De difícil controle, a giberela do trigo causa grandes prejuízos no trigo

A giberela em trigo é de difícil controle, com prejuízos severos em relação à produtividade e à qualidade do grão

26.02.2016 | 20:59 (UTC -3)

A giberela, causada pelo fungo Gibberella zeae, é uma doença que pode provocar prejuízos quantitativos e qualitativos em trigo, com importantes danos no rendimento de grãos e no peso do hectolitro, assim como produzir micotoxinas capazes de comprometer a segurança alimentar.

Na prática esta doença é de difícil controle, tanto pelo melhoramento genético quanto pelo emprego de fungicidas. Por esse motivo são necessários esforços na busca de ganhos na eficiência de controle da giberela em lavouras. Em laboratório, já foram identificados fungicidas com potencial de até 93,2% de controle da doença, porém no campo, diversos fatores interferem na ação fungitóxica. Deduz-se daí que a eficiência de controle nas lavouras pode ser melhorada pela qualidade da deposição dos fungicidas nos sítios de infecção. Esse aspecto tem estreita relação com o momento adequado para a pulverização de fungicidas. A tecnologia considera o início e o final do período de predisposição do trigo à infecção como sendo o começo da floração (anteras soltas e presas) até o estádio de grão leitoso (anteras presas presentes), ou seja, do estádio 60 ao 75 da escala de Zadoks et al (1974). Esse é o período durante o qual as espigas de trigo têm de ser protegidas pelos fungicidas.

A tecnologia de aplicação de produtos fitossanitários objetiva a colocação dos ingredientes ativos sobre os alvos em que a sua ação é necessária, com a máxima economia e o mínimo de desperdício e de contaminação do homem e do ambiente.

Analisando-se a baixa eficácia do controle da giberela, em lavouras, percebe-se que as dificuldades se devem, em grande parte, à deficiência da deposição de quantidades adequadas de gotas da calda fungicida no alvo onde são requeridos (as faces laterais das espigas), caracterizando um problema que envolve diretamente a tecnologia de aplicação.

Alvo da deposição

Os órgãos das plantas a serem protegidos pelo fungicida são as espigas orientadas na vertical e que apresentam forma cilíndrica. As infecções de Gibberella zeae ocorrem durante e após a antese do trigo até o estádio de grão leitoso, período em que a ação dos fungicidas é necessária para controlar esta doença.

Os sítios de infecção da giberela são as anteras, principalmente as parcialmente expostas ou presas.

Na realidade, o alvo da deposição dos fungicidas para o controle da giberela parece ter sido pouco considerado. Observa-se que os jatos das pulverizações não atingem as faces laterais das espigas, que devem ser protegidas, uma vez que aí estão localizados os sítios de infecção. Em parte, isso ocorre porque se utiliza o mesmo equipamento de pulverização (gotas direcionadas na vertical) para o controle de doenças foliares e das espigas.

Pesquisas demonstraram que jatos voltados com ângulo de 30o para frente proporcionaram maior cobertura nas espigas do que nas folhas-bandeira. O mercado oferece pontas que geram jatos planos duplos, sendo um voltado 30º para frente e outro 30º para trás, em relação à vertical. Também estão disponíveis pontas de jatos cônicos vazios, que lançam gotas segundo uma figura de um cone, direcionando-as para todos os lados, inclusive para frente e para trás.

A possibilidade da utilização de auxílio à barra de pulverização por meio de cortina de ar também deve merecer atenção. Estima-se que o estudo da dinâmica das gotas produzidas por diferentes equipamentos de pulverização e respectivas regulagens possam ser ferramentas úteis para auxiliar no equacionamento do problema.

Trabalhos experimentais

Durante as safras de trigo 2011/2012 realizaram-se ensaios no campo experimental da Universidade de Passo Fundo (UPF). Foram comparadas aplicações de fungicida através de uma barra de pulverização tradicional com bicos espaçados em 0,50m com uma barra dupla com e sem capa protetora do vento (Tabela 1).

Na tentativa de obter uma distribuição mais uniforme das gotas de pulverização ao redor das espigas de trigo, foi montada uma barra dupla capaz de direcionar jatos de pulverização tanto paralelamente quanto perpendicularmente à linha de deslocamento, em direção às faces laterais das espigas.

As duas barras e os respectivos bicos ficaram distanciados a 0,50m entre si. Considerando o sentido de caminhamento na pulverização, na barra 1 (à frente) os corpos de bicos duplos ficaram orientados no sentido norte/sul (paralelos ao caminhamento) e os da barra 2 (atrás) ficaram no sentido leste/oeste (perpendiculares ao caminhamento). Quando foram utilizadas pontas de jatos cônicos vazios, a barra foi coberta por uma “saia" composta por um filme plástico, para reduzir a interferência do vento que poderia causar excessivas perdas de gotas por deriva. O trigo, cultivar Mirante, foi conduzido em parcelas de 20m x 4m. No oitavo dia após o início da floração, foram aplicados os tratamentos, conforme consta na Tabela 1. Foi aplicado o fungicida piraclostrobina + metconazol a 0,75L/ha + óleo vegetal a 1,0L/ha + adjuvante organosiliconado 0,04L/ha.

Tabela 1 - Tratamentos comparados e parâmetros de tecnologia de aplicação

Tratamento

Corpo de bico

Pontas

Volume (L/ha)

1. Barra tradicional

simples

Jato plano XR110015

150

2. Barra dupla

duplo

Jato plano XR110015

200

3. Barra dupla +

capa protetora

duplo

Jato cônico vazio HB1

200*

Tratamento

Corpo de bico

Pontas

Volume (L/ha)

1. Barra tradicional

simples

Jato plano XR110015

150

2. Barra dupla

duplo

Jato plano XR110015

200

3. Barra dupla +

capa protetora

duplo

Jato cônico vazio HB1

200*

* A velocidade do vento foi de 5,0km/h em todos os tratamentos, porém, a presença da capa protetora amenizou o efeito do vento sobre as gotas no tratamento 3.

Para avaliar a deposição de gotas foram utilizadas espigas artificiais (cilindros confeccionados com tubos de PVC) posicionadas dentro das parcelas de trigo na mesma altura que as espigas reais. Os tubos de PVC com 1,0cm de diâmetro foram cortados em segmentos de 10cm de comprimento e posicionados na vertical através de "estacas" de aço (arames) com diâmetro de 1,5mm. Os cilindros foram envolvidos com cartão hidrossensível. Foram distribuídas cinco espigas artificiais, aleatoriamente dentro de cada parcela.

Após a pulverização, as imagens dos cartões hidrossensíveis foram digitalizadas com auxílio do software CIR 1.5. Foi determinado o número de impactos de gotas/cm², o diâmetro mediano volumétrico (DMV - µm) e a cobertura (%) em cada “quadrante" do cartão que foi nomeada de acordo com o sentido da aplicação em norte (N), sul (S), leste (L) e oeste (O). Os dados foram submetidos à análise de variância e comparação de médias pelo teste de Duncan a 5% de probabilidade de erro.

Resultados preliminares

As barras apresentaram diferenças na uniformidade da cobertura nos quadrantes N (norte), S (sul), L (leste) e O (oeste) das espigas (Tabela 2). Com a barra tradicional (jato na vertical), houve maior cobertura nos lados N e L das espigas, demonstrando que este equipamento não cobre uniformemente todos os lados das espigas, o que também pode ser explicado pela ação do vento causando deriva nos sentidos N e L das espigas.

Independentemente do modelo de ponta, a barra dupla proporcionou cobertura semelhante em todas as faces da espiga. Com a ponta cone-vazio houve maior número de impactos/cm² e menor DMV ao redor da espiga, aumentando a chance de atingir o alvo. A qualidade da deposição foi semelhante com a ponta de jato-leque montada na barra dupla, reforçando que o direcionamento dos jatos também deve ser perpendicular às espigas. As pontas de jatos cônicos-cheios (Micron-HB1) apresentaram melhor desempenho com a capa protetora, indicando que necessitam desta proteção, mesmo em condições de velocidade do vento abaixo de 8km/h, devido à maior suscetibilidade à deriva das gotas finas que geram, quando comparadas às gotas geradas por pontas de jatos planos simples (XR11001).

Tabela 2 - Eficiência de uma barra tradicional e de uma barra dupla equipada com dois modelos de pontas na deposição de gotas nas laterais de espigas artificiais de trigo. FAMV/UPF- Passo Fundo/RS, 2012

Equipamento

Face da espiga

Impactos/cm2

DVM* (µm)

Área coberta** (%)

Barra tradicional

com pontas de jatos planos da série

XR 110015

N

256

225,5

18,3 a

S

22,3

265,9

2,2 b

L

169,3

222,4

13,8 a

O

42,3

247,7

3,7 b

Média

122,4

240,4

9,5

Barra dupla com pontas de jatos planos da série

XR 110015

N

233,6

295,2

14,9 a

S

119,5

312,1

14,0 a

L

171,5

359,3

16,6 a

O

256,8

248,1

13,9 a

Média

195,3

303,7

14,8

Barra dupla com proteção e pontas de jatos cônicos

vazios, série HB1

N

260,8

228

15,4 a

S

196,1

257,3

13,7 a

L

228,5

222,7

12,7 a

O

145

241,4

12,0 a

Média

207,6

237,4

13,4

Equipamento

Face da espiga

Impactos/cm2

DVM* (µm)

Área coberta** (%)

Barra tradicional

com pontas de jatos planos da série

XR 110015

N

256

225,5

18,3 a

S

22,3

265,9

2,2 b

L

169,3

222,4

13,8 a

O

42,3

247,7

3,7 b

Média

122,4

240,4

9,5

Barra dupla com pontas de jatos planos da série

XR 110015

N

233,6

295,2

14,9 a

S

119,5

312,1

14,0 a

L

171,5

359,3

16,6 a

O

256,8

248,1

13,9 a

Média

195,3

303,7

14,8

Barra dupla com proteção e pontas de jatos cônicos

vazios, série HB1

N

260,8

228

15,4 a

S

196,1

257,3

13,7 a

L

228,5

222,7

12,7 a

O

145

241,4

12,0 a

Média

207,6

237,4

13,4

(*) - Diâmetro mediano volumétrico dos impactos em cartão sensível (µm)

(**) – Porcentagem da superfície das espigas artificiais coberta por impactos das gotas de pulverização, onde médias seguidas pelas mesmas letras, dentro de cada equipamento, não apresentam diferenças significativas entre as faces das espigas artificiais - teste de Duncan a 5 % de probabilidade de erro.

Com a utilização da barra dupla, a porcentagem de cobertura da área da superfície das espigas foi maior (13,4% - jatos cônicos, e 14,8% - jatos planos), em comparação com a barra tradicional com pontas de jatos planos (9,5%), o que corresponde a ganhos de cobertura de 41% e de 56%, respectivamente.

Estes resultados são preliminares e sustentam a hipótese de que há necessidade de direcionar os jatos de calda em direção às faces laterais das espigas. Para comprovar se a cobertura obtida de 13% a 15% é eficiente no controle da giberela, estão sendo conduzidos ensaios em nível de campo na Universidade de Passo Fundo (UPF).

Considerações finais

- As anteras presas são os sítios de infecção, local crítico, em que o fungicida potente deve ser depositado, garantindo proteção durante o período de predisposição;

- A deposição uniforme de fungicidas nas faces laterais das espigas do trigo ainda é o maior desafio para o controle da giberela;

- O direcionamento do jato da pulverização na direção perpendicular à lateral da espiga é uma estratégia que permite atingir toda a superfície das espigas com maior cobertura e homogeneidade;

- As "espigas artificiais" são uma ferramenta útil para a pesquisa na avaliação da qualidade da cobertura das faces laterais das espigas de trigo.

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