Utilização de agricultura de precisão no cultivo de vinhedos

A utilização de princípios de agricultura de precisão em vinhedos possibilita aos produtores identificar onde estão as plantas mais produtivas e os frutos com propriedades mais adequadas à produção

06.11.2017 | 21:59 (UTC -3)

É bem reconhecido atualmente que há uma necessidade crescente na agricultura de se adotar gestão localizada, por causa de pressões econômicas e ambientais No entanto, esta gestão exige conhecimento exato sobre a variação espacial das propriedades de solo e planta dentro da lavoura. Na viticultura, em particular, a compreensão da natureza, extensão e causas da variabilidade, nos vinhedos, pode ajudar viticultores e enólogos a usar ferramentas de agricultura de precisão para melhorar as práticas de gestão, tais como a irrigação, a adubação, poda, colheita e destino final da produção, dentro da vinícola.

Neste contexto viticultura de precisão, é um conceito em desenvolvimento, que explora o conhecimento da variabilidade espacial dentro do vinhedo, para projetar estratégias de gestão localizadas. A sua aplicabilidade, porém, depende tanto DE disponibilidade quanto da precisão de informações espacialmente referenciados, de solo e planta.

PARÂMETROS DE SOLO E PLANTA DE RÁPIDO MAPEAMENTO

Dentre os parâmetros importantes na descrição da composição e qualidade da produção no vinhedo estão as condições de solo. Estas afetam o desenvolvimento vegetal. O conhecimento sobre elas é fundamental para o manejo de nutrientes, no manejo da cobertura, do tráfego de máquinas e na adoção de práticas preventivas ou corretivas à compactação, dentre outras.

As relações solo/planta podem modificar a concentração de compostos na baga da uva afetando a qualidade da produção e seus derivados. Em um ambiente de intenso uso agrícola do solo, onde o tráfego de máquinas é crescente, sobretudo com a recente introdução de podadoras, colhedoras automotrizes e outras máquinas, estas relações podem ser alteradas, com prejuízo ao produtor. Por isso, é importante monitorar constantemente as áreas de vinhedo buscando reconhecer as áreas problemáticas, para antecipar práticas de manejo que possam evitar o declínio da videira em função de impactos negativos sobre o ambiente radicular. Estas condições podem ser estimadas pela resistência do solo à penetração de raízes, através do uso de penetrômetros.

Por outro lado, o próprio desenvolvimento do índice de massa vegetal, medido pelo índice de área foliar (IAF) é um descritor do “status" do dossel, sendo um parâmetro balizador do desenvolvimento vegetal. O vigor da videira, estimado pelo IAF, pode ser usado como uma variável auxiliar, para mapear a saúde do vinhedo e, sob certas condições microclimática e de manejo da planta, pode ser usado como um potencial indicador do índice de carga (massa vegetal/massa de fruto).

A videira possui mecanismos fisiológicos de autorregulação, isto é, direciona suas reservas para vigor (crescimento vegetativo) ou para a frutificação (crescimento reprodutivo), de acordo com suas próprias necessidades. Portanto, o vigor da videira pode ser um indicativo da qualidade da produção, pois é conhecimento corrente que vigor da planta e qualidade da uva têm relação inversa, dentro de certos limites do crescimento e desenvolvimento da cultura.

Notadamente, a qualidade da baga é o resultado final apresentado pelo vinhedo em função das condições de solo, planta e microclima a que foi submetida durante a estação de crescimento atual e anterior, e, seu monitoramento é de fundamental importância.

A qualidade da uva pode variar de baga a baga, cacho a cacho e de planta para planta, dentro de uma mesma área. E esta variabilidade é resultado da interação solo-planta-microclima. Um estudo desta variabilidade permitiria a delimitação de zonas de contrastes, aumentando o poder de decisão de manejo da área, principalmente quanto à alocação de recursos, planejamento da colheita e destino da uva colhida.

O conceito de qualidade da uva é difícil de estabelecer e varia conforme a perspectiva em que se analisa a produção. Porém, geralmente se usa o teor de açúcares solúveis (ºBRIX), teor de acidez e pH como indicadores iniciais para evolução da maturação da baga e como norteadores iniciais na vinificação. Porém, sob um mesmo teor de açúcares solúveis pode-se ter uma variação no conteúdo de polifenóis e outros compostos importantes na definição da qualidade da produção. Assim, uma análise mais apurada da qualidade da baga pode incluir outros elementos descritores da qualidade da baga, como o teor de polifenóis. Dentre eles, o teor antocianina tem sido usado como um variável de mapeamento, devido ao seu conteúdo, mais concentrado na película da baga, sendo responsável pela cor do vinho e sucos e por ter sido provado que seu conteúdo tem relação positiva com a qualidade da uva.

TECNOLOGIAS PARA MAPEAMENTO EM VINHEDO

Há várias técnicas atualmente, em desenvolvimento, que podem contribuir para o mapeamento das variáveis descritoras da qualidade de solo e planta. Algumas trabalham com imagens de satélites, outras com imagens obtidas através da videografia aerotransportada, com amostragem de apoio feita na planta e no solo. São técnicas promissoras, mas ainda estão em desenvolvimento.

No entanto, um modo prático de fazer este mapeamento é fazer medidas diretas, “in situ", de modo rápido e prático, um pouco antes da colheita da videira. Novas tecnologias têm permitido se medir diretamente a campo algumas variáveis descritoras da qualidade da uva, que outrora somente se podia fazer em laboratório. Estas técnicas incluem o uso de infravermelho para se quantificar e qualificar elementos da química da uva.

A varredura em malha é de grande importância, pela necessidade de se cobrir uma área com vários pontos de amostragem. A distribuição espacial destes pontos pode ser estudada e os dados sobre a distribuição obtida podem ser utilizados para se fazer um mapeamento preciso da área, através de técnicas de interpolação. Desta maneira é possível segregar zonas contrastantes quanto à qualidade de solo, planta e da uva, e se se buscar aproveitar as oportunidades de manejo surgidas, em função do mapeamento obtido a partir das técnicas em tela.

INTEGRAÇÃO TECNOLÓGICA

No Centro de Engenharia do Instituto Agronômico (CEA/IAC), pesquisas recentes na área têm buscado desenvolver o mapeamento de vinhedos, com base em integração tecnológica, com vistas a obter o mapeamento da qualidade de solo e planta. As variáveis, compactação do solo, desenvolvimento do IAF e qualidade da baga (graduado pelos níveis de antocianina, açúcares solúveis e acidez titulável), têm sido utilizadas como as variáveis norteadoras de mapeamento.

Para poder realizar a varredura, em malha, nas plantações de videiras, foram feitas adaptações em veículo utilitário John Deere Gator modelo TH 6x4 para receber os equipamentos necessários para tal objetivo.

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA COMPACTAÇÃO DO SOLO

Para a medição da resistência à penetração ou compactação do solo, um penetrômetro eletrônico foi integrado à carroceria do veículo utilitário através de um sistema constituído de um chassi em forma de meia lua, com um pino pivot na parte central, ao qual se prende o suporte do penetrômetro. O arco foi construído de aço com perfil em forma de “C", em cujo interior correm rolamentos que permitem o deslocamento angular do penetrômetro. A integração proporcionou versatilidade ao equipamento, permitindo a coleta de amostras em um grande número de posições, na entrelinha da videira, permitindo inclusive, uma curta aproximação da zona da coroa radicular da planta.

Utilizando este equipamento, em um vinhedo, foi feita uma amostragem da resistência do solo à penetração de raízes em 54 pontos distribuídos na área até uma profundidade de 20 cm. Estes pontos foram georeferenciados o que permitiu confeccionar mapas da distribuição da resistência nesta área. Pode-se se observar no Mapa 1 que a zona de maior resistência do solo ocorre na região do canto esquerda da área, acima de 90 metros na direção do Oeste, conforme coordenadas estabelecidas no mapeamento. Nesta região a pressão exercida ultrapassa 1800 kPa, mas a resultados de pesquisa mostram que valores até 2500 kPa são considerados baixos e apresentam pouca limitação ao desenvolvimento das raízes. Apesar de a pressão média exercida na região discutida estar em torno de 1800 a 2750 kPa, conclui-se que, mesmo para os valores mais elevados encontrados na área, não existem problemas sérios de resistência do solo a penetração das raízes na área estudada, até o momento da retirado dos dados em tela.

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DO VIGOR DE PLANTA

Uma das formas de estimar o vigor das videiras é através o índice de área foliar (IAF). Para a determinação do IAF fez uma correlação da área das folhas da videira em uma foto digital. A imagem digital do dossel é obtida através de uma câmera controlada por um laptop, e colocada em um braço construído de tubos quadrados metálicos que passa sobre a planta a ser fotografada. O laptop foi colocado sobre um suporte adaptado sobre o painel do veículo e alimentado pela sua bateria. Para melhorar o contraste e isolar a planta do resto da paisagem foi colocada uma tela retrátil de fundo branca.

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA QUALIDADE DA BAGA

Para testar uma varredura em campo, utilizaram-se algumas variáveis experimentais. Determinar a campo uma malha de pontos para os teores de sólidos solúveis, acidez total e antocianina, presentes na baga, durante a safra de 2012, em Jundiaí (SP). Um espectroscópio (Brimrose Corp.), operando na faixa do infravermelho próximo (IVP), portátil e miniaturizado foi embarcado no veículo utilitário. O equipamento contém tecnologia com base em filtro ajustável através de relação óptico-acústica, que fraciona a luz (laser) em faixas de frequências precisas.

Após a calibração do equipamento, em laboratório, foram feitas amostragens na zona de frutificação da videira, visando à estimativa dos parâmetros descritores da qualidade da produção. Os dados médios de transmitância das bagas da uva, que constituem a assinatura espectral destes parâmetros, evidenciaram claramente picos de passagem da luz bem acentuado, próximo da microbanda de 1300 nm e um segundo pico próximo a 1600 nm, além de outros picos menores ao longo da faixa do infravermelho próximo.

Os resultados da integração e georreferenciamento dos dados obtidos através da espectroscopia permitiram fazer o mapeamento para as dados descritores da qualidade da uva. Pode-se observar no mapa que, para a mesma área, as zonas de depressão em antocianina, são coincidentes com aquelas zonas em que ocorre elevação da acidez titulável, o que também ocorre concomitantemente com um abaixamento no acúmulo de sólidos solúveis. Esta situação está bem clara para a porção à direita das imagens.

No entanto, seria necessário ainda investigar mais dados de solo e de planta, em escala compatível com a segmentação apresentada, para se concluir corretamente sobre as causas da depressão observadas nas variáveis estudadas em campo. Notadamente, a disponibilidade e dinâmica da água no solo, assim como a penetração da radiação solar direta e indireta no dossel, são variáveis capazes de contribuir para as ocorrências, em discussão.

Por outro lado, os dados sugerem que numa divisão inicial da produção, da área discutida, poderia haver uma separação da uva, fazendo-se uma fermentação separada para a uva proveniente das porções mais deprimidas em antocianina (Figura 1), evitando-se misturar a uva oriunda desta área, com àquelas provenientes da porção mais a esquerda, na imagem, onde os valores de sólidos solúveis e antocianina são crescentes.

Com isto, se pode vislumbrar a fabricação de dois vinhos diferentes, provenientes da mesma área de cultivo, o que pode se justificar se for possível obter preços mais favoráveis para vinhos provenientes das zonas consideradas de maior qualidade da baga.

Portanto, a integração e calibração de instrumentos permitiram a amostragem em varredura de dados de solo e planta e o mapeamento de variáveis descritoras da qualidade da produção e do ambiente de cultivo da videira, demonstrando-se o aumento do poder de decisão que se pode obter a partir do conhecimento mais detalhado do vinhedo.

Este artigo foi publicado na edição 140 da revista Cultivar Máquinas. Clique aqui para ler a edição.

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