Integração lavoura-pecuária (ILP) é a denominação que se dá a sistemas de produção que integram atividades de agricultura e de pecuária de forma sinérgica e sistêmica. Sua importância pode ser atestada pelo fato de atingirem 2,5 bilhões de hectares no mundo, sendo responsáveis por mais de 50% da carne e mais de 90% do leite consumidos. Esses sistemas de produção são particularmente importantes para países em desenvolvimento, pois, dos pobres das áreas rurais, 2/3 têm animais em suas pequenas propriedades e 60% desses utilizam sistemas integrados de exploração.
Se não recente, a ILP é um conceito, por assim dizer, re-emergente. O renovado interesse na ILP tem relação com o potencial deste conceito de produção em trazer não somente benefícios econômicos, mas também ambientais, particularmente quando associado a outras tecnologias de conservação, tal qual o sistema em plantio direto (SPD). ILP em SPD é uma tecnologia genuinamente brasileira. Resulta um sistema em que as benesses aportadas pelo SPD, tais como a conservação estrutural do solo e o aumento da matéria orgânica, entre outras, são potencializadas pela introdução de espécies forrageiras. De forma geral, as forrageiras acumulam ainda mais carbono do que as culturas agrícolas, cujos resíduos se mostram, muitas vezes, insuficientes para a manutenção da cobertura do solo.
Tão fundamental quanto isto, a rotação com plantas forrageiras, e mais especificamente a presença do animal em pastejo em ciclos entre culturas, traz um componente de diversidade ao sistema que não se atinge apenas com o SPD. A presença do animal em pastejo modifica as rotas e a dinâmica da ciclagem de nutrientes no sistema, beneficiando a cultura em sucessão quando a intensidade de pastejo é manejada adequadamente. Pesquisas têm demonstrado que a ILP promove a reciclagem e eficiência no uso dos nutrientes, o aumento dos teores de matéria orgânica do solo, o incremento da biomassa microbiana, a diminuição de pragas e doenças no ciclo agrícola e o aumento da profundidade de reação do calcário aplicado em cobertura. Esses e outros efeitos benéficos aportados pela pecuária ao sistema, tais como o aumento da eficiência do uso da terra, maquinário e instalações, aumento de liquidez e melhoria do fluxo de caixa, etc., têm promovido os sistemas de ILP a ponto de serem, hoje, reconhecidos como estratégicos para o desenvolvimento nacional.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento criou, recentemente, o Comitê Nacional do Projeto Integração Lavoura Pecuária (Prolapec), que visa financiar projetos nessa linha, vislumbrando não somente o potencial de produção de riqueza desta tecnologia, mas também a perspectiva de diminuição do desmatamento de novas áreas na Amazônia a partir do incremento de eficiência das áreas sob ILP.
A ILP vem aumentando em todo o país. No Cerrado, a ILP tem sido utilizada como uma estratégia de recuperação de áreas de pastagens degradadas. A ILP promove um ou mais ciclos de agricultura para, então, retornar a pastagem em solos com maior fertilidade. Neste sistema é a agricultura que se associa à pecuária e o promotor desta associação é o pagamento dos custos da adubação por meio da produção agrícola. Um outro tipo de ILP tem ocorrido a partir da associação da pecuária à agricultura, na medida em que as rotações das principais culturas agrícolas em SPD, em muitas regiões, não acumulem biomassa sufiente para a manutenção da cobertura de palha necessária ao sistema. Neste caso, o promotor da integração é o potencial que as plantas forrageiras têm de acumular biomassa e garantir a cobertura do solo.
Já no sul do Brasil a ILP tem como concepção de base à rotação de culturas, e tem sido proposta como alternativa às clássicas rotações entre culturas anuais de verão e as culturas anuais de inverno. Na medida em que as culturas de inverno não têm sido alvo de maior interesse por parte dos produtores (problemas sanitários, de custo, de preço, etc.), o uso de forrageiras anuais de inverno (particularmente a aveia preta e o azevém) tem se apresentado como opção aos cultivos de inverno. Soma-se a isso o fato de que a imprevisibilidade das culturas de verão, seja em termos de rendimento ou de preço, tem trazido intranqüilidade ao produtor. Aqueles que trabalham com ILP testemunham a diminuição dos riscos da operação agrícola pela agregação de uma atividade cujas variações de preço e de produtividade são muito menores, comparativamente. Simulações realizadas em 2003 pela UFRGS em conjunto com a UFPR atestaram que, para a região do Alto Vale Uruguai no RS, os sistemas de produção de soja apresentavam rentabilidade negativa com colheitas inferiores a 25 sacas/ha. Já com ILP a rentabilidade negativa somente ocorria com colheitas inferiores a 3 sacas/ha, demonstrando o potencial dos sistemas integrados em diminuir os riscos inerentes à atividade agrícola.
No entanto, paradigmas quanto à compactação dos animais em SPD que impedem o avanço mais relevante desta tecnologia no sul do Brasil. Dos 14,9 milhões de hectares em cultivos anuais de verão nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (safra 2005/2006), apenas 2,8 milhões se tornam cultivos de inverno. Isto significa que mais de 12 milhões de hectares esteja em pousio ou, mais comumente, com culturas de cobertura (geralmente aveia preta e azevém) cuja única finalidade é a de proteger o solo e produzir palha para a cultura de verão. Uma pequena parte dessas áreas de inverno é utilizada com animais em pastejo, mas o mais comum é se encontrar áreas que nem mesmo têm cercas, com plantas forrageiras em cobertura, mas sem pastejo, enquanto a maior parte da população bovina da região sofre de restrição alimentar nesse mesmo período.
No atual contexto social e econômico, a cobertura do solo com forrageiras tendo por único objetivo produzir palha é injustificável. Só no RS estima-se que 400.000 toneladas de peso vivo deixem de ser produzidas. Isto é riqueza que está disponível e deixa de ser colhida. Pesquisas da UFRGS e da UFPR têm demonstrado há anos que intensidades de pastejo moderadas não comprometem os atributos físicos do solo, tampouco o rendimento das culturas em sucessão. Pelo contrário, o pastejo potencializa os efeitos do plantio direto e as características químicas do solo.
O Brasil tem se destacado em nível mundial por desenvolver sistemas de integração onde as qualidades acima são ainda mais potencializadas, ao se adaptar as rotações agrícolas e pecuárias às premissas do sistema em plantio direto. Tendo em vista todo este contexto o grupo de pesquisa em Integração Lavoura-Pecuária registrado junto ao CNPq, constituído de pesquisadores de várias instituições, concluiu que era chegado o momento de organizar um simpósio internacional neste tema além de oferecer cursos de pós-graduação para profissionais que queiram se tornar especialistas neste assunto. Este Simpósio pretende reforçar esta posição de liderança e ao mesmo tempo reunir o estado da arte em sistemas integrados de lavoura com pecuária que são conduzidos nas diferentes zonas tropicais e temperadas do mundo. Além do intercâmbio científico e da criação de um network nesta temática, resultará um livro que deverá ser considerado como referência no assunto. O segundo curso de especialização em ILP será ofertado no formato de curso à distância com alguns encontros presenciais para permitir que um grande número de profissionais de todo País tenha possibilidade de investir no conhecimento desta área e fazer uso destas novas tecnologias a campo. O início deste curso será coincidente com o Simpósio Internacional que ocorrerá em Curitiba nos dias 13-15 de Agosto de 2007 sendo este o primeiro encontro presencial.
Prof. Adj., Faculdade de Agronomia da UFRGS (paulocfc@ufrgs.br), Porto Alegre-RS.
Prof. Assoc. Agronomia da UFPR (anibalm@ufpr.br), Curitiba-PR., Pesquisador CNPq
Este artigo tem apoio da Fundação Agrisus, CNPq e da Agropecuária Cerro Coroado
Qualquer informação adicional poderá ser obtida pelo site
ou pelo email ilp@ufpr.br .
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