Decisão judicial provisória condiciona Ferrogrão a protocolos indígenas

Juiz federal de Itaituba determinou que reuniões, audiências e outros devem seguir protocolos de consulta editados pelas próprias comunidades indígenas, em especial a etnia Munduruku

22.08.2022 | 12:05 (UTC -3)
Ministério Público Federal no Pará

A Justiça Federal determinou que os responsáveis pela proposta de construção da ferrovia Ferrogrão, entre Sinop (MT) e Itaituba (PA), não façam consultas aos povos indígenas que não sigam os protocolos editados pelas comunidades.

A decisão, que acolheu pedidos do Ministério Público Federal (MPF), registra que a realização das consultas é uma condição prévia e obrigatória para o prosseguimento das discussões sobre a viabilidade socioambiental do empreendimento.

Na ação o MPF tinha relatado uma série de violações ao direito dos indígenas à consulta e consentimento livre, prévio e informado, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

As rés no processo são a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), a União – por meio da Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (SE-SPPI) – e o consórcio de empresas Estação de Luz Participações.

Violações

O juiz federal Marcelo Garcia Vieira ressalta, na decisão, a ocorrência de quatro violações específicas:

• a inexistência de consulta às comunidades que a ANTT confessou que serão impactadas;

• o fato de o governo federal ter considerado liderança indígena uma pessoa que confessadamente não tinha autoridade ou representatividade para responder em nome dos indígenas;

• a realização de reunião sem qualquer consideração da cultura indígena, em local fora dos territórios indígenas e sem a mediação de tradutores culturais;

• o suposto cumprimento da Convenção 169 de acordo com a interpretação autônoma da União, em contrariedade à jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Prova

A maior prova do descumprimento das regras da Convenção 169 é seu cumprimento de acordo com a interpretação autônoma pela União, em contrariedade à jurisprudência da CIDH, destaca o juiz federal Marcelo Garcia Vieira.

Segundo a decisão, os documentos apresentados pela União e pela ANTT no processo “indicam apenas protocolos de intenções e contorcionismos narrativos para tentar iludir os incautos da total e completa violação da Convenção OIT nº 169, como se o projeto de traçado da Ferrogrão não devesse ser submetido a consulta e consentimento dos povos indígenas afetados ou somente devesse ser realizado posteriormente aos efeitos decisórios de soberania nacional ou interesse econômicos, em tudo violador da referida convenção internacional”.

Consulta desde a concepção

Em relação a alegações das rés de que a Justiça não poderia ter acolhido os pedidos urgentes do MPF, o juiz federal frisou que é justamente desde a fase de concepção de projeto e nos estudos de viabilidade que devem ser cumpridos os direitos fundamentais indígenas.

O cumprimento das obrigações primárias derivadas da Convenção 169 da OIT no início do procedimento evita maiores danos aos cofres públicos – em caso de espera da instrução processual –, tendo em vista que as obras e a fase da implantação já estarão muito mais adiantadas e o retrocesso ou paralisação tardia seriam muito mais custosos para o erário, aponta a decisão judicial.

A íntegra da decisão pode ser lida no link abaixo:

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