Daninhas em feijão: Competição acirrada

​A cultura do feijão sofre com a interferência de plantas daninhas como o picão-preto, que exige atenção e manejo adequado

20.11.2019 | 20:59 (UTC -3)

A cultura do feijão sofre com a interferência de plantas daninhas, que competem por recursos do ambiente, dificultam a colheita, limitam a produtividade e depreciam a qualidade do produto, além de servirem de hospedeiras para pragas e doenças. É o caso do picão-preto, que exige muita atenção e manejo adequado por parte dos produtores

O Brasil está entre os maiores produtores de feijão, com produção media anual de 3,1 milhões de toneladas. Produto típico da alimentação brasileira é cultivado por pequenos e grandes produtores em vários locais do país. Sendo um dos mais importantes componentes da dieta alimentar do brasileiro, tem elevado teor proteico, carboidratos, vitaminas, minerais, fibras e compostos antioxidantes que contribuem na redução de doenças. A cada dez brasileiros, sete consomem feijão diariamente. Entretanto, a produtividade da cultura no Brasil é considerada baixa, podendo triplicar quando se emprega o uso adequado de tecnologias na lavoura. Uma das causas da baixa produtividade é justificada pela interferência imposta pelas plantas daninhas na lavoura.

O feijoeiro apresenta ciclo que varia de 80 dias a 100 dias conforme a cultivar, forma dossel de 40cm a 50cm de altura e se desenvolve principalmente em regiões de clima ameno e livre de geada. Seu desenvolvimento apresenta período crítico de interferência por plantas daninhas até os 30 dias após a emergência, sendo que depois desse período as plantas daninhas já não interferem diretamente na produtividade, dispensando a aplicação de herbicidas.

Por ser uma cultura de ciclo vegetativo curto, torna-se bastante sensível à competição, sobretudo nos estádios iniciais de desenvolvimento vegetativo. As plantas daninhas nesta fase de desenvolvimento competem por recursos do ambiente (água, luz, nutrientes), dificultam a colheita, depreciam qualidade do produto, além de servirem de hospedeiras para pragas e doenças.

Espécies de plantas daninhas podem se desenvolver normalmente mesmo em condições desfavoráveis, como estresse hídrico, baixa fertilidade, acidez ou alcalinidade e solos compactados. Na fase de plântula, uma espécie não altera o desenvolvimento da outra. A interferência de uma planta sobre outra começa quando a demanda pelos fatores de desenvolvimento é maior que a quantidade disponível. As plantas daninhas causam problemas sérios para a agricultura, pois se desenvolvem em condições semelhantes às culturas desejadas, apresentam elevada adaptação e podem sobreviver e se perpetuar muito facilmente, reduzem a produtividade e aumentam os custos de produção.

A competição depende de um grande número de fatores relacionados à cultura do feijão ou das plantas daninhas presentes na área. Como exemplo se pode citar: cultivar, espaçamento, densidade de plantas, adubação, espécie de planta daninha, densidade de ocorrência e período de interferência.  Caso ocorra competição entre plantas daninhas e a cultura, as perdas podem ser de 23%-80%, dependendo dos fatores relacionados anteriormente.

São citadas como infestantes na cultura do feijão 32 espécies, sendo algumas as mais importantes: carrapicho de carneiro (Acanthospermum hispidum), picão-preto (Bidens pilosa), papuã (Brachiaria plantaginea), capim carrapicho (Cenchrus echinatus), capim colchão (Digitaria sp.), picão-branco (Galinsoga parviflora).

Uma das espécies de plantas daninhas que têm se destacado na cultura é o picão-preto (Bidens pilosa), planta herbácea, ereta, com porte variável de 20cm a 150cm. Possui desenvolvimento rápido, alta produção de sementes e em condições favoráveis pode se desenvolver o ano todo. Comumente infesta lavouras anuais em mais de 40 países, sendo que altas concentrações podem provocar redução de 30% na produtividade, além de ser planta hospedeira de fungos, nematoides e vírus.

No entanto, o manejo do picão-preto deve ser feito de forma a obter o máximo de benefícios para a cultura e o ambiente. Devido ao clima favorável, é evidente a presença de plantas de picão-preto em lavouras de feijão no sudoeste do Paraná, e do restrito conhecimento sobre a habilidade competitiva da cultura com a planta daninha em questão. Buscou-se verificar a hipótese de que o feijão apresenta habilidade competitiva superior, quando ocorre em proporção equivalente ao picão-preto.

Para determinar as relações de competição entre plantas, comumente são utilizados ensaios que permitem a interpretação do processo competitivo das espécies, os efeitos da população e a diferença do número de plantas da cultura com as plantas daninhas. Estes ensaios incluem a cultura sozinha e em mistura com plantas daninhas, em que o número de plantas por área das duas espécies é variável. A quantidade total de plantas é constante em todos os tratamentos do experimento, indicando qual espécie é mais competitiva, sendo que, de modo geral, as culturas têm mostrado ser mais competitivas que as plantas daninhas.

Quando se pensa em estudos de competição, o ideal é que ocorra a germinação da cultura e planta daninha ao mesmo tempo, isto é, no mesmo dia. Quando ocorre no mesmo dia é possível verificar a habilidade de competição das plantas por metro quadrado, em diferentes densidades de plantas daninhas e cultura. Desta forma, foram feitos estudos em casa de vegetação na Universidade Tecnológica Federal do Paraná Campus Dois Vizinhos (UTFPR-DV), em diferentes proporções da cultura e planta daninha, ou seja, foram testadas populações de até 400 plantas/m² das duas espécies juntas. 

Figura 1 - Diagrama da produção relativa média da massa seca aérea (A), altura (B) e número de folhas (C) de feijão e picão-preto em função da variação da proporção entre as duas espécies. UTFPR, Dois Vizinhos, PR, 2014
Figura 1 - Diagrama da produção relativa média da massa seca aérea (A), altura (B) e número de folhas (C) de feijão e picão-preto em função da variação da proporção entre as duas espécies. UTFPR, Dois Vizinhos, PR, 2014

De acordo com a Figura 1, os dados de produtividade relativa (PR) e produtividade relativa total (PRT) foram analisados por meio de diagramas e em função da proporção das espécies. Na análise de PR, a produção esperada é definida pela linha reta que liga o ponto da produção de cada espécie em estande puro (100:0) ao ponto de estande zero (0:100). Quando a PR resultar em linha reta, significa que não há efeito de uma espécie sobre outra. Em situações em que a PR resulte em linha côncava, há indicativo de prejuízo de uma ou de ambas as espécies, mas quando resultar em linha convexa existem benefícios para uma ou ambas as espécies. Para a PRT, se o valor for igual a 1 (linha reta), ocorre competição pelos mesmos recursos; se o valor for maior (linha convexa), a competição é evitada; e, se o valor for menor que 1 (linha côncava), há competição. Em outras palavras, linha cheia, acima da pontilhada, indica ser mais competitiva a cultura e/ou a planta daninha. Quando ocorrer da linha cheia apresentar-se abaixo da pontilhada, houve perdas para uma ou as duas espécies de plantas. Quando ficar a linha cheia sobre a pontilhada não houve competição entre as plantas.

No processo competitivo e nas condições em que foi realizado o ensaio, verificou-se que houve competição entre a planta daninha e a cultura do feijão por recursos como água, nutrientes, luz, espaço, entre outros fatores do ambiente. Para a produção de matéria seca, altura de plantas e número de folhas, a cultura do feijão expressou maior competitividade sobre a planta daninha durante os 30 dias de convívio, que são críticos para a cultura (Figura 1).

Características próprias do feijoeiro, como maior altura e área foliar, podem ter contribuído para o melhor desempenho competitivo da cultura por luz e espaço, embora tenham emergido no mesmo dia, refletindo assim em maior produção de matéria seca. Atributos como altura, acúmulo de biomassa, arquitetura do dossel, número e tamanho de ramos cooperam para maior competitividade em cultivares em relação às plantas competidoras. As diferenças em termos de competitividade das espécies avaliadas podem ser explicadas pelo fato de apresentarem características morfofisiológicas diferentes. As plantas de picão-preto, quando submetidas a forte competição, têm suas características fisiológicas do crescimento e desenvolvimento, normalmente, alteradas, reduzindo altura de plantas, matéria seca e número de folhas das plantas. Outro fator que pode ter contribuído para este resultado é o lento desenvolvimento da planta daninha nos primeiros dias após a germinação.

A cultura do feijão apresenta superioridade na competição com picão-preto interferindo no desenvolvimento da planta daninha, principalmente quando as duas espécies emergem no mesmo dia. Embora a cultura seja mais competitiva que picão-preto, o produtor rural deve estar atento à infestação da planta daninha nos 30 dias após a emergência DAE, pois são os dias mais importantes para a cultura, principalmente se já existirem plantas de picão-preto na área antes da emergência do feijão. É preciso lembrar que o controle integrado pode ser necessário, pois além de ser planta daninha agressiva e competitiva com as culturas por recursos do meio, o picão-preto pode servir de abrigo para pragas e doenças, com capacidade para provocar perdas significativas à cultura.


Andressa Camana, Pedro Valério Dutra de Moraes, Lucas da Silva Domingues, Jhessica Bortolotti, Maira Schuster, UTFPR-DV


Artigo publicado em dezembro de 2014, na edição 187 da Cultivar Grandes Culturas. 

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