Efeitos do estresse calórico sobre a produção e reprodução do gado leiteiro

Estresse calórico deve ser respeitado como sendo um importante fator na diminuição da produção e reprodução de vacas leiteiras.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

A seleção genética nos últimos 50 anos na busca por vacas altamente produtivas alavancou a produção de leite. Entretanto, esse crescimento foi à custa do surgimento de animais mais sensíveis frente às diversas situações a que são submetidos, inclusive as ambientais. Assim, o estresse calórico deve ser respeitado como sendo um importante fator na diminuição da produção e reprodução de vacas leiteiras.

O clima é uma combinação de elementos que incluem a temperatura, umidade, chuvas, ventos, radiação e pressão barométrica. Sabe-se que possui interferência direta sobre a vida na terra, assim como sobre os processos fisiológicos que comandam a vida animal, tornando-se, então, fundamental o reconhecimento e o entendimento de como o organismo animal reage frente às condições climáticas, em especial ao calor.

Estresse calórico é o desequilíbrio que ocorre no organismo como resposta às condições ambientais desfavoráveis tais como a elevada temperatura, alta radiação solar e alta umidade relativa do ar. Estas, juntamente com a alta produção de calor metabólico, resultam em um estoque de calor corpóreo excedente, ou seja, o animal recebe uma grande quantia de calor do ambiente que aliada ao calor produzido pelo seu metabolismo, são maiores do que a quantidade de calor que o animal consegue eliminar. Geralmente, quando mais leite a vaca produz, maior é a quantidade de calor metabólico gerado – decorrente da digestão dos alimentos, tornando os animais mais produtivos os mais suscetíveis ao estresse calórico. Os bovinos possuem duas formas principais de manutenção de seu balanço termal e regulagem da temperatura corporal em condições de alto estresse calórico, sendo a principal delas a dispersão calórica pela evaporação, ofegação e salivação. Essas atividades aumentam as necessidades energéticas de manutenção do animal em uma estimativa de 20% a 35C, portanto, no caso das vacas leiteiras, isso significa que parte da energia de produção será redirecionada para a regulação termal.

O estresse térmico é conhecido há muito tempo por reduzir a produtividade e a eficiência reprodutiva do gado leiteiro, acarretando perdas econômicas que podem chegar à R$ 1.000,00/vaca/ano. Uma estimativa indica que 80% dessas perdas estejam associadas com a produtividade do animal – quantidade e qualidade do leite, e 20% associadas a desordens de saúde – problemas de reprodução e imunidade, os quais resultam em aumento da mortalidade e particularmente a frequência de mastite. Mudanças no comportamento alimentar são visíveis. As vacas tendem a realizar a maior parte da ingestão durante o período mais fresco do dia. Esta ingestão consequentemente é mais rápida, aumentando os riscos de redução de pH ruminal. Este consumo irregular de alimento pode levar a um aumento do intervalo entre partos, atrasando o ciclo reprodutivo do animal. Quando a temperatura aumenta acima de 26°C com a mesma umidade relativa já ocorre uma redução do consumo de alimento e da produção de leite. A fertilidade do rebanho também passa a ser afetada. Com temperaturas em torno de 32°C e a umidade relativa do ar acima de 60% - condições comuns em várias partes do Brasil, a queda na produção de leite pode chegar a 30% e a taxa de concepção fica seriamente comprometida. Os problemas de saúde decorrente do estresse calórico ainda incluem a alteração da duração do cio, da qualidade do colostro, do índice de concepção, do funcionamento uterino, das funções endócrinas e do desenvolvimento fetal, além de poder provocar uma distocia, a qual pode resultar em morte da vaca durante o parto, como também em morte embrionária prematura.

Quanto aos bovinos, o conforto térmico está na faixa entre -13ºC e +25ºC, sendo que assim a temperatura corporal estabiliza entre 38.4ºC a 39.1ºC. Em temperaturas a partir de 25°C a 26ºC as vacas já sofrem com o estresse calórico. Portanto, a recomendação é que os animais permaneçam em ambiente com temperaturas entre 4º e 24ºC e com umidade relativa do ar menor que 75%, podendo restringir esta faixa aos limites entre 7º e 21ºC, em função da umidade relativa do ar e da radiação solar.

Como diagnosticar?

Existem diferentes maneiras de medir o estresse calórico, sendo a mais comum o Índice de Temperatura e Umidade - calculado a partir da temperatura e da umidade relativa do ar. Entretanto, a mais eficaz é a medição da temperatura retal do animal. Estando as vacas com temperatura retal acima de 40ºC, resultado de uma exposição a temperaturas ambientes de 32C por até 72hs após uma inseminação, os índices de concepção caem a 0%, já em ambientes com temperaturas de 21C, onde a temperatura retal é de 38,5ºC os índices de concepção ficam em 48%.

Para identificar o estresse calórico nas suas vacas, podem-se escolher dez vacas em lactação ao acaso e aferir a temperatura retal de cada uma delas. Para isto, é importante saber que usualmente a temperatura retal dos bovinos apresenta um pico elevado no inicio da tarde e valores mínimos no início da manhã, dentro da faixa da normalidade, entre 38ºC e 39ºC. Portanto deve-se fazer este teste antes da ordenha da tarde. Se sete ou mais vacas apresentarem temperaturas retais acima de 39,4º C, é sinal de que estes animais estão mostrando sintomas de estresse calórico e, acima dos 40ºC considera-se estresse calórico severo. Deve-se também contar os batimentos cardíacos das dez vacas. Se a frequência cardíaca for maior que 60 batimentos por minuto em no mínimo sete animais, é também um sinal de estresse calórico. E, finalmente se ocorrer uma redução na ingestão de alimentos e na produção de leite, é provável que o rebanho esteja manifestando sinais de estresse calórico. A tabela 1 mostra uma relação das variáveis fisiológicas e níveis de estresse.

Prevenção

Foram identificadas três estratégias de manejo muito eficazes para minimizar os riscos de estresse calórico:

1. Modificação física do ambiente (sistemas de ventilação):

Ao providenciar sombra e ventilação suplementar para as vacas no verão, os efeitos do estresse calórico diminuem e a produtividade aumenta. Conforme estudos, vacas em um adequado sistema de ventilação aumentam o consumo de alimentos em aproximadamente 7,1% a 9,2%, a produção de leite em 7,1 a 15,8%, sendo que a temperatura retal diminuiu cerca de 0,4 a 0,5ºC e os índices respiratórios 17,6 à 40,6%.

2. Desenvolvimento genético de raças mais tolerantes ao calor:

Cruzamento de raças para a expressão de maior resistência frente a condições adversas, já vem sendo feitos e um exemplo disso é o cruzamento da raça Gir com a raça Holandês, tendo como origem a raça Girolando, uma espécie de animal mais rústico, resistente e que mantém bons índices produtivos de leite.

A novidade está em pesquisas realizadas com a raça Senepol, onde cientistas descobriram um gene diretamente relacionado ao crescimento da pelagem e à alta tolerância ao calor. Se este gene for identificado e isolado, possivelmente poderá ser introduzido em raças leiteiras. Com isso, vai se gerar uma alternativa de cruzamento com esta raça, selecionando alta produtividade de leite e baixa temperatura retal durante períodos de estresse calórico. Assim, talvez seja possível desenvolver um cruzamento em que a vaca possua alta tolerância ao calor sem comprometer sua produtividade.

3. Melhoramento nutricional:

O manejo nutricional para os períodos quentes do ano devem incluir uma dieta “fria”, aquela que gera uma alta proporção de nutrientes para síntese de leite e diminui o incremento calórico proveniente da fermentação e metabolismo dos alimentos. As características destas dietas são o alto teor de energia, fibra de alta fermentação, menor degradabilidade de proteínas e alto conteúdo de nutrientes protegidos. Pastagens tenras, silagem com alto conteúdo de grãos e concentrados ricos em gordura encaixam-se nessa categoria. Ainda, a suplementação mineral com potássio, sódio e magnésio, além de sempre manter água de boa qualidade à disposição dos animais, são práticas nutricionais fundamentais para se minimizar os efeitos do estresse calórico.

Portanto, tomando medidas preventivas e sempre mantendo o cuidado necessário, a produtividade, saúde e bem estar do rebanho estarão preservadas. Apesar de ser uma questão relevada por inúmeros produtores, o estresse calórico deve sim ser levado em conta no momento do estabelecimento de um rebanho, já que, silenciosamente, afeta parâmetros produtivos e reprodutivos, em especial, do gado leiteiro.

Marcelo Moreira Antunes – Graduando em Medicina Veterinária

Paula Giovana Pazinato - Graduanda em Biologia

Rubens Alves Pereira – Mestrando em Biotecnologia

Augusto Schneider – Doutorando em Biotecnologia

Ivan Bianchi – Doutor em Biotecnologia Agrícola

Marcio Nunes Corrêa – Doutor em Biotecnologia

Núcleo de Pesquisa, Ensino e Extensão em Pecuária

Confira esse texto, com tabelas, no link abaixo:

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