Como evitar a deriva na pulverização

Deriva é um dos principais complicadores da pulverização, fenômeno que exige muita atenção e técnica para ser minimizado nas operações

18.06.2020 | 20:59 (UTC -3)

A deriva é um dos principais complicadores da pulverização, fenômeno que exige muita atenção e técnica para ser minimizado nas operações.

A elevação da produção agrícola no mundo ocorre em resposta à crescente demanda de alimentos para necessidades nutricionais e de matérias-primas para a indústria. A otimização do potencial produtivo das lavouras é uma condição determinante para a existência da atividade como negócio, pois maximiza o rendimento com o menor uso de recursos na área cultivada.

Estes recursos podem ser de âmbito local como o solo, a água e a luz, ou importados como as sementes, os fertilizantes e os agroquímicos. Independentemente de que seja local ou não, estes recursos devem ser utilizados de forma racional para que a exploração não caracterize um desperdício de recursos, não antecipe sua escassez e não eleve custos de produção.

Além do uso racional, a produção agrícola não deve condicionar a utilização de um recurso que comprometa outro. Assim, um fertilizante não pode ser usado de forma que contamine o solo, mesmo elevando a produção. Da mesma forma, um agroquímico não pode contaminar o ambiente fora do local de aplicação, mesmo que controle com eficácia um determinado agente de dano.

Estudos avaliam os fatores que interferem na deriva.
Estudos avaliam os fatores que interferem na deriva.

Embora esta premissa seja lógica, ela não é fácil de ser obedecida, principalmente quando se trata de produção agrícola. Esta dificuldade se deve, entre outras razões, às condições locais variáveis em que esta atividade é praticada e ao tempo, normalmente escasso, para execução dela.

Dada a extensão do território brasileiro, pode-se considerar a grande variabilidade das condições climáticas, operacionais e culturais existentes nas diferentes regiões, o que exige do produtor um profundo conhecimento ou uma boa orientação das técnicas agrícolas necessárias para uma produção sustentável.

Dentre os riscos da ocorrência de impactos negativos ao ambiente, a deriva de agroquímicos é um dos mais preocupantes, pois caracteriza-se pelo transporte do produto aplicado para um local indesejado. Esta deriva pode ocorrer dentro da área onde o agroquímico foi pulverizado, seja por escorrimento, rebore ou não interceptação da gota no alvo, neste caso chamada de endoderiva. Já o transporte da gota que se dá para fora da área de pulverização é chamado de exoderiva.

Esta última, além de submeter pessoas, animais e outros cultivos a riscos de desconforto, comprometimento da saúde ou queda da produção, também reduz a quantidade de produto aplicado na área agrícola, minimizando o nível de controle sobre o agente de dano e reduzindo o período residual do produto na proteção da lavoura.

CONDIÇÕES DETERMINANTES NA OCORRÊNCIA DA DERIVA

Vários são os fatores que podem elevar os riscos da deriva de um agroquímico, entre eles alguns são bastante conhecidos e serão aqui destacados, tais como: a condição ambiental no momento da pulverização, o espectro de gotas produzido pelo equipamento e a composição da calda de pulverização.

CONDIÇÃO AMBIENTAL

Dentre as variáveis ambientais, a velocidade do vento, a temperatura e a umidade do ar são os mais relevantes. Embora seja frequentemente atribuída à ocorrência de vento a maior responsabilidade na deriva, deve-se considerar que o vento movimentara para fora da área de aplicação somente as gotas que não caíram na direção do alvo, caracterizando a deriva por transporte horizontal.

Dentre as variáveis ambientais, a velocidade do vento, a temperatura e a umidade do ar são as mais relevantes.
Dentre as variáveis ambientais, a velocidade do vento, a temperatura e a umidade do ar são as mais relevantes.

A ausência de vento também pode favorecer a deriva, pois em momentos de desprendimento de calor do solo ou deflexão do calor de sua superfície, seja dia ou noite, a ausência de vento intensifica a transferência de calor para o ar próximo em contato com o solo, reduzindo sua densidade e promovendo o deslocamento ascendente de massas de ar, chamadas de correntes convectivas, que retardam ou impedem a queda das gotas mais leves da pulverização na área que foi tratada, caracterizando a deriva vertical.

A temperatura e a umidade do ar atuam de forma combinada, acelerando a evaporação dos compostos voláteis das gotas (Figura 1). Desta forma, a água que compõe a gota é retirada para o ambiente na forma de vapor, tornando a gota mais leve, expondo-a à ação convectiva do calor ou ao arrastamento pelo vento, que movimentará esta gota a um local indesejado. Este local pode ser a área vizinha, uma cidade ou uma fonte de água, próxima ou distante.

Figura 1 - Tempo de evaporação da gota após o contato com o alvo em diferentes condições ambientais em pulverizações com e sem adjuvantes
Figura 1 - Tempo de evaporação da gota após o contato com o alvo em diferentes condições ambientais em pulverizações com e sem adjuvantes

ESPECTRO DE GOTAS

A micronização das gotas na pulverização pode ser obtida de diversas formas, promovendo classes de gotas de diversos tamanhos, sendo as classes mais comuns as finas, médias e grossas. Cada classe de gotas deverá ser utilizada considerando as condições locais da aplicação como produto, condições climáticas, índice de área foliar, entre outros. Cada uma destas classes de gotas está caracterizada por um determinado intervalo de diâmetro, mas isto não significa que todas as gotas do espectro estarão dentro deste intervalo. Aquelas gotas mais finas da pulverização representam as de maior risco de deriva.

Estudos são realizados para identificação de como alguns fatores afetam o espectro de gotas. Dentre os que mais podem ter efeito sobre a qualidade delas estão as pontas de pulverização e a pressão operacional. Pontas de jato plano de uso ampliado são reconhecidamente aquelas com a maior variabilidade das gotas, elevando o potencial de deriva numa pulverização devido ao elevado percentual de gotas muito finas. Já as pontas com indução de ar produzem níveis baixos de gotas finas, permitindo que produtos de maior risco ambiental possam ser usados com baixos riscos de deriva (Figura 2).

Figura 2 - Deriva coletada em túnel de vento a 5, 10 e 15 metros de distância, com diferentes velocidades de vento em pulverizações com pontas de gotas finas e grossas
Figura 2 - Deriva coletada em túnel de vento a 5, 10 e 15 metros de distância, com diferentes velocidades de vento em pulverizações com pontas de gotas finas e grossas

Associada aos parâmetros de prestação da ponta de pulverização está a pressão de trabalho. A mesma pode ser modificada de acordo com a vazão e taxa de aplicação pretendida, sendo estes parâmetros diretamente proporcionais à pressão operacional. Quanto maior a pressão operacional, mais intenso será o choque do jato ou lâmina de líquido projetado pelo orifício da ponta com o ar da atmosfera, intensificando a micronização do líquido e a formação de gotas mais finas.

Assim, embora a elevação da pressão aumente também a vazão para promover correções na taxa de aplicação, sua adoção pode aumentar os riscos de deriva (Figura 3), alertando que a forma mais segura de se aumentar a taxa de aplicação é a substituição de uma determinada ponta de pulverização por outra de maior vazão absoluta, não requerendo elevação da pressão.

Figura 3 - Deriva coletada em túnel de vento a 5, 10 e 15 metros de distância, com diferentes pontas de pulverizações com duas pressões de trabalho
Figura 3 - Deriva coletada em túnel de vento a 5, 10 e 15 metros de distância, com diferentes pontas de pulverizações com duas pressões de trabalho

COMPOSIÇÃO DA CALDA

A composição da calda de pulverização tem também elevada influência nos riscos de deriva. Pesquisas têm mostrado que algumas formulações de agroquímicos podem reduzir o impacto ambiental destas aplicações (Figura 4). Atualmente, a indústria desenvolve formulações ou produtos específicos que permitem que o produtor possa fazer as pulverizações com segurança, minimizando as perdas para o ambiente e potencializando sua eficiência.

Dentre os produtos mais usados estão alguns adjuvantes de calda com características antideriva e as formulações de baixa volatilidade e com baixo potencial de formação de gotas muito finas. Estes produtos estão difundidos no meio agrícola e são recomendados quando o risco de perdas em evaporação ou deriva é iminente, devendo ser escolhidos por sua segurança.

Figura 4 - Deriva coletada em túnel de vento a 5, 10 e 15 metros de distância, com diferentes formulações de agroquímicos em pulverizações com e sem adjuvantes
Figura 4 - Deriva coletada em túnel de vento a 5, 10 e 15 metros de distância, com diferentes formulações de agroquímicos em pulverizações com e sem adjuvantes

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Alguns fatores potencializadores de deriva podem agir associados na sua ocorrência. Assim, as altas temperaturas e baixas umidades do ar podem reduzir rapidamente a massa das gotas pela evaporação da porção volátil, retardando sua queda, expondo estas gotas à flutuação pela ação convectiva que, combinadas com ventos fortes, terminam por arrastar estas gotas para outros locais.

Da mesma forma, a tecnologia de formulações mais seguras, associada à ponta de pulverização mais indicada, também pode reduzir a níveis mínimos estas perdas, compensando-as mesmo nos períodos de maior risco.

Uma tecnologia já estudada que poderá trazer à agricultura aplicações mais seguras é o uso da assistência de ar associada com sistemas eletrostáticos. A assistência é uma corrente de ar na barra de pulverização, gerada artificialmente que projeta a gota para baixo. O sistema eletrostático, por sua vez, carrega as gotas com uma carga elétrica que tem por objetivo proporcionar a atração eletromagnética entre a gota e a planta. A fixação rápida da gota na planta diminui seu tempo de exposição no ambiente, reduzindo as perdas por evaporação e por deriva.

Se a deriva é um fator nocivo à aplicação por reduzir o depósito no local desejado, o conhecimento e o uso das tecnologias de aplicação mais seguras são reconhecidamente alternativas para sua redução. Os conhecimentos técnicos para sua adoção devem ser buscados e divulgados na sua totalidade. Esta condição é essencial para que o crescimento da produção agrícola ocorra de forma segura e justa, permitindo o consumo de um alimento saudável em um ambiente livre de contaminação.


Marco Antonio Gandolfo, Ulisses Delvaz Gandolfo, Instituto Dashen de Pesquisa Agronômica 


Artigo publicado na edição 164 da Cultivar Máquinas.

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