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Estudos taxonômicos com percevejo-de-renda, coletados em cultivos de mandioca do Acre, confirmaram o primeiro registro oficial das espécies Vatiga manihotae e Vatiga illudens para o Estado, e Gargaphia opima para o Brasil, associadas à cultura. Encontrados em roçados da Terra Indígena Kaxinawá de Nova Olinda, município de Feijó, esses insetos-pragas atacam as folhas da planta e, em altas populações, podem causar perdas na produção. Publicados no periódico EntomoBrasilis, os resultados contribuem para o aumento do conhecimento sobre a distribuição geográfica dessas espécies no País.
A descoberta é fruto de pesquisas de prospecção de insetos, realizadas com o objetivo de identificar as principais pragas da agricultura indígena e orientar alternativas de controle, por meio do projeto “Etnoconhecimento e Agrobiodiversidade entre os Kaxinawá de Nova Olinda – Fase II”, executado pela Embrapa Acre (Rio Branco) e instituições parceiras, entre 2015 e 2018. Segundo o pesquisador Rodrigo Santos, coordenador dos estudos, durante os trabalhos de campo foram coletadas diferentes espécies de insetos-pragas nos roçados indígenas, mas três espécies de percevejo–de-renda chamaram a atenção da equipe. “Realizamos a triagem dos insetos capturados e selecionados 21 exemplares para análise. Enviamos esse material conservado em álcool 70% para a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), referência em taxonomia de insetos, para identificação das espécies”, afirma.
O estudo taxonômico para determinar a identificação dos percevejo-de-renda se baseou no uso de chaves dicotômicas que envolvem diferentes parâmetros morfológicos, ou seja, descrições sobre a morfologia externa da ordem, gênero e espécie dos insetos. Esses estudos possibilitam avaliações comparativas e indicam caminhos a serem seguidos no processo. De acordo com a professora da UFRJ, Luci Boa Nova Coelho, embora estes insetos apresentem como característica comum as asas rendilhadas, há grande variação na morfologia das espécies.
“Analisamos o formato do dorso e das asas, posicionamento de antenas e formato do estreitamento do abdômen, onde se localiza o aparelho sexual de machos e fêmeas, entre outras características da composição estrutural corporal, essenciais para a identificação de insetos, comparando com espécies de percevejo-de-renda já descritas na literatura. As análises permitiram confirmar as espécies Vatiga manihotae e Vatiga illudens, pela primeira vez registradas no estado do Acre, e o primeiro registro da espécie Gargaphia opima em território brasileiro”, afirma a entomologista.
Os especialistas também realizaram estudos comparativos com espécies de coleções entomológicas oficiais, mantidas em Universidades e museus do Brasil e outros países, e com imagens de insetos constantes em literatura científica. “O uso de chaves analíticas dicotômicas é um método de identificação de insetos bastante eficiente, mas a variação de caracteres presentes em cada chave e a ausência de informações científicas sobre algumas espécies ainda não reconhecidas pela Ciência, entre outras questões, podem dificultar a análise. Para evitar erros de interpretação, como regra geral, após a identificação, sempre buscamos a confirmação da espécie comparando o exemplar físico com figuras e fotografias de insetos já determinados cientificamente”, explica Santos.
Pesquisas revelam que o gênero Vatiga inclui diferentes espécies de percevejo-de-renda, encontradas na região Neotropical (parte das Américas do Norte, Sul e Central), associadas a diversas plantas do gênero Manihot. As espécies identificadas no Acre já ocorrem em outras localidades no Brasil, associadas à cultura da mandioca. Vatiga illudens foi registrada na Bahia, Mato Grosso do Sul, Ceará, Rio Grande do Norte, Distrito Federal e Paraná. Vatiga manihotae foi relatada no Amazonas, Pará, Mato Grosso do Sul, Paraná e Santa Catarina.
De acordo com Santos, no contexto da Terra Indígena, essas espécies ocorrem em pequena densidade populacional, devido a especificidades dos sistemas agrícolas adotados como a produção em pequena escala e a implantação dos roçados próximos a áreas de floresta nativa, prática que contribui para a presença de inimigos naturais nos cultivos e funciona como método de controle. Nessas condições, esses insetos-praga não oferecem riscos à cultura, mas precisamos investigar como se comportarão em extensas áreas de monocultivo no estado do Acre”, enfatiza.
Nativo das Américas, o gênero Gargaphia é encontrado na Colômbia, Equador, Peru e Bolívia, com espécies associadas a culturas de importância econômica como maracujá, feijão-de-porco e quiabo. Até então, apenas a Gargaphia lunulata (Mayr) havia sido registrada no Brasil, relacionada à mandioca. A hipótese dos pesquisadores é que a espécie Gargaphia opima Drake tenha migrado de países vizinhos, em função da proximidade do Acre com as fronteiras boliviana e peruana.
O primeiro registro científico da nova espécie de percevejo-de-renda no Brasil permitirá atualizar a lista oficial de insetos-pragas associados à cultura da mandioca, atribuição de responsabilidade do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). “Essa inclusão no rol de pragas da agricultura do País também respaldará a realização de pesquisas de prospecção para identificar novas áreas de ocorrência do inseto, conhecer aspectos do comportamento populacional e medir os impactos na produção”, diz Santos.
Consumida por quase um milhão de pessoas no mundo, a mandioca tem sido considerada, por organismos internacionais, uma das culturas que podem contribuir para reduzir a fome no planeta. Cultivada em mais de 100 países, serve de alimento para populações rurais e urbanas que consomem a raíz de forma in natura e transformada em farinha, beijus e pães entre outros subprodutos. Apesar da importância econômica e social, os cultivos mundo afora são susceptíveis a diversas doenças causadas por fungos, bactérias, vírus ou protozoário e a pragas que pode dizimar os plantios, como a lagarta mandarová e as formigas cortadeiras, além de pragas de menor importância econômica como os percevejo-de-renda.
Santos explica que esses insetos sugadores são pragas secundárias da cultura, entretanto, por se alimentarem da seiva das folhas, principalmente as mais jovens, retirando parte da clorofila, em níveis populacionais elevados prejudicam o desempenho produtivo dos cultivos. Os danos causados às folhas reduzem a capacidade de fotossíntese da planta, comprometendo a produção de amido (açúcares) e o desenvolvimento das raízes, acarretando prejuízo para os agricultores.
Segundo o pesquisador, a principal estratégia para evitar ataques e minimizar perdas é o monitoramento da população nos mandiocais. Realizar vistorias regulares aos plantios possibilita a adoção de medidas efetivas de controle no momento da constatação dos primeiros focos de insetos, baseadas no uso de produtos e dosagens recomendas pela pesquisa, aspecto que ajuda a preservar insetos benéficos à cultura. “Além disso, gerar informações científicas sobre as espécies identificadas é essencial para a implementação de programas de Manejo Integrado de Pragas (MIP), seja em nível estadual ou em âmbito nacional”, ressalta.
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