Nas últimas três décadas, a produção brasileira de batata (Solanum tuberosum L.) cresceu cerca de 70%, reflexo, entre outras coisas, da sanidade das lavouras. A média brasileira de área cultivada é 138 mil ha, com produção de três milhões de toneladas e produtividade de 21 t/ha em duas ou três safras anuais (Tabela 1). Essa produtividade é considerada baixa, com exceção da Bahia (32 t/ha), quando comparada com países da América do Norte e Europa, onde ultrapassa 30 t/ha. Os estados brasileiros maiores produtores de batata são Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul (Tabela 1 -
). O baixo rendimento, particularmente de alguns estados, pode ser ocasionado, entre outros motivos, pela baixa qualidade fitossanitária dos tubérculos-semente utilizados na produção, pois a batata é uma cultura que se propaga por tubérculos, e esta forma de propagação favorece a disseminação de vários patógenos.
No Brasil, cerca de 13% da produção de batata é destinada à semente, mas apenas 20 a 30% apresentam sementes de qualidade (certificada). A produção de batata-semente certificada é regulada por normas específicas (Instrução Normativa No. 5, de 8 de março de 2004, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), tendo por objetivos principais a preservação da identidade genética, a produção de material com baixo nível de infecção e infestação de vírus, bactérias, nematóides e outros agentes patogênicos capazes de reduzir, nas condições brasileiras, seu potencial de produção e/ou multiplicação. A proposta atual de categorias para produção de batata-semente é a seguinte:
1. Genética – material de reprodução sob a responsabilidade e controle direto de seu obtentor ou introdutor;
2. Básica G0 (muda, planta in vitro e minitubérculo):
3. Básica G1 (primeira colheita a campo);
4. Básica G2 (segunda colheita a campo);
5. Básica G3 (terceira colheita a campo);
6. Certificada de primeira geração (quarta colheita a campo);
7. Certificada de segunda geração (quinta colheita a campo).
As pectobactérias têm como característica principal a capacidade de produção de enzimas pectolíticas em grande quantidade, que ocasiona a rápida maceração dos tubérculos (podridão-mole) e dos tecidos da haste (canela-preta e podridão-da-haste). Existem duas espécies de Pectobacterium:
e
(Pch).
apresenta cinco subespécies: atrosepticum (Pca), betavasculorum (Pcb), carotovorum (Pcc), odoriferum (Pco) e wasabiae (Pcw). Pca era tida como a única capaz de causar canela-preta em batata no estágio inicial de crescimento, as demais causariam podridão mole; ambas as doenças causam perdas consideráveis na produção. Recentemente outra subespécie foi proposta, P. carotovorum subsp. brasiliensis (Pcbr). Existem evidências de que esta subespécie predomina no Brasil e, talvez, na América do Sul.
A ocorrência das espécies e subespécies de pectobactérias está associada à capacidade de sua adaptação a determinadas temperaturas; Pca se adapta melhor a temperaturas baixas (15-20 °C), sendo predominante em regiões temperadas, Pcc tem ampla distribuição nas zonas temperada e tropical (20-25 °C), e Pch predomina em zonas mais quentes. Pcbr tem sido encontrada tanto nas temperaturas adequadas à Pca como à Pch.
Uma pesquisa conduzida pela UFRGS, para conhecer a população de pectobactérias, associadas à canela-preta, nas lavouras de batata do RS, trouxe algumas informações interessantes, visto que muito pouco tem sido publicado a respeito no Brasil. O trabalho constou da coleta de plantas com sintomas em 22 lavouras em nove municípios de quatro regiões produtoras: Serra do Nordeste, Planalto, Depressão Central e Grandes Lagoas, nos meses de setembro a dezembro de 1999 (safra primavera-verão). Entre 408 estirpes estudadas, 55, 42 e 1% foram identificadas como Pcbr, Pcc e Pch, respectivamente. Oito isolados não se enquadraram nos padrões de identificação utilizados.
Muitas são as fontes de inóculo de pectobactérias, sendo o mais importante o tubérculo-semente infectado, que dissemina o patógeno onde for plantado, levando-o para novas áreas.
Outra pesquisa, conduzida pela UFRGS, constou da coleta de tubérculos de batata-semente pré-básica, básica, registrada e certificada, de oito cultivares, oriundos de 21 lavouras localizadas nos municípios de Vacaria, Canguçu, Piratini e Ibiraiaras, no RS, nos meses de maio a agosto de 2002. Pectobactérias foram detectadas nos tubérculos-semente das 21 lavouras; 120 e 95 isolados foram identificados como Pcbr e Pcc, respectivamente. Oito isolados não se enquadraram na classificação bioquímica. A conclusão foi que subespécies de Pc estão presentes em tubérculos de batata-semente, independente da cultivar, classe ou município de origem. Pca, a principal responsável por incitar canela-preta em batata em outros países, não foi verificada.
É comum encontrar num mesmo hospedeiro mais de uma espécie ou subespécie de pectobactéria, não sendo possível determinar, apenas pelo sintoma, qual está presente.
Pesquisas complementares da UFRGS indicaram a ocorrência de Pcbr e Pcc e a ausência de Pca em tubérculos de batata-consumo oriundos da Argentina e Chile.
Considera-se que as únicas pectobactérias capazes de produzir sintoma típico de canela-preta a partir de tubérculos-semente infectados são Pca e Pcbr, pois estas permanecem na forma latente no sistema vascular, esperando as condições de desenvolvimento serem favoráveis, assim, deslocam-se através dos vasos, chegando ao colo da planta e causando canela-preta. Pcbr é considerada no Brasil e, talvez, na América do Sul, a responsável por esta doença a partir da infecção do sistema vascular. Pca é a maior responsável pela doença em países da América do Norte e Europa. Existem algumas controvérsias sobre estas afirmações, e pesquisas estão sendo conduzidas para comprovação.
A resposta da pergunta formulada anteriormente sobre a importância da identificação da pectobactéria presente no tubérculo-semente está no fato de que nem toda a pectobactéria está bem adaptada à batata e é capaz de causar os três tipos de sintomas. A adaptação inclui a capacidade de permanecer protegida dentro de lenticelas e do sistema vascular.
Diversos métodos podem ser utilizados para a detecção e identificação destas bactérias. O Laboratório Oficial de Diagnóstico Fitossanitário da UFRGS (http://www.ufrgs.br/agro/fitossan/clinica/default.html), credenciado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, presta serviços à comunidade em geral, no sentido de diagnosticar doenças e pragas de plantas. No isolamento, meios de cultura específicos são usados para a distinção das pectobactérias de outras bactérias comuns do solo. Mas, para a identificação exata das espécies e subespécies, é necessário o uso de outras técnicas, como testes bioquímicos e fisiológicos, assim como testes imunológicos, como imunoflorescência e ELISA (Enzyme-linked Immunosorbent Assay). A técnica da reação em cadeia da polimerase ou PCR (Polymerase Chain Reaction) também tem sido utilizada para a identificação e detecção destes patógenos em tubérculos e hastes de plantas de batata.
Apesar de pouco recomendado para doenças bacterianas, pode apresentar algum resultado se adotado como medida complementar de controle de canela-preta em batata. O tratamento preventivo, imergindo a batata-semente em solução do antibiótico kasugamicina (Hokko Kasumin), precisa ser acompanhado da preocupação de manter o produto ativo, renovando a solução, e de evitar a persistência do filme de água na superfície do tubérculo, que dará condições de anaerobiose que predispõe os tecidos a esta bactéria.
O manejo integrado das doenças causadas por pectobactérias deve considerar como meta principal iniciar com tubérculos-semente livres do patógeno. Adquirir tubérculo-semente de fonte credenciada, com compromisso com a qualidade fitossanitária do material, é o primeiro passo para uma lavoura rentável, com alto rendimento. As demais medidas complementam!
Dentro da gama de patógenos que atacam a batata, as pectobactérias (Sin. Erwinia) são de grande importância, pois podem permanecer nas aberturas naturais dos tubérculos (lenticelas), tecidos suberizados e no estolão (sistema vascular) na forma latente, sem causar doença, até que as condições de temperatura, umidade e aeração sejam favoráveis para a sua multiplicação.
As perdas causadas pela ação das pectobactérias são estimadas em 10 a 40% na fase de desenvolvimento da cultura e podem chegar até 100% durante o armazenamento.
Esta doença caracteriza-se pela ação da bactéria no tubérculo, primeiramente, na forma de uma mancha aquosa de cor creme, seguida da degradação dos tecidos da batata, tornando a área afetada amolecida, com escurecimento das bordas, que se desprendem facilmente do tecido sadio, exalando um mau cheiro devido à proliferação de outros microorganismos. A deterioração é rápida, ocorrendo em poucos dias, e a bactéria facilmente infecta outros tubérculos.
O sintoma é caracterizado pelo enegrecimento do colo da planta, originado pela colonização sistêmica a partir da batata-semente infectada. Quando a doença ocorre antes da emergência dos ramos, a batata-semente e os brotos apodrecem, diminuindo o estande de plantas na lavoura. Na pós-emergência, as folhas apresentam inicialmente enrolamento, evoluindo para amarelecimento e murcha, as hastes primeiramente descolorem, tornando-se marrom e negras. Também é conhecida por talo-oco.
Esta doença não ocorre a partir da batata-semente, mas de outras fontes de pectobactérias, sendo as aberturas naturais e ferimentos nas hastes as principais portas de entrada. As lesões aparecem primeiramente como áreas marrons a negras irregulares, que evoluem para podridão, fazendo com que a haste murche e morra.
e
UFRGS
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