Uma visão da tendência internacional no desenvolvimento de biocombustíveis, partilhada por muitos especialistas, é a de que os biocombustíveis de primeira geração (etanol de sacarose e amido; biodiesel produzido pela transesterificação de óleos e gorduras com etanol ou metanol) atualmente disponíveis serão seguidos pelos chamados “biocombustíveis de segunda geração”, que incluem diesel produzido por gás de síntese em processos termoquímicos e etanol a partir de materiais lignocelulósicos por processos químicos e enzimáticos. Em seguida, nesta linha do tempo, biorrefinarias integradas serão construídas para aproveitamento integral de energia, biocombustíveis e um grande número de produtos químicos e bioquímicos a partir da biomassa.
Para todos os países, o desafio das políticas públicas para energia é basicamente o de garantir o abastecimento a longo prazo e obter menores preços e diversificação de fontes mantendo a competitividade da energia produzida localmente. Tais objetivos devem ser alcançados considerando-se o desenvolvimento sustentável e minimizando os problemas ambientais causados pelas emissões. Por essa razão, o governo brasileiro tem direcionado suas políticas públicas favorecendo o desenvolvimento e fortalecimento dos biocombustíveis.
Os biocombustíveis promovem uma série de ganhos ambientais (seqüestro de carbono, menor nível de emissões), são renováveis (ciclo de produção curto, com o processo quase que inteiramente controlado pelo homem) e promovem impactos sócio-econômicos positivos (geração de empregos, melhor distribuição de renda, aumento de exportação e possibilidade de complementar a demanda energética global).
O Brasil apresenta todas as condições para o desenvolvimento de um programa nacional amplo e sustentável de produção de biocombustíveis: elevada diversidade de matérias primas adequadas às diferentes regiões, amplo potencial para expansão agrícola, recursos humanos capacitados, amplo setor industrial de óleos vegetais e de álcool, experiência e liderança mundial no negócio de biocombustíveis (etanol). Para definir as diretrizes básicas para produção de energia de biomassa no país foi elaborado o Plano Brasileiro de Agroenergia (PNA) 2006 – 2011, cujo objetivo fundamental é assegurar a liderança internacional do país no novo setor da agroenergia.
A implementação do PNA se baseia no fortalecimento do componente de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I), com foco em 4 plataformas (biodiesel, etanol, florestas energéticas e aproveitamento de resíduos), e inclui um portfolio de projetos envolvendo o desenvolvimento de tecnologia agrícola (sistemas de produção sustentáveis), tecnologia industrial (processos eficientes de conversão) e estudos transversais (mercados, impactos sócio-econômicos e ambientais, entre outros). Dessa forma, o país pretende consolidar sua liderança nos biocombustíveis de 1ª geração e desenvolver combustíveis de 2ª geração, agrobiotecnologia (sementes, enzimas e microrganismos) e concretizar o conceito de biorrefinaria, produtos químicos e bioquímicos “verdes” (polímeros, resinas). As cadeias de produção de agroenergia deverão ser organizadas, a médio prazo, incluindo combustíveis de 1ª e 2ª geração e bioeletricidade.
Para definir a visão e ações esperadas da Embrapa para o desenvolvimento do setor de agroenergia, é apropriado usar como referência o Plano Diretor da empresa (PDE) para o período de 2008-2023. Neste documento, os objetivos estratégicos da Embrapa descrevem os desafios científicos e tecnológicos que a empresa planeja enfrentar, definindo resultados de alta prioridade que deverão ser alcançados dentro do período coberto pelo plano estratégico. Dos cinco objetivos estratégicos (OE) definidos no PDE, o segundo é especificamente dedicado à agroenergia: “Atingir um novo patamar tecnológico competitivo em agroenergia e biocombustíveis”.
Para alcance deste OE, duas estratégias prioritárias de médio prazo (2011) foram selecionadas: 1) Estender o esforço de PD&I ao desenvolvimento de novas tecnologias de energia (etanol de celulose, produtos de biorrefino, hidrogênio) e 2) Desenvolver tecnologias para aproveitamento de co-produtos e resíduos. Para o longo prazo (2023), três prioridades estratégicas estão incluídas: 1) Intensificar PD&I orientados para o desenvolvimento de novos processos produtivos e cultivares com características superiores para produção de energia; 2) Ampliar o esforço de zoneamento e avaliação de impactos ecológicos, econômicos e sociais para a identificação de áreas competitivas e sustentáveis à produção de agroenergia e 3) Desenvolver tecnologias e sistemas de produção visando o aproveitamento de áreas degradadas para a produção de bioenergia.
Em resposta ao PNA 2006 – 2011, e considerando as prioridades estabelecidas em seu Plano Diretor, a Embrapa atualmente desenvolve um portfolio de projetos no tema agroenergia. Dentre eles, os esforços presentes para o desenvolvimento de processos industriais em etanol, são principalmente relacionados ao desenvolvimento de processos de 2ª geração, incluindo ações articuladas para: a) caracterizar e selecionar fontes alternativas de matéria-prima com melhores características para a produção de etanol lignocelulósico; b) prospectar e selecionar microrganismos para a produção de enzimas hidrolíticas da parede celular e para fermentação alcoólica de pentoses e hexoses; c) prospectar, sintetizar e caracterizar genes envolvidos na síntese de enzimas hidrolíticas para aumentar sua atividade específica ou para a consolidação dos processos de conversão; d) desenvolver processos de conversão mais eficientes utilizando matérias-primas, microrganismos e enzimas melhorados visando à produção sustentável de etanol a partir de matéria-prima lignocelulósica.
Na pesquisa e desenvolvimento de processos relacionados à produção de biodiesel, os principais esforços científicos e tecnológicos da Embrapa estão relacionados a: a) caracterizar, selecionar e desenvolver sistemas sustentáveis de produção de matérias-primas alternativas com melhores características para a produção de biodiesel; b) desenvolvimento da rota etílica; c) desenvolvimento de alternativas sustentáveis para o uso de resíduos (especialmente glicerina e tortas resultantes da extração do óleo); e d) caracterização das propriedades e teste das tecnologias de processamento de biodiesel utilizando matérias-primas alternativas para aumentar e diversificar a produção nacional.
A Embrapa Agroenergia esta ciente de que no desenvolvimento de processos industriais de conversão da biomassa em biocombustíveis, além dos desafios técnicos, um grande desafio que não pode ser subestimado é a governança dos processos de PD&I, envolvendo a integração de esforços, trabalhos em rede, alocação adequada e compartilhamento de recursos humanos, físicos e financeiros e estabelecimento de parcerias público-privadas, entre outros aspectos. Longe de ser meramente operacionais, aqueles relacionados à gestão serão absolutamente fundamentais para que as ações destinadas ao desenvolvimento de processos industriais de conversão de biomassas em biocombustíveis sejam profícuas no sentido de que o Brasil mantenha a liderança tecnológica e industrial em vários dos aspectos citados.
Esdras Sundfeld
Chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agroenergia
Cristina Machado
Pesquisadora da Embrapa Agroenergia
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