Crise do coronavírus afeta exportações e importações brasileiras de hortaliças
Por Warley Marcos Nascimento, Pesquisador e Chefe-Geral da Embrapa Hortaliças
Capaz de passar despercebida em campo, por falta de identificação, Spodoptera albula acaba de ser detectada em lavouras de soja de Goiás e Mato Grosso. Favorecida pelo sistema de cultivo brasileiro, em que a soja situa-se como cultura principal sucedida de milho, esta praga tem potencial para se tornar parte do principal grupo do complexo de lagartas do gênero Spodoptera. Estudos sobre o nível de controle e eficiência de princípios ativos precisam ser aprofundados para enfrentar mais este desafio.
Spodoptera albula é uma praga que apresenta ampla distribuição geográfica, uma vez que pode ser encontrada em diversos locais como EUA, Caribe, América Central e América do Sul. No Brasil, seu primeiro registro foi na década passada na região sudeste atacando a cultura do amendoim. É uma espécie de lagarta que se alimenta de folhas e frutos, podendo causar dano econômico a diversas culturas como soja, milho, sorgo, girassol, algodão e hortaliças, implicando em prejuízo aos produtores rurais.
Possui alto potencial reprodutivo, visto que uma fêmea tem capacidade de ovipositar, uma a quatro camadas sobrepostas com 100 ovos a 250 ovos, que podem eclodir em seis dias após a postura, conforme condições climáticas. As lagartas de primeiro instar, raspam o limbo foliar e, conforme vão se desenvolvendo, destroem completamente a folha. Geralmente são encontradas em reboleiras devido à forma de oviposição em massa, pelo adulto, no terço médio da planta hospedeira.
A coloração das lagartas varia de preto-acinzentado a castanho-acinzentado, com duas fileiras dorsais de manchas triangulares escuras, cada uma delas com um ponto branco no centro (figura 1AB). A linha lateral é ausente ou fraca e as linhas dorsais e subdorsais são, frequentemente, de cor amarelo-brilhante, vermelha ou laranja, podendo ser fracamente marcada e a cabeça, castanha com manchas pretas (King & Saunders, 1984).
Após finalizar seu ciclo, a lagarta deixa a planta, dirige-se para o solo, e se transforma em pupa, de coloração avermelhada até quase preta, com uma duração de 15 dias a 17 dias.
As mariposas dessa espécie possuem de 26mm a 37mm de envergadura, asas anteriores e corpo com coloração cinza e as asas posteriores brancas, porém muitas vezes são translucidas (figura 2), podendo viver aproximadamente 12 dias. Geralmente, após o terceiro ou quarto dia da emergência da fêmea ocorre a oviposição. Assim, o ciclo completo de desenvolvimento do inseto, que se inicia na fase de ovo até adulto é de aproximadamente 30 dias.
Os adultos dessa espécie possuem hábito noturno, não são ativos durante o dia, e são encontrados em abrigos próximos ao solo, geralmente sob folhas. Se houver alguma perturbação, voam aleatoriamente, até encontrarem algum local, para que possam se esconder. Duas a quatro horas, após o pôr do sol, inicia-se o período ativo dos adultos, em que as mariposas se movimentam próximas às plantas hospedeiras para alimentação, acasalamento e oviposição (Todd & Poole, 1980).
Na fase de lagarta, S. albula compartilha com Spodoptera eridania e Spodoptera cosmioides muitas características morfológicas e biológicas semelhantes, o que dificulta sua identificação. Dessa forma é possível que essa praga esteja disseminada pelas regiões brasileiras, passando despercebida aos olhos de profissionais do campo.
Nos últimos anos, tem sido encontrada na cultura da soja, porém em populações baixas, não atingindo níveis de controle preconizados para as demais lagartas de igual gênero. O sistema de produção atual, em que a soja situa-se como cultura principal sucedida de milho, algodão ou sorgo, provavelmente, tem favorecido o desenvolvimento e adaptação dessa praga, ocasionando surtos populacionais. Dessa forma, gradativamente, S albula vem ganhando espaço e aparecendo com mais frequência, sendo crucial para o controle, sua correta identificação.
Na safra de verão de 2016, lagartas de S. albula foram encontradas atacando a cultura da soja, nos municípios de Rio Verde e Santo Antônio da Barra, em Goiás e Querência, no Mato Grosso, sendo necessário efetuar controle químico do inseto nessa última área. Foram encontradas lagartas ativas no período diurno e em "reboleiras" de diâmetro de aproximadamente 12 metros, formando ilhas de infestação não homogêneas na lavoura, causando desfolha nos terços superiores das plantas, preservando as nervuras centrais do limbo foliar (figura 3AB). Foram amostradas, em média, 10 indivíduos (3o instar a 5o instar) por metro de pano de batida, que foram identificados pelo pesquisador Alexandre Specht (Embrapa Cerrados, Planaltina DF).
S. albula possui tolerância a diversos inseticidas químicos como observado no município de Querência na Fazenda São Cristóvão (BR-242), 12°46’10.82” S e 52°13'43.62" O, onde houve necessidade de duas aplicações com diferentes princípios ativos (espinosina e diamida, respectivamente) em intervalo de 7 dias.
Assim como as demais espécies do gênero Spodoptera, albula possui resistência ao gene Cry1Ac de Bacillus thuringiensis. Fica evidente, portanto, a realização de estudos, associados ao Manejo Integrado de Pragas, como importante ferramenta para efetivar um melhor manejo contra essa praga. Por exemplo, o monitoramento com utilização de armadilhas para capturar adultos, como forma de averiguar a presença da praga, época de infestação, local e nível populacional. Com isso a base para a tomada de decisão para controlar S. albula pode ser definida pelo produtor. A associação e rotação de inseticidas pode evitar que esta praga proporcione prejuízos à lavoura e prevenir que princípios ativos percam sua eficiência. A eliminação de plantas voluntárias e restos culturais são importantes para evitar ou reduzir o potencial de ataque e reinfestação desta praga para a próxima safra ou a nova cultura a ser implementada.
Ainda, existem poucos estudos relacionados ao nível de controle de S. albula, de plantas daninhas hospedeiras e eficiência de princípios ativos, o que mostra a necessidade de se conhecer mais sobre essa espécie, que pode se tornar parte do principal grupo do complexo de lagartas do gênero Spodoptera.
Antonio Germano C. Rocha e Eduardo Lima de Carmo, Universidade de Rio Verde
Artigo publicado na edição 203 da Cultivar Grandes Culturas.
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