Braquiária na entrelinha do café traz ganhos ao produtor e ao meio ambiente

De baixo custo e fácil implantação, a tecnologia melhora a estrutura do solo e a capacidade de armazenar água

26.04.2021 | 20:59 (UTC -3)
Embrapa

Pesquisa realizada com participação de cafeicultores apresenta resultados importantes para a produção de café, tanto irrigado, quanto de sequeiro, desde que em regiões com oferta hídrica regular. Trata-se do sistema que utiliza a braquiária como planta de cobertura nas entrelinhas do cafezal. Com baixo custo e de fácil implantação, esse modelo de produção melhora a estrutura do solo e a sua capacidade de armazenar água. Além disso, favorece o estoque de carbono nas camadas superficiais do solo.

Avaliação de impacto econômico do uso desse sistema de produção, relativa ao ano de 2020, demostra que cada real investido na pesquisa e desenvolvimento dessa solução proporciona retorno de R$ 24,14 em benefícios para a sociedade. Essa primeira avaliação de impacto levou em consideração o investimento estimado para a geração da tecnologia ao longo dos anos, assim como os custos para realizar a sua transferência para o setor produtivo. Por outro lado, foram avaliados os seguintes impactos econômicos: incremento de produtividade; redução de custos de produção; e agregação de valor ao café produzido, alcançando um Valor Presente Líquido (VPL) de pouco mais de R$ 61,1 milhões.

Os dados são relativos a cerca de 29 mil hectares de cafezais onde a tecnologia está sendo adotada nos estados da Bahia, Goiás, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo e Distrito Federal. “A metodologia de avaliação dos impactos econômicos realizada pela Embrapa é baseada no método do excedente econômico. O enfoque do excedente econômico permite que se estime o benefício econômico gerado pela adoção de inovações tecnológicas comparando-se a nova solução tecnológica com a tecnologia anteriormente em uso ou tradicional”, explicou Jamilsen Santos, supervisor da área responsável pela avaliação na Embrapa Café.

“Outros aspectos, como impacto social e ambiental, no caso do uso da braquiária nas entrelinhas do cafezal, estão sendo desenvolvidos e devem constar de futuras avaliações”, complementa o supervisor.  A integração dessas avaliações com os impactos econômicos e estimativas de taxas internas de retorno compõem as bases para elaboração do Balanço Social da Embrapa, publicado anualmente. 

O Balanço Social é uma forma da Empresa prestar contas à sociedade quanto aos investimentos públicos realizados na pesquisa agropecuária, proporcionando maior transparência às suas atividades. É também fundamental como informação estratégica da Empresa que utiliza o documento para direcionar novas iniciativas e avaliar a relevância de suas contribuições científicas e tecnológicas, grande parte delas desenvolvidas em parceria com outras instituições de pesquisa e cada vez mais com a atuação ativa do setor produtivo.

Manejo do cafezal é simplificado e solo é melhorado

O pesquisador Omar Rocha, atual chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Café, um dos responsáveis pelo estudo, conta que o objetivo inicial foi buscar solução para ajudar o produtor no manejo das principais plantas daninhas que acometem o cafezal, além de melhorar a qualidade do solo. “Quando iniciamos a pesquisa, por volta de 2004, já existia alguns estudos com uso de planta de cobertura nas entrelinhas de cultivos perenes, mas verificamos que a braquiária possuía características interessantes, como um sistema radicular que, com oferta hídrica regular, aumenta de 18% a 20% a água prontamente disponível no solo para a planta, além de melhorar a estrutura do solo”. Além disso, esse modelo de produção permitiu a estocagem de até 10,7 T.ha-1 de carbono orgânico nos primeiros 0,20m do solo, explica.

A adaptabilidade às condições locais, arquitetura adequada ao sistema produtivo da cultura, perenidade, facilidade de ressemeadura natural, rusticidade, facilidade de manutenção e resistência à mecanização são características desejáveis na seleção de uma planta de cobertura, descreveu Omar Rocha em sua tese de doutoramento em que estudou vários aspectos da inserção da braquiária como planta de cobertura na cultura do café. “São características encontradas na braquiária, o que justifica a escolha dessa planta, além da larga disponibilidade desse capim em áreas produtoras de café.

Rocha conta que sem o uso da planta de cobertura, a lavoura é acometida por plantas invasoras que exigem diferentes tipos de manejo para controle, resultando em uso excessivo de defensivos. Nesse sentido, o uso da braquiária apresentou redução de aproximadamente 40% na utilização de herbicidas e no uso máquinas e equipamentos. Outras vantagens foram evidenciadas na capacidade da braquiária em armazenar e reciclar nutrientes, além de favorecer a atividade microbiológica devido à redução na temperatura média do solo. 

O produtor de café e consultor Guy de Carvalho participou dos testes da tecnologia em campo. Ele disse que desde os primeiros experimentos ocorridos no Oeste Baiano onde o terreno é arenoso e o clima é quente, com período de chuva muito definido e longo, a introdução da braquiária já demostrou grande economia na produção, com menos uso de óleo diesel, pois foram realizados menos roçados, e com a racionalização do uso da água na irrigação, onde era utilizado bico spray. “Observamos que a braquiária não competiu com o cafeeiro, além de contribuir para a ciclagem de nutrientes e a incorporação de matéria orgânica no solo”, conta.

Ele lembra que os experimentos com o uso da braquiária começaram em paralelo ao projeto Raioba, que tinha o objetivo de desenvolver e adaptar técnicas de manejo de água na cafeicultura irrigada em solos arenosos do Oeste Baiano. No mesmo ano, foi adotado o estresse hídrico controlado, que promoveu a redução de custos, de perdas na colheita, de pragas, da requeima e da alta incidência de flores tipo estrelinhas. “A tecnologia permitiu ainda o controle sobre a floração do cafeeiro e a uniformização da maturação dos frutos”, rememora. Este projeto foi conduzido no âmbito do Consórcio Pesquisa Café, coordenado pela Embrapa.

Atualmente, Carvalho possui plantações de café no Sul de Minas. Ele diz que na região, a utilização dessa solução tem proporcionado grande economia para o sistema produtivo –“gastamos atualmente metade do que gastávamos com o método de manejo tradicional”, comemora. Ele tem incorporado a braquiária em terreno com declive. “A braquiária ajuda no controle de erosão e possibilita o uso de mecanização em linhas retas com até 30% de declividade,” conta. “Essa tecnologia serviu como uma luva para mecanizar em áreas declivosas”, disse com entusiasmo.

É importante que haja planejamento por parte do produtor na implantação da braquiária intercalando as linhas de pés de café e, apesar de fácil implantação, deve-se buscar orientação técnica para fazer o uso correto do sistema. O plantio da gramínea deve ser feito na formação e na renovação da lavoura, através de podas, permitindo assim a entrada de sol na plantação.

Com base na avaliação de impacto realizada, é possível estimar ganhos médios com o uso da braquiária na entrelinha da lavoura de café. Foi verificado aumento de produtividade em cinco sacas (60Kg) por hectares (ha), com redução de R$520 nos custos de produção. A tecnologia proporcionou maior uniformidade de maturação e nutrição equilibrada, contribuindo para o aumento médio da peneira e a redução de defeitos, em especial em grãos verdes e ardidos, permitindo agregação de valor ao produto na ordem de R$ 906, por saca. Jamilsen Santos explica que esses são valores médios potenciais e que cada produtor vai ter diferente resposta com esse sistema de produção, alertando para o fato de que o alcance de resultados altamente positivos depende também do uso de boas práticas agrícolas.  

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