Pesquisadores identificam fungos que estimulam o crescimento de tomate
Empregado como bioinseticida em lavouras de cana, Metarhizium ainda pode ajudar na imunidade e crescimento do tomateiro
Pesquisadores da Embrapa Agroenergia (DF) e da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF) pretendem disponibilizar em breve um ativo natural para controlar fitonematoides. Para isso, estão utilizando coprodutos e resíduos de cadeias agroindustriais como matéria-prima para obtenção do novo insumo. Atualmente, essa praga agrícola do solo é controlada com práticas de manejo e compostos sintéticos, que têm perdido eficácia ao longo dos anos, além de poder causar impactos ambientais e à saúde humana.
Realizada em parceria com o Grupo Santa Clara, a Demetra Agroscience e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o projeto Nematus conta com o apoio da Empresa Brasileira de Inovação Industrial (Embrapii) e investiga extratos e compostos bioativos de fungos e plantas para aplicação no controle de fitonematoides, ou seja, busca por fontes naturais e renováveis para a obtenção de nematicidas.
“Buscamos por princípios ativos mais específicos para esses organismos, de modo a não comprometer o rico ecossistema do solo, uma vez que o uso de nematicidas sintéticos de largo espectro de atuação influenciam de maneira negativa toda a rizosfera/ecossistema envolvido, acarretando riscos à saúde humana, animal e ao ambiente”, declara o líder do projeto, Clenilson Martins Rodrigues, pesquisador da Embrapa Agroenergia. Além de matar as pragas, alguns agroquímicos sintéticos podem causar danos, por exemplo, a pássaros, abelhas e até mesmo aos agricultores que fazem a aplicação.
Fitonematoides são vermes presentes nos solos que, para sobreviverem e se reproduzirem, atacam as raízes das plantas para obterem reserva nutricional. Um dos fitonematoides mais comuns no Brasil é o Meloidogyne incognita, também conhecido como “Nematoide-das-galhas”.
A praga é um parasita capaz de provocar alterações na raiz da planta, prejudicando significativamente o seu desenvolvimento. O ataque causa a chamada “galha dos nematoides”, uma célula gigante onde o parasita faz a postura dos ovos, o que compromete o crescimento dos cultivos e é frequentemente fatal às plantas. No Brasil, esse fitopatógeno ataca principalmente as culturas da soja, algodão, café, feijão, milho e cana-de-açúcar.
“Esse fitonematoide foi escolhido para ser o alvo principal da pesquisa por ser uma das espécies mais comuns em todo o mundo e um problema sério para a agricultura brasileira,” esclarece Rodrigues.
O diferencial dos ativos tecnológicos que estão sendo desenvolvidos é que eles preconizam o aproveitamento de coprodutos e resíduos de cadeias agroindustriais, viabilizando novas alternativas de agregação de valor a elas.
“Os extratos vegetais e microbianos com atividade nematotóxica comprovada poderão ser utilizados na formulação de defensivos naturais a um custo de produção possivelmente inferior ao de um princípio ativo sintético. Além disso, esses extratos vegetais e microbianos poderão ser incorporados nas formulações de outros produtos para garantir ações complementares, por exemplo: atuar como nematicida, regulador de crescimento e fixador de nitrogênio”, conta Rodrigues.
Para o diretor técnico e de marketing da Santa Clara Agrociência, Marcelo Rolim, o grande diferencial do nematicida em desenvolvimento é ser uma alternativa para o manejo e controle de nematoides nas lavouras com compostos de origem natural, desenvolvidos pelas plantas e microrganismos durante milhões de anos de evolução natural.
“Queremos oferecer aos agricultores uma alternativa para que possam produzir alimentos de maneira viável e econômica, utilizando um defensivo de origem natural, mais amigável para o meio ambiente, para as pessoas que o manipulam e para os consumidores em geral”, afirma Rolim.
Para o diretor, a pesquisa também representa uma nova visão da cadeia produtiva, que precisa ser não somente eficiente ao garantir a produção de alimentos como também sustentável ambiental e socialmente. “O fato de os ingredientes ativos do nematicida serem produzidos a partir de coprodutos de origem vegetal é uma comprovação de sua sustentabilidade e alinhamento aos conceitos mais modernos da economia circular”, complementa Rolim.
A base para o estudo foi iniciada quando a equipe de pesquisadores do projeto caracterizou uma oleaginosa cuja composição química evidenciou a ocorrência de metabólitos pertencentes a classes químicas que são reconhecidas por combaterem pragas de uma forma geral. Os ensaios preliminares in vitro, realizados nos laboratórios da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, em Brasília (DF), confirmaram a ação positiva dos diferentes extratos dessa oleaginosa contra a M. incognita.
Nesse tipo de ensaio, soluções de concentrações pré-determinadas dos extratos investigados são colocadas em contato com uma população fixa dos fitonematoides modelo (M. incognita), no estádio de maior capacidade infectiva. Os materiais investigados provocaram dois efeitos característicos nos fitonematoides: paralisação (também chamado de efeito nematostático) e o próprio efeito nematicida, ou seja, com a morte da praga, sendo que em alguns casos foi verificada a clara perfuração da cutícula do verme pela presença de metabólitos obtidos dos materiais estudados.
“No contexto do projeto que temos com a Santa Clara e Demetra, avaliamos ao menos 30 materiais diferentes e a maioria apresentou resultados extremamente promissores, sendo possível selecionar candidatos capazes de fazer o controle de M. incognita em ensaios in vitro com mortalidade acima de 90%”, explica o pesquisador Clenilson.
O projeto explora conceitos da biotecnologia industrial e da química verde. As biomassas são estudadas sob a ótica da bioeconomia, especialmente recorrendo aos preceitos das biorrefinarias e, nesse caso, são abordadas as rotas química e bioquímica para obtenção dos materiais nematotóxicos. Além da oleaginosa, outras biomassas provenientes da agroindústria e do setor sucroalcooleiro estão sendo analisadas pela pesquisa, com obtenção de extratos por meio de rotas biotecnológicas e biossintéticas.
Na rota bioquímica, de forma geral, as biomassas são usadas como fonte de carbono que alimenta fungos previamente selecionados e os fazem crescer. Estes, por sua vez, ao consumirem as fontes de carbono, secretam metabólitos fúngicos que apresentam capacidade de controlar fitonematoides.
Já na abordagem química, foi realizado um cruzamento entre a disponibilidade de biomassas processadas pela agroindústria versus o fato de essas biomassas pertencerem a famílias botânicas cuja literatura científica confirma ocorrência de metabólitos capazes de controlar pragas agrícolas. A partir dessa premissa, foram desenvolvidos processos extrativos, com o uso de solventes quimicamente verdes, para obter o melhor rendimento dos metabólitos nematotóxicos.
O uso de biomassas vindas do agronegócio brasileiro é uma estratégia adotada pela Embrapa Agroenergia para valorar as demais cadeias agrícolas, no caso, a cadeia de resíduos, utilizando conceitos de química verde e processos de extração que não geram resíduos laboratoriais.
Os pesquisadores, agora, estão avaliando a segurança de uso (toxicidade dos extratos) para outros organismos não alvo (fitotoxicidade e citotoxicidade), etapa fundamental para garantir a segurança no consumo dos produtos agrícolas produzidos com o uso do nematicida natural. Também será testada a estabilidade do produto ao intemperismo previsto no uso a campo (termoestabilidade).
Etapas de pré-escalonamento dos processos (químico e bioquímico) estão sendo realizadas para gerar materiais em quantidade suficiente para garantir maior rigor na seleção dos melhores ativos tecnológicos em experimentos em casa de vegetação, com planta-modelo. Essa etapa, em finalização, pretende verificar o efeito de cada material em um ambiente mais complexo e representativo. A partir desse experimento, os candidatos de maior potencial serão selecionados para desenvolvimento do formulado que será validado com uso de variedade comercial de soja, também em experimentos em casa de vegetação.
“Nessa etapa, vamos observar os candidatos que apresentarem maior rendimento dos metabólitos nematotóxicos, além de selecionar, ao menos, dois materiais que sejam capazes de reduzir ou impedir a taxa de infecção de M. incognita em uma cultura comercial, no caso, a soja. Ao final, processos e produtos serão transferidos para as empresas para que os passos finais de industrialização e comercialização sejam realizados”, explica Rodrigues.
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