Manejo Integrado gera produtividade e sustentabilidade no campo

Por Gabriela Vieira, engenheira agrônoma especialista em Manejo Integrado de Pragas (MIP) e produtos biológicos, e Descascando a Ciência, empresa de comunicação

08.10.2025 | 14:11 (UTC -3)

Quem atua no campo sabe: controlar pragas não é apenas questão de aplicar produtos — é estratégia! Ao longo dos anos, o Manejo Integrado de Pragas (MIP) deixou de ser um conceito acadêmico e passou a ser uma prática consolidada e que entrega sustentabilidade para a agricultura mundial e principalmente para o agro brasileiro.

Contexto do Manejo Integrado de Pragas

Não é por acaso que eu sempre digo: “Não existe milagre, existe manejo”. O MIP ganhou força e estrutura em meados da década de 1970, cerca de 20 anos após o início da Revolução Verde, quando os defensivos químicos — herbicidas, fungicidas e inseticidas — passaram a ser vistos como uma “solução milagrosa” para os problemas do campo.

No entanto, como acontece com qualquer tecnologia, o uso excessivo e sem estratégia começou a trazer efeitos colaterais: resistência de pragas/doenças e ressurgência populacional. A “solução milagrosa” já não entregava os mesmos resultados, e foi aí que a ciência passou a olhar com mais atenção para o manejo.

O foco deixou de ser apenas o produto e passou a incluir a integração de diversas ferramentas: o conhecimento mais aprofundado sobre o alvo biológico, monitoramento, bioinsumos, biotecnologia, práticas culturais e físicas, novas variedades e, claro, defensivos químicos — usados de forma estratégica, racional e sustentável.

Nesse sentido, o MIP não é uma solução isolada. Ele é a combinação inteligente de várias soluções, adaptadas à realidade de cada lavoura.

Essa personalização é indispensável para os bons resultados. Embora exista um padrão de MIP, cada área exige estratégias e ferramentas específicas — desde fatores óbvios, como a espécie cultivada, até aspectos menos triviais, como as características das populações de pragas da região, sua interação com o ambiente e até as condições edafoclimáticas.

Estratégia científica e necessária no campo

O MIP é um processo dinâmico, baseado na ecologia e na lógica dos ecossistemas. Seu objetivo é manter o equilíbrio, promovendo lavouras saudáveis com o menor grau de intervenção possível.

E aqui no Brasil, o caminho tem sido de avanço: ao longo das últimas décadas, programas de MIP têm sido aplicados com sucesso por pequenos, médios e grandes produtores, nas mais diversas culturas — de hortaliças como tomate, alface e batata-doce até grandes culturas como soja, milho e cana-de-açúcar. Esses exemplos mostram que o MIP é viável, funciona e traz benefícios concretos para todos.

Resultados reais do MIP no campo brasileiro

A adoção do Manejo Integrado de Pragas no Brasil é realidade em diferentes cadeias produtivas. Levantamentos da Embrapa, universidades e empresas do setor mostram que, quando aplicado corretamente, o MIP pode aumentar a produtividade, ao mesmo tempo que reduz os custos de produção.

Por exemplo, o MIP-Soja no Paraná é um caso emblemático. Os trabalhos começaram ainda na década de 1970, fruto de uma parceria entre a Embrapa Soja e a Emater-PR (hoje IDR-Paraná), com o objetivo de levar a prática para o dia a dia dos agricultores. Nas últimas dez safras, foram conduzidas unidades de referência em áreas de produção reais, junto a produtores, gerando resultados consistentes: diminuição do custo de produção e manutenção da produtividade.

O histórico é robusto — só na safra 2022/2023, os dados sistematizados pela Embrapa Soja (Série Documentos 455) confirmam que o MIP-Soja garante maior retorno econômico para o agricultor e benefícios ambientais para a sociedade, tornando-se um exemplo de agricultura sustentável aplicada. Esse trabalho é considerado um dos mais completos já realizados sobre a adoção do MIP-Soja por agricultores no país e repete-se ano após ano.

Na safra 2023/2024 (Série Documentos 467) os resultados mostram que o número de adeptos ao MIP vêm aumentando em função da conscientização dos produtores de que é necessário otimizar o uso de insumos, principalmente aqueles que afetam negativamente o meio ambiente.

Quando falamos em otimização de insumos, a questão não é apenas ambiental, mas também técnica e financeira. Alguns ingredientes ativos já sofrem forte pressão de seleção, exigindo aplicações mais frequentes e em maiores doses — o que eleva custos e riscos. Por isso, é essencial rotacionar o uso com outras alternativas disponíveis e, principalmente, incentivar o desenvolvimento e registro de novos defensivos: mais eficientes, seletivos e específicos, capazes de integrar o MIP de forma inteligente e sustentável.

O produtor como protagonista do MIP

O engenheiro agrônomo e produtor rural paranaense Sadi Filho, que conduz lavouras de soja, milho e cana-de-açúcar em Londrina (PR), o MIP é a base da sua rotina no campo: “o manejo integrado de pragas não elimina o uso de defensivos químicos, mas os utiliza de forma inteligente e racional, combinando métodos biológicos, culturais e genéticos para manter a lavoura saudável, produtiva e ambientalmente responsável. Eu acho simples e eficaz”.

Ele explica que a rotina de quem adota o MIP é bastante diferente daquela de produtores que seguem apenas calendários de pulverização ou apostam em uma única ferramenta de controle. O MIP exige planejamento, acompanhamento contínuo e integração de estratégias, mas gera resultados consistentes no campo.

“A meu ver, facilita porque a gente trabalha de forma antecipada ao problema. Uma parte essencial da rotina é o monitoramento semanal ou até mais frequente: instalar armadilhas (como feromônios e adesivas), fazer amostragens manuais em pontos estratégicos do talhão e registrar tudo. Isso exige tempo. No início pode parecer trabalhoso, mas depois se torna uma prática natural”, complementa.

Desde que iniciou as práticas com base no MIP, há mais de duas safras, Sadi já alcançou economia de cerca de 10% no uso de defensivos químicos, mantendo a produtividade da lavoura e reduzindo custos de produção.

Benefícios agronômicos, ambientais e econômicos

O Manejo Integrado de Pragas (MIP) tem se mostrado uma estratégia capaz de gerar ganhos consistentes no campo, unindo produtividade, rentabilidade e sustentabilidade. Experiências documentadas pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO) em diferentes regiões do mundo — de pequenas propriedades na Ásia e América Latina a lavouras comerciais nos Estados Unidos — comprovam que, quando bem implementado, o MIP:

  • Aumenta a produtividade: em diversos contextos, os rendimentos cresceram entre 13% e 19%, resultado de lavouras mais equilibradas, com menor pressão de pragas e melhor aproveitamento do potencial produtivo das plantas.
  • Reduz custos de produção: ao racionalizar o uso de insumos (principalmente inseticidas) e priorizar intervenções realmente necessárias, o produtor evita desperdícios e melhora sua margem de lucro.
  • Diminui riscos de desequilíbrios no campo: práticas como o monitoramento e o uso integrado de diferentes métodos de controle reduzem o impacto negativo sobre inimigos naturais e polinizadores, preservando serviços ecossistêmicos essenciais.
  • Aumenta a resiliência do sistema produtivo: lavouras manejadas com base no MIP tendem a responder melhor a variações climáticas e a pressões de pragas emergentes.

O papel dos defensivos químicos

A evolução tecnológica dos defensivos químicos tem permitido que eles sejam cada vez mais seletivos, ou seja, capazes de atuar com alta eficiência sobre as pragas-alvo enquanto preservam inimigos naturais e polinizadores — elementos essenciais para o equilíbrio do agroecossistema.

Além disso, as moléculas mais modernas oferecem maior eficácia em doses menores e podem ser aplicadas por métodos mais assertivos junto ao alvo a ser controlada (praga), ampliando o custo-benefício para o produtor.

Inovações recentes, como o uso de nanotecnologia em formulações químicas e biológicas, têm elevado ainda mais o nível de precisão e sustentabilidade no manejo integrado de pragas.

Outro ponto importante é a segurança. Assim como todos os outros já registrados, os novos ingredientes ativos e produtos passam por processos de avaliação toxicológica e ambiental, além das avaliações agronômicas, antes de serem registrados, garantindo que seu uso esteja alinhado com padrões internacionais de proteção à saúde humana e ao meio ambiente. Estes novos ingredientes, devido ao avanço da pesquisa e ciência, possuem a tendência de ter perfil toxicológico e ambiental mais favorável. 

Não há dúvidas sobre a importância da conscientização e do conhecimento para a utilização dos defensivos químicos — seja para alcançar maior eficácia de controle, para melhorar a seletividade ou para manejar populações de pragas resistentes. Por isso, é fundamental que novos defensivos continuem sendo desenvolvidos e registrados — mais eficientes, específicos e seguros — para mantermos a produtividade e a sustentabilidade no campo.

O MIP no Brasil é uma prova de que ciência, tecnologia e estratégia podem andar juntas para gerar resultados concretos no campo. Com a integração de diferentes ferramentas - do monitoramento das pragas às novas moléculas químicas - é possível aumentar a produtividade, reduzir riscos e preservar recursos naturais.

*Por Gabriela Vieira, engenheira agrônoma especialista em Manejo Integrado de Pragas (MIP) e produtos biológicos, e Descascando a Ciência, empresa de comunicação 

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