Prejuízos do crestamento gomoso em cucurbitáceas e métodos de manejo

Causado pelo fungo Didymella bryoniae, o crestamento gomoso pode resultar em danos de até 100% em cucurbitáceas como melões, pepino partenocárpico e melancia, caso medidas eficientes de controle não sejam adotadas

15.01.2018 | 21:59 (UTC -3)

O crestamento gomoso (podridão gomosa ou gomose das cucurbitáceas) é uma doença causada pelo fungo Didymella bryoniae (sin. Mycosphaerella melonis; anamorfo: Ascochita cucumis). Esse patógeno pode infectar diversas espécies de cucurbitáceas cultivadas e silvestres. Nas espécies cultivadas, a doença tem sido mais importante em melões (Cucumis melo), tipos Valenciano e Nobre (C. melo var. reticulatus e C. melo var. canatalupensis), em pepino partenocárpico (“pepino japonês”) (C. sativus) e em melancia (Citrulus lanatus). Os danos podem chegar a 100%, quando medidas de controle não são empregadas.  

    Para a adoção de medidas para o controle do crestamento gomoso, de forma eficiente, há necessidade de se conhecer algumas características do patógeno e da epidemiologia da doença. D. bryoniae pode sobreviver de um cultivo para outro colonizando restos culturais da cultura anterior e também na forma de micélio dormente. Essas duas formas de sobrevivência tendem a ser fonte de inóculo primário para a cultura a ser instalada. Além disso, D. bryoniae é transmitido eficientemente por sementes. Em cultivos de melões nobres e pepino partenocárpico as sementes têm sido a principal fonte inóculo primário, com incidência de até 54% e 52%, respectivamente, e transmissão para plântulas de até 52% e 25%, respectivamente.

O patógeno se aloja internamente, tanto na casca, como no perisperma e no embrião das sementes. Esse inóculo primário tem sido um dos fatores que mais contribuem para epidemias de crestamento gomoso nesses dois agrossistemas. Vale a pena lembrar que a grande maioria das sementes de melões nobres e pepino partenocárpico é importada e que não tem havido nas embalagens informações sobre a qualidade sanitária dessas sementes.

Embora D. bryoniae possa ser transmitido eficientemente via sementes é raro observar a sintomatologia da doença em plantas durante os estádios de mudas; ou seja, raramente se percebe mudas doentes nas células das bandejas contendo substrato (antes do transplante). Após o transplante, por volta de 20 dias a 25 dias, aparecem na cultura os primeiros sintomas do crestamento gomoso. Geralmente no caule, na região de inserção das folhas cotiledonares, ou de inserção da primeira folha definitiva surgem pequenas manchas, de cor clara e aspecto corticoso. Essas manchas evoluem para manchas maiores, ocorrendo desenvolvimento longitudinal e transversal no caule e tornam-se enegrecidas, com a presença de grande quantidade de picnídios e peritécios. Numa fase seguinte ocorre anelamento do caule, com consequente murcha e morte da planta. Recentemente, Gasparotto et al (2011) mostraram que D. bryoniae apresenta infecção latente em mudas de melão e pepino, ou seja, as mudas estão infectadas, mas não apresentam sintomatologia da doença

    Essas características levam a sequências interessantes na epidemiologia da doença nas culturas no campo e da forma de controle que tem sido usada pelos agricultores. Como as mudas estão assintomáticas, não se tem empregado medidas de controle tanto com relação ao tratamento de sementes, como ao tratamento de mudas nas bandejas.

Os sintomas iniciais da doença na cultura ocorrem no caule, na região de interseção das folhas cotiledonares e primeira folha definitiva. Daí a doença se dissemina para outras regiões do caule da mesma planta ou de outras plantas. Uma das vias de disseminação mais eficientes tem sido os próprios agricultores, através de instrumental de desbrotas e podas. Ao desbrotar uma planta doente (assintomática ou sintomática) e em sequência desbrotar outra sadia transfere-se propágulos do patógeno. Vida et al (2012) mostraram que somente com a desinfestação do instrumental de poda pode ocorrer redução da doença em até 21,9% na cultura do melão. Outro aspecto refere-se ao fato de que, muitas vezes, as pulverizações com fungicidas têm apresentado resultados não satisfatórios. Isto porque, em vários casos, protege-se a folhagem mas os focos de infecção estão em segmentos baixeiros do caule.

Ressalte-se que o maior problema de crestamento gomoso nas culturas de melão e pepino está nas infecções no caule. Sintomas da doença na folhagem não são frequentes. Por isso é importante proteger, prioritariamente, o caule das plantas. Outra característica de D. bryoniae, importante para o controle da doença, descoberta por Gasparotto (2010), é a ocorrência de infecção sistêmica em melão. Trabalhos recentes mostraram ser este um fenômeno de ocorrência comum também em pepino.

   

Estratégias para interromper ou reduzir o ciclo da doença

 2 – A pulverização de mudas com fungicidas antes do transplante se constitui em uma estratégia que, preferencialmente, deve estar associada ao tratamento de sementes. Embora o tratamento de sementes possa resultar em redução drástica da transmissão para plântulas, normalmente não há erradicação do patógeno das sementes infectadas. Por isso, é frequente que, mesmo com o tratamento de sementes, ainda ocorra infecção em mudas com inóculo originado das sementes. Vale lembrar que D. bryoniae, normalmente, causa infecção latente em mudas. Por isso, mesmo com aparência assintomática, as mudas podem ser fonte de inóculo para epidemias da doença na cultura pós-transplante. Uma pulverização de mudas com fungicida tem chances de contribuir para significativa redução da intensidade da doença na cultura.

3 – A pulverização da cultura com fungicida pós-transplante de mudas é outra medida importante. Mesmo com o tratamento de sementes e/ou pulverização de mudas com fungicida, ainda pode ocorrer presença de inóculo primário na cultura, cuja fonte tenha sido as sementes. Também restos culturais de cultivos anteriores de cucurbitáceas colonizados pelo patógeno, micélio dormente e esporos originados de outras cucurbitáceas cultivadas constituem fonte de inóculo para a doença se instalar na cultura pós-transplante de mudas. A eficiência de controle se dá em função do fungicida empregado, do intervalo entre pulverizações e da otimização da tecnologia de pulverização. Acrescente-se a esses fatores a favorabilidade ao crestamento gomoso e a predisposição do hospedeiro: potencial de inóculo, condições climáticas e condição nutricional da cultura.

4 – A enxertia com porta-enxerto imune é outra alternativa. A enxertia é uma técnica usada frequentemente na cultura de pepino partenocárpico e está em fase de introdução na cultura de melões nobres. Um dos porta-enxertos mais empregados tem sido o híbrido de abóbora Shelpper, que é imune a D. bryoniae. Trabalhos têm mostrado que o uso da enxertia em vários híbridos de melões nobres empregando abóbora Shelper como porta-enxerto resultou na redução da severidade do crestamento gomoso em até 34,2%. A enxertia é considerada uma medida alternativa de controle e quando empregada isoladamente não proporciona controle prático, necessitando de medidas complementares.

5 – A nutrição equilibrada das plantas também é importante. Plantas que apresentam estressamento, principalmente de origem de balanço nutricional, estão muito mais predispostas a D. bryoniae, com a doença atingindo maior severidade. Trabalhos desenvolvidos por Penharbel (2011) mostraram que em cultivo hidropônico e do tipo “mulching” houve redução da severidade de D. bryoniae de 85,9% e 12,1%, respectivamente, em relação ao cultivo no solo. Esta também é uma medida que necessita de outras ações complementares de controle.

6 – O uso de híbridos menos suscetíveis também é recomendado. Embora não se disponha de híbridos imunes ou com nível alto de resistência, existem significativas diferenças de suscetibilidade a D. bryoniae entre híbridos de pepino e melões cultivados no Brasil. O híbrido de melão nobre Prince Hakusho é significativamente menos suscetível a D. bryoniae, do que os híbridos Bonus II e Sun Rise. Híbridos de pepino partenocárpico são, significativamente, menos suscetíveis ao patógeno, do que híbridos de melões nobres.


Clique aqui para ler o artigo na íntegra na edição 78 da Cultivar Hortaliças e Frutas.

 

 

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