A agricultura de precisão vem sendo discutida dentro das tecnologias alternativas para o manejo agrícola, viabilizada através do maior detalhamento e aproveitamento da informação sobre um sistema de produção, o que tem sido feito pela integração de técnicas de manejo com a observação de eventos em locais determinados dentro da lavoura. Os eventos citados se referem, na grande maioria, à expressão do potencial produtivo da lavoura e possíveis fatores influentes (limitantes de algum modo) no crescimento, desenvolvimento e produção final dos cultivos anuais ou perenes.
O conjunto de técnicas, que pode ir das mais simples até as mais complexas, prevê o aproveitamento da estrutura da variação espacial de elementos do meio físico, condicionantes da produtividade agrícola, para avançar na racionalização da aplicação de insumos e abrandamento de eventuais impactos ambientais advindos de superdosagens, por locais específicos, dentro da lavoura.
Existem críticas quanto à adoção e aos resultados práticos destas metodologias como estratégia complementar de manejo. Porém, o assunto necessita ainda maiores estudos e os pilares básicos desta questão não foram ainda adequadamente tratados para a realidade agrícola brasileira, inspirando reflexão e cautela.
Se considerarmos o aumento do grau de informação como uma etapa importante do processo de profissionalização do sistema produtivo e ponderarmos que existe uma grande variação de tipos de propriedades agrícolas, com os mais variados níveis de tecnificação, o assunto poderá ter importância em curto prazo para alguns produtores e carecer de significado imediato para outros. Por outro lado, a aplicação das citadas tecnologias pode não estar ligada unicamente à busca do aumento de produtividade, mas à viabilização de algumas práticas de manejo e à racionalização de outras, portanto, tratamos de vários níveis de aplicabilidade, que poderiam ser conseguidos a partir da adoção de níveis crescentes de informação.
Candidatos à adoção de algumas práticas, nesta área, necessitariam saber, inicialmente, qual o nível de contraste entre eventuais “manchas” de solo e a expressão do potencial produtivo ao longo dos anos, dentro do espaço da lavoura. Igualmente, é preciso saber se é possível mapear e reconhecer alguns fatores que sistematicamente limitam o potencial produtivo de um determinado cultivo, e que possam merecer atenção diferenciada, no espaço de uma mesma lavoura.
Fatores limitantes da produtividade
Notadamente, o mapeamento da produtividade tem sido bastante divulgado, como uma etapa importante para um possível gerenciamento da lavoura de modo diferenciado, uma vez que poderia ser um indicador de “manchas” ou zonas com fatores limitantes comuns, sendo, portanto, uma ferramenta auxiliar para a divisão da lavoura em subáreas de manejo, onde o produtor poderia vislumbrar a viabilidade de tratamento diferenciado. No entanto, este dado, isoladamente, apresenta alguns problemas quanto a sua correta interpretação e utilização, no que se refere à identificação e mapeamento de fatores limitantes da produtividade. Estes fatores (água, nutrientes, propriedade de solo, clima, pragas etc.) apresentam ações características que nem sempre são fáceis de detalhar, merecendo atenção as que seguem: a) alguns influenciam diretamente a produtividade; b) alguns interagem com outros; c) alguns fatores limitantes ocorrem todo ano, outros não; e) alguns influenciam de modo distinto os diferentes cultivos; f) o clima interage com a maioria dos fatores limitantes. Desse modo, dois talhões na lavoura, que apresentam baixa produtividade, podem ter causas em uma combinação diferente de fatores. Além disso, a variação temporal da produtividade (advinda da pressão climática sobre fatores limitantes do potencial produtivo) pode ser mais importante que a variação espacial, ou seja, pode ocorrer agravamento da inconsistência na expressão do potencial produtivo ao longo da lavoura, de um ano para outro, para os mesmos talhões, dificultando o aparecimento de um padrão. No entanto, cada lavoura se constitui em um particular de solo, de manejo e de clima que devem ser considerados.
Integrar e gerar informações
A existência de contrastes fortes, consistentes, levantados ao longo dos anos e a integração de dados nesta área são a chave para se chegar a informações úteis, que poderiam ser um suporte ao manejo, desde que tenham um custo justificável.
O mapeamento da produtividade, feito ao longo de algumas safras, pode ser cotejado com algumas características do solo, e o agrupamento de talhões com características físicas e de potencial produtivo similares pode ser feito com o intuito de se mapear possíveis áreas com potencial produtivo diferenciado. A título de exemplo prático, a figura 1(A e B -
) mostra uma área de 40 ha, cultivada com milho, onde foram retiradas várias amostras, numa distância de 50m entre elas. Em cada ponto foram determinados os valores de argila, cinco diâmetros de areia, matéria orgânica, densidade do solo e a água que fica retida sob dois valores de pressão no solo (caracterizando um intervalo prático de disponibilidade da água para as raízes). Os pontos foram agrupados em duas e três classes, de acordo com características físicas similares, através de técnica denominada “segmentação multivariada”. Excluiu-se do agrupamento, neste caso particular, os dados de produtividade obtidos na área, para se ter um dado separado (independente) para análise [veja comparação das classes, com os dados de produtividade obtidos em duas safras, com direções de plantio diferentes, na figura 2 (A e B)]. Os valores de argila, areia grossa e silte foram os dados mais importantes para a separação das classes, conforme dados resultantes da própria análise. Os níveis de argila decrescem a partir da primeira classe e os de areia grossa fazem o caminho contrário.
Este tipo de informação, cotejada com o histórico de chuva de uma determinada microrregião, pode ser candidata a auxiliar na escolha e escalonamento de épocas de plantio de cultivares e manejo de alguns nutrientes, por exemplo, o nitrogênio, desde que os contrastes físicos sejam evidentes, a ponto de justificar a divisão proposta, ou seja, se as classes apresentadas na Figura 1 (A e B) apresentam diferenças marcantes, a ponto de serem aproveitadas como classes de manejo. Para a correta implementação destas técnicas, estudos seriam necessários, na realidade agrícola brasileira, para desenvolver práticas de manejo que levem em consideração este tipo de informação, particularmente quanto à recomendação de nutrientes. A ausência de conhecimento agronômico, que dê suporte a esta idéia, tem levado a poucos resultados práticos na aplicação de nutrientes a taxas variáveis que, na grande maioria das lavouras dos países mais desenvolvidos, tem sido implementada a partir de recomendação ainda pouco evoluída para relação entre subáreas com potencial produtivo diferenciado e aplicação de nutrientes, principalmente em estudos envolvendo nitrogênio.
Por outro lado, a idéia de agrupamento de manchas, na lavoura, com fatores limitantes comuns (ou com potencial diferenciado) é antiga, sendo que provavelmente o melhor caminho para o levantamento de dados de solo não seja a metodologia usada para levantar os dados da área, na Figura 1 (A e B), mas sim, o uso de ferramentas que estão em evolução em nosso meio, como a videografia multiespectral, dentre outras, que poderiam fornecer alguns dados de solo, além de outros, de modo mais rápido e com custo menor. Este fato tem importância crucial quando áreas mais extensas são consideradas.
A Figura 2 (A e B) dá uma idéia do comportamento da malha de produtividade de um ano para outro, e a relação com as classes da Figura 1 (A e B). No primeiro ano (Figura 2A), a produtividade apresenta-se com duas áreas distintas, a área mais produtiva e a menos produtiva. Para a primeira safra é possível notar uma relativa coincidência entre a classe 1 (maior teor de argila, maior retenção de água) e as áreas mais produtivas.
Para o ano seguinte (Figura 2b), ocorre uma distribuição diferente das manchas mais produtivas, neste caso com a influência adicional da mudança da direção de plantio, sugerindo que, a presença física do milho (caule e raízes) se sobrepõe às condições do solo (propriedades hidráulicas), influenciando a distribuição da água no solo da área e a distribuição da malha de produtividade.
A divisão dos pontos amostrais em três classes não parece ser adequada, para a área em questão, em nenhuma das safras, pois em termos práticos, a produtividade mostra uma concentração maior em duas classes. Este fato, porém, necessitaria ser cadastrado por um número maior de anos.
O produtor deve ficar atento ao fato de que os dados de solo foram mantidos separados nesta exposição, para uma análise simples entre condições de solo e da produtividade do milho. Se uma nova análise fosse feita juntando os dois conjuntos de dados (solo e produtividade), ainda assim, necessitaria ser provado que as classes resultantes teriam contrastes suficientes para serem consideradas “de manejo”.
Informação versus incerteza
A agricultura de precisão ainda está na construção do seu alicerce, sendo que certamente este tipo de tecnologia segue o fluxo natural do trâmite tecnológico em cadeias produtivas, alcançando primeiro os que já estão no ponto mais alto, em termos de tecnificação, onde terá vários usos, conforme a adequação do nível de informação necessário e a justificativa econômica para aplicação das técnicas discutidas. Em todo caso, porém, é bom lembrar que a atividade agrícola sofre de grande incerteza, pois depende da natureza para se desenvolver, e um detalhamento da informação sobre o sistema produtivo, a um custo justificável, pode ser um meio eficaz de amenizar aquela incerteza e melhor aproveitar os recursos da terra.
Os resultados experimentais apresentados foram realizados na R & F Lavouras Ltda/Estância dois Irmãos, em Itapetininga, SP.
Antonio Odair Santos
IAC - APTA
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