Manejo da mancha de alternária em algodão

Resistência genética desponta como mais barata, segura e racional entre as alternativas para conviver com a doença

11.08.2020 | 20:59 (UTC -3)

A resistência genética desponta como mais barata, segura e racional entre as alternativas para conviver com a mancha de alternária, doença secundária mas que tem demandado atenção nas lavouras de algodão do Brasil, favorecida pelo modelo agrícola e pelas condições ambientais.

Doenças foliares provocadas por fungos têm sido relatadas há longo tempo na cotonicultura da região meridional do Brasil. Entretanto, salvo ocorrências localizadas e intensas de ramulose, e um surto episódico grave de mancha de Stemphylium nos anos 1994 a 1996 – nos dois casos devido a incidência em cultivares muito suscetíveis – tais doenças nunca foram expressivas na região. Mesmo com incidências frequentes, sempre foram consideradas secundárias em seus efeitos.

Essa percepção, todavia, passa por considerável mudança a partir do primeiro quinquênio deste século, pela conjugação de dois fatores principais. De um lado, ocorre o deslocamento da cultura para regiões do Centro-Oeste brasileiro, especialmente Mato Grosso, onde prevalecem condições climáticas altamente favoráveis aos patógenos responsáveis por essas doenças. De outro, na esteira desse deslocamento geográfico, sobrevêm notável mudança tecnológica na condução da cultura, realizada agora em grandes áreas e com alto nível de mecanização nas suas práticas. Esse segundo fator viria a demandar cultivares adaptadas às novas condições, especialmente quanto a alta porcentagem de fibra, porte e compactação das plantas, resistência ao acamamento, ciclo mais precoce e determinado, maior retenção da pluma nas cápsulas e adaptação à colheita mecânica. Devido à inexistência, no Brasil, de cultivares com essas propriedades, quando da implantação dos novos sistemas de produção, iniciou-se e tornou-se regra a utilização, nas lavouras, de material introduzido, que se mostrou suscetível à maioria dos patógenos que aqui ocorrem. E isso vem acontecendo não apenas para as doenças mais destrutivas, mas também para aquelas outrora consideradas secundárias, entre elas a mancha de Alternária.

Mancha nas folhas do baixeiro
Mancha nas folhas do baixeiro
Manchas generalizadas por toda a planta
Manchas generalizadas por toda a planta

Conhecida e descrita há mais de um século, essa doença é causada no Brasil pelo fungo Alternaria macrospora Zimm. Sua importância tem sido destacada em outros países, mediante relato da incidência principalmente em cultivares de algodoeiro da espécie Gossypium barbadense, praticamente não cultivada comercialmente no Brasil. Nesses relatos têm sido apontados prejuízos de até 20% na produção, devidos a esse patógeno. As circunstâncias, já mencionadas, podem ocorrer na cotonicultura brasileira atual, tanto pelas condições ambientais favoráveis ao fungo, como pelo uso de cultivares de alta suscetibilidade.

 O progresso da doença é favorecido por alta umidade relativa, principalmente em temperaturas na faixa de 20ºC a 30oc. A infecção ocorre já nos cotilédones, manifestando-se, em seguida, nas folhas verdadeiras do baixeiro das plantas, quando atingem 20 dias a 30 dias de idade. Sob as mesmas condições, o desenvolvimento da doença é bem maior nos cotilédones do que nas folhas, o que os tornam o principal reservatório de inóculo para infectar as folhas que surgem a seguir.

Os sintomas iniciais são áreas de cor verde clara e forma indefinida, que evoluem para manchas circulares de tonalidade marrom e bordas enegrecidas e bem definidas. Nelas se notam anéis concêntricos de coloração escura, onde se encontram os esporos do patógeno. No centro das manchas verifica-se um halo de coloração amarelada. Em casos de incidência mais severa, pode ocorrer coalescência das lesões, levando à formação de áreas necróticas irregulares, que promovem rasgaduras nas folhas e até mesmo sua queda.

Comparação entre folhas de cultivar resistente e suscetível
Comparação entre folhas de cultivar resistente e suscetível

O patógeno em questão é transmissível por meio de sementes e sobrevive em restos culturais. Esses fatos já indicam providências necessárias para prevenir a ocorrência da doença, principalmente se for utilizada na lavoura cultivar suscetível. Entre elas, o emprego de semente isenta ou tratada, destruição de restos culturais e rotação de culturas. Todavia, estabelecida a doença, faz-se necessário seu controle por meios químicos. Para isso, fungicidas estanhados são os mais recomendáveis, havendo diversos deles, ao lado de outros grupos químicos, registrados para a doença, no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Em áreas onde já se espera utilizar fungicidas para controle de outras doenças, como ramulose e ramulária, pode-se cogitar o emprego de produtos que além destas, controlem também a mancha de Alternária.

Obviamente, o controle mais seguro, racional e econômico dessa e de outras doenças, se dá por meio de cultivares resistentes. Essa possibilidade pode ser verificada nas tabelas 1 e 2, nas quais se encontram resultados obtidos pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), em experimentos de campo realizados em localidades de São Paulo. Neles foram avaliados para a doença, sob infestação natural desse patógeno, cultivares e linhagens recentemente desenvolvidas pelas principais entidades que realizam melhoramento genético do algodoeiro no Brasil. O desempenho de cada cultivar é caracterizado por meio de notas médias, em escala que variou de 1 (máxima resistência), à 5 (suscetibilidade máxima).Verifica-se notável diferença entre as cultivares, havendo desde as altamente resistentes até as altamente suscetíveis, e outras, de desempenho intermediário. Ressalte-se que entre as mais suscetíveis foram estimadas perdas de até 12% na produção, devidas à incidência da doença. Assinale-se, ainda, que algumas cultivares têm desempenho inconsistente, mostrando-se resistentes em condições de baixa ou média infestação e suscetíveis sob incidências mais severas da doença. Esse fato deve ser levado em conta para que não ocorram equívocos na escolha da cultivar a ser utilizada. 


Edivaldo Cia e Milton Geraldo Fuzatto, Instituto Agronômico (IAC)


Artigo publicado na edição 211 da Cultivar Grandes Culturas.

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