírus que assolam a cultura do feijoeiro, alguns de soja e de feijão-caupi (Vigna unguiculata). Destaca-se a importância porque alguns destes vírus também podem ser transmitidos pelas larvas.
A famíla Coccinelidae caracteriza-se por ser predadora, apresentando apenas o gênero Epilachna com representantes fitófagos. Já se mostrou que pelo menos a espécie E. varivestis é vetora de diversos vírus. No Brasil, as espécies que merecem destaque como fitófagas são: E. cacica, E. marginella, E. paenulata e E. clandestina (Dutra et al, 1997), pragas de diversas espécies da família Cucurbitaceae. Já a família Curculionidae (bicudos) tem como representantes principais os gêneros: Apion, Chalcodermus, Cionus e Sitona. No Brasil, entretanto, apenas Chalcodermus bimaculatus (“manhoso”) foi descrito como vetor experimental do mosaico do caupi (Cowpea mosaic virus – CpMV), com resultados positivos.
Na família Meloidae, a única espécie descrita como vetora, até 1990, era Epicauta vittata, para o vírus do mosqueado da vagem do feijoeiro (Bean pod mottle vírus - BPMV). No entanto, em pesquisas desenvolvidas no Laboratório de Estudo de Vetores do Instituto Biológico, São Paulo (LEV/IB), observou-se que, pelo menos experi-mentalmente, a espécie E. atomaria (“vaquinha ou burrinho-das-solanáceas”) transmite quatro isolados do vírus do mosaico da berinjela (“eggplant mosaic virus” – EMV) (Figura 3).
Outro aspecto relevante refere-se à importância das plantas hospedeiras envolvidas no processo de transmissão. As espécies de leguminosas, por exemplo, bem como variedades de uma mesma espécie, podem afetar de forma significativa a eficiência na transmissão de vírus por coleópteros. Isto ocorre porque a infecção viral induz inúmeras alterações bioquímicas na planta, inclusive no seu metabolismo secundário, favorecendo não só a atratividade e a palatabilidade, como também causando alterações de cor, levando a uma maior preferência do coleóptero pela espécie ou cultivar.
Apesar de se tratar de um assunto interessante, poucos são os grupos no mundo que se dedicam a estudos envolvendo estes insetos como vetores, deixando uma lacuna para estudos mais elaborados. Principalmente quando se compara a outros grupos de insetos vetores, como os vírus transmitidos por-mosca branca ou tripes. No entanto, é preciso destacar a importância econômica de algumas espécies de coleópteros, que além de provocarem danos diretos, podem vir a causar danos indiretos apenas ocorrendo a combinação exata entre: vírus de planta x besouro vetor x planta hospedeira, uma roleta-russa.
Fernando J. Sanhueza Salas, Samantha Zanotta, Thiago Navarro, Instituto Biológico-CPSV-LEV
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