Artigo: Soluções para enfrentar o La Niña

09.09.2011 | 20:59 (UTC -3)

De acordo com o boletim emitido em 20 de agosto de 2010 pelo Centro de Previsão de Tempo e Assuntos Climáticos (CPTEC) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o fenômeno La Niña configura-se no pacífico equatorial, com possibilidade de persistir pelo menos até o início de 2011. Para os meses de setembro, outubro e novembro de 2010, a previsão climática de consenso sugere maior probabilidade de chuvas abaixo da média na Região Sul, especialmente no Rio Grande do Sul, enquanto as temperaturas estão previstas dentro da normalidade climatológica. Assim, possivelmente teremos a safra 2010/2011 de soja mais seca que o normal.

O clima mais seco pode favorecer algumas doenças de soja, como oídio, nematoides e podridão cinza da raiz, além de afetar a emergência de plântulas. Por outro lado, doenças diretamente relacionadas com alta umidade, como podridão radicular de fitóftora, podridão vermelha da raiz e ferrugem, não deverão apresentar altas incidência e/ou severidade.

Segundo o pesquisador Ademir Henning, da Embrapa Soja, em 2010 o risco é muito alto de ocorrerem chuvas abaixo da média e mal distribuídas durante o período de semeadura da soja. Nessa situação, é muito importante a conscientização dos sojicultores quanto à utilização de sementes de alta qualidade fisiológica (com altos índices de vigor e de germinação) e sanitária (livres de patógenos), além da necessidade do tratamento de sementes com misturas de fungicidas de contato + sistêmicos, para garantir proteção à semente no solo, evitando ressemeaduras por falhas no estabelecimento do estande. Além disso, em áreas sujeitas ao ataque de lagarta elasmo ou corós, a aplicação de produtos que contenham inseticida poderá ser boa alternativa.

Se a semeadura de soja não for realizada em condições ideais de umidade do solo, poderão ocorrer sérios problemas na emergência. Em tais circunstâncias, o tratamento de semente com fungicidas oferece garantia adicional ao estabelecimento da lavoura a custos reduzidos (estimados em menos de 0,6% do custo de instalação da lavoura). A adoção desta técnica possibilita ao agricultor economizar sementes e evitar operação de ressemeadura, que é extremamente danosa para a rentabilidade da lavoura, pois, muitas vezes, perde-se o período ideal de semeadura, podendo ocorrer troca de cultivar (pela que, normalmente, está sobrando no mercado), além de problemas relacionados com aplicação de herbicidas e adubação, bem como problemas fitossanitários, principalmente a ferrugem da soja, sabidamente mais severa em plantios atrasados.

A eficiência de diversos fungicidas no controle dos principais patógenos transmitidos pela semente de soja, como: Cercospora kikuchii, Cercospora sojina, Fusarium semitectum, Phomopsis spp. e Colletotrichum truncatum, é anualmente avaliada na Embrapa Soja. O controle dos quatro primeiros patógenos é propiciado por fungicidas sistêmicos, especialmente do grupo dos benzimidazóis. Dentre os produtos testados e hoje indicados para tratamento de sementes de soja, os fungicidas dos grupos químicos tiabendazol, carbendazim e tiofanato metílico têm sido os mais eficientes. Os fungicidas de contato, tradicionalmente conhecidos (captan, tiram e tolilfluanid), que apresentam bom desempenho no campo quanto à emergência, não controlam totalmente Phomopsis spp. e F. semitectum nas sementes que apresentam índices elevados destes patógenos (acima de 40%). Por essa razão, tais produtos devem sempre ser utilizados em misturas com fungicida sistêmico (Tabela 1).

Além de controlar estes patógenos, o tratamento de sementes é uma prática eficiente para assegurar populações adequadas de plantas, quando as condições edafoclimáticas durante a semeadura são desfavoráveis à germinação e à rápida emergência da soja, deixando a semente exposta por mais tempo a patógenos habitantes do solo, como: Rhizoctonia solani, Phytophthora sojae, Pythium spp., Sclerotium rolfsii; Fusarium spp. (principalmente F. solani) e Aspergillus spp. (A. flavus) que, entre outros, podem causar a deterioração da semente no solo ou a morte de plântulas.

De acordo com os pesquisadores Álvaro Almeida e Leila Costamilan esta doença é a mais favorecida por períodos de estiagem e altas temperaturas. Provavelmente, será muito frequente durante a safra 2010/11. Há várias safras vem ocorrendo no sul do Brasil, o que significa a presença de alta quantidade de inóculo no campo. Seu sintoma mais visível é a antecipação do ciclo de plantas distribuídas ao acaso ou agrupadas em áreas de solo mais seco, resultando em grãos de menor tamanho e de menor qualidade. Estas plantas apresentam raízes apodrecidas, desprendendo a casca com facilidade, apresentando o lenho de coloração acinzentada. Trabalhos realizados na Embrapa Soja mostraram a correlação entre chuva e ocorrência desta doença, no Paraná. Em ano de deficiência de água, mais de 50% de plantas de soja mostraram a doença aos 105 dias após a semeadura. Nos dois anos seguintes, quando não houve restrição hídrica, este índice atingiu 30% no final do ciclo da cultura.

É uma doença de difícil controle, pois não há cultivares de soja com resistência, a rotação de culturas não é eficiente a curto prazo e o tratamento com fungicidas não tem efeito algum. Para minimizar seus impactos, o agricultor deve investir em formas para manter suprimento adequado de água às plantas, como irrigação, plantio direto (que aumenta a quantidade de matéria orgânica) e melhoria das condições físicas do solo, evitando a compactação e favorecendo o desenvolvimento do sistema radicular.

Segundo a pesquisadora Leila Costamilan esta doença não deverá ocorrer de forma significativa nesta safra, principalmente porque depende de alta umidade no solo para infectar as plantas de soja. Além disto, os agricultores têm preferido usar cultivares resistentes em áreas onde a doença já foi constatada em anos anteriores, diminuindo o risco de desenvolvimento do problema. Somente causará danos como apodrecimento de sementes e morte de plântulas em áreas onde ocorrerem chuvas fortes ou acúmulo de umidade no período de germinação e emergência de plântulas de cultivar suscetível, levando, inclusive, à necessidade de ressemeadura. A doença pode causar, também, sintomas em plantas adultas, como o apodrecimento radicular e o escurecimento da parte inferior da haste e de ramos laterais, associados com chuvas esporádicas durante a safra.

A pesquisadora Cláudia Godoy destaca que para a ocorrência de ferrugem da soja, o ambiente exerce papel relevante no desenvolvimento de epidemias durante a safra, pois a maioria das cultivares é suscetível e o fungo sobrevive de um ano para outro em plantas voluntárias ou em outros hospedeiros. Trabalhos publicados no Exterior e no Brasil mostram que a dispersão e o desenvolvimento da ferrugem são favorecidos pela melhor distribuição da precipitação na safra. A chuva influencia diretamente no período de molhamento foliar (necessário para a infecção), na disseminação (atuando na liberação, dispersão e deposição de esporos do fungo) e também indiretamente, na sobrevivência do inóculo (pela menor exposição dos esporos à radiação UV durante períodos nublados). Conforme os dados do Consórcio Antiferrugem, a evolução da doença tem apresentando padrões distintos nas safras, associados aos padrões de precipitação nas diferentes regiões produtoras (Figura 1). Nas safras 2006/07 e 2009/10, sob influência de El Niño, a ferrugem começou mais cedo e o número total de focos foi maior que na safra 2008/09, sob influência de La Niña. Embora as precipitações pluviais irregulares previstas para a safra 2010/11 possam desfavorecer a evolução de ferrugem, as orientações para o manejo da doença não se alteram, devendo ser realizado o monitoramento das lavouras e o acompanhamento da ocorrência da doença na região. O controle de ferrugem deve ser feito após os sintomas iniciais da doença na lavoura, ou preventivamente, levando em consideração o estádio fenológico da cultura, a presença da ferrugem na região, as condições climáticas, a logística de aplicação, a presença de outras doenças e o custo do controle.

A baixa umidade no inverno, especialmente na região central do Brasil, tem desfavorecido a brotação de plantas voluntárias e a sobrevivência do fungo, contribuindo com o vazio sanitário, que tem como principal objetivo a redução do inóculo do fungo durante a entressafra. Desta forma, espera-se atraso na ocorrência dos primeiros focos de ferrugem na próxima safra, enfatizando ainda mais a necessidade do monitoramento para evitar aplicações desnecessárias de fungicida.

De forma oposta à ferrugem, o oídio da soja é favorecido por condições de baixa umidade relativa do ar e pode predominar principalmente em regiões com temperaturas amenas, caso as previsões climáticas se confirmem. O oídio tem a capacidade de provocar danos de até 35% de produtividade; no entanto, as cultivares apresentam níveis diferenciados de resistência e seu controle pode ser realizado por meio da aplicação de fungicidas.Podridão vermelha da raiz (Fusarium spp.) – Os pesquisadores Claudine Seixas e Álvaro Almeida apontam que provavelmente, esta não será uma doença muito importante nesta safra de La Niña, pois seu desenvolvimento está relacionado com bom suprimento de água no solo. Quatro espécies de Fusarium podem estar associadas aos sintomas da doença, F. tucumaniae é a prevalente no Brasil. Este fungo reduz o volume e a nodulação das raízes. A região do colo da planta apresenta mancha avermelhada. As folhas de plantas infectadas apresentam o sintoma conhecido como folha “carijó”, com manchas cloróticas entre as nervuras das folhas, que posteriormente tornam-se necróticas. Geralmente, plantas com estes sintomas ocorrem em reboleiras.

Solos compactados e com alta umidade favorecem o ataque por esse fungo. O controle dessa doença pode ser auxiliado com a escarificação ou subsolagem, o que permite a “quebra” da camada compactada, favorecendo o desenvolvimento radicular e o aumento da infiltração de água.

Nematoides de galhas – Meloidogyne javanica, M. incógnita e Heterodera glycines – O pesquisador Waldir Dias informa que no caso de nematoides de galhas, as raízes da soja apresentam engrossamento, e as plantas podem murchar nas horas mais quentes do dia, apresentar baixo desenvolvimento e reduzido rendimento de grãos. Com nematoide de cisto, as plantas ficam verde-claras, com menor desenvolvimento e rendimento.

Tudo que é favorável ou negativo para a soja também é bom ou ruim para os nematoides. Em anos de seca, quando falta água no solo, a soja fica mais vulnerável aos danos por estes organismos, devido à dificuldade de absorção de água pelo sistema radicular, provocada por nematoides. A falta de água livre no solo, entretanto, tem a vantagem de dificultar a disseminação destes organismos. Além disto, plantas de soja mais estressadas não favorecerão a multiplicação dos nematoides.

Dessa forma, sabendo-se que algumas doenças de soja podem ser favorecidas por períodos de seca, medidas são recomendadas para diminuir eventuais prejuízos em anos de La Niña. Tratamento de sementes, seleção de cultivares resistentes a oídio e nematoides, controle químico de oídio e melhoria das condições de manutenção de água no solo, principalmente com o uso de plantio direto, são fatores que têm efeito positivo no controle de doenças favorecidas por seca e, consequentemente, no rendimento de grãos de soja.

Embrapa Trigo

Embrapa Soja

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