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As plantas estão suscetíveis a milhares de doenças e pragas, que destroem, somente no Brasil, 25 milhões de toneladas de alimentos por ano. Sem o uso de pesticidas a perda poderia chegar de 20% a 40% de toda a produção nacional. Os dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostram a importância desses produtos para a produção de alimentos. Para discutir o assunto, que tem rendido polêmicas e muita desinformação, a Câmara dos Deputados promoveu, nesta segunda-feira (16), Comissão Geral, com a presença de especialistas.
O Projeto de Lei 6299/02, proposto pelo ex-senador Blairo Maggi e relatado na Câmara pelo deputado Luiz Nishimori (PL-PR), que atualiza as regras que tratam sobre a análise de pesticidas, foi o centro do debate. Para o parlamentar, a proposta irá trazer mais rigor científico na análise ténica para a aprovação de novos produtos e mais transparência em todo o processo.
“A lei de pesticidas foi debatida por dois anos, com 12 audiências públicas, apresentações e estudos. Chegamos, então, a um texto muito responsável. A modernização é necessária pois a lei que trata do assunto foi criada em 1989. Durante esse período, ocorreram grandes avanços científicos e tecnológicos na agricultura e a legislação ficou defasada, não acompanhou essa evolução”, defendeu Nishimori.
De acordo com ele, o PL não só irá permitir maior produtividade de alimentos no Brasil como mais segurança alimentar. “Hoje temos a oportunidade de discutir e quebrar alguns paradigmas, para possibilitar o uso de produtos mais modernos e menos tóxicos. Além de adequar nossa legislação aos padrões internacionais e trazer mais celeridade ao processo de analise e aprovação dos produtos, que hoje demora, em média, de 3 a 8 anos para autorização de um novo princípio ativo. E temos uma fila de mais de2 mil produtos, sendo 95% dela de genéricos. Em outros paises, o princípio ativo é autorizado em seis meses”.
Presente ao debate, o deputado Zé Silva (SD-MG), membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), afirmou que a Comissão Geral é um momento estratégico para discutir um tema tão importante. Para ele, o nível de produção agrícola hoje no Brasil só consegue ser mantido com o uso dos defensivos. “Nenhum produtor rural quer usar pesticida. Mas como irão produzir sem eles? “, questionou.
Nesse sentido, ele lançou um manifesto com propostas de solução para preservar e produzir de forma sustentável e responsável. “O Estado tem que definir o nível de competitividade que ele quer para seus produtos. Infelizmente, apenas 20% dos produtores no país tem assistência técnica e extensão rural”.
Receituário agronômico integrado com o Cadastro Único, desoneração para incentivar a criação de biofábricas, recursos para pesquisas de inovação e tecnologia para reduzir o uso de pesticidas foram algumas das propostas apresentadas pelo parlamentar.
Os professores e pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea-ESALQ) da USP, Mauro Osaki e Lucílio Alves, apresentaram um estudo realizado pelo instituto, em 35 regiões produtoras de soja em 14 estados no país, sobre o impacto econômico de não utilizar os pesticidas na cultura da soja.
De acordo com a pesquisa, para tratar a ferrugem asiática, o setor gasta R$ 8 bilhões de reais com pesticidas. “Se o produtor optar por não combater o fungo, isso reduziria, em média, 30% a produção. Para compensar, seria preciso aumentar 30% a área agrícola cultivada e investir R$ 47 bilhões de reais”, explicou Osaki.
O impacto econômico no preço ao consumidor final foi apresentado por Alves. De acordo com ele, não combater a ferrugem iria causar redução na disponibilidade do produto para a sociedade, com impacto de 23% nos preços. “Temos óleo de soja e derivados de soja presentes no leite, na margarina, no sabão, no frango, no suíno. Com 30% a menos de oferta, o aumento de preço direto no caso do óleo de soja para o consumidor seria de 11%”, completou Alves.
Para o representante da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas), Eduardo Brandão, o Brasil carece hoje de produtos mais modernos, mais baratos, testados cientificamente, que deem mais competitividade aos alimentos. “Em nosso setor, o gasto com pesticidas fica acima de 20% a 30% do custo de produção, ou seja, o produtor só usa porque é necessário”, afirmou.
Coordenador de Tecnologia da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Reginaldo Minaré, foi enfático ao afirmar que não existe país que tenha uma agricultura minimamente razoável que não faça uso dos pesticidas. Segundo ele, junto com sementes, máquinas e fertilizantes, eles formam a base da agricultura mundial hoje. “A CNA defende, desde 2005, a mudança da lei atual, que estabeleceu um ritmo moroso à aprovação e dificulta o acesso, principalmente dos pequenos produtores. Precisamos que os genéricos, que reduzem o custo do produção, cheguem a eles. A nova legislação vai fazer renascer, inclusive, a disposição para o investimento de novas empresas do setor no Brasil”.
Sobre o trabalho realizado no registro de produtos no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o diretor do Departamento de Temas Técnicos, Sanitários e Fitossanitários, Leandro Diamantino Feijó, defendeu que o processo leva em conta todos os regramentos internacionais. “Seguimos as boas práticas regulatórias internacionais e isso nos traz segurança nos resultados. A políitica de registro e controle de agroquímicos no Brasil é segura e rígida; afinal exportamos alimentos para centenas de países com características distintas”.
O diretor de Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas do Mapa, Carlos Goulart, corroborou a fala de Feijó. De acordo com ele, não existe nação soberana com potencial agrícola como o Brasil que possa dispensar o uso de pesticidas. “Se os nosso alimentos não fossem seguros, não exportaríamos para mais de 160 países no mundo”.
Para Goulart, a indústria de inovação avançou enormemente em descompasso com a legislação atual, que precisa ser modernizada. “Nossa legislação completou 30 anos agora em julho. Os governos precisam produzir regulações para deixar os produtos competitivos e conseguir fornecer alimentos em grandes quantidades. Os produtos genéricos vão trazer essa competitividade e reduzir custos para os produtores”.
Também falando em nome do Mapa, o secretário de Defesa Agropecuária do órgão, José Guilherme Leal, destacou que existem hoje no Brasil cerca de 20 mil produtores orgânicos e outros cinco milhões de estabelecimentos rurais, de acordo com o Censo 2017. “O único sistema no Brasil que tem restrição aos pesticidas é o orgâncio, que tem um embasamento e uma lógica de cumprimento de regras socioambientais. Mas ele não consegue abastecer o Brasil”.
De acordo com ele, a utilização dos pesticidas precisa de regulamentação e controle, capacitação e fiscalização, além de monitoramento do impacto à saúde. “O PL que está em discussão mantém a avaliação de saúde, do meio ambiente e agrícola. E nós precisamos avançar em um arcabouço que dê mais agilidade, mas sem perder o rigor científico”, concluiu.
Dados oficiais do Ministério da Saúde, por meio do DataSus, mostram que, em 10 anos, das mais de 800 mil notificações registradas no sistema, 43% das intoxicações cadastradas foram por remédios, enquanto somente 5% foram por produtos fitossanitários. Ainda sim, as intoxicações por pesticidas não foram por ingestão de “comida intoxicada”, mas por utilização incorreta, como erro ou abuso de administração dos produtos; tentativas de homicídio, e na maioria dos casos, tentativas de suicídio.
Professor e pesquisador da Unesp, Caio Carbonari, afirmou que o Brasil realizou uma verdadeira revolução em termos de manejo fitossanitário e, apesar da imagem negativa que se criou, faz um uso bastante racional dos pesticidas. “O Brasil tem conseguido aumentar continuamente sua produtividade agrícola e isso só é possível pautando-se na ciência, tecnologia e inovação. Para evoluirmos, precisamos de uma legislação que avence no mesmo nivel que a agricultura brasileira avançou”.
Vice-presidente da FPA, o deputado Sérgio Souza (MDB-PR), fez questão de esclarecer a polêmcia sobre a autorização de novas substâncias no pais. “Em 2019 foram 262 produtos autorizados e, desse total, apenas sete são novas moléculas, os demais são genéricos, substâncias que já eram autorizadas no Brasil. E 136 são produtos técnicos de uso da indústria, apenas”.
Ele chamou a atenção para a responsabilidade do Brasil. “Segundo a ONU, até 2050 precisaremos dobrar nossa produão de alimentos para alimentar mais um bilhão de seres humanos no planeta. Então, o que é preciso é ter regras claras, como o PL, que endurece e deixa mais rígido o processo de análise e registro de pesticidas”.
Souza destacou que o grande problema hoje é a má utilização dos produtos, geralmente causada por falta de instrução e assistência técnica aos produtores rurais. “Para se ter uma ideia, a Anvisa analisou 12.051 coletas de 25 alimentos frescos e apenas 134 tinham resíduos, o que representa 1,1%”.
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