Arroz é alternativa viável para reduzir custos de produção de suínos e aves

Arroz pode substituir milho na alimentação animal, com qualidade nutricional, e baratear custo da ração

01.02.2022 | 14:06 (UTC -3)
Embrapa
Arroz pode substituir milho na alimentação animal, com qualidade nutricional, e baratear custo da ração. - Foto: Paulo Lanzetta
Arroz pode substituir milho na alimentação animal, com qualidade nutricional, e baratear custo da ração. - Foto: Paulo Lanzetta

Estudos da Embrapa Suínos e Aves (SC) mostram que, do ponto de vista nutricional, o arroz pode complementar ou substituir o milho na alimentação animal. A conclusão pode ser uma ótima notícia para os suinocultores e avicultores brasileiros que enfrentam os altos preços decorrentes da crescente valorização do milho e da soja. Paralelamente, o excesso de oferta de arroz no mercado nacional, com uma sobra de 600 a 800 mil toneladas na safra 2020/2021, reforça a viabilidade do grão para baratear as rações de suínos e aves, que atualmente respondem por cerca de 70% a 80% do custo de produção das duas atividades.

“A Embrapa já mostrou que o arroz descascado (arroz marrom), do ponto de vista nutricional, serve perfeitamente para complementar ou substituir o milho na alimentação animal”, afirma o pesquisador da Embrapa Suínos e Aves Jorge Vitor Ludke.

Já faz três anos que o milho e a soja têm influenciado o desempenho da suinocultura e avicultura, de acordo com dados da Central de Inteligência de Suínos e Aves da Embrapa Suínos e Aves (CIAS), que apura mensalmente o comportamento dos custos de produção nos dois setores. Para entender melhor como essa influência acontece na prática, basta observar a trajetória do preço das sacas de milho e soja. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), o preço médio real da saca de 60 quilos de milho passou de R$ 50,11, em abril de 2019, para R$ 97,15, em abril de 2021 - ou seja, um aumento de 93,9%. No mesmo período, a saca de soja encareceu 68,1%. Isso significa que os custos de produção da suinocultura e avicultura cresceram quase que na mesma proporção nos últimos três anos.

Esse movimento para cima nas cotações do milho e soja foi puxado pelas incertezas relacionadas à pandemia da Covid-19, valorização do dólar frente ao real, alta demanda por grãos no mercado asiático (principalmente o chinês) e quebras na primeira e segunda safras de milho devido a problemas climáticos e à cigarrinha-do-milho, segundo avaliação de um estudo da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) divulgado em julho de 2021. A última estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é de que a produção total de milho na safra 2020/2021 chegará a 85 milhões, bem abaixo das 106 milhões de toneladas projetadas inicialmente. Assim, há a expectativa de que ocorra no curto prazo um déficit entre 15 e 20 milhões de toneladas de milho no mercado nacional.

Já o arroz vive situação oposta. Os arrozeiros gaúchos e catarinenses, responsáveis por 91% da produção brasileira, atingiram produtividade recorde e entregaram 8,5 milhões de toneladas na safra 2020/2021, a quarta maior da história. Porém, com a estabilização do consumo no mercado interno e menores vendas para o exterior (especialmente para a África) na comparação com 2020, sobrou arroz no País. “O arroz é um grão que tem como prioridade a alimentação humana e vai continuar sendo assim. Mas agora existe um excedente e a alimentação animal é uma alternativa”, explica Rodrigo Ramos Rizzo, engenheiro agrícola e assessor especial da presidência da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul).

Problema para um, solução para outro

O problema de um setor, então, virou possibilidade de amenizar a situação do outro. Segundo Rodrigo Rizzo, já há contratos de venda de arroz em casca ou quirera de arroz entre arrozeiros e produtores de carne de frango e carne suína no Rio Grande do Sul. No entanto, o que vai definir a extensão do uso do arroz como alimento alternativo nas rações animais será a comparação da sua cotação com a do milho na hora da compra. Levando em consideração as cotações de outubro, cada quilo de milho para uso na alimentação animal, na média, ficou em R$ 1,50, enquanto o arroz chegou a R$ 1,82 (arroz marrom).

Assim, a utilização do excedente de arroz na alimentação de suínos e aves depende muito do custo do frete. “É por isso que o uso do arroz como alimento alternativo compensa, na prática, somente em lugares que poderão contar com uma grande vantagem logística”, ressalta o pesquisador Jorge Ludke. A região Sul se encaixa nessa lógica. Ela é a que apresenta o maior déficit de grãos para suínos e aves e também a que concentra o excedente de arroz. Em média, uma saca de arroz percorre 500 km no Sul do Brasil para se transformar em ração animal. Já no caso do milho, que vem do Centro-Oeste majoritariamente, a distância sobe para cerca de 2.000 km (de Sinop, MT, a Chapecó, SC), o que representa um frete até 70% mais caro.

“A questão mais importante em torno do uso do arroz neste momento é, na verdade, reforçar o debate sobre a criação de mecanismos para tornar permanente a oferta de alimentos alternativos para a ração animal”, complementa o também pesquisador da Embrapa Suínos e Aves Dirceu Talamini, especialista em temas ligados ao custo de produção de suínos e aves. Ainda não há um retrato claro do quanto o arroz ajudará a reduzir os custos de produção na suinocultura e avicultura. Nem se as duas atividades consumirão todo o excedente de arroz. Já está certo, porém, que os três setores enfrentarão o restante de 2021 compartilhando preocupações e articulando sinergias.

Uso do arroz faz parte de debate maior

O uso do arroz na alimentação animal faz parte de um debate retomado recentemente a respeito de como garantir um fluxo contínuo de alimentos alternativos para a suinocultura e avicultura. A Embrapa tem sido uma das protagonistas dessa discussão que interessa especialmente a Região Sul, que vê todo ano o déficit de grãos para suínos e aves aumentar. “Temos colaborado nessa discussão apresentando nossas pesquisas que mostram como cereais de inverno podem ocupar áreas ociosas no Sul do país e gerar bons resultados para produtores de grãos e de proteína animal”, afirma a pesquisadora Teresinha Bertol, da Embrapa Suínos e Aves.

Pesquisas conjuntas desenvolvidas por equipes da Embrapa Trigo (RS) e Embrapa Suínos e Aves apontam que cereais de inverno (como trigo, aveia, centeio, cevada e triticale) podem ocupar cerca de 6 milhões de hectares em Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Essas áreas ficam ociosas após a colheita de verão e poderiam estrategicamente ser usadas para regionalmente abastecer de grãos o mercado de proteína animal.

Segundo estudos da Embrapa, o trigo (foto ao lado) e o triticale são os grãos de inverno com maior potencial para substituir o milho e o farelo de soja nas dietas para suínos e aves. “São necessários ajustes nos níveis dos ingredientes que compõem as rações de forma a manter níveis equivalentes de nutrientes e de energia para atender às exigências dos animais em cada fase. Porém, o trigo e o triticale possuem viabilidade técnica e econômica e podem suprir parte significativa do déficit de milho no Sul do Brasil”, ressalta Teresinha Bertol.

Uma das cultivares da Embrapa que mostrou bom potencial para a composição de rações de suínos e aves foi o trigo BRS Tarumã. Com teor de proteína próximo a 18%, foi desenvolvido para a alimentação animal e atende há 20 anos o setor de bovinos. Outras variedades de trigo da Embrapa, como o BRS Pastoreio e o BRS Sanhaço, assim como as cultivares de triticale BRS Saturno e Embrapa 53, apresentaram menor conteúdo de energia do que o milho, o que aumenta a demanda por óleo nas rações.

Os pesquisadores da Embrapa destacam que o uso desses cereais pode ser economicamente mais vantajoso nas fases em que os animais apresentam menor demanda de energia, como, por exemplo, na gestação dos suínos. Já no caso do trigo BRS Tarumã, devido ao seu conteúdo de energia superior ao do milho e ao alto conteúdo de proteína, o uso é mais produtivo nas fases de crescimento e terminação, quando a exigência desses fatores é mais elevada.

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