Controle, apesar de necessário, exige muito critério para preservar a lucratividade de modo sustentável
07.10.2022 | 16:27 (UTC -3)
O cafeeiro é uma cultura perene bastante predisposta à competição de daninhas, o que pode resultar em prejuízos diretos pela redução de crescimento e produtividade, bem como indiretos, por estas plantas dificultarem o manejo e servirem de hospedeiras para patógenos ou vetores de importantes doenças. Seu controle, apesar de necessário, exige muito critério para preservar a lucratividade de modo sustentável.
Cada
cultura agrícola apresenta um nível diferenciado de sensibilidade à presença de
plantas daninhas, que depende, principalmente, das características intrínsecas
de cada espécie de planta cultivada e do seu sistema de cultivo. A planta de
café e sua forma de cultivo apresentam, por exemplo, algumas peculiaridades que
favorecem a infestação de plantas daninhas e, ou, tornam a cultura sensível aos
efeitos prejudiciais da comunidade infestante.
Inicialmente,
é preciso lembrar que o cafeeiro é uma planta perene. Isso quer dizer que seu
ciclo de vida supera dois anos. Na verdade, o cafeeiro é uma planta que vive
muitos anos, podendo sua vida produtiva estender-se por mais de 30 anos. Como a
maioria das plantas perenes, o crescimento inicial do cafeeiro é lento, comparado
àquele de plantas anuais. Assim, a formação da sua copa ocorre lentamente após
o transplantio. Consequentemente, não há uma boa cobertura do solo durante a
fase de formação da lavoura, período que se estende por 18 meses a 24 meses
após o transplantio.
Essa
Rubiácea (família botânica à qual o cafeeiro pertence) é tradicionalmente
cultivada em linhas de plantio paralelas, distanciadas umas das outras em 3,0m
a 4,0m. O espaçamento entre uma planta e outra dentro da linha de plantio varia
geralmente de 0,5m a 1,0m, dependendo do cultivar e do sistema de cultivo. Logo,
o amplo espaçamento de cultivo, associado ao crescimento relativamente lento da
copa (cujo diâmetro na fase adulta praticamente não ultrapassa os 2,0 m), deixa
uma grande área de solo exposta na lavoura, sobretudo nas fases iniciais de
cultivo, permitindo, assim, forte infestação e crescimento de plantas daninhas.
Logo
após o transplantio, as mudas de café, sejam provenientes de sacolinhas (mudas
de torrão) ou de tubetes apresentam sistema radicular incipiente e superficial,
com uma capacidade limitada de absorção de nutrientes diante dos sistemas
radiculares agressivos de plantas daninhas, principalmente daquelas de ciclo anual
de crescimento rápido.
O
plantio do cafeeiro no campo, sobretudo nas áreas de sequeiro, é realizado
geralmente no final da primavera, portanto no início da estação chuvosa
(novembro), época em que há maior oferta hídrica. Da mesma forma, nesse período ocorrem temperaturas
relativamente altas. Todos esses fatores contribuem para estimular a germinação
das sementes de plantas daninhas e, principalmente, para seu crescimento
rápido, o que agrava os efeitos prejudiciais dessas plantas sobre o cafeeiro.
Seu
plantio ocorre em covas ou sulcos devidamente preparados para esse fim. Adiciona-se
matéria orgânica (que muitas vezes é a fonte principal de sementes de plantas
daninhas), fertilizantes e corretivos que, juntamente ao grande revolvimento do
solo para as operações de plantio, estimulam ou potencializam a infestação das
plantas daninhas, muito proximamente ao caule do cafeeiro, agravando o processo
competitivo.
Durante
a fase adulta, as lavouras em produção comumente passam por dois processos
necessários à colheita, que são a arruação (na pré-colheita) e a esparramação
do “cisco” (após a colheita). Essas práticas consistem, respectivamente, em
retirar e retornar os resíduos vegetais existentes debaixo da copa do cafeeiro,
para permitir o recolhimento dos grãos de café que caem (naturalmente ou
durante a colheita) ao chão. Ao mesmo tempo em que são práticas que acabam por
fazer um controle mecânico direto de eventuais plantas daninhas existentes,
sobretudo sob a copa do cafeeiro, também espalham sementes de plantas daninhas
pela lavoura, podendo potencializar a reinfestação da área, logo que se inicie
a próxima estação chuvosa.
Tomadas
em conjunto, essas características da cafeicultura e da própria planta de café
permitem que as plantas daninhas infestem as lavouras, prejudicando seu
crescimento e a produtividade. Isso ocorre basicamente pela competição direta
por recursos, como água, luz e nutrientes minerais, reduzindo sua oferta ao cafeeiro,
sobretudo nas fases iniciais de cultivo, como demonstrado em diversos trabalhos
científicos. Mas os prejuízos não residem apenas nisso. As plantas daninhas
podem comprometer o manejo da cultura, por exemplo, reduzindo a eficiência da
distribuição de adubos e corretivos, da aplicação de defensivos para controle
fitossanitário, assim como o recolhimento do café do chão, durante a colheita.
Não obstante, plantas daninhas podem hospedar patógenos ou vetores de
importantes doenças do cafeeiro. Diante disso, o controle de plantas daninhas é
uma prática comum durante todas as etapas de produção de café na fazenda.
O
controle começa cedo, ainda no momento da limpeza da área para construção do
viveiro e aquisição de terra e matéria orgânica (esterco) para produção de
mudas. No viveiro, as plantas daninhas que germinam junto às mudas de café
devem ser eliminadas. A área na qual a lavoura será implantada deve ter a
vegetação parcial (somente na linha de plantio) ou totalmente removida,
dependendo do sistema de cultivo e região. Logo após o transplantio e nos
primeiros 18 meses que se seguem, a lavoura passa por um período de alta
sensibilidade competitiva, devendo ser adotado, portanto, um manejo integrado de
plantas daninhas, apropriado para cada situação. Finalmente, nas lavouras em
produção ou naquelas podadas, devem ser efetuadas práticas sustentáveis de
manejo de plantas daninhas para mitigar a competição e garantir o crescimento e
a produtividade da cultura ao longo dos anos, pois, afinal de contas, trata-se
de uma cultura perene. É importante registrar, entretanto, que todas as
práticas de controle empregadas na cafeicultura devem ser muito bem
posicionadas pela adoção do manejo integrado para assegurar, dentre vários
aspectos, os benefícios ambientais que as plantas daninhas podem agregar à
lavoura.
Percebe-se, portanto, que as práticas de controle de plantas
daninhas são necessárias para garantir produtividades satisfatórias. Todavia,
têm um custo associado. Logo, estão
diretamente relacionadas à sustentabilidade econômica da produção de café.
Isso, pois, dentre os diversos fatores que afetam a lucratividade da lavoura de
café (e.g. preço de venda), o aumento da produtividade (medida em sacas de 60
kg de café beneficiado por hectare) paralelamente à redução no custo de produção,
tendem, em conjunto, a aumentar a lucratividade da atividade. Consequentemente,
quando as plantas daninhas (e seu controle) são consideradas no sistema de
produção, podem comprometer a lucratividade da cafeicultura tanto por reduzir a
produtividade em decorrência da competição, quanto por aumentar o custo de
produção, pois o produtor precisará desembolsar recursos financeiros para o
controle. Dessa forma, é possível deduzir que as práticas empregadas no
controle de plantas daninhas na lavoura de café têm de ser apropriadamente
balanceadas para reduzir ao mínimo a competição, para potencializar as
produtividades, mas, simultaneamente, com o menor custo possível.
É
preciso, entretanto, cautela quando se pensa em redução de custo de controle de
plantas no cafeeiro, pois isso pode ter reflexos muito negativos na
produtividade. Para exemplificar, considere-se o custo das operações
mecanizadas de controle em lavouras altamente mecanizáveis (e.g. lavouras no
Cerrado Mineiro). Nessas áreas, o custo com mão-de-obra, herbicidas, óleo
diesel ou manutenção de implementos como roçadoras, trinchas ou aplicadores de
herbicidas é muito baixo. Todavia, não pode ser negligenciado, pois, caso
contrário, as perdas de produtividade pela competição reduzirão significativamente
a lucratividade da produção de café.
É
possível concluir que o manejo de plantas daninhas nas lavouras de café deve
ser realizado com muito critério, sobretudo para compensar a grande sensibilidade
do cafeeiro à presença de plantas daninhas. Infelizmente, apesar da grande
importância econômica e social do cafeeiro no Brasil e no mundo, há certa
carência de informações científicas sobre os diversos aspectos relativos a essa
área de conhecimento, quando comparada a outras culturas também importantes.
Isso ocorre tanto para o (Coffeea arabica)
quanto para o (Coffea canephora),
sendo que para este último (aqui no Brasil representado pela variedade conilon)
são ainda mais escassas. Não obstante, o café é produzido no Brasil em
diferentes regiões, sob diversos sistemas de cultivo. Logo, os métodos de
controle de plantas daninhas empregados pelos cafeicultores podem variar
consideravelmente entre lavouras, o que é necessário para se adequar às realidades
de cada lavoura.
Cláudio
Pagotto Ronchi, UFV
Artigo publicado na edição 230 da Cultivar Grandes Culturas, mês julho, ano 2018.
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