Pesquisa para os próximos levantamentos de grãos e café ocorre em MG
Os dados de produção, produtividade, área plantada e principais condições das culturas de grãos e de café serão coletados a partir da próxima semana
O gênero Passiflora possui aproximadamente 500 espécies descritas, sendo que cerca de 120 são endêmicas do Brasil. Das espécies brasileiras de Passiflora, exploradas comercialmente, o maracujá-azedo e o maracujá-doce são as mais importantes. Porém, devido à sua utilização, tanto para o consumo in natura como para a indústria de suco concentrado, o maracujá-azedo é o mais produzido com uma área cultivada de 62 mil hectares e produção média anual de 920 mil toneladas. Este fato confere ao Brasil o posto de maior produtor mundial, sendo as regiões Nordeste, Sudeste e Norte as mais importantes e responsáveis por 94% da produção nacional. A maior parte do maracujá produzido no Brasil atende à demanda da indústria para a produção de suco concentrado, que abastece tanto o mercado consumidor interno quanto aquele direcionado à exportação.
Em decorrência da produção intensiva, iniciada no estado de São Paulo na década de 1960, os cultivos de maracujá-azedo passaram a ser acometidos por diversas doenças induzidas por fungos, bactérias, fitoplasmas, nematoides e, principalmente, por vírus. Até o momento, no Brasil, as seguintes espécies definitivas de vírus, aceitas pelo International Committee on Taxonomyof Viruses (ICTV), já foram relatadas infectando maracujazeiros: Cucumber mosaic virus (CMV, Cucumovirus), Passionfruit vein clearing virus (PVCV, Potyvirus), Passion fruit yellow mosaic vírus (PFYMV, Tymovirus) e Cowpea aphid-borne mosaic vírus (CABMV, Potyvirus). Porém, outras espécies de vírus, ainda não aceitas como definitivas pelo ICTV, foram descritas originalmente e exclusivamente em maracujazeiros no Brasil: Purple granadilla mosaic vírus (PGMV, espécie com taxonomia não determinada), Passion fruit green spot vírus (PFGSV, Cytorhabdovirus), Passion flower little leaf mosaic virus (PLLMV, Begomovirus), Passion fruit severe leaf distortion virus (PSLDV Begomovirus) e, mais recentemente, o Passion fruit chlorotic mottle virus (PCMoV, Begomovirus).
No Brasil, o CABMV é responsável por causar o endurecimento dos frutos do maracujazeiro (EFM), uma das doenças mais importantes do maracujá. O CABMV é uma espécie de vírus pertencente ao gênero Potyvirus, família Potyviridae. Sua primeira ocorrência foi registrada no ano de 1978 em pomares comerciais de maracujá-doce, no município de Feira de Santana (BA). Rapidamente esta virose se disseminou para pomares de todas as regiões produtoras brasileiras, sendo os primeiros registros de quebra de produção relatados no estado de São Paulo, na década de 1990, causando perdas de até 80% na produção de maracujá-azedo nas regiões do Vale do Ribeira e Alta Sorocabana. Desde então, em trabalhos científicos realizados, observou-se que, pelo menos, 16 espécies de maracujazeiros selvagens (ou espécies que têm potencial para a exploração comercial como frutífera ou ornamental) são suscetíveis ao CABMV. Atualmente, o CABMV tem sido responsável por epidemias frequentes, ocorrendo em todos os pomares comerciais de maracujá-azedo nos estados da Bahia, de Pernambuco, Ceará, Sergipe, São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito Federal e Santa Catarina.
Na região Nordeste, além de infectar o maracujazeiro-azedo, o CABMV também é um dos principais patógenos do feijão-caupi (Vigna unguiculata), Fabaceae (ou Leguminosae), importante por ser uma das espécies que constituem a base da alimentação do povo nordestino. Outras leguminosas cultivadas como o amendoim (A. hypogaea), a soja (Glycine max) e várias cultivares de feijão (Phaseolus vulgaris) também já foram relatadas como suscetíveis a este vírus. Em experimentos realizados no Laboratório de Fitovirologia e Fisiopatologia do Instituto Biológico, demonstrou-se que os isolados de CABMV, provenientes de amostras de maracujazeiro-azedo coletadas no estado de São Paulo, também são capazes de infectar leguminosas alimentícias como a ervilha (Pisum sativum) e o tremoço (Lupinus albus). Os pesquisadores constataram também que as espécies utilizadas na produção de biomassa verde e fixação de nitrogênio no solo (adubação verde) como crotalária (Crotalaria juncea, C. incana e C. spectabilis), feijão-mucuna (Mucuna aterrina e M. cinerea), feijão-de-porco (Canavalia ensiformes), feijão-guandu (Cajunus cajan) esiratro (Macroptilium atropurpureum), bem como aquelas empregadas na formação de pastagens consorciadas como a soja-perene (Neonotonia wightii), comportaram-se como suscetíveis ao vírus. Além disso, o fedegoso (Senna occidentalis), uma leguminosa arbustiva perene, nativa da América do Sul, também foi suscetível, revelando-se como um potencial reservatório do CABMV. Todas as espécies ou variedades comerciais de maracujazeiro, quando infectadas por esse vírus, desenvolvem sintomas foliares de mosaico, bolhas e deformações. Os frutos não se desenvolvem e são frequentemente deformados, apresentando o pericarpo endurecido e espesso. A deformação e a má formação dos frutos, aliadas ao encurtamento do período de produção e à diminuição do conteúdo de polpa, reduzem significativamente a produção com consequente perda do valor comercial.
Inicialmente, o cultivo do maracujá era semiperene, com substituição dos pomares a cada três a quatro anos. Após a disseminação e diante da severidade e dos prejuízos causados pelo CABMV, nas áreas destinadas à produção intensiva, os produtores passaram a adotar como manejo a renovação anual dos pomares. Outro fator importante que impulsionou a renovação dos pomares anualmente foi a dificuldade de obtenção de variedades resistentes a essa virose. Associada à renovação anual dos pomares, tem-se preconizado como prática cultural, para minimizar as perdas ocasionadas pelo CABMV, a introdução de mudas de maracujazeiro-azedo com estágios de desenvolvimento mais avançados, ou seja, com pelo menos 0,8m, e chegando a 1,5m de altura. Essas mudas devem ser mantidas, desde a semeadura, em telados antiafídeos para então serem levadas ao campo.
O CABMV não é transmitido por sementes de maracujá, no entanto, sua dispersão no campo é realizada eficientemente por diversas espécies de afídeos (pulgões). Entretanto, os afídeos não colonizam o maracujazeiro. Este fato, muitas vezes, causa dúvida e estranheza entre os produtores, que afirmam não constatar a presença desses insetos em seus pomares. Embora não colonize o maracujazeiro, a maioria das espécies de afídeos coloniza uma infinidade de plantas daninhas e cultivadas, incluindo outras espécies frutíferas, o que favorece a manutenção das populações e constantes revoadas desses insetos no campo durante todo o ciclo de desenvolvimento, ou seja, desde a introdução, o desenvolvimento até a produção do pomar. A transmissão do CABMV, assim como dos demais potyvírus, ocorre de modo não persistente (não circulativo), ou seja, o vírus é adquirido pelo afídeo em poucos segundos e, após a aquisição, já pode ser imediatamente transmitido, sendo que a inoculação do vírus também ocorre em poucos segundos. Esse tipo de transmissão, realizado durante as picadas de prova, ocorre nas células da epiderme e mesófilo das folhas. Os afídeos se caracterizam por serem insetos sugadores de seiva do floema das suas plantas hospedeiras, onde se estabelecem formando grandes colônias. Porém, as picadas de prova (nas células do mesófilo) servem para o reconhecimento de suas hospedeiras. O aparelho bucal desses insetos é constituído de um estilete, que permite que o afídeo perfure e faça a sucção do conteúdo da célula. Quando reconhece a hospedeira, o afídeo continua alongando o estilete nos espaços entre as células até atingir os vasos do floema, onde permanecerá se alimentando de seiva. Após as picadas de prova, se o afídeo não reconhecer a planta como hospedeira, recolherá seu estilete e alçará voo na busca por uma nova hospedeira.
Ao realizarem as picadas de prova em uma planta de maracujá infectada, geralmente em pomares em final de ciclo ou já abandonados, os afídeos adquirem rapidamente as partículas do CABMV que ficarão retidas na ponta dos estiletes durante minutos ou poucas horas. Como os afídeos não colonizam maracujazeiros, após as picadas de prova em uma planta infectada realizarão voos de reconhecimento em busca de uma nova hospedeira. Nas regiões de cultivo intensivo, há grande probabilidade de que ocorram pousos sucessivos em outras plantas de maracujá-azedo (sadias ou infectadas) e, sendo assim, nos processos subseqüentes de alimentação ocorrerá a inoculação do vírus e, consequentemente, a dispersão do EFM no pomar. Em estudos de epidemiologia realizados em diferentes regiões do estado de São Paulo, constatou-se que a dispersão do EFM pode ser muito rápida, principalmente em áreas tradicionais de plantio de maracujá. No Vale do Ribeira, por exemplo, em aproximadamente seis meses, um pomar de maracujá poderá estar com 100% das suas plantas infectadas pelo CABMV.
Como os afídeos comportam-se como visitantes dos pomares de maracujá-azedo, o controle destes insetos com a aplicação de agroquímicos não é uma prática recomendada para conter a dispersão do CABMV, pois a transmissão será realizada durante as picadas de provas antes que o inseticida surta efeito. Vale ressaltar que a dispersão da virose, além do papel importante dos afídeos vetores, também pode ser potencializada por meio da utilização de ferramentas de corte contaminadas durante as práticas culturais, tais como enxertia e poda.
Estudos epidemiológicos, também realizados por pesquisadores do Laboratório de Fitovirologia e Fisiopatologia do Instituto Biológico, para monitorar as populações de afídeos em pomares de maracujá situados nas regiões Leste paulista e Vale do Ribeira, São Paulo, permitiram constatar a ocorrência de intensas revoadas de afídeos durante todo o ciclo de produção do maracujá-azedo. Armadilhas amarelas adesivas e armadilhas amarelas de água (Moericke) foram utilizadas durante todo o ciclo produtivo do maracujá-azedo, com o objetivo de se coletar e identificar as principais espécies de afídeos envolvidas na transmissão. As maiores revoadas foram registradas durante o período de inverno quando, normalmente, as temperaturas são mais amenas e os índices pluviométricos são menores. Dezesseis espécies de afídeos foram classificadas como visitantes dos pomares monitorados: Aphis fabae, Aphis craccivora, Aphis gossypii, Aphis nasturtii, Aphis nerii, Aphis spiraecola, Aulacorthum solani, Brevicoryne brassicae, Hyperomyzus lactucae, Macrosiphum euphorbiae, Myzus persicae, Pemphigus spp., Pentalonia nigronervosa, Toxoptera aurantii, Toxoptera citricidus, Uroleucon ambrosiae. As espécies do gênero Aphis foram as mais constantes (sempre presentes) e abundantes (com os números mais elevados de indivíduos), principalmente A. fabae e A. gossypii. Testes experimentais de transmissão evidenciaram que A. fabae foi capaz de transmitir o CABMV com uma eficiência de até 40%, o que indicou que esta espécie de afídeo está fortemente relacionada com a dispersão do vírus no campo. Quando se comparou o comportamento de mudas mais desenvolvidas (1,5m) com mudas de até 30cm de altura, frente à pressão do CABMV, foi verificado que independentemente do tamanho da muda, a entrada do vírus no pomar ocorreu simultaneamente. Porém, nas mudas desenvolvidas, houve um retardo no surgimento dos sintomas, permitindo a produção de frutos com valor comercial por até dois anos.
Devido à expansão do cultivo de maracujá-azedo nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste do Brasil e diante da diversidade edafoclimática dessas regiões, que interfere diretamente na população de afídeos, torna-se difícil a preconização de um manejo único para a cultura do maracujá. Entretanto, o conhecimento do comportamento das revoadas das populações de afídeos é importante para adotar estratégias de manejo e controle do EFM. Este princípio é válido principalmente para a adoção de estratégias de controle de vírus em culturas onde não há a oferta de variedades com genes de resistência específicos, como é o caso da interação CABMV-maracujazeiro.
Apesar das dificuldades de produção, e enquanto a obtenção de variedades comerciais resistentes ainda não é uma realidade, algumas medidas fitossanitárias e de manejo cultural para o cultivo de maracujá são indispensáveis, independentemente da região (Tabela 1). Por fim, os trabalhos incessantes dos pesquisadores dos institutos de pesquisa e universidades têm garantido ao Brasil o posto de maior produtor de maracujá-azedo, apreciado no mundo inteiro.
As plantas cultivadas têm sua origem a partir de espécies ancestrais selvagens provenientes dos denominados “centros de diversidade” ou “centros de origem”. Estes centros correspondem a áreas delimitadas geograficamente, que são de grande utilidade para programas de melhoramento genético que buscam resgatar genes de interesse, presentes nas espécies selvagens, como aqueles que conferem resistência a fatores abióticos e bióticos. Quase que exclusivamente, os genes que conferem algum nível de resistência a fatores bióticos, como pragas e doenças, são resgatados nos respectivos centros de origem. Do centro de origem de plantas denominado “Brasil-Paraguai” originaram-se inúmeras espécies de importância agrícola como o amendoim (Arachis hypogaea), o chá-mate (Ilex paraguayensis), a mandioca (Manihot esculenta) e a seringueira (Hevea brasiliensis), além de uma grande diversidade de espécies frutíferas com potencial para exploração comercial, tais como maracujazeiro-azedo (Passiflora edulis) e maracujazeiro-doce (P. alata), goiabeira (Psidium guajava), pitangueira (Eugenia uniflora), uvaieira (E. uvalha), grumixameira (E. dombeyi), cabeludinha (E. tomentosa), jabuticabeira (Myriaria jaboticaba), abacaxizeiro (Ananas comosus), cacaueiro (Theobroma cacao), castanheira-do-Brasil (Bertholletia excelsa) e cajueiro (Anacardium occidentale). O maracujazeiro-azedo, das espécies nativas brasileiras, é o mais explorado comercialmente, sendo somente superado pelo cultivo de espécies introduzidas como a laranja, a banana, a uva, o mamão, a maçã e a manga, que tem seu centro de origem em outras regiões do mundo.
Alexandre Levi Rodrigues Chaves, Marcelo Eiras, Leilane Karam Rodrigues e Addolorata Colariccio, Instituto Biológico
A cada nova edição, a Cultivar Hortaliças e Frutas divulga uma série de conteúdos técnicos produzidos por pesquisadores renomados de todo o Brasil, que abordam as principais dificuldades e desafios encontrados no campo pelos produtores rurais. Através de pesquisas focadas no controle das principais pragas e doenças do cultivo de hortaliças e frutas, a Revista auxilia o agricultor na busca por soluções de manejo que incrementem sua rentabilidade.
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