Plantio de soja é finalizado no RS
69% da área cultivada está em germinação/desenvolvimento vegetativo; 24%, em floração; e 7% em enchimento de grãos
A produção global de alimentos terá de aumentar em mais de 70% até 2050, para que seja possível alimentar uma população estimada em nove bilhões de pessoas, sendo mais de 95% concentrada em regiões urbanas. Atualmente é produzido alimento suficiente para 12 bilhões de pessoas, porém mais de 900 milhões ainda vivem em insegurança alimentar (FAO, 2013). São muitos os gargalos envolvidos nesse processo, como a restrição na oferta de água, as incertezas climáticas, as dificuldades no manejo agronômico, as limitações edáficas e as perdas observadas em todas as etapas, tanto da cadeia de produção como na distribuição dos alimentos.
Se a produtividade média das principais culturas for mantida nos valores atuais, para produzir o alimento necessário para suprir a demanda será preciso mais que duplicar a área de produção. O aumento na eficiência genética das culturas, a manutenção do cenário atual de dano, causado por pragas e correções no processo de distribuição, estão entre algumas das medidas mais relevantes.
Ao longo da história, diversas tecnologias foram agregadas à atividade agrícola, para o aumento na sua eficiência, e resultaram no notável incremento da produtividade observado atualmente.
Alimentar pessoas é um processo desafiador, que se inicia antes da fazenda, passa pelo processo produtivo na propriedade e tem prosseguimento no mercado de distribuição (Tabela 1). Estes processos são complementares e necessitam ser parametrizados, passando pela simplificação na etapa produtiva, redução no consumo de água, menor utilização de fertilizantes e agroquímicos sintéticos, redução significativa do impacto dos sistemas de produção sobre os ecossistemas naturais, ausência de contaminação de rios e águas subterrâneas devido aos insumos químicos utilizados.
Igualmente desafiador é o estabelecimento de um processo vertical de oferta de alimentos que inclui aumento na eficiência da cadeia de distribuição e adequações para atender ao regramento global de comercialização dos produtos agrícolas.
Como as tecnologias digitais podem auxiliar na produtividade das culturas e na distribuição dos alimentos
A agenda da nova agricultura considera que o mercado vai ser o regulador do processo de oferta de alimento e que o sistema de produção deverá se ajustar constantemente a estas demandas (Figura 1).
O desafio de alimentar o planeta de forma sustentável não é simples. No cenário atual não basta apenas produzir mais e com menor custo. É necessário considerar as mudanças no perfil do consumidor, as alterações na urbanização e na estrutura da sociedade, além das constantes alterações nas demandas regulatórias globais.
Torna-se vital a parametrização de todas as fases do processo de oferta de alimentos para o aumento da eficiência e da rastreabilidade em cada etapa. Deste modo, os dados coletados passam a ser utilizados de forma a retroalimentar o sistema, sugerindo as alterações que o mercado consumidor exige. Machinelearning, inteligência artificial e Internet das coisas (IoT) são ferramentas fundamentais neste processo.
Deve ser considerado que o conservadorismo do meio rural pode reduzir a velocidade inicial de adoção das novas tecnologias. Outro agravante é a precariedade de infraestrutura observada na maioria das áreas rurais do Brasil, e em diversos países da América Latina e América do Norte.
Estudo realizado entre 2017 e 2019 junto a cooperativas, consultores e indústria nos Estados Unidos (Tabela 2) apresenta um aumento lento na adoção das tecnologias digitais totalmente ligadas à produção, destacando-se equipamentos orientados por GPS e/ou utilização de imagens para diagnóstico do status das lavouras (Erickson et al, 2019).
Estudos indicam que algumas tecnologias apresentam adoção preferencial, tais como direção automática de equipamentos automotores, barras de luz auxiliares para aplicação de insumos líquidos e sistemas providos de GPS. Vants providos de sensores capazes de avaliar condições de solo, necessidade de irrigação, mapas de colheita, softwares para monitoramento das condições sanitárias do cultivo, plataformas para análise de grandes volumes de dados são outras tecnologias adotadas, mas ainda em menor escala (Figura 2).
No Brasil, é estimado que o mercado de tecnologias digitais apresente uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 12% até 2025, com base em um mercado avaliado em R$ 1 bilhão em 2018 (Céleres, 2019).
Houve um momento em que a estratégia macro para solucionar os problemas de oferta de alimentos foi baseada tão somente no aumento de produtividade. A implantação de tecnologias digitais disruptivas na agricultura é o caminho para transformá-la em uma indústria altamente tecnológica. Os próximos passos irão muito além do segmento produtivo, terão de considerar as preferências do consumidor, a construção de bancos de dados robustos, a completa parametrização dos processos e uma constante reinvenção de todo o processo.
As tecnologias já disponíveis podem ser agrupadas em função dos produtos ou atividades (Krishnan, 2017), conforme ilustrado na Figura 3 e relacionado a seguir:
• Sistemas de monitoramento, informação ou predição que reduzem os riscos de perdas com eventos climáticos, pragas e desastres naturais;
• Sistemas automatizados de irrigação (Smart irrigations) que reduzem o desperdício de água;
• Alteração na preferência alimentar do consumidor;
• Diversificação dos alimentos disponíveis;
• Cadeia de distribuição viabilizando maior rapidez na distribuição dos alimentos;
• Equipamentos embarcados em máquinas agrícolas podem indicar desde a necessidade da manutenção até parâmetros específicos de desempenho;
• Automação das máquinas agrícolas agregando precisão às operações;
• Colhedoras providas de inúmeros dispositivos embarcados que fornecem informações em tempo real sobre o desempenho produtivo da cultura;
• Equipamentos instalados em silos podem indicar as condições de estocagem evitando perdas no armazenamento;
• GPS (global positioning system) para automação de diversas operações no segmento da produção e da distribuição;
• Equipamentos embarcados nas diversas máquinas, e que facilitam a comunicação entre produtor, operadores, administradores, agrônomos, através do uso de celulares e/ou ferramentas de internet;
• Sensores associados ao solo podem coletar dados indicativos de umidade ou do balanço hídrico, levando à indicação da necessidade de irrigação;
• Imagens de plantas, capturadas por sensores térmicos ou hiperespectrais, podem acelerar a detecção de pragas permitindo a aplicação de defensivos específicos, na quantidade e no momento corretos;
• Parametrização na utilização de luz, umidade, energia e água, permitindo que os alimentos sejam produzidos apenas com a quantidade necessária destes recursos naturais;
• Dados sobre desempenho, sanidade e vigor em animais (Animal data);
• O sistema Crispr (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats) e a edição de genes possibilitam que os alimentos apresentem características que especificamente atendam a demanda do mercado;
• Computação em nuvem com armazenamento de grandes volumes de dados, possibilitando rastreabilidade do alimento na produção, armazenamento e consumo final;
• Análises de dados para orientação de mercado e logística;
• Dispositivos móveis e redes sociais para monitorar o mercado;
• Aumento da produtividade por unidade de área resultando em redução no uso de terra por unidade de alimento produzido;
• Completa automação das fazendas com o apoio de robótica;
• Alimentos cultivados em laboratório, de origem animal ou vegetal, com maior eficiência, em menor período de tempo e sem todos os insumos exigidos pelas fazendas;
A importância das tecnologias digitais no meio rural é inquestionável. Contudo, é fundamental que os avanços buscados na produção de alimentos não sejam apenas baseados na aquisição de tecnologias digitais. Não existe solução mágica para problemas de tal complexidade cujos gargalos podem estar ligados a uma gama enorme de condicionantes, incluindo desde limitações técnicas, culturais, até de infraestrutura.
As tecnologias oferecidas somente serão impactantes se condições mínimas forem disponibilizadas. Alguns questionamentos são comumente formulados, tais como qual tecnologia é a mais apropriada para resolver determinado problema, como utilizá-la e quais resultados podem ser obtidos.
O processo de adoção de uma nova tecnologia digital deve contemplar quatro etapas:
1ª etapa: avaliação das condições onde a tecnologia vai ser empregada, os problemas que se propõe a resolver, as limitações de infraestrutura que podem interferir no seu desempenho, nas dificuldades técnicas que possam dificultar a sua utilização.
2ª etapa: escolha de tecnologias que melhor atendam a demanda, sendo identificados benefícios, restrições, demandas técnicas, suporte técnico disponível, compatibilidade com equipamentos já existentes e vantagens econômicas.
3ª etapa: teste piloto da tecnologia escolhida para avaliar sua adequação às condições onde será implantada, capacidade para solução do problema identificado e mensurar as vantagens financeiras agregadas.
4ª etapa: implantação da tecnologia considerando os resultados obtidos a partir dos testes pilotos, os ajustes necessários, adequação à infraestrutura existente, treinamento da equipe e avaliação dos resultados técnicos e econômicos.
A adoção de novas tecnologias pode encontrar barreiras significativas (Figura 3), listadas de forma simplificada a seguir:
● Equipamentos inadequados e/ou conectividade limitada. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 40% das propriedades rurais possuem conectividade. Este fator é o mais restritivo ao uso das tecnologias digitais.
● Potencial de entrega da tecnologia no contexto da propriedade define o grau de adequação e das necessidades de ajuste do sistema para otimização da entrega da mesma.
● Capacitação do pessoal técnico para explorar as potencialidades da tecnologia, é crítico e limitante se não houver possibilidade de treinamento.
● Capacidade de investimento por parte do produtor, restringe as possibilidades de busca por tecnologias digitais.
● Suporte deficiente por parte do fabricante.
● Incompatibilidade entre equipamentos e tecnologias já existentes.
● Insegurança no compartilhamento das informações com as empresas.
● Softwares e aplicativos têm alto potencial de crescimento, mas enfrentam uma falta de conhecimento além das limitações de conectividade. Céleres (2019) calcula que 6% da área agrícola total foi monitorada através de softwares no Brasil em 2018, sendo uma forte tendência nos próximos anos.
A adoção de tecnologias digitais vai mudar radicalmente a agricultura, transformando-a em uma indústria altamente tecnológica. O papel gerencial e operacional do produtor em sua propriedade cederá lugar ao gerencial-estratégico considerando o mercado. O conhecimento de todas as etapas do processo produtivo por parte do produtor será decisivo para que seja avaliado o ganho tecnológico ao seu negócio, permitindo avaliação da sua capacidade competitiva para o atendimento das demandas do mercado. Evidente que, para tanto, é importante compreender a inversão na cadeia de valor. O consumidor será o definidor de todo o processo, e o sistema de produção, até então proeminente, deverá se ajustar tanto à demanda do consumidor como aos sistemas verticais de distribuição.
● Implementos movidos por tração animal - século 19
● Máquinas a combustão - anos 40
● Agroquímicos sintéticos orgânicos ou inorgânicos - anos 60
● Revolução Verde - anos 70
● Plantio Direto - anos 80
● Biotecnologia - anos 90
● Agricultura de Precisão - anos 90
● GPS (global positioning system) - anos 90
● Veículos terrestres autônomos - anos 2000
● Veículos aéreos não tripulados (Vants) - anos 2010
● Sistemas de coleta e gestão de dados - anos 2010
● Digital Farming (agricultura 4.0) - anos 2010
● Data banking, conectividade, robótica (agricultura 5.0) - anos 2020
Ricardo Balardin, Phytus Group
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